Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5001502-10.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal LUIZ DE LIMA STEFANINI
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
13/06/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 28/06/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL.
REGIME EM ECONOMIA FAMILIAR. PROVA DOCUMENTAL. MARIDO LAVRADOR.
ESCRITURA DE IMÓVEL RURAL ONDE EXERCIDO O LABOR EM REGIME DE ECONOMIA
FAMILIAR. PROVA TESTEMUNHAL. CORROBORAÇÃO. TEMPO DE TRABALHO EXIGIDO NA
LEGISLAÇÃO. COMPROVAÇÃO. CONDENAÇÃO DO INSS. DATA DO INÍCIO DO BENEFÍCIO.
HONORÁRIOS. 10% DO VALOR DA CONDENAÇÃO ATÉ A PRESENTE DATA. JUROS E
CORREÇÃO MONETÁRIA. ENTENDIMENTO DO STF. PROVIMENTO DO RECURSO. CUSTAS
DEVIDAS. PROCEDÊNCIA DA AÇÃO.
1.A prova documental é no sentido de demonstrar o labor rural por parte do autora pelo prazo de
carência, conforme exige o art. 142 da Lei previdenciária, em regime de economia familiar,
considerando que há documento oficial a indicar a qualificação de lavrador do marido a ela
extensível.
2.Documentos oficiais de escritura de lote rural e compra e venda onde a família exerce o labor
em regime de economia familiar.
3.Há comprovação de que a autora trabalhou como rurícola, o que veio corroborado pela prova
testemunhal colhida que afirmou o trabalho rural da autora, a evidenciar o cumprimento da
carência.
4.Dessa forma, torna-se viável a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, uma
vez que há início de prova material, ficando comprovado que a parte autora efetivamente
trabalhou nas lides rurais no tempo mínimo em exigência da lei, prevista no art. 143 da Lei nº
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
8.213/91.
5. Condenação do INSS a conceder à autora a aposentadoria por idade rural, no valor de um
salário mínimo, a partir do requerimento administrativo.
6. Honorários advocatícios de 10% do valor da condenação até a presente data, uma vez
improcedente a sentença.
7.No que diz com os juros e correção monetária, aplico o entendimento do E.STF, na repercussão
Geral, no Recurso Extraordinário nº 870.947 e o Manual de Cálculos da Justiça Federal.
8.Custas pelo réu, de acordo com a previsão legal do Estado Mato Grosso do Sul a respeito.
9.Provimento da apelação.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001502-10.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
APELANTE: DURVALINA MARIA DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELANTE: LUIS AFONSO FLORES BISELLI - MS12305-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001502-10.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
APELANTE: DURVALINA MARIA DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELANTE: LUIS AFONSO FLORES BISELLI - MS12305-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta por Durvalina Maria de Oliveira, em sede de ação cujo objeto é a
concessão de aposentadoria por idade devida a trabalhador rural, que alega ter trabalhado pelo
tempo necessário previsto em lei, e que, portanto, faria jus ao benefício.
Com a inicial vieram documentos.
Justiça gratuita concedida.
Contestação da parte ré, com extrato do CNIS da autora sem anotação de vínculos e concessão
de pensão por morte previdenciária de trabalhador rural.
Em juízo foram colhidos depoimentos em audiência.
Por sentença datada de 03/09/2017, o MMº Juízo "a quo" julgou improcedente o pedido, ao
fundamento de que não há elementos probatórios suficientes a sustentá-lo.
Consignou que: “Em relação ao exercício da atividade rural como segurada especial, a parte
autora juntou aos autos: cópia de contrato de cessão parceria realizado no ano de 2013 na qual
consta como parceira outorgante de 37 cabeças de gado (fls. 14-15); uma certidão de
propriedade rural de 100 ha emitida em 2009. A prova material juntada aos autos não se mostra
suficiente para comprovar a condição de trabalhadora rural sob economia de regime familiar, isso
porque ao que tudo indica, da análise dos únicos dois documentos juntados aos autos passíveis
de serem considerados, não são suficientes para comprovar o regime de economia familiar, nem
tampouco a carência exigida para concessão do benefício pleiteado. Além disso a parte ré trouxe
aos autos documentos que comprovam a prática de atividade urbana por parte do já falecido
marido da parte autora, bem como a informação de que ele foi aposentado exercendo atividade
urbana. Por fim, tem-se que o depoimento pessoal da autora e de suas testemunhas não
merecem credibilidade, posto que confusos e contraditórios.”.
Em apelação, a autora alega, em síntese, haver provas suficientes do trabalho rural, sendo nula a
sentença que desconsiderou os documentos trazidos, porquanto a autora trabalhou sempre para
manutenção e sobrevivência e também exerceu trabalho rurícola, como relatado na inicial.
Com contrarrazões recursais, os autos subiram a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001502-10.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
APELANTE: DURVALINA MARIA DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELANTE: LUIS AFONSO FLORES BISELLI - MS12305-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Em linhas introdutórias, destaco que antes da entrada em vigor da Constituição Federal de 1988
e da Lei nº 8.213/91, que a regulamentou, a Lei Complementar nº 11, de 25.05.1971, em seu
artigo 4º, previa que a aposentadoria por idade seria devida ao trabalhador rural quando este
completasse 65 (sessenta e cinco) anos, o que foi posteriormente alterado pela Lei
Complementar nº 16, de 30.10.1973, que, em seu artigo 5º, passou a prever que a qualidade de
trabalhador rural dependeria da comprovação de sua atividade pelo menos nos últimos três anos
anteriores à data do pedido do benefício, ainda que de forma descontínua.
Já a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 202, e inciso I, estabeleceu:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários de contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e
comprovada a regularidade dos reajustes dos salários de contribuição de modo a preservar seus
valores reais e obedecidas as seguintes condições:
I - aos sessenta e cinco anos de idade, para o homem, e aos sessenta, para a mulher, reduzido
em cinco anos o limite de idade para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que
exerçam suas atividades em regime de economia familiar, neste incluídos o produtor rural, o
garimpeiro e o pescador artesanal" - grifo nosso.
Referida norma constitucional foi regulamentada pela Lei nº 8.213/91, que dispõe sobre os Planos
de Benefícios da Previdência Social, tendo, em seu artigo 48, e §§ 1º e 2º, estabelecido os
requisitos etário e de efetivo exercício de atividade rural pelo período de carência do benefício
pretendido - conforme tabela de carências, prevista no artigo 142 daquela Lei -, para que homens
e mulheres possam obter a aposentadoria por idade, nos seguintes termos:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
§ 1o Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso
de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na
alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11;
§ 2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o
efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei" - grifei.
Por sua vez, o artigo 39 da supra referida Lei garante ao trabalhador rural, segurado especial -
isto é, aquele que trabalha em regime de economia familiar -, aposentadoria por idade no valor de
um salário mínimo, desde que comprove efetivo exercício de atividade rural pelo período legal de
carência do benefício, "verbis":
"Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, fica garantida a
concessão:
I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de
pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86,
desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período,
imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes
à carência do benefício requerido".
Da mesma forma, prevê o artigo 143 da Lei nº 8.213/91:
"Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Destaco, por fim, o artigo 26, inciso III, da Lei nº 8.213/91, que isentou o segurado especial -
produtor rural em regime de economia familiar - do recolhimento de contribuições, fazendo jus ao
benefício, pois, independentemente de contribuição, desde que comprove exercício de atividade
rural pelo número de meses correspondentes à carência do benefício pretendido, "verbis":
"Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:
[...]
III - os benefícios concedidos na forma do inciso I do art. 39, aos segurados especiais referidos no
inciso VII do art. 11 desta Lei".
Conclui-se, portanto, que o benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural está
disciplinado nos artigos 39, I, 48 e 143, da Lei nº 8.213/91, exigindo-se, além da comprovação da
idade (60 anos para homens e 55 para mulheres), prova do exercício de atividade rural, mesmo
que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de
meses idêntico à carência do benefício, nos termos dos artigos 26, III e 142 daquela Lei.
Pois bem, uma vez analisado o sistema normativo que regulamenta a concessão do benefício em
questão, importante destacar também os critérios de valoração das provas, já sedimentados pela
jurisprudência pátria.
Nesse sentido, esta E. Oitava Turma vem decidindo, "verbis":
"[...] Declarações de Sindicato de Trabalhadores Rurais fazem prova do quanto nelas alegado,
desde que devidamente homologadas pelo Ministério Público ou pelo INSS, órgãos competentes
para tanto, nos exatos termos do que dispõe o art. 106, III, da Lei nº 8.213/91, seja em sua
redação original, seja com a alteração levada a efeito pela Lei nº 9.063/95.
Na mesma seara, declarações firmadas por supostos ex-empregadores ou subscritas por
testemunhas, noticiando a prestação do trabalho na roça, não se prestam ao reconhecimento
então pretendido, tendo em conta que equivalem a meros depoimentos reduzidos a termo, sem o
crivo do contraditório, conforme entendimento já pacificado no âmbito desta Corte.
Igualmente não alcançam os fins pretendidos, a apresentação de documentos comprobatórios da
posse da terra pelos mesmos ex-empregadores, visto que não trazem elementos indicativos da
atividade exercida pela parte requerente.
Já a mera demonstração, pela parte demandante, de propriedade rural, só se constituirá em
elemento probatório válido desde que traga a respectiva qualificação como lavrador ou agricultor.
No mesmo sentido, a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante a juntada
dos respectivos comprovantes de pagamento das mensalidades.
Têm-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a
qualificação da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos
por órgãos públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge Scartezzini,
v.u., DJ de 15.04.2002, p. 248.
Da mesma forma, a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a partir
da celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos
Tribunais.
Na atividade desempenhada em regime de economia familiar, toda a documentação
comprobatória, como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida, em regra, em nome
daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar. Ressalte-se, contudo, que nem sempre é
possível comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de
documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da
família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja
eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio
rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua colheita por outros produtos, de sua
necessidade, que um sitiante vizinho eventualmente tenha colhido, ou a entrega, como forma de
pagamento, pela parceria na utilização do espaço de terra cedido para plantar.
De qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº
463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em
nome dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constituem
início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos.
Ressalte-se que o trabalho urbano de membro da família não descaracteriza, por si só, o
exercício de trabalho rural em regime de economia familiar de outro. Para ocorrer essa
descaracterização, é necessária a comprovação de que a renda obtida com a atividade urbana é
suficiente à subsistência da família.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura numerus
clausus, já que o "sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento
motivado" (AC nº 94.03.025723-7/SP, TRF 3ª Região, Rel. Juiz Souza Pires, 2º Turma, DJ
23.11.94, p. 67691), cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e
sua aceitação.
A lei não distinguiu entre trabalhadores urbanos e rurais, ao introduzir o preceito de que a perda
da qualidade de segurado não infirma o direito à aposentadoria por tempo de contribuição ou por
idade, se os requisitos do tempo de contribuição e da carência foram adimplidos em momento
anterior.
A circunstância, ainda, de o citado artigo mencionar "tempo de contribuição" não exclui o rurícola,
pois o legislador contentou-se aqui em explicitar o requisito geral, que é o da contribuição, nem
por isso tencionando afastar de sua abrangência o trabalhador rural que, em alguns casos, por
norma especial, é dispensado dos recolhimentos; ademais, o raciocínio albergado pela lei é
aplicável do ponto de vista fático tanto aos urbanos como aos rurais, sendo de se invocar o
brocardo Ubi eadem ratio ibi idem jus.
A equiparação dos trabalhadores urbanos e rurais, para fins previdenciários, é garantia da Carta
de 1988 e não pode ser olvidada, sem justificativa plausível, sob pena de ofensa ao princípio da
isonomia e à previsão contida no seu art. 194, parágrafo único, II.
No entanto, penso que, se as lides campesinas foram abandonadas pela parte autora muitos
anos antes do implemento do requisito etário, já não há porque se aplicar a redução de 5 (cinco)
anos mencionada no art. 48, §1º, da Lei 8.213/1991, uma vez que tal determinação visou proteger
o idoso que, submetido às penosas condições do trabalho no campo, teria o direito de se
aposentar mais cedo. Esse, a meu ver, o raciocínio adotado pelo legislador no art. 48, §3º, da Lei
de Benefícios, ao prever o afastamento da redução etária se, para completar o tempo de
carência, houver contagem de períodos sob outras categorias.
No que se refere ao recolhimento das contribuições previdenciárias, destaco que o dever legal de
promover seu recolhimento junto ao INSS e descontar da remuneração do empregado a seu
serviço, compete exclusivamente ao empregador, por ser este o responsável pelo seu repasse
aos cofres da Previdência, a quem cabe a sua fiscalização, possuindo, inclusive, ação própria
para haver o seu crédito, podendo exigir do devedor o cumprimento da legislação. No caso da
prestação de trabalho em regime de economia familiar, é certo que o segurado é dispensado do
período de carência, nos termos do disposto no art. 26, III, da Lei de Benefícios e, na condição de
segurado especial, assim enquadrado pelo art. 11, VII, da legislação em comento, caberia o dever
de recolher as contribuições, tão-somente se houvesse comercializado a produção no exterior, no
varejo, isto é, para o consumidor final, para empregador rural-pessoa física, ou a outro segurado
especial (art. 30, X, da Lei de Custeio).
Por fim, outra questão que suscita debates é a referente ao trabalho urbano eventualmente
exercido pelo segurado ou por seu cônjuge, cuja qualificação como lavrador lhe é extensiva.
Perfilho do entendimento no sentido de que o desempenho de atividade urbana, de per si, não
constitui óbice ao reconhecimento do direito aqui pleiteado, desde que o mesmo tenha sido
exercido por curtos períodos, especialmente em época de entressafra, quando o humilde
campesino se vale de trabalhos esporádicos em busca da sobrevivência.
Da mesma forma, o ingresso no mercado de trabalho urbano não impede a concessão da
aposentadoria rural, na hipótese de já restar ultimada, em tempo anterior, a carência exigida
legalmente, considerando não só as datas do início de prova mais remoto e da existência do
vínculo empregatício fora da área rural, como também que a prova testemunhal, segura e
coerente, enseje a formação da convicção deste julgador acerca do trabalho campesino exercido
no período. (TRF 3ª REGIÃO, AGRAVO LEGAL EM APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002576-
92.2015.4.03.9999/SP, Rel. DES. FED. DAVI DANTAS, 8ª TURMA, julgado em 14 de dezembro
de 2015, v.u).
No mesmo sentido: Apelação cível nº 2014.03.99.038096-5, Rel. Des. Fed. GILBERTO JORDAN,
TRF 3ª Região, Julgado em 17.12.2104.
Do caso dos autos.
A parte autora, Durvalina Maria de Oliveira, completou o requisito idade mínima (55 anos) em
03/03/2000, posto que nasceu em 03/03/1945, devendo, assim, demonstrar o efetivo exercício de
atividade rural por, no mínimo, 114 meses, conforme previsto no artigo 142 da Lei nº 8.213/91.
Narra a inicial que a autora iniciou o trabalho rural desde tenra idade com seus pais lavradores e
continuou a exercer o mesmo labor na região, após o casamento com lavrador.
Como início de prova material de seu trabalho no campo, apresentou os documentos:
Certidão de Casamento com Custódio Pereira de Oliveira, lavrador, em 25/11/1961;
Certidão de Nascimento do filho Sebastião constando o endereço da autora na Fazenda
Lageado;
Certidão de Nascimento do filho Aldevan Pereira de Oliveira nascido na Fazenda Cabeceira do
Pouso em 18/01/1965;
Certidão de Óbito de Custódio em 02/12/2011;
Contrato de Parceria agrícola firmado de 25/03/2013 até 2016;
Certidão de lote Rural em 21/09/1972 com Escritura de compra e venda do imóvel localizado na
Cabeceira do Pouso, firmada em 26/06/2009 onde consta a profissão do esposo da autora como
lavrador.
Examinados os autos, a sentença é de ser reformada.
A prova documental é no sentido de demonstrar o labor rural por parte da autora, pelo prazo de
carência, conforme exige o art. 142 da Lei previdenciária, considerando que há documento oficial
a indicar a qualificação de lavrador do marido da autora a ela extensível, bem como há início de
prova material do trabalho rurícola da autora e documentação do imóvel rural objeto de escritura,
bem como diante da prova testemunhal obtida e dos informes do CNIS da autora que não trazem
vínculos urbanos e apenas concessão de amparo social ao idoso cessado em 2011 e pensão por
morte previdenciária (aposentadoria por idade de seu marido) a partir de 2011.
Ao ser ouvida em Juízo, a autora disse que nasceu na Fazenda Lageado e hoje mora em Rio
Verde com filho e neta; que teve cinco filhos e recebe pensão; que sempre foi morar na Fazenda
Cabeceira do Pouso; que desde 1970 mais ou menos trabalha na fazenda e que o seu trabalho
consistia em cultivo da mandioca, horta, criação de galinha, etc, para consumo da família.
Verifico que a prova testemunhal colhida (o informante Inacio, as testemunhas Ramona e Maria
Belchior) afirmou o trabalho rural da autora, a evidenciar o cumprimento da carência.
O informante Inácio disse que conhece a autora desde 1960, quando a autora morou e trabalhou
sempre na roça, na fazenda Lageado. Disse que depois a autora foi trabalhar na Fazenda
Guanabara e que o esposo, ao que sabe sempre trabalhou na lavoura.
A testemunha Maria Belchior conhece a autora da Fazenda Lageado desde criança; o marido e
os filhos sempre laboraram como trabalhadores rurais, sem empregados trabalharam no Sítio
Guanabara e Pontal na plantação e cultivo.
A testemunha Ramona disse que conhece a autora há uns 30 anos na Fazenda Lageado com o
pai dela e depois na Guanabara; que toda vida moravam na fazenda.
Entendo que a prova testemunhal corrobora as palavras da autora considerada a dificuldade que
as testemunhas geralmente encontram para descrever com mais detalhes memoriais da atividade
rural apontada pelos requerentes.
Dessa forma, torna-se viável a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, uma vez
que há início de prova material, ficando comprovado que a parte autora efetivamente trabalhou
nas lides rurais no tempo mínimo em exigência da lei, prevista no art. 143 da Lei nº 8.213/91.
Assim, a autora comprovou que o trabalho rural tenha sido predominante ao longo de sua vida.
Preenchidos os requisitos legais, é devido o benefício de aposentadoria por idade pleiteado e
procedente o pedido para condenar o INSS a conceder à autora o benefício de aposentadoria por
idade de trabalhador rural, no valor de um salário mínimo, a partir do requerimento administrativo
(23/06/2009 ) conforme pedido na inicial e demais consectários legais.
Fixo os honorários advocatícios em 10% do valor da condenação até a data do presente julgado,
uma vez improcedente a sentença.
Com relação à correção monetária, cabe pontuar que o artigo 1º-F, da Lei 9.494/97, com a
redação dada pela Lei nº 11.960/09, foi declarado inconstitucional por arrastamento pelo
Supremo Tribunal Federal, ao julgar as ADIs nos 4.357 e 4.425, mas apenas em relação à
incidência da TR no período compreendido entre a inscrição do crédito em precatório e o efetivo
pagamento.
Isso porque a norma constitucional impugnada nas ADIs (art. 100, §12, da CRFB, incluído pela
EC nº 62/09) referia-se apenas à atualização do precatório e não à atualização da condenação,
que se realiza após a conclusão da fase de conhecimento.
Vislumbrando a necessidade de serem uniformizados e consolidados os diversos atos normativos
afetos à Justiça Federal de Primeiro Grau, bem como os Provimentos da Corregedoria desta E.
Corte de Justiça, a Consolidação Normativa da Corregedoria-Geral da Justiça Federal da 3ª
Região (Provimento COGE nº 64, de 28 de abril 2005) é expressa ao determinar que, no tocante
aos consectários da condenação, devem ser observados os critérios previstos no Manual de
Orientação de Procedimentos para Cálculos da Justiça Federal.
A respeito do tema, insta considerar que, no dia 20/09/2017, no julgamento do RE nº 870.947,
com repercussão geral reconhecida, o Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou a
inconstitucionalidade da utilização da TR, também para a atualização da condenação.
No mesmo julgamento, em relação aos juros de mora incidentes sobre débitos de natureza não
tributária, como é o caso da disputa com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em causa,
o STF manteve a aplicação do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela
Lei 11.960/2009.
"In casu", como se trata da fase anterior à expedição do precatório, e tendo em vista que a
matéria não está pacificada, há de se concluir que devem ser aplicados os índices previstos pelo
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor por
ocasião da execução do julgado, em respeito ao Provimento COGE nº 64, de 28 de abril 2005
(AC 00056853020144036126, DESEMBARGADORA FEDERAL TANIA MARANGONI, TRF3 -
OITAVA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/05/2016), observado o entendimento firmado pelo
STF no RE 870.947.
Custas pelo réu, em face da previsão legislativa estadual do Mato Grosso do Sul.
Ante o exposto, dou provimento ao recurso interposto por Durvalina Maria de Oliveira, para julgar
procedente a ação.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL.
REGIME EM ECONOMIA FAMILIAR. PROVA DOCUMENTAL. MARIDO LAVRADOR.
ESCRITURA DE IMÓVEL RURAL ONDE EXERCIDO O LABOR EM REGIME DE ECONOMIA
FAMILIAR. PROVA TESTEMUNHAL. CORROBORAÇÃO. TEMPO DE TRABALHO EXIGIDO NA
LEGISLAÇÃO. COMPROVAÇÃO. CONDENAÇÃO DO INSS. DATA DO INÍCIO DO BENEFÍCIO.
HONORÁRIOS. 10% DO VALOR DA CONDENAÇÃO ATÉ A PRESENTE DATA. JUROS E
CORREÇÃO MONETÁRIA. ENTENDIMENTO DO STF. PROVIMENTO DO RECURSO. CUSTAS
DEVIDAS. PROCEDÊNCIA DA AÇÃO.
1.A prova documental é no sentido de demonstrar o labor rural por parte do autora pelo prazo de
carência, conforme exige o art. 142 da Lei previdenciária, em regime de economia familiar,
considerando que há documento oficial a indicar a qualificação de lavrador do marido a ela
extensível.
2.Documentos oficiais de escritura de lote rural e compra e venda onde a família exerce o labor
em regime de economia familiar.
3.Há comprovação de que a autora trabalhou como rurícola, o que veio corroborado pela prova
testemunhal colhida que afirmou o trabalho rural da autora, a evidenciar o cumprimento da
carência.
4.Dessa forma, torna-se viável a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, uma
vez que há início de prova material, ficando comprovado que a parte autora efetivamente
trabalhou nas lides rurais no tempo mínimo em exigência da lei, prevista no art. 143 da Lei nº
8.213/91.
5. Condenação do INSS a conceder à autora a aposentadoria por idade rural, no valor de um
salário mínimo, a partir do requerimento administrativo.
6. Honorários advocatícios de 10% do valor da condenação até a presente data, uma vez
improcedente a sentença.
7.No que diz com os juros e correção monetária, aplico o entendimento do E.STF, na repercussão
Geral, no Recurso Extraordinário nº 870.947 e o Manual de Cálculos da Justiça Federal.
8.Custas pelo réu, de acordo com a previsão legal do Estado Mato Grosso do Sul a respeito.
9.Provimento da apelação. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
