
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006089-07.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - JUIZ CONVOCADO FERNANDO MARCELO MENDES
APELANTE: NEUZA VIEIRA DE SOUZA
Advogado do(a) APELANTE: JESSICA LORENTE MARQUES - MS16933-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006089-07.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: NEUZA VIEIRA DE SOUZA
Advogado do(a) APELANTE: JESSICA LORENTE MARQUES - MS16933-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pela parte autora contra a r. sentença de primeiro grau que julgou improcedente o pedido e condenou a parte requerente ao pagamento das custas processuais e honorários de advogado fixados em 10% (dez por cento) do valor da causa, nos termos do art. 85, §2º, do CPC, cuja exigibilidade fica suspensa em razão da benesse da gratuidade judiciária (art. 98, §3º, do CPC).
A parte autora interpôs recurso de apelação alegando que a sentença deve ser reformada, uma vez que o autor demonstrou seu labor rural por meio de prova material e testemunhal e faz jus à aposentadoria por ter idade rural, na forma requerida na inicial, devendo ser acolhido o recurso para reformar a sentença e conceder a aposentadoria por idade rural.
Sem as contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006089-07.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: NEUZA VIEIRA DE SOUZA
Advogado do(a) APELANTE: JESSICA LORENTE MARQUES - MS16933-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado mostra-se formalmente regular, motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação (art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o e passo a apreciá-lo nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil.
A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), bem como a demonstração do exercício de atividade rural, além do cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei (art. 201, § 7º, II, da CF/88 e arts. 48, 49, 142 e 143, da Lei nº 8.213/91).
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material corroborado por prova testemunhal. Ademais, para a concessão de benefícios rurais, houve um abrandamento no rigorismo da lei quanto à comprovação da condição de rurícola dos trabalhadores do campo, permitindo a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais para os filhos, ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não tenha se dado sob o regime de economia familiar.
Cumpre ressaltar que, em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante exigência equivaleria a retirar destes qualquer possibilidade de auferir o benefício conferido em razão de sua atividade.
O art. 143 da Lei n.º 8.213/1991, com redação determinada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, dispõe que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Saliento, ainda, que, segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
No caso dos autos, a autora, nascida em 06/08/1959, comprovou o cumprimento do requisito etário para a concessão da aposentadoria por idade rural no ano de 2014. Assim, considerando que o implemento desse requisito se deu quando já havia encerrado a prorrogação prevista no art. 143 da Lei de Benefícios, é necessária, após 31/12/2010, a comprovação do recolhimento de contribuições para os empregados rurais, trabalhadores avulsos e diaristas, além da comprovação do cumprimento da carência de 180 meses, a teor do que dispõe o art. 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91, com vistas à concessão do benefício.
Observo, no entanto, que a parte autora alega seu labor campesino em regime de economia familiar (segurado especial) e o trabalho rural eventualmente exercido poderá ser reconhecido mediante a apresentação de início de prova material, corroborado por prova testemunhal, consistente e robusta.
Cumpre salientar, nesses termos, que o trabalho rural exercido em regime de economia familiar, a fim de classificar a parte autora como segurada especial (e justificar a ausência de contribuições previdenciárias), pressupõe a exploração de atividade primária pelo indivíduo como principal forma de sustento, acompanhado ou não pelo grupo familiar, mas sem o auxílio de empregados (art. 11, VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91).
Assim, nos termos do art. 11, VII, da Lei 8.213/91, consideram-se segurados especiais, em regime de economia familiar, os produtores, parceiros, meeiros, arrendatários rurais, pescadores artesanais e assemelhados, que exerçam atividades individualmente ou com auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo, residindo na área rural ou em imóvel próximo ao local onde a atividade rural é exercida e com participação significativa nas atividades rurais do grupo familiar.
In casu, para comprovar o alegado labor rural, a parte autora acostou aos autos certidão de casamento com Juliano Rodrigues Oliveira, datada de 28/01/1981 e certidão de casamento com Levino Gomes Rodrigues, datada de 11/04/1997, constando a profissão da autora como sendo do lar e do marido como porteiro; ficha de inscrição de matrícula, na qual consta como seu endereço residencial área rural; declaração anual de produtor rural em nome do esposo Levino Gomes Rodrigues, referente aos anos de 1987, 1990, 1992, data em que ainda não vivia maritalmente com a autora; comprovante de pagamento de imposto sobre propriedade territorial rural entre os anos de 1991, 1994 e 2009, cadastro de imóvel rural em nome do pai da requerente; certificados de cadastro do Incra, em nome do pai da requerente, referentes aos exercícios de 1986, 1987, 1988 e 1989; certificados de cadastro de imóvel rural, concernentes aos anos de 2003 a 2005, em nome de Nilza Vieira de Souza; ficha de atendimento hospitalar, constando o endereço da autora na zona rural; nota fiscal de comercialização de produtos agrícolas em nome da requerente, emitidas em 2011, 2012, 2013, 2014, 2017, 2018 e 2019; contrato de arrendamento firmado entre o pai da requerente e o esposo Levino Gomes Rodrigues, firmado em 1993 e contrato de comodato firmado em 30/09/2009 até 30/09/2019 entre a requerente e Nilza Vieira e cópia d CTPS da autora constando contratos de trabalho de natureza urbana nos anos de 1972 a 1976 e junto a Secretaria da Educação de Campo Grande no ano de 2000 a 2001.
Da prova material acostada aos autos, verifica-se que o labor rural da autora só se comprova a partir do ano de 2011, pelas notas fiscais apresentadas, corroborada pela prova testemunhal, visto que anteriormente a esta data os documentos demonstram o labor rural da autora eventual e de natureza urbana. No entanto, referido período, não satisfaz a carência mínima necessária para os privilégios concedidos aos segurados especiais na qualidade de trabalhador rural em regime de economia familiar.
Dos documentos apresentados, ambos os maridos da autora se declararam trabalhadores de natureza urbana, não úteis a entender sua qualidade de rurícola à autora, assim como, das provas materiais apresentadas em seu nome, remetem, majoritariamente a atividade de natureza urbana, sendo exercido de forma híbrida, não abrangida pela aposentadoria por idade rural nos termos do § 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91, conforme requerimento inicial.
Cumpre salientar que, quanto à prova testemunhal, pacificado no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que apenas ela não basta para a comprovação da atividade rural, requerendo a existência de início de prova material, conforme entendimento cristalizado na Súmula 149, que assim dispõe: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção do benefício previdenciário". Em suma, a prova testemunhal deve corroborar a prova material, mas não a substitui.
Dessa forma, ausentes os requisitos necessários para a concessão da aposentadoria por idade rural na forma requerida na inicial, vez que não apresentou prova suficiente do labor rural no período de carência mínima para a benesse pretendida, a improcedência do pedido é medida que se impõe, devendo ser mantida a sentença em seus exatos termos, vez que em conformidade com entendimento desta E. Turma de julgamento.
Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito previdenciário da parte autora em demonstrar sua qualidade de segurada especial com trabalhadora rural em regime de economia familiar no período de carência mínima exigida pela de lei de benefícios previdenciários, a improcedência do pedido é medida que se impõe.
Por esses fundamentos, nego provimento à apelação da parte autora, mantendo, in totum, a sentença que julgou improcedente o pedido de aposentadoria por idade rural, nos termos consignados.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO - APOSENTADORIA POR IDADE RURAL - EXIGÊNCIA DE PROVA MATERIAL DO LABOR RURAL - REQUISITOS LEGAIS DESCUMPRIDOS.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), bem como a demonstração do exercício de atividade rural, além do cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei (art. 201, § 7º, II, da CF/88 e arts. 48, 49, 142 e 143, da Lei nº 8.213/91).
2. Ausentes os requisitos necessários para a concessão da aposentadoria por idade rural na forma requerida na inicial, vez que não apresentou prova suficiente do labor rural no período de carência mínima para a benesse pretendida, a improcedência do pedido é medida que se impõe, devendo ser mantida a sentença em seus exatos termos, vez que em conformidade com entendimento desta E. Turma de julgamento.
3. Apelação da parte autora desprovida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
