
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001215-24.2021.4.03.6125
RELATOR: Gab. 50 - DES. FED. SILVIA ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA JOSE DE ALMEIDA REGIS
Advogado do(a) APELADO: ALVARO AUGUSTO RODRIGUES - SP232951-N
OUTROS PARTICIPANTES:
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001215-24.2021.4.03.6125
RELATOR: Gab. 50 - DES. FED. SILVIA ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA JOSE DE ALMEIDA REGIS
Advogado do(a) APELADO: ALVARO AUGUSTO RODRIGUES - SP232951-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Juiz Federal Convocado BUENO DE AZEVEDO (Relator):
Trata-se de agravo interno interposto pela parte autora (ID 287755744) em face da decisão monocrática (ID 286997316) que deu julgou prejudicada a apelação do INSS em decorrência de inovação recursal e reformou, de ofício, a r. sentença do juízo a quo para julgar extinto o feito sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, IV, do CPC e da tese fixada no Tema nº 629 do STJ.
Em seu recurso, requer a agravante a retratação da r. decisão monocrática para julgar procedente a ação e conceder o benefício pleiteado ou o envio para julgamento do recurso pela C. 8ª Turma desta Corte. Sustenta que há prova material nos autos, corroborada por prova testemunhal, suficiente para comprovar o exercício de atividade laboral na qualidade de segurado especial por todo o período de carência necessário.
Sem contrarrazões do INSS.
É o relatório.
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001215-24.2021.4.03.6125
RELATOR: Gab. 50 - DES. FED. SILVIA ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA JOSE DE ALMEIDA REGIS
Advogado do(a) APELADO: ALVARO AUGUSTO RODRIGUES - SP232951-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Juiz Federal Convocado BUENO DE AZEVEDO (Relator):
O presente recurso não merece provimento.
O pedido exposto na peça exordial consiste na condenação da autarquia previdenciária a conceder o benefício de aposentadoria por idade rural, desde a DER (29/10/2012), na condição de segurado especial.
Para comprovar o alegado exercício de atividade rural em regime de economia familiar, de modo a preencher a carência exigida de 180 meses, a autora juntou aos autos as cópias dos seguintes documentos:
1. Certidão de casamento dos pais da autora celebrado em 04/02/1956, datada de 11/12/2020, onde consta a profissão do genitor como lavrador (ID 284964493);
2. Certidão de casamento da autora celebrado em 12/10/1974, datada de 16/11/2005, onde consta a profissão do cônjuge como lavrador (ID 284964495);
3. Certidão de casamento da autora celebrado em 12/10/1974, atualizada em 24/02/2021, onde consta a profissão do genitor da autora como lavrador (ID 284964494);
4. Certidão de nascimento da filha da autora ocorrido em 03/11/1978, atualizada em 11/12/2020, onde consta a profissão do genitor como lavrador (ID 284964496);
5. Título de eleitor do cônjuge, datado de 04/12/1974, onde consta como profissão lavrador (ID 284964497);
6. Ficha cadastral do “Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Fartura”, datado de 22/01/1976, onde consta como profissão lavrador (ID 284964498);
7. Declaração unilateral de “Luiz Melo”, datada de 08/11/2012, onde consta a informação de que a autora exerceu atividade rural no período de 08/1999 a 09/2012 (ID 284964499);
8. Cópia da CTPS da autora, emitida em 17/01/1975, sem vínculo empregatício (ID 284964500);
9. Ficha de identificação civil expedida pela Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo – SSP/SP, datada de 16/11/2005, onde consta a profissão da autora como “rural” (ID 284964501);
10. Ficha cadastral de paciente emitida pela Prefeitura Municipal de Taguaí, cadastrada em 07/02/2007, onde consta a profissão da autora como “trabalhador rural” (ID 284964502).
Em audiência de instrução, a parte autora prestou depoimento pessoal afirmando que desde criança exerceu trabalhos rurais como “boia-fria” com sua família. Em relação as atividades exercidas, citou “quebrar milho”, “carpir a terra”, colher feijão e arrancar batatas. Disse ainda que depois seu casamento, ocorrido em 1974, seguiu exercendo atividades rurícolas com seu cônjuge. Afirmou que deixou de exercer tais atividades há cinco anos devido a problemas de saúde (ID 284964690).
Por seu turno, a testemunha Benedito Ap. Carneiro informou que conhece a autora desde a infância e que a mesma trabalhava junto à família como “boia-fria”. Afirmou que trabalhou com a autora no exercício de tais atividades, mas não se recorda o período e nem local, pois trabalhavam em diversas fazendas. Não sabe se a autora exerce atividades rurais atualmente. Afirmou que até cerca de oito ou dez anos, a autora exercia tais atividades (ID 284964690).
A testemunha José Roberto informou que conhece a autora há quarenta anos, época em que trabalharam juntos como “boia-fria” em várias fazendas colhendo feijão, milho e café. Disse que há cerca de cinco anos a autora não mais exerce atividades laborais (ID 284964690)
Por sua vez, a testemunha Ester Marcos da Silva disse que conhece a autora “da roça” há cerca de vinte anos, uma vez que trabalharam juntas em diversos lugares como “taquara branca” e “batatinha”. Informou que colhiam café e milho, recebendo o pagamento semanalmente. Informou que há cerca de cinco anos a autora não exerce atividades rurícolas, que sabe tal informação pela própria autora (ID 284964689).
O art. 201, §7º, inciso II, da CF, anuncia que é assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, para os trabalhadores rurais e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal, aos 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e aos 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher.
Os requisitos para a aposentadoria por idade rural, para os filiados ao RGPS à época da edição da Lei nº 8.213/91, estão dispostos nos §§ 1º e 2º do art. 48 e no art. 39, inciso I, ambos dispostos na Lei de Benefícios, que exigem: idade mínima de 60 anos para o homem e 55 anos para a mulher (art. 48, § 1º ); e o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, independente do recolhimento de contribuições.
Para o segurado que implementar o requisito etário cumulado com o tempo de serviço necessário após o ano de 2011, conforme artigos 25, inciso II, 142 e 143 da Lei nº 8.213/91, o tempo de serviço rural exigido será de 180 meses.
Em se tratando de aposentadoria por idade rural do segurado especial, tanto os períodos posteriores ao advento da Lei nº 8.213/91 como os anteriores podem ser considerados sem o recolhimento de contribuições.
Implementados os requisitos legais, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo (DER) ou, na ausência deste, e desde que caracterizado o interesse processual para a propositura da ação judicial, da data do respectivo ajuizamento (STF, RE 631.240, Rel. Ministro Luís Roberto Barroso, julgado em 03/09/2014).
Importante ressaltar que a EC 103/2019 não alterou as regras para a concessão da aposentadoria por idade rural.
Contudo, o cálculo do benefício deverá ser efetuado na forma do art. 26 da EC 103/2019, ou, no caso de ser computado unicamente tempo de serviço rural em regime de economia familiar, deverá prevalecer o disposto no art. 39, inciso I, da Lei nº 8.213/91 (RMI de um salário mínimo).
Em suma, os requisitos necessários para a concessão de aposentadoria por idade rural são: a) idade mínima de 60 anos, para homens e de 55 anos para mulheres; b) efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior à DER, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, independente do recolhimento de contribuições; c) cumprimento da carência necessária.
A controvérsia dos autos recai sobre a demonstração de atividade rural na qualidade de segurado especial pelo tempo necessário à concessão do benefício (180 meses). Quanto ao requisito etário, a autora, nascida em 06/07/1957, comprovou o cumprimento em 2012.
Em relação à demonstração da atividade campesina, de acordo com o art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91, a comprovação do tempo de atividade rural para fins previdenciários exige, pelo menos, um início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea (Recurso Especial Repetitivo nº 1.133.863/RN, Rel. Des. Convocado Celso Limongi, 3ª Seção, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011).
O art. 106 da Lei nº 8.213/1991 traz uma relação de documentos, cujo rol é meramente exemplificativo, sendo admitidos como início de prova material quaisquer documentos que indiquem, de forma direta ou indireta, o exercício da atividade rural, inclusive em nome de outros membros do grupo familiar (STJ, AgRg no AREsp 31.676/CE, Quinta Turma, Rel.Ministro Gilson Dipp, julgado em 28/08/2012).
Na análise dos documentos é imprescindível que se considere as particularidades do meio rural, bem como a dificuldade do segurado, que não raras vezes é pessoa humilde de pouca instrução, em obter documentos que comprovem o tempo de labor rural controvertido.
Ainda, quanto à necessidade de início de prova material, importante mencionar a Súmula 149, do STJ que dispõe: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário.
Além do verbete sumular transcrito, devem ser observados os precedentes vinculantes do STJ, consoante as seguintes teses firmadas:
Tema 532: O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
Tema 554: Aplica-se a Súmula 149/STJ ('A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário') aos trabalhadores rurais denominados 'boias-frias', sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
Tema 629: A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.
Tema 642: O segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade.
No caso dos autos, a autora não logrou êxito em comprovar o efetivo desempenho de atividades rurícolas necessário ao enquadramento como segurado especial, uma vez que as provas materiais apresentadas são referentes aos anos de 1974 (Certidão de casamento da autora celebrado em 12/10/1974, datada de 16/11/2005) e 1976 (Título de eleitor do cônjuge, datado de 04/12/1974, onde consta como profissão lavrador, e Ficha cadastral do “Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Fartura”, datado de 22/01/1976, onde consta como profissão lavrador).
A certidão de casamento dos genitores da autora, a Certidão de casamento da autora atualizada (documento nº 3) e a Certidão de nascimento da filha foram retificados no ano de 2020 para inclusão da profissão de trabalhador rural, o que torna frágil a prova quanto ao período a que se refere tal labor.
É certo que não se se exige do segurado especial início de prova material correspondente a todo o período equivalente à carência do benefício, sendo possível a extensão do período comprovado por documentos diante de sólida prova testemunhal colhida sob o crivo do contraditório.
Contudo, no presente caso, o lapso temporal transcorrido entre as provas apresentadas soma aproximadamente 30 (trinta anos), tempo excessivamente extenso para que se reconheça o exercício de atividade rurícola baseada apenas em provas testemunhais.
A oitiva das testemunhas não substitui a prova material necessária ao reconhecimento do labor rural exercido, tampouco supre sua omissão, pois possuem apenas o condão de corroborar as alegações fundadas nas provas documentais que, todavia, estão ausentes no caso concreto.
Neste ponto, cabe esclarecer que a Ficha de identificação Civil expedida pela Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo – SSP/SP, datada de 16/11/2005, onde consta a profissão da autora como “rural” (ID 284964501) e a Ficha cadastral de paciente emitida pela Prefeitura Municipal de Taguaí, cadastrada em 07/02/2007, onde consta a profissão da autora como “trabalhador rural” (ID 284964502) fazem prova material do período de 2005 a 2007, apenas, sendo insuficientes para concessão da aposentadoria.
Diante da insuficiência do conjunto probatório apresentado nos autos, o processo deve ser extinto sem julgamento de mérito, conforme decisão proferida nos autos do REsp nº 1.352.721/SP, Tema 629 do STJ, cujo caráter é vinculante.
Com a aplicação do referido tema, assegura-se que, caso o segurado especial venha a obter outros documentos que possam ser considerados prova material do labor rurícola, lhe seja conferida a oportunidade de novo ajuizamento de ação sem o risco de ser extinta em razão da coisa julgada.
Diante de todo o exposto, nego provimento ao agravo interno, para manter na íntegra a r. decisão monocrática agravada.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ESCASSEZ DE PROVA MATERIAL DO LABOR RURAL. PERÍODO EXTENSO SEM INÍCIO DE PROVA DOCUMENTAL.
- Os requisitos necessários para a concessão de aposentadoria por idade rural são: a) idade mínima de 60 anos, para homens e de 55 anos para mulheres; b) efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior à DER, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, independente do recolhimento de contribuições; c) cumprimento da carência necessária.
- Em relação à demonstração da atividade campesina, de acordo com o art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91, a comprovação do tempo de atividade rural para fins previdenciários exige, pelo menos, um início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea (Recurso Especial Repetitivo nº 1.133.863/RN, Rel. Des. Convocado Celso Limongi, 3ª Seção, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011).
- Neste sentido, a Súmula 149, do STJ dispõe: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário.
- Não se se exige do segurado especial início de prova material correspondente a todo o período equivalente à carência do benefício, sendo possível a extensão do período comprovado por documentos diante de sólida prova testemunhal colhida sob o crivo do contraditório.
- No presente caso, o lapso temporal transcorrido entre as provas apresentadas soma aproximadamente 30 (trinta anos), tempo excessivamente extenso para que se reconheça o exercício de atividade rurícola baseada apenas em provas testemunhais.
- Agravo não provido.
