Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5000354-95.2017.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal ANA LUCIA JORDAO PEZARINI
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
06/06/2018
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 11/06/2018
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA DA ESPOSA.
EXTENSÃO AO MARIDO. EXCEPCIONALIDADE. FALTA DE CARÊNCIA. IMPROCEDÊNCIA.
- Requisito etário adimplido em 29/01/2010.
- Em relação à certidão de casamento, não há contemporaneidade com o lapso no âmbito do qual
haveria de ser comprovado o labor rural (29/07/1995 a 29/01/2010), sequer se referindo a
pequeno quinhão.
- No que tange aos documentos em nome da consorte do vindicante, verifica-se, segundo extrato
do CNIS colacionado aos autos (id. 395113, fls. 23/25), a existência de vínculo empregatício de
natureza urbana (CBO 8484 – “trabalhadores na fabricação e conservação de alimentos”) no
período de 01/02/2002 a 29/12/2007, situação esta a descaracterizar qualquer início de prova
documental de trabalho rurícola extensível ao cônjuge até então.
- Frise-se não se tratar de labor rural em regime de economia familiar, hipótese em que,
excepcionalmente, admite-se o exercício de atividade rural concomitante ao desempenho de
trabalho urbano por um dos integrantes da família, desde que módicos os valores recebidos com
tal atividade, permanecendo o labor campesino como principal sustentáculo do núcleo familiar.
- Assim, ainda que admitido a aproveitamento de início de prova documental da esposa, pelo
demandante, após o encerramento do vínculo de natureza urbana da consorte, resta evidenciado
o não cumprimento da carência necessária à outorga da benesse vindicada.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
- Apelo autoral improvido.
- Apelo do INSS provido para julgar improcedente o pedido.
Acórdao
APELAÇÃO (198) Nº 5000354-95.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - DES. FED. ANA PEZARINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, PROCURADORIA-
REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: SALMO BATISTA ISMAEL
Advogado do(a) APELADO: JAYSON FERNANDES NEGRI - SP2109240S
APELAÇÃO (198) Nº 5000354-95.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - DES. FED. ANA PEZARINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, PROCURADORIA-
REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: SALMO BATISTA ISMAEL
Advogado do(a) APELADO: JAYSON FERNANDES NEGRI - SP2109240S
R E L A T Ó R I O
Cuida-se de apelação autárquica e recurso adesivo tirados de sentença, não submetida à
remessa oficial, que, em autos de concessão de aposentadoria por idade de trabalhador rural,
julgou procedente o pedido e condenou o réu no pagamento do benefício, a partir do
requerimento administrativo, discriminados os consectários, arbitrada verba honorária em 10%
sobre o valor da condenação, observada a Súmula 111 do STJ (id. 395139, fls. 01/03).
Em seu apelo, pugna o INSS pela reforma da decisão combatida, ao argumento de ausência de
início de prova material da atividade rurícola, bem como não comprovação de atividade rural pelo
período de carência. Subsidiariamente, questiona o critério de correção monetária (id. 395139, fls.
19/26).
A parte autora, em razões de recurso adesivo, pleiteia a majoração da verba honorária
sucumbencial (id. 395139, fls. 38/41).
Ofertadas contrarrazões apenas pelo autor (id. 395139, fls. 31/36), subiram os autos a este
Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5000354-95.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - DES. FED. ANA PEZARINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, PROCURADORIA-
REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: SALMO BATISTA ISMAEL
Advogado do(a) APELADO: JAYSON FERNANDES NEGRI - SP2109240S
V O T O
Inicialmente, afigura-se correta a não submissão da r. sentença à remessa oficial.
De fato, o artigo 475, § 2º, do CPC/1973, com redação dada pelo art. 1º da Lei nº 10.352/2001,
que entrou em vigor em 27 de março de 2002, dispõe que não está sujeita ao reexame
necessário a sentença em ações cujo direito controvertido não exceda a 60 (sessenta) salários
mínimos.
Nesse sentido, segue o entendimento do e. Superior Tribunal de Justiça:
"AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. REEXAME
NECESSÁRIO. SENTENÇA ILÍQUIDA. PERDA DA AUDIÇÃO. AUXÍLIO-ACIDENTE.
PRESSUPOSTOS. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. IMPOSSIBILIDADE.
1. A sentença ilíquida proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município e as
respectivas autarquias e fundações de direito público está sujeita ao duplo grau de jurisdição,
exceto quando se tratar de valor certo não excedente de 60 (sessenta) salários mínimos.
2. Afastado, na origem, o direito ao auxílio-acidente, em razão de inexistirem os pressupostos à
sua concessão, impede o reexame da matéria, em âmbito especial, o enunciado 7 da Súmula
desta Corte.
3. Agravo interno ao qual se nega provimento."
(STJ, AgRg no Ag 1274996/SP, Rel. Min. Celso Limongi, 6ª Turma, DJe 22.06.2010).
No caso dos autos, considerando as datas do termo inicial do benefício (requerimento
administrativo em 28/05/2012, id. 395089 – fl. 04) e da prolação da sentença (10/07/2014), bem
como o valor da benesse, de um salário mínimo, verifico que a hipótese em exame não excede os
60 salários mínimos.
Não sendo, pois, o caso de submeter o decisum de primeiro grau à remessa oficial, passo à
análise dos recursos em seus exatos limites.
Pois bem, a aposentadoria por idade de rurícola exige idade mínima de 60 anos (homem) e 55
anos (mulher), bem assim comprovação do exercício de atividade rural, ainda que de forma
descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de
meses idêntico à carência da benesse, conforme tabela progressiva, de cunho transitório, inserta
no art. 142 da Lei nº 8.213/91, a ser manejada conforme o ano de implementação do requisito
etário, ficando afastada a obrigatoriedade de contribuições. Findo o período de vigência da norma
de transição, imperioso aplicar-se a regra permanente estampada no art. 48 e parágrafos do
mesmo diploma, na dicção da Lei nº 11.718/2008, fincada, nesse particular, a exigência de
demonstração do exercício de labor rural por 180 meses (carência da aposentadoria por idade).
Muito se debateu a respeito da comprovação da atividade rural para efeito de concessão do
aludido benefício e, atualmente, reconhece-se na jurisprudência elenco de posicionamentos
assentados sobre o assunto, a nortear apreciação das espécies e a valoração dos respectivos
conjuntos probatórios. Dentre esses entendimentos, podem-se destacar os seguintes:
(i) é suficiente à demonstração do labor rural início de prova material (v.g., documentos expedidos
por órgãos públicos que contemplem a qualificação rurícola da parte autora, não sendo taxativo o
rol de documentos previsto no art. 106 da Lei nº 8.213/91), corroborado por prova testemunhal
coesa e harmônica, sendo inservível a tal finalidade prova exclusivamente testemunhal (Súmula
STJ 149), inclusive para os chamados "boias-frias" (REsp nº 1.321.493/PR, apreciado na
sistemática do art. 543-C do CPC);
(ii) são extensíveis à mulher, a partir da celebração do matrimônio ou do limiar da união estável,
os documentos em que os cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores
(v.g., STJ, AGARESP 201402280175, Relatora Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJE
11/12/2014)
(iii) não se enquadra como princípio documental certidão recente da Justiça Eleitoral, preenchida
de acordo com informações fornecidas pelo próprio postulante do jubilamento, assemelhando-se,
portanto, à singela declaração unilateral de atividade profissional (e.g., TRF3, AC
00160584920114039999, Relator Juiz Convocado Valdeci dos Santos, Décima Turma, e-DJF3
01/07/2015; AC 00025385620104039999, AC 1482334, Relatora Desembargadora Federal Tania
Marangoni, Oitava Turma, e-DJF3 16/04/2015).
(iv) o afastamento do ofício rural, após o preenchimento de todos os requisitos exigidos à
aposentadoria, não interfere em sua concessão, sendo, contudo, inaplicável aos rurícolas o
estatuído no art. 3º, da Lei nº 10.666/2003 (STJ, PET nº 7.476/PR, 3ª Seção, Rel. Min. Napoleão
Nunes Maia Filho, j. 13/12/2010, Rel. p/ acórdão Min. Jorge Mussi; AgRg no REsp nº 1.253.184,
5ª Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 06/09/2011; AgRg no REsp nº 1.242.720, 6ª Turma, Rel. Min.
Sebastião Reis Junior, j. 02/02/2012; REsp nº 1.304.136, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamim,
j. 21/02/2013, DJe 07/03/2013), sob pena, inclusive, de se atribuir aos trabalhadores rurais regime
híbrido em que se mesclariam as vantagens típicas dos campesinos e outras inerentes
exclusivamente aos obreiros urbanos;
(v) possível o reconhecimento de tempo de serviço rural antecedente ou ulterior ao princípio de
prova documental apresentado, desde que ratificado por testemunhos idôneos (STJ, REsp nº
1.348.633/SP, Relator Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJE
05/12/2014).
A despeito de toda evolução exegética a respeito da matéria, certo é que alguns pontos
permaneceram polêmicos por anos e apenas recentemente experimentaram pacificação. Talvez o
maior deles diga respeito, justamente, à necessidade de demonstração da labuta rural no período
imediatamente anterior ao requerimento da benesse.
Respeitáveis posições recusavam uma resposta apriorística do que viesse a se entender pela
expressão período imediatamente anterior, sob o argumento de que a solução da controvérsia
passa por acurado estudo de cada caso concreto, com destaque à cronologia laboral da parte
autora, a fim de definir se verdadeiramente se está diante de pessoa que dedicou sua vida
profissional às lides rurais.
Sem embargo, o dissenso acabou desfechado pelo c. STJ em sede de recurso representativo de
controvérsia, in verbis:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE
RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE
TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER
PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Tese
delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º
combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que
estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural,
momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo
48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter
atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo
descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito.
Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os
requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício. 2. Recurso especial do INSS
conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código
de Processo Civil." (RESP 201202472193, RESP - RECURSO ESPECIAL - 1354908, Relator
MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, DJE 10/02/2016).
No mesmo sentido:
AGARESP 201401789810, Relator Min. HERMAN BENJAMIN, STJ, SEGUNDA TURMA, DJE
28/11/2014; AGA 200501236124, Relatora Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, STJ,
SEXTA TURMA, DJE 19/10/2009; AGARESP 201301680980, Relator HUMBERTO MARTINS,
STJ, SEGUNDA TURMA, DJE 26/08/2013; AC 00098544720154039999, Relator
DESEMBARGADOR FEDERAL SERGIO NASCIMENTO, TRF3, DÉCIMA TURMA, e-DJF3
Judicial 1 09/12/2015.
Da análise dos entendimentos jurisprudenciais coletados, penso que a concessão da
aposentadoria por idade de trabalhador rural há de se atrelar à comprovação do desempenho de
labor rural quando da propositura da ação, da formulação do requerimento administrativo ou, ao
menos, por ocasião do atingimento do requisito etário, como, de resto, textualmente deliberado
por esta E. Corte em paradigma da Terceira Seção: EI 00139351020134039999, Relatora
DESEMBARGADORA FEDERAL THEREZINHA CAZERTA, e-DJF3 Judicial 1 10/06/2015.
Outra temática remanesce polêmica à atualidade, mormente na seara desta egrégia Corte, e diz
com a necessidade de contemporaneidade do início de prova material amealhado a, quando
menos, uma fração do período exigido pela lei para a outorga do benefício.
Muito embora reconheça postura algo hesitante deste Tribunal - que, muita vez, vem relativizando
o atendimento dessa exigência, principalmente naquelas espécies em que o histórico laborativo
rural da parte impressiona, permitindo divisar que na maior parte de sua jornada trabalhista a
parte dedicou-se veramente aos ofícios campestres - tenho por certo que o egrégio STJ vem
consagrando a imprescindibilidade de concomitância temporal - ainda que ínfima - entre a data do
documento indiciário do afazer rurícola e o interstício de atividade rural necessário à concessão
da benesse.
Seguem arestos nesse diapasão: STJ, AR 3994 / SP, Relator Ministro REYNALDO SOARES DA
FONSECA, TERCEIRA SEÇÃO, j. 23/09/2015, DJe 01/10/2015; STJ, AgRg no AREsp 436471 /
PR, AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2013/0384226-1, Relator
Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, j. 25/03/2014, DJe 15/04/2014; TRF3,
APELREEX 00232553620034039999, Relator DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA
SANTOS, NONA TURMA, e-DJF3 10/07/2015.
Esposando o mesmo raciocínio, a Súmula 34 da TNU, verbis:
"Para fins de comprovação do tempo de labor rural, o início de prova material deve ser
contemporâneo à época dos fatos a provar".
A propósito, tenho que a condicionante resulta, de certo modo, enaltecida em recurso repetitivo
emanado do c. STJ. Vale constatar, num primeiro lanço, o seguinte aresto, exarado sob o rito do
art. 543-C do CPC/1973:
"RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ
8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL.
TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE
TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE.
PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E
ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO
VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA. 1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo
de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão
recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias. 2. A solução integral da
controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC. 3. Aplica-se
a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade
rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais
denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. 4.
Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador
campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente
sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação
é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova
testemunhal. 5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o
afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e
assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada
especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados. 6. Recurso Especial do
INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do
STJ." (RESP 201200891007, Relator Min. HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, DJE
19/12/2012).
Ora bem, da leitura da ementa retrotranscrita, ressai cristalino ser dispensável que o princípio de
prova documental diga respeito a todo o período a comprovar-se: admite-se que aluda, apenas, à
parcela deste. Equivale, pois, a afirmar-se que o princípio deve reportar-se ao menos a um
quinhão do intervalo laborativo a ser comprovado. E, em ação de aposentadoria por idade rural, o
que deve ser demonstrado é justamente o lapso dito de carência, vale dizer, a labuta campesina
no período imediatamente anterior à vindicação do benefício, pois, sem isso, não há benesse a
deferir-se.
Destarte, à luz dos julgados do c. STJ e da linha exegética acima, inclino-me pela simultaneidade,
ainda quando diminuta, entre os documentos ofertados e o interregno laboral necessário à
outorga do beneplácito.
De se acentuar, a esta parte, que doutrina e jurisprudência tradicionalmente caminhavam no
sentido de que a inexistência de início de prova material, em feitos tendentes à outorga de
aposentadoria por idade de trabalhador rural, conduzia, inexoravelmente, à improcedência da
postulação deduzida.
Todavia, não se pode olvidar do advento de precedente oriundo do colendo Superior Tribunal de
Justiça, tirado na sistemática dos recursos representativos de controvérsia, precisamente o REsp
nº 1.352.721/SP, no âmbito do qual se deliberou que a falta de eficaz princípio de prova material
do labor campesino traduz-se em ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento
válido do processo, abrindo ensejo à extinção do processo sem resolução de mérito, verbis:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR
IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA
ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E
DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO
DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE DOS
ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO ESPECIAL
DO INSS DESPROVIDO.
1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os seus
procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas
previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em conta
os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto social
adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários.
2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais da
Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência
Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a
parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização
dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica
previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as
normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação
previdenciária a que faz jus o segurado.
3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística
civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar
prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas
demandas.
4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual
garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir
como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo
certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente
dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura
previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela
via da assistência social.
5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do
CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo,
impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente
possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos
necessários à tal iniciativa.
6. Recurso Especial do INSS desprovido."
(RESP 201202342171, NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, STJ - CORTE ESPECIAL, DJE
28/04/2016).
Muito embora ciente do posicionamento desta Turma Julgadora, do qual comungo, a caracterizar
a improcedência do pedido em casos tais, reputo curial revisitar tal exegese, pela força
incontrastável do leading case retrotranscrito, inclusive em homenagem à celeridade
procedimental, tendo em conta a possibilidade de devolução de feitos pela egrégia Vice-
Presidência para eventual exercício de juízo de retratação. Adite-se que a egrégia Terceira Seção
desta Corte, incumbida do apaziguamento de posicionamentos jurisprudenciais na seara
previdenciária, vem adotando o entendimento da Corte Superior, como dá conta o seguinte
precedente:
"PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. APOSENTADORIA RURAL
POR IDADE. ATIVIDADE URBANA DO CÔNJUGE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL
DESCARACTERIZADO. VIOLAÇÃO À LITERAL DISPOSIÇÃO LEGAL. OCORRÊNCIA.
AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. DESNECESSIDADE DE VALORAÇÃO DOS
DEPOIMENTOS TESTEMUNHAIS. SÚMULA N. 149 DO E. STJ. IMPEDIMENTO PARA O
DESENVOLVIMENTO REGULAR DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM
RESOLUÇÃO DO MÉRITO. RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE
TÍTULO JUDICIAL QUE ORA SE RESCINDE. IMPOSSIBILIDADE. NATUREZA ALIMENTAR E
BOA-FÉ. REVELIA. NÃO APLICAÇÃO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. (...) IX - A finalidade do
legislador e da jurisprudência ao afastar a prova exclusivamente testemunhal não foi criar
dificuldades inúteis para a comprovação do tempo de serviço urbano ou rural e encontra respaldo
na segunda parte do art. 400 do CPC de 1973, atual artigo 443 do Novo CPC. X - A interpretação
teleológica dos dispositivos legais que versam sobre a questão em exame leva à conclusão que a
ausência nos autos de documento tido por inicio de prova material é causa de extinção do feito
sem resolução do mérito, com base no art. 485, IV, do Novo CPC, pois o art. 55, § 3º, da Lei n.
8.213/91 e a Súmula 149 do E. STJ, ao vedarem a prova exclusivamente testemunhal em tais
casos, criaram um óbice de procedibilidade nos processos que envolvam o reconhecimento de
tempo de serviço, que a rigor acarretaria o indeferimento da inicial, nos termos dos arts. 320 e
321 do atual CPC. XI - Carece a autora da ação subjacente de comprovação material sobre o
exercício de atividade rural por ela desempenhado (art. 39, I, da Lei nº 8.213/91), restando
prejudicada a apreciação do pedido de reconhecimento da atividade rural. (...) XIV - Ação
rescisória cujo pedido se julga procedente. Processo subjacente que se julga extinto, sem
resolução do mérito. Tutela que se concede em maior extensão". (AR 00086993320154030000,
Relator DESEMBARGADOR FEDERAL SERGIO NASCIMENTO, e-DJF3 Judicial 1 17/06/2016).
Postas as balizas, passa-se ao exame do caso dos autos.
De pronto, verifica-se o cumprimento pelo autor do requisito etário em 29/01/2010 (id. 395107, fls.
01/02), incumbindo-lhe, pois, demonstrar atividade campestre por 174 meses.
A título de início de prova material foram colacionados os seguintes documentos:
a) Certidão emitida pelo INCRA em 11/08/2011, atestando que a esposa do requerente é
assentada no PA São Joaquim, lote nº 65, desenvolvendo atividade em regime de economia
familiar desde 03/12/2008 (id. 395085, fl. 01);
b) Recibos emitidos pela Associação dos Produtores Rurais do Assentamento São Joaquim em
nome da mulher do demandante, com datas entre 11/11/2008 e 11/04/2012 (id. 395085, fls. 02/11
e id. 395089, fl. 02);
c) Recibos emitidos pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Selvíria/MS em nome da esposa,
com datas entre 10/07/2011 e 10/11/2011 (id. 395085, fls. 12/13);
d) Recibos emitidos pela Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Inocência/MS em nome da
mulher, com datas entre 05/10/2007 e 05/12/2008 (id. 395085, fls. 14/19 e id. 395089, fl. 01); e
e) Certidão de casamento, contraído em 27/10/1975, onde o autor acha-se qualificado como
lavrador (id. 395089, fl. 03).
Em relação à certidão de casamento, não há contemporaneidade com o lapso no âmbito do qual
haveria de ser comprovado o labor rural (29/07/1995 a 29/01/2010), sequer se referindo a
pequeno quinhão.
No que tange aos documentos em nome da consorte do vindicante, verifica-se, segundo extrato
do CNIS colacionado aos autos (id. 395113, fls. 23/25), a existência de vínculo empregatício de
natureza urbana (CBO 8484 – “trabalhadores na fabricação e conservação de alimentos”) no
período de 01/02/2002 a 29/12/2007, situação esta a descaracterizar qualquer início de prova
documental de trabalho rurícola extensível ao cônjuge até então.
Frise-se não se tratar de labor rural em regime de economia familiar, hipótese em que,
excepcionalmente, admite-se o exercício de atividade rural concomitante ao desempenho de
trabalho urbano por um dos integrantes da família, desde que módicos os valores recebidos com
tal atividade, permanecendo o labor campesino como principal sustentáculo do núcleo familiar.
Assim, ainda que admitido a aproveitamento de início de prova documental da esposa, pelo
demandante, após o encerramento do vínculo de natureza urbana da consorte, resta evidenciado
o não cumprimento da carência necessária à outorga da benesse vindicada.
Diante do exposto,NEGO PROVIMENTO AO APELO AUTORAL E DOU PROVIMENTO AO
APELO AUTÁRQUICO para julgar improcedente o pedido.
Condeno a parte autora em honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da
causa, observado o disposto no art. 98, § 3º, do NCPC, que manteve a sistemática da Lei n.
1.060/50, por ser beneficiária da justiça gratuita.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA DA ESPOSA.
EXTENSÃO AO MARIDO. EXCEPCIONALIDADE. FALTA DE CARÊNCIA. IMPROCEDÊNCIA.
- Requisito etário adimplido em 29/01/2010.
- Em relação à certidão de casamento, não há contemporaneidade com o lapso no âmbito do qual
haveria de ser comprovado o labor rural (29/07/1995 a 29/01/2010), sequer se referindo a
pequeno quinhão.
- No que tange aos documentos em nome da consorte do vindicante, verifica-se, segundo extrato
do CNIS colacionado aos autos (id. 395113, fls. 23/25), a existência de vínculo empregatício de
natureza urbana (CBO 8484 – “trabalhadores na fabricação e conservação de alimentos”) no
período de 01/02/2002 a 29/12/2007, situação esta a descaracterizar qualquer início de prova
documental de trabalho rurícola extensível ao cônjuge até então.
- Frise-se não se tratar de labor rural em regime de economia familiar, hipótese em que,
excepcionalmente, admite-se o exercício de atividade rural concomitante ao desempenho de
trabalho urbano por um dos integrantes da família, desde que módicos os valores recebidos com
tal atividade, permanecendo o labor campesino como principal sustentáculo do núcleo familiar.
- Assim, ainda que admitido a aproveitamento de início de prova documental da esposa, pelo
demandante, após o encerramento do vínculo de natureza urbana da consorte, resta evidenciado
o não cumprimento da carência necessária à outorga da benesse vindicada.
- Apelo autoral improvido.
- Apelo do INSS provido para julgar improcedente o pedido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento ao apelo autoral e dar provimento ao apelo autárquico,
nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
