Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5003345-44.2017.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal LUIZ DE LIMA STEFANINI
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
08/05/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 13/05/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL.
DOCUMENTO DE CTPS COM ANOTAÇÃO DE LAVRADOR. PROVA TESTEMUNHAL.
TRABALHO RURÍCOLA RECENTE. TESTEMUNHO. CORROBORAÇÃO E
COMPLEMENTAÇÃO. TEMPO DE TRABALHO EXIGIDO NA LEGISLAÇÃO. COMPROVAÇÃO.
CONDENAÇÃO DO INSS. DATA DO INÍCIO DO BENEFÍCIO. REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO.EFETIVO TRABALHO RURAL DA AUTORA. NÃO COMPROVAÇÃO. PROVA
DOCUMENTAL INEXISTENTE. PROVA TESTEMUNHAL QUE NÃO DEMONSTRA CARÊNCIA.
AUTORA AFIRMA SER COZINHEIRA.BENEFÍCIO INDEVIDO. CASSAÇÃO. PARCIAL
PROVIMENTO DO RECURSO. PARCIAL PROCEDÊNCIA DA AÇÃO SOMENTE EM RELAÇÃO
AO AUTOR.
1.A prova documental é no sentido de demonstrar o labor rural por parte do autor pelo prazo de
carência, conforme exige o art. 142 da Lei previdenciária, considerando que há documento
(CTPS) a indicar ser lavrador com vínculos de trabalho rural anotados.
2.Há comprovação de que o autor trabalhou como rurícola, o que veio corroborado pela prova
testemunhal colhida que afirmou o trabalho rural da parte autora, a evidenciar o cumprimento da
carência, conforme atestado pelas testemunhas.
3.Viável a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, uma vez que há início de
prova material, ficando comprovado que a parte autora efetivamente trabalhou nas lides rurais no
tempo mínimo em exigência da lei, prevista no art. 143 da Lei nº 8.213/91.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
4. Mantida a condenação do INSS a conceder ao autor a aposentadoria por idade rural, no valor
de um salário mínimo com consectários para o autor José Lopes da Silva.
5.Data inicial do benefício no requerimento administrativo, conforme pedido inicial, quando o autor
já havia preenchido os requisitos para a obtenção do benefício.
6.Juros e correção monetária conforme Manual de Cálculos da Justiça Federal e entendimento do
E.STF.
7.Não comprovação de atividade rural efetiva por parte da autora Lucia Elias de Araujo Silva que
afirmou sempre ter sido cozinheira e empregada doméstica, o que foi confirmado pelo marido no
período que seria anterior ao casamento realizado em 2004.
8. Não há documento de comprovação de carência em relação a autora Lucia Elias de Araujo
Silva.
9. Parcial provimento da apelação, apenas para cassar o benefício concedido a autora Lucia,
mantida a concessão do benefício ao autor José Lopes da Silva.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003345-44.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE LOPES DA SILVA, LUCIA ELIAS DE ARAUJO SILVA
Advogado do(a) APELADO: SILVANA DE CARVALHO TEODORO ZUBCOV - MS5547-A
Advogado do(a) APELADO: SILVANA DE CARVALHO TEODORO ZUBCOV - MS5547-A
APELAÇÃO (198) Nº 5003345-44.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE LOPES DA SILVA, LUCIA ELIAS DE ARAUJO SILVA
Advogado do(a) APELADO: SILVANA DE CARVALHO TEODORO ZUBCOV - MS5547-A
Advogado do(a) APELADO: SILVANA DE CARVALHO TEODORO ZUBCOV - MS5547-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Proc. nº 50033454420174039999 PJE
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do seguro Social - INSS, em sede de ação
proposta por José Lopes da Silva e Lucia Elias de Araujo Silva cujo objeto é a concessão de
aposentadoria por idade devida a trabalhador rural, que alega ter trabalhado pelo tempo
necessário previsto em lei, e que, portanto, faria jus ao benefício.
Com a inicial vieram documentos.
Justiça gratuita concedida.
Contestação da parte ré, com réplica.
Em juízo foram colhidos depoimentos em audiência.
Por sentença, o MMº Juízo "a quo" julgou procedente o pedido, ao fundamento de que há
elementos probatórios suficientes a sustentá-lo, diante da prova material e testemunhal colhida e
concedeu a aposentadoria por idade rural no valor de um salário mínimo, a partir do requerimento
administrativo, com consectários.
Em apelação, o INSS alega:
Não haver provas suficientes do trabalho rural do autor e ainda que assim entendido não se
estenderia à autora o trabalho como empregado rural, bem como não comprovada a carência,
uma vez que o autor apresenta poucos vínculos no CNIS e DATAPREV.
Prequestiona a matéria.
Com contrarrazões recursais, os autos subiram a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5003345-44.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE LOPES DA SILVA, LUCIA ELIAS DE ARAUJO SILVA
Advogado do(a) APELADO: SILVANA DE CARVALHO TEODORO ZUBCOV - MS5547-A
Advogado do(a) APELADO: SILVANA DE CARVALHO TEODORO ZUBCOV - MS5547-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Em linhas introdutórias, destaco que antes da entrada em vigor da Constituição Federal de 1988
e da Lei nº 8.213/91, que a regulamentou, a Lei Complementar nº 11, de 25.05.1971, em seu
artigo 4º, previa que a aposentadoria por idade seria devida ao trabalhador rural quando este
completasse 65 (sessenta e cinco) anos, o que foi posteriormente alterado pela Lei
Complementar nº 16, de 30.10.1973, que, em seu artigo 5º, passou a prever que a qualidade de
trabalhador rural dependeria da comprovação de sua atividade pelo menos nos últimos três anos
anteriores à data do pedido do benefício, ainda que de forma descontínua.
Já a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 202, e inciso I, estabeleceu:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários de contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e
comprovada a regularidade dos reajustes dos salários de contribuição de modo a preservar seus
valores reais e obedecidas as seguintes condições:
I - aos sessenta e cinco anos de idade, para o homem, e aos sessenta, para a mulher, reduzido
em cinco anos o limite de idade para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que
exerçam suas atividades em regime de economia familiar, neste incluídos o produtor rural, o
garimpeiro e o pescador artesanal" - grifo nosso.
Referida norma constitucional foi regulamentada pela Lei nº 8.213/91, que dispõe sobre os Planos
de Benefícios da Previdência Social, tendo, em seu artigo 48, e §§ 1º e 2º, estabelecido os
requisitos etário e de efetivo exercício de atividade rural pelo período de carência do benefício
pretendido - conforme tabela de carências, prevista no artigo 142 daquela Lei -, para que homens
e mulheres possam obter a aposentadoria por idade, nos seguintes termos:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
§ 1o Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso
de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na
alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11;
§ 2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o
efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei" - grifei.
Por sua vez, o artigo 39 da supra referida Lei garante ao trabalhador rural, segurado especial -
isto é, aquele que trabalha em regime de economia familiar -, aposentadoria por idade no valor de
um salário mínimo, desde que comprove efetivo exercício de atividade rural pelo período legal de
carência do benefício, "verbis":
"Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, fica garantida a
concessão:
I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de
pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86,
desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período,
imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes
à carência do benefício requerido".
Da mesma forma, prevê o artigo 143 da Lei nº 8.213/91:
"Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Destaco, por fim, o artigo 26, inciso III, da Lei nº 8.213/91, que isentou o segurado especial -
produtor rural em regime de economia familiar - do recolhimento de contribuições, fazendo jus ao
benefício, pois, independentemente de contribuição, desde que comprove exercício de atividade
rural pelo número de meses correspondentes à carência do benefício pretendido, "verbis":
"Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:
[...]
III - os benefícios concedidos na forma do inciso I do art. 39, aos segurados especiais referidos no
inciso VII do art. 11 desta Lei".
Conclui-se, portanto, que o benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural está
disciplinado nos artigos 39, I, 48 e 143, da Lei nº 8.213/91, exigindo-se, além da comprovação da
idade (60 anos para homens e 55 para mulheres), prova do exercício de atividade rural, mesmo
que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de
meses idêntico à carência do benefício, nos termos dos artigos 26, III e 142 daquela Lei.
Pois bem, uma vez analisado o sistema normativo que regulamenta a concessão do benefício em
questão, importante destacar também os critérios de valoração das provas, já sedimentados pela
jurisprudência pátria.
Nesse sentido, esta E. Oitava Turma vem decidindo, "verbis":
"[...] Declarações de Sindicato de Trabalhadores Rurais fazem prova do quanto nelas alegado,
desde que devidamente homologadas pelo Ministério Público ou pelo INSS, órgãos competentes
para tanto, nos exatos termos do que dispõe o art. 106, III, da Lei nº 8.213/91, seja em sua
redação original, seja com a alteração levada a efeito pela Lei nº 9.063/95.
Na mesma seara, declarações firmadas por supostos ex-empregadores ou subscritas por
testemunhas, noticiando a prestação do trabalho na roça, não se prestam ao reconhecimento
então pretendido, tendo em conta que equivalem a meros depoimentos reduzidos a termo, sem o
crivo do contraditório, conforme entendimento já pacificado no âmbito desta Corte.
Igualmente não alcançam os fins pretendidos, a apresentação de documentos comprobatórios da
posse da terra pelos mesmos ex-empregadores, visto que não trazem elementos indicativos da
atividade exercida pela parte requerente.
Já a mera demonstração, pela parte demandante, de propriedade rural, só se constituirá em
elemento probatório válido desde que traga a respectiva qualificação como lavrador ou agricultor.
No mesmo sentido, a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante a juntada
dos respectivos comprovantes de pagamento das mensalidades.
Têm-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a
qualificação da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos
por órgãos públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge Scartezzini,
v.u., DJ de 15.04.2002, p. 248.
Da mesma forma, a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a partir
da celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos
Tribunais.
Na atividade desempenhada em regime de economia familiar, toda a documentação
comprobatória, como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida, em regra, em nome
daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar. Ressalte-se, contudo, que nem sempre é
possível comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de
documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da
família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja
eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio
rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua colheita por outros produtos, de sua
necessidade, que um sitiante vizinho eventualmente tenha colhido, ou a entrega, como forma de
pagamento, pela parceria na utilização do espaço de terra cedido para plantar.
De qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº
463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em
nome dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constituem
início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos.
Ressalte-se que o trabalho urbano de membro da família não descaracteriza, por si só, o
exercício de trabalho rural em regime de economia familiar de outro. Para ocorrer essa
descaracterização, é necessária a comprovação de que a renda obtida com a atividade urbana é
suficiente à subsistência da família.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura numerus
clausus, já que o "sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento
motivado" (AC nº 94.03.025723-7/SP, TRF 3ª Região, Rel. Juiz Souza Pires, 2º Turma, DJ
23.11.94, p. 67691), cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e
sua aceitação.
A lei não distinguiu entre trabalhadores urbanos e rurais, ao introduzir o preceito de que a perda
da qualidade de segurado não infirma o direito à aposentadoria por tempo de contribuição ou por
idade, se os requisitos do tempo de contribuição e da carência foram adimplidos em momento
anterior.
A circunstância, ainda, de o citado artigo mencionar "tempo de contribuição" não exclui o rurícola,
pois o legislador contentou-se aqui em explicitar o requisito geral, que é o da contribuição, nem
por isso tencionando afastar de sua abrangência o trabalhador rural que, em alguns casos, por
norma especial, é dispensado dos recolhimentos; ademais, o raciocínio albergado pela lei é
aplicável do ponto de vista fático tanto aos urbanos como aos rurais, sendo de se invocar o
brocardo Ubi eadem ratio ibi idem jus.
A equiparação dos trabalhadores urbanos e rurais, para fins previdenciários, é garantia da Carta
de 1988 e não pode ser olvidada, sem justificativa plausível, sob pena de ofensa ao princípio da
isonomia e à previsão contida no seu art. 194, parágrafo único, II.
No entanto, penso que, se as lides campesinas foram abandonadas pela parte autora muitos
anos antes do implemento do requisito etário, já não há porque se aplicar a redução de 5 (cinco)
anos mencionada no art. 48, §1º, da Lei 8.213/1991, uma vez que tal determinação visou proteger
o idoso que, submetido às penosas condições do trabalho no campo, teria o direito de se
aposentar mais cedo. Esse, a meu ver, o raciocínio adotado pelo legislador no art. 48, §3º, da Lei
de Benefícios, ao prever o afastamento da redução etária se, para completar o tempo de
carência, houver contagem de períodos sob outras categorias.
No que se refere ao recolhimento das contribuições previdenciárias, destaco que o dever legal de
promover seu recolhimento junto ao INSS e descontar da remuneração do empregado a seu
serviço, compete exclusivamente ao empregador, por ser este o responsável pelo seu repasse
aos cofres da Previdência, a quem cabe a sua fiscalização, possuindo, inclusive, ação própria
para haver o seu crédito, podendo exigir do devedor o cumprimento da legislação. No caso da
prestação de trabalho em regime de economia familiar, é certo que o segurado é dispensado do
período de carência, nos termos do disposto no art. 26, III, da Lei de Benefícios e, na condição de
segurado especial, assim enquadrado pelo art. 11, VII, da legislação em comento, caberia o dever
de recolher as contribuições, tão-somente se houvesse comercializado a produção no exterior, no
varejo, isto é, para o consumidor final, para empregador rural-pessoa física, ou a outro segurado
especial (art. 30, X, da Lei de Custeio).
Por fim, outra questão que suscita debates é a referente ao trabalho urbano eventualmente
exercido pelo segurado ou por seu cônjuge, cuja qualificação como lavrador lhe é extensiva.
Perfilho do entendimento no sentido de que o desempenho de atividade urbana, de per si, não
constitui óbice ao reconhecimento do direito aqui pleiteado, desde que o mesmo tenha sido
exercido por curtos períodos, especialmente em época de entressafra, quando o humilde
campesino se vale de trabalhos esporádicos em busca da sobrevivência.
Da mesma forma, o ingresso no mercado de trabalho urbano não impede a concessão da
aposentadoria rural, na hipótese de já restar ultimada, em tempo anterior, a carência exigida
legalmente, considerando não só as datas do início de prova mais remoto e da existência do
vínculo empregatício fora da área rural, como também que a prova testemunhal, segura e
coerente, enseje a formação da convicção deste julgador acerca do trabalho campesino exercido
no período. (TRF 3ª REGIÃO, AGRAVO LEGAL EM APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002576-
92.2015.4.03.9999/SP, Rel. DES. FED. DAVI DANTAS, 8ª TURMA, julgado em 14 de dezembro
de 2015, v.u).
No mesmo sentido: Apelação cível nº 2014.03.99.038096-5, Rel. Des. Fed. GILBERTO JORDAN,
TRF 3ª Região, Julgado em 17.12.2104.
Do caso dos autos.
Narra a inicial que os autores são trabalhadores da roça, tendo laborado em diversas
propriedades rurais na região de Pedro Gomes/MS, como diaristas, fazendo jus ao benefício
pleiteado. Alegam que desempenharam atividade rural desde 1980 e em 2004 se casaram e
trabalharam nas lides rurais, pretendendo ainda a antecipação de tutela.
A parte autora, José Lopes da Silva, completou o requisito idade mínima (60 anos) em
26/03/2009, posto que nasceu em 26/03/1949, devendo, assim, demonstrar o efetivo exercício de
atividade rural por, no mínimo, 168 meses, conforme previsto no artigo 142 da Lei nº 8.213/91.
A parte autora, Lucia Elias de Araujo Silva, esposa de José, completou o requisito idade mínima
(55 anos) em 18/03/2007, posto que nasceu em 18/03/1952, devendo, assim demonstrar o efetivo
exercício de atividade rural, no mínimo, por 156 meses.
Como início de prova material de seus trabalhos no campo, apresentaram os seguintes
documentos:
Certidão eleitoral em nome de José onde consta ser agricultor (sem valor probatório);
Ficha cadastral de cliente em 2014 na qual consta o autor ser lavrador;
Ficha de sindicato dos Trabalhadores Rurais de Pedro Gomes, com alguns pagamentos anotados
em nome de Lúcia;
Certidão de casamento dos autores em 04/06/2004 na qual consta o autor como lavrador e a
autora como “do lar”;
CTPS em nome do autor onde consta vínculos rurais com Fazenda Santa Clara em 02/04/1990 a
22/06/1993 e Fazenda União, de 02/01/2008 a 31/06/2008;
Termo de rescisão do contrato de trabalho com a Fazenda União constando admissão em
02/10/2007 a 31/07/2008;
Conta residencial de água;
Entrevista rural de José, morador na Fazenda União, zona rural onde declara que sempre foi
trabalhador rural, documento datado de 20/11/2012;
Informe do CNIS.
Em relação a autora Lucia, entrevista rural concedida e inscrição de sócia no Sindicato dos
Trabalhadores Rurais de Pedro Gomes/MS.
Examinados os autos, a sentença é de ser parcialmente reformada.
A prova documental é no sentido de demonstrar o labor rural por parte do autor, José Lopes da
Silva pelo prazo de carência, conforme exige o art. 142 da Lei previdenciária, considerando que
os documentos trazidos estão a indicar a qualificação de lavrador, constando anotação de
trabalho rural na CTPS havendo início razoável de prova material do trabalho rurícola.
Em relação ao autor, a prova testemunhal é inconteste. Tanto a testemunha José Teodoro como
a testemunha Roosevelt disseram que o autor sempre desempenhou trabalho na roça, desde
1980. José disse que o autor trabalhou por dez anos na Fazenda Esperança, na lavoura quando
o autor ainda não era casado e confirmou o trabalho posterior no que foi seguido por Roosevelt.
O próprio autor confirmou o trabalho rural ainda recente na Fazenda Tupã como trabalhador
braçal, local onde trabalhou por 10 anos, o que foi confirmado por sua esposa Lucia.
A prova testemunhal veio a complementar e corroborar a prova material trazida.
Dessa forma, torna-se viável a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural em favor
de José Lopes da Silva, uma vez que há início de prova material, ficando comprovado que a parte
autora efetivamente trabalhou nas lides rurais no tempo mínimo em exigência da lei, prevista no
art. 143 da Lei nº 8.213/91.
Assim, a parte autora comprovou que o trabalho rural tenha sido predominante ao longo de sua
vida, fazendo jus à percepção do benefício, cuja data inicial deve ser mantida na data do
requerimento administrativo, em 21/11/2012, quando o autor já havia preenchido os requisitos
para obtenção.
Preenchidos os requisitos legais, é devido o benefício de aposentadoria por idade pleiteado e
procedente o pedido para condenar o INSS a conceder à autora o benefício de aposentadoria por
idade de trabalhador rural, no valor de um salário mínimo, a partir da data do requerimento
administrativo, conforme pedido na inicial e demais consectários legais.
Já no que diz com a autora Lucia Elias de Araujo Silva o mesmo não ocorre.
A autora Lucia não apresentou documento hábil a demonstrar o efetivo trabalho rural necessário
à concessão do benefício.
A autora se casou no ano de 2004 e tanto ela como o autor disseram que anteriormente ela foi
empregada doméstica e também noto que na entrevista rural a autora disse que sempre
desempenhou a atividade de cozinheira, o que não foi descartado pelas testemunhas quando
ouvidas. A própria autora disse em Juízo que trabalhou muitos anos como cozinheira e fazendo
faxina, a descaracterizar o trabalho rural. Ainda assim se reputado rural o trabalho realizado após
o casamento, não há comprovação da carência necessária, uma vez que o casamento foi
realizado apenas em 2004 e as testemunhas não comprovam o tempo de carência, nem há
documento que a comprove, razão pela qual tenho por indevida a concessão da aposentadoria,
devendo ser oficiado o INSS para cassação da mesma.
DA CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA PARA PAGAMENTO EM RELAÇÃO AO
AUTOR A CARGO DO INSS
Com relação à correção monetária, cabe pontuar que o artigo 1º-F, da Lei 9.494/97, com a
redação dada pela Lei nº 11.960/09, foi declarado inconstitucional por arrastamento pelo
Supremo Tribunal Federal, ao julgar as ADIs nos 4.357 e 4.425, mas apenas em relação à
incidência da TR no período compreendido entre a inscrição do crédito em precatório e o efetivo
pagamento.
Isso porque a norma constitucional impugnada nas ADIs (art. 100, §12, da CRFB, incluído pela
EC nº 62/09) referia-se apenas à atualização do precatório e não à atualização da condenação,
que se realiza após a conclusão da fase de conhecimento.
Vislumbrando a necessidade de serem uniformizados e consolidados os diversos atos normativos
afetos à Justiça Federal de Primeiro Grau, bem como os Provimentos da Corregedoria desta E.
Corte de Justiça, a Consolidação Normativa da Corregedoria-Geral da Justiça Federal da 3ª
Região (Provimento COGE nº 64, de 28 de abril 2005) é expressa ao determinar que, no tocante
aos consectários da condenação, devem ser observados os critérios previstos no Manual de
Orientação de Procedimentos para Cálculos da Justiça Federal.
A respeito do tema, insta considerar que, no dia 20/09/2017, no julgamento do RE nº 870.947,
com repercussão geral reconhecida, o Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou a
inconstitucionalidade da utilização da TR, também para a atualização da condenação.
No mesmo julgamento, em relação aos juros de mora incidentes sobre débitos de natureza não
tributária, como é o caso da disputa com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em causa,
o STF manteve a aplicação do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela
Lei 11.960/2009.
"In casu", como se trata da fase anterior à expedição do precatório, e tendo em vista que a
matéria não está pacificada, há de se concluir que devem ser aplicados os índices previstos pelo
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor por
ocasião da execução do julgado, em respeito ao Provimento COGE nº 64, de 28 de abril 2005
(AC 00056853020144036126, DESEMBARGADORA FEDERAL TANIA MARANGONI, TRF3 -
OITAVA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/05/2016), observado o entendimento firmado pelo
STF no RE nº 870.947".
Mantidos os honorários advocatícios.
Em relação à autora sucumbente estabeleço os honorários a seu cargo em 10% do valor da
causa, observada a gratuidade da justiça e a suspensão do art. 98, §3º, do CPC.
Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso, apenas para cassar o benefício concedido a
Lucia Elias de Araujo Silva, oficiando-se à autarquia e mantenho a concessão do benefício a José
Lopes da Silva.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL.
DOCUMENTO DE CTPS COM ANOTAÇÃO DE LAVRADOR. PROVA TESTEMUNHAL.
TRABALHO RURÍCOLA RECENTE. TESTEMUNHO. CORROBORAÇÃO E
COMPLEMENTAÇÃO. TEMPO DE TRABALHO EXIGIDO NA LEGISLAÇÃO. COMPROVAÇÃO.
CONDENAÇÃO DO INSS. DATA DO INÍCIO DO BENEFÍCIO. REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO.EFETIVO TRABALHO RURAL DA AUTORA. NÃO COMPROVAÇÃO. PROVA
DOCUMENTAL INEXISTENTE. PROVA TESTEMUNHAL QUE NÃO DEMONSTRA CARÊNCIA.
AUTORA AFIRMA SER COZINHEIRA.BENEFÍCIO INDEVIDO. CASSAÇÃO. PARCIAL
PROVIMENTO DO RECURSO. PARCIAL PROCEDÊNCIA DA AÇÃO SOMENTE EM RELAÇÃO
AO AUTOR.
1.A prova documental é no sentido de demonstrar o labor rural por parte do autor pelo prazo de
carência, conforme exige o art. 142 da Lei previdenciária, considerando que há documento
(CTPS) a indicar ser lavrador com vínculos de trabalho rural anotados.
2.Há comprovação de que o autor trabalhou como rurícola, o que veio corroborado pela prova
testemunhal colhida que afirmou o trabalho rural da parte autora, a evidenciar o cumprimento da
carência, conforme atestado pelas testemunhas.
3.Viável a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, uma vez que há início de
prova material, ficando comprovado que a parte autora efetivamente trabalhou nas lides rurais no
tempo mínimo em exigência da lei, prevista no art. 143 da Lei nº 8.213/91.
4. Mantida a condenação do INSS a conceder ao autor a aposentadoria por idade rural, no valor
de um salário mínimo com consectários para o autor José Lopes da Silva.
5.Data inicial do benefício no requerimento administrativo, conforme pedido inicial, quando o autor
já havia preenchido os requisitos para a obtenção do benefício.
6.Juros e correção monetária conforme Manual de Cálculos da Justiça Federal e entendimento do
E.STF.
7.Não comprovação de atividade rural efetiva por parte da autora Lucia Elias de Araujo Silva que
afirmou sempre ter sido cozinheira e empregada doméstica, o que foi confirmado pelo marido no
período que seria anterior ao casamento realizado em 2004.
8. Não há documento de comprovação de carência em relação a autora Lucia Elias de Araujo
Silva.
9. Parcial provimento da apelação, apenas para cassar o benefício concedido a autora Lucia,
mantida a concessão do benefício ao autor José Lopes da Silva.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento ao recurso, apenas para cassar o benefício
concedido a Lucia Elias de Araujo Silva, oficiando-se à autarquia e manter a concessão do
benefício a José Lopes da Silva, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
