Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5003638-77.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal LUIZ DE LIMA STEFANINI
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
11/03/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 09/04/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL.
SUFICIÊNCIA. PROVA TESTEMUNHAL. CORROBORAÇÃO. TEMPO DE TRABALHO EXIGIDO
NA LEGISLAÇÃO. TUTELA MANTIDA. INÍCIO DO BENEFÍCIO. REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO. HONORÁRIOS. 10% DO VALOR DA CONDENAÇÃO ATÉ A SENTENÇA.
MONTANTE ADEQUADO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. ENTENDIMENTO DO STF E
MANUAL DE CÁLCULOS DA JUSTIÇA FEDERAL. IMPROVIMENTO DO RECURSO DO INSS.
PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO DA PARTE AUTORA. PROCEDÊNCIA DA AÇÃO
MANTIDA.
1.A parte autora completou o requisito idade mínima (60 anos) em 2015, devendo, assim,
demonstrar o efetivo exercício de atividade rural por, no mínimo, 180 meses, conforme previsto
no artigo 142 da Lei nº 8.213/91.
2.Como início de prova material de seu trabalho no campo, apresentou documentos certidão de
casamento e certidão de nascimento do filho nas quais consta a qualificação de lavrador.
3. Há comprovação de trabalho rural no tempo necessário previsto na legislação previdenciária e
comprovação de imediatidade do labor rurícola.
4.As testemunhas ouvidas em juízo disseram que o autor atualmente continua como trabalhador
rural, a confirmar a narrativa inicial.
5.Mantida a data inicial do benefício quando do requerimento administrativo, ocasião em que o
autor já havia cumprido os requisitos para a obtenção da aposentadoria.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
6.Juros e correção conforme entendimento do STF e Manual de Cálculos da Justiça Federal.
7. Improvimento do recurso do INSS e parcial provimento do recurso da parte autora, apenas em
relação aos juros e correção monetária.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003638-77.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: DORIVAL FERREIRA
Advogado do(a) APELADO: JOSE ANTONIO SOARES NETO - MS8984-A
APELAÇÃO (198) Nº 5003638-77.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: DORIVAL FERREIRA
Advogado do(a) APELADO: JOSE ANTONIO SOARES NETO - MS8984-A
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelações interpostas pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS e por Dorival
Ferreira, em sede de ação cujo objeto é a concessão de aposentadoria por idade devida a
trabalhador rural, que alega ter trabalhado pelo tempo necessário previsto em lei, e que, portanto,
faria jus ao benefício.
Com a inicial vieram documentos.
Justiça gratuita concedida.
Contestação da parte ré oferecida com réplica pela parte autora.
Em juízo foram colhidos depoimentos em audiência.
Por sentença datada de 04/10/2017, o MMº Juízo "a quo" julgou procedente o pedido, ao
fundamento de que há elementos probatórios suficientes a sustentá-lo e concedeu a
aposentadoria por idade rural do autor, a partir do requerimento administrativo (07/12/2016), com
consectários e honorários no valor de 10% da condenação até a sentença (Súmula nº 111 do
STJ).
Em apelação a autarquia alega, em síntese, não haver provas suficientes do trabalho rural, em
regime de economia familiar, do cumprimento de carência, da qualidade de segurado especial,
vedada a cumulação de aposentadoria com pensão por morte e requisitos simultâneos de idade e
atividade pelo tempo devido, além da existência de outros rendimentos.
Subsidiariamente, pretende a alteração dos critérios de juros e correção monetária; que o início
do benefício recaia na data da audiência e prequestiona a matéria.
Apela o autor, objetivando a modificação dos critérios de juros e correção monetária para a
aplicação do Manual de Cálculos da Justiça Federal vigente ao tempo da execução do julgado e
entendimento do E.STF, com aplicação do RE nº870.947, bem como honorários advocatícios no
valor de 20% da condenação.
Com contrarrazões recursais, os autos subiram a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.ata-se de apelações interpostas pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS e
por Dorival Ferreira, em sede de ação cujo objeto é a concessão de aposentadoria por idade
devida a trabalhador rural, que alega ter trabalhado pelo tempo necessário previsto em lei, e que,
portanto, faria jus ao benefício.
Com a inicial vieram documentos.
Justiça gratuita concedida.
Contestação da parte ré oferecida com réplica pela parte autora.
Em juízo foram colhidos depoimentos em audiência.
Por sentença datada de 04/10/2017, o MMº Juízo "a quo" julgou procedente o pedido, ao
fundamento de que há elementos probatórios suficientes a sustentá-lo e concedeu a
aposentadoria por idade rural do autor, a partir do requerimento administrativo (07/12/2016), com
consectários e honorários no valor de 10% da condenação até a sentença (Súmula nº 111 do
STJ).
Em apelação a autarquia alega, em síntese, não haver provas suficientes do trabalho rural, em
regime de economia familiar, do cumprimento de carência, da qualidade de segurado especial,
vedada a cumulação de aposentadoria com pensão por morte e requisitos simultâneos de idade e
atividade pelo tempo devido, além da existência de outros rendimentos.
Subsidiariamente, pretende a alteração dos critérios de juros e correção monetária; que o início
do benefício recaia na data da audiência e prequestiona a matéria.
Apela o autor, objetivando a modificação dos critérios de juros e correção monetária para a
aplicação do Manual de Cálculos da Justiça Federal vigente ao tempo da execução do julgado e
entendimento do E.STF, com aplicação do RE nº870.947, bem como honorários advocatícios no
valor de 20% da condenação.
Com contrarrazões recursais, os autos subiram a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5003638-77.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: DORIVAL FERREIRA
Advogado do(a) APELADO: JOSE ANTONIO SOARES NETO - MS8984-A
V O T O
Em linhas introdutórias, destaco que antes da entrada em vigor da Constituição Federal de 1988
e da Lei nº 8.213/91, que a regulamentou, a Lei Complementar nº 11, de 25.05.1971, em seu
artigo 4º, previa que a aposentadoria por idade seria devida ao trabalhador rural quando este
completasse 65 (sessenta e cinco) anos, o que foi posteriormente alterado pela Lei
Complementar nº 16, de 30.10.1973, que, em seu artigo 5º, passou a prever que a qualidade de
trabalhador rural dependeria da comprovação de sua atividade pelo menos nos últimos três anos
anteriores à data do pedido do benefício, ainda que de forma descontínua.
Já a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 202, e inciso I, estabeleceu:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários de contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e
comprovada a regularidade dos reajustes dos salários de contribuição de modo a preservar seus
valores reais e obedecidas as seguintes condições:
I - aos sessenta e cinco anos de idade, para o homem, e aos sessenta, para a mulher, reduzido
em cinco anos o limite de idade para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que
exerçam suas atividades em regime de economia familiar, neste incluídos o produtor rural, o
garimpeiro e o pescador artesanal" - grifo nosso.
Referida norma constitucional foi regulamentada pela Lei nº 8.213/91, que dispõe sobre os Planos
de Benefícios da Previdência Social, tendo, em seu artigo 48, e §§ 1º e 2º, estabelecido os
requisitos etário e de efetivo exercício de atividade rural pelo período de carência do benefício
pretendido - conforme tabela de carências, prevista no artigo 142 daquela Lei -, para que homens
e mulheres possam obter a aposentadoria por idade, nos seguintes termos:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
§ 1o Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso
de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na
alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11;
§ 2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o
efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei" - grifei.
Por sua vez, o artigo 39 da supra referida Lei garante ao trabalhador rural, segurado especial -
isto é, aquele que trabalha em regime de economia familiar -, aposentadoria por idade no valor de
um salário mínimo, desde que comprove efetivo exercício de atividade rural pelo período legal de
carência do benefício, "verbis":
"Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, fica garantida a
concessão:
I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de
pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86,
desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período,
imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes
à carência do benefício requerido".
Da mesma forma, prevê o artigo 143 da Lei nº 8.213/91:
"Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Destaco, por fim, o artigo 26, inciso III, da Lei nº 8.213/91, que isentou o segurado especial -
produtor rural em regime de economia familiar - do recolhimento de contribuições, fazendo jus ao
benefício, pois, independentemente de contribuição, desde que comprove exercício de atividade
rural pelo número de meses correspondentes à carência do benefício pretendido, "verbis":
"Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:
[...]
III - os benefícios concedidos na forma do inciso I do art. 39, aos segurados especiais referidos no
inciso VII do art. 11 desta Lei".
Conclui-se, portanto, que o benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural está
disciplinado nos artigos 39, I, 48 e 143, da Lei nº 8.213/91, exigindo-se, além da comprovação da
idade (60 anos para homens e 55 para mulheres), prova do exercício de atividade rural, mesmo
que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de
meses idêntico à carência do benefício, nos termos dos artigos 26, III e 142 daquela Lei.
Pois bem, uma vez analisado o sistema normativo que regulamenta a concessão do benefício em
questão, importante destacar também os critérios de valoração das provas, já sedimentados pela
jurisprudência pátria.
Nesse sentido, esta E. Oitava Turma vem decidindo, "verbis":
"[...] Declarações de Sindicato de Trabalhadores Rurais fazem prova do quanto nelas alegado,
desde que devidamente homologadas pelo Ministério Público ou pelo INSS, órgãos competentes
para tanto, nos exatos termos do que dispõe o art. 106, III, da Lei nº 8.213/91, seja em sua
redação original, seja com a alteração levada a efeito pela Lei nº 9.063/95.
Na mesma seara, declarações firmadas por supostos ex-empregadores ou subscritas por
testemunhas, noticiando a prestação do trabalho na roça, não se prestam ao reconhecimento
então pretendido, tendo em conta que equivalem a meros depoimentos reduzidos a termo, sem o
crivo do contraditório, conforme entendimento já pacificado no âmbito desta Corte.
Igualmente não alcançam os fins pretendidos, a apresentação de documentos comprobatórios da
posse da terra pelos mesmos ex-empregadores, visto que não trazem elementos indicativos da
atividade exercida pela parte requerente.
Já a mera demonstração, pela parte demandante, de propriedade rural, só se constituirá em
elemento probatório válido desde que traga a respectiva qualificação como lavrador ou agricultor.
No mesmo sentido, a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante a juntada
dos respectivos comprovantes de pagamento das mensalidades.
Têm-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a
qualificação da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos
por órgãos públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge Scartezzini,
v.u., DJ de 15.04.2002, p. 248.
Da mesma forma, a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a partir
da celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos
Tribunais.
Na atividade desempenhada em regime de economia familiar, toda a documentação
comprobatória, como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida, em regra, em nome
daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar. Ressalte-se, contudo, que nem sempre é
possível comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de
documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da
família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja
eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio
rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua colheita por outros produtos, de sua
necessidade, que um sitiante vizinho eventualmente tenha colhido, ou a entrega, como forma de
pagamento, pela parceria na utilização do espaço de terra cedido para plantar.
De qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº
463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em
nome dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constituem
início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos.
Ressalte-se que o trabalho urbano de membro da família não descaracteriza, por si só, o
exercício de trabalho rural em regime de economia familiar de outro. Para ocorrer essa
descaracterização, é necessária a comprovação de que a renda obtida com a atividade urbana é
suficiente à subsistência da família.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura numerus
clausus, já que o "sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento
motivado" (AC nº 94.03.025723-7/SP, TRF 3ª Região, Rel. Juiz Souza Pires, 2º Turma, DJ
23.11.94, p. 67691), cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e
sua aceitação.
A lei não distinguiu entre trabalhadores urbanos e rurais, ao introduzir o preceito de que a perda
da qualidade de segurado não infirma o direito à aposentadoria por tempo de contribuição ou por
idade, se os requisitos do tempo de contribuição e da carência foram adimplidos em momento
anterior.
A circunstância, ainda, de o citado artigo mencionar "tempo de contribuição" não exclui o rurícola,
pois o legislador contentou-se aqui em explicitar o requisito geral, que é o da contribuição, nem
por isso tencionando afastar de sua abrangência o trabalhador rural que, em alguns casos, por
norma especial, é dispensado dos recolhimentos; ademais, o raciocínio albergado pela lei é
aplicável do ponto de vista fático tanto aos urbanos como aos rurais, sendo de se invocar o
brocardo Ubi eadem ratio ibi idem jus.
A equiparação dos trabalhadores urbanos e rurais, para fins previdenciários, é garantia da Carta
de 1988 e não pode ser olvidada, sem justificativa plausível, sob pena de ofensa ao princípio da
isonomia e à previsão contida no seu art. 194, parágrafo único, II.
No entanto, penso que, se as lides campesinas foram abandonadas pela parte autora muitos
anos antes do implemento do requisito etário, já não há porque se aplicar a redução de 5 (cinco)
anos mencionada no art. 48, §1º, da Lei 8.213/1991, uma vez que tal determinação visou proteger
o idoso que, submetido às penosas condições do trabalho no campo, teria o direito de se
aposentar mais cedo. Esse, a meu ver, o raciocínio adotado pelo legislador no art. 48, §3º, da Lei
de Benefícios, ao prever o afastamento da redução etária se, para completar o tempo de
carência, houver contagem de períodos sob outras categorias.
No que se refere ao recolhimento das contribuições previdenciárias, destaco que o dever legal de
promover seu recolhimento junto ao INSS e descontar da remuneração do empregado a seu
serviço, compete exclusivamente ao empregador, por ser este o responsável pelo seu repasse
aos cofres da Previdência, a quem cabe a sua fiscalização, possuindo, inclusive, ação própria
para haver o seu crédito, podendo exigir do devedor o cumprimento da legislação. No caso da
prestação de trabalho em regime de economia familiar, é certo que o segurado é dispensado do
período de carência, nos termos do disposto no art. 26, III, da Lei de Benefícios e, na condição de
segurado especial, assim enquadrado pelo art. 11, VII, da legislação em comento, caberia o dever
de recolher as contribuições, tão-somente se houvesse comercializado a produção no exterior, no
varejo, isto é, para o consumidor final, para empregador rural-pessoa física, ou a outro segurado
especial (art. 30, X, da Lei de Custeio).
Por fim, outra questão que suscita debates é a referente ao trabalho urbano eventualmente
exercido pelo segurado ou por seu cônjuge, cuja qualificação como lavrador lhe é extensiva.
Perfilho do entendimento no sentido de que o desempenho de atividade urbana, de per si, não
constitui óbice ao reconhecimento do direito aqui pleiteado, desde que o mesmo tenha sido
exercido por curtos períodos, especialmente em época de entressafra, quando o humilde
campesino se vale de trabalhos esporádicos em busca da sobrevivência.
Da mesma forma, o ingresso no mercado de trabalho urbano não impede a concessão da
aposentadoria rural, na hipótese de já restar ultimada, em tempo anterior, a carência exigida
legalmente, considerando não só as datas do início de prova mais remoto e da existência do
vínculo empregatício fora da área rural, como também que a prova testemunhal, segura e
coerente, enseje a formação da convicção deste julgador acerca do trabalho campesino exercido
no período. (TRF 3ª REGIÃO, AGRAVO LEGAL EM APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002576-
92.2015.4.03.9999/SP, Rel. DES. FED. DAVI DANTAS, 8ª TURMA, julgado em 14 de dezembro
de 2015, v.u).
No mesmo sentido: Apelação cível nº 2014.03.99.038096-5, Rel. Des. Fed. GILBERTO JORDAN,
TRF 3ª Região, Julgado em 17.12.2104.
Do caso dos autos.
A parte autora, Dorival Ferreira, completou o requisito idade mínima (60 anos) em 01/08/2015,
posto que nasceu em 01/08/1955, devendo, assim, demonstrar o efetivo exercício de atividade
rural por, no mínimo, 180 meses, conforme previsto no artigo 142 da Lei nº 8.213/91.
Como início de prova material de seu trabalho no campo, apresentou os seguintes documentos:
Certidão de casamento celebrado em 05 de dezembro de 1984, na qual consta qualificação de
lavrador;
Certidão de nascimento do filho Sílvio César em 13/08/1980, onde consta o nome do pai (autor)
como sendo lavrador;
Inscrição em nome do autor no Sindicato de Trabalhadores Rurais;
Cópia da CTPS;
Conta de luz em nome da companheira Josélia;
Entrevista rural que concluiu tratar-se de trabalhador rural;
Cópia do indeferimento do benefício requerido em 07/12/2016.
Examinados os autos, a sentença concedeu o benefício e a tutela antecipada é de ser mantida.
A prova documental aponta no sentido de demonstrar o labor rural por parte do autor pelo prazo
acima, conforme exige o art. 142 da Lei previdenciária, em regime de economia familiar pelo
tempo de carência, considerando ainda que o autor traz certidões oficiais nas quais consta ser
lavrador desde o seu casamento até quando completou a idade necessária para a obtenção do
benefício, como requer a regra da imediatidade do labor rural em relação ao tempo de carência, o
que veio corroborado pela conclusão da entrevista rural e pelos depoimentos testemunhais.
Com efeito, as testemunhas ouvidas (Maria de Lourdes Neves de Andrade e Celso Carvalho dos
Santos) confirmaram a narrativa inicial.
A testemunha Maria de Lourdes conheceu o autor e trabalhou desde 2000 como diarista ou bóia-
fria e até hoje continua como trabalhor rural. Disse que trabalhou com o autor no rural, onde todos
os dias o autor ganhava por dia, na plantação de melancia e abobrinha. Agora o autor planta soja
no sítio próximo onde mora.
A testemunha Celso disse que conhece o autor há 11 anos de Mundo Novo. O autor trabalha na
lavoura agora com soja e milho, todos os dias até o dia atual. Nunca trabalhou na cidade. Mora
perto do autor na propriedade rural e afirmou que o trabalha com o Zeca no meio rural.
Dessa forma, torna-se viável a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, uma vez
que, presente o início razoável de prova material, ficando comprovado que a parte autora
efetivamente trabalhou nas lides rurais no tempo mínimo em exigência da lei, prevista no art. 143
da Lei nº 8.213/91.
As testemunhas corroboraram o labor rural da parte autora que comprovou que o trabalho rural foi
predominante em regime de economia familiar, ao longo de sua vida profissional, comprovada
também a imediatidade anterior do trabalho rural quando do implemento dos requisitos pela parte
autora.
Preenchidos os requisitos legais, é devido o benefício de aposentadoria por idade pleiteado e
procedente o pedido.
Mantenho a data do início do benefício a partir do indeferimento do requerimento administrativo
quando a parte autora já reunia os requisitos para a aposentadoria, bem como a tutela concedida.
Mantenho os honorários advocatícios que fixados em 10% do valor da condenação nos termos do
§2º do art.85, do CPC, até a sentença, uma vez que adequados ao grau da complexidade da
causa e parâmetros legais.
No que diz com os juros e correção monetária, aplico o entendimento do C.STF, na Repercussão
geral, no Recurso Extraordinário nº 870.947, bem como o Manual de Cálculos da Justiça Federal
vigente ao tempo da execução do julgado.
Veja-se:
"DA CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA
Com relação à correção monetária, cabe pontuar que o artigo 1º-F, da Lei 9.494/97, com a
redação dada pela Lei nº 11.960/09, foi declarado inconstitucional por arrastamento pelo
Supremo Tribunal Federal, ao julgar as ADIs nos 4.357 e 4.425, mas apenas em relação à
incidência da TR no período compreendido entre a inscrição do crédito em precatório e o efetivo
pagamento.
Isso porque a norma constitucional impugnada nas ADIs (art. 100, §12, da CRFB, incluído pela
EC nº 62/09) referia-se apenas à atualização do precatório e não à atualização da condenação,
que se realiza após a conclusão da fase de conhecimento.
Vislumbrando a necessidade de serem uniformizados e consolidados os diversos atos normativos
afetos à Justiça Federal de Primeiro Grau, bem como os Provimentos da Corregedoria desta E.
Corte de Justiça, a Consolidação Normativa da Corregedoria-Geral da Justiça Federal da 3ª
Região (Provimento COGE nº 64, de 28 de abril 2005) é expressa ao determinar que, no tocante
aos consectários da condenação, devem ser observados os critérios previstos no Manual de
Orientação de Procedimentos para Cálculos da Justiça Federal.
A respeito do tema, insta considerar que, no dia 20/09/2017, no julgamento do RE nº 870.947,
com repercussão geral reconhecida, o Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou a
inconstitucionalidade da utilização da TR, também para a atualização da condenação.
No mesmo julgamento, em relação aos juros de mora incidentes sobre débitos de natureza não
tributária, como é o caso da disputa com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em causa,
o STF manteve a aplicação do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela
Lei 11.960/2009.
"In casu", como se trata da fase anterior à expedição do precatório, e tendo em vista que a
matéria não está pacificada, há de se concluir que devem ser aplicados os índices previstos pelo
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor por
ocasião da execução do julgado, em respeito ao Provimento COGE nº 64, de 28 de abril 2005
(AC 00056853020144036126, DESEMBARGADORA FEDERAL TANIA MARANGONI, TRF3 -
OITAVA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/05/2016), observado o entendimento firmado pelo
STF no RE nº 870.947".
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DOU PARCIAL PROVIMENTO
À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, apenas em relação aos juros e correção monetária na forma
supra.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL.
SUFICIÊNCIA. PROVA TESTEMUNHAL. CORROBORAÇÃO. TEMPO DE TRABALHO EXIGIDO
NA LEGISLAÇÃO. TUTELA MANTIDA. INÍCIO DO BENEFÍCIO. REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO. HONORÁRIOS. 10% DO VALOR DA CONDENAÇÃO ATÉ A SENTENÇA.
MONTANTE ADEQUADO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. ENTENDIMENTO DO STF E
MANUAL DE CÁLCULOS DA JUSTIÇA FEDERAL. IMPROVIMENTO DO RECURSO DO INSS.
PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO DA PARTE AUTORA. PROCEDÊNCIA DA AÇÃO
MANTIDA.
1.A parte autora completou o requisito idade mínima (60 anos) em 2015, devendo, assim,
demonstrar o efetivo exercício de atividade rural por, no mínimo, 180 meses, conforme previsto
no artigo 142 da Lei nº 8.213/91.
2.Como início de prova material de seu trabalho no campo, apresentou documentos certidão de
casamento e certidão de nascimento do filho nas quais consta a qualificação de lavrador.
3. Há comprovação de trabalho rural no tempo necessário previsto na legislação previdenciária e
comprovação de imediatidade do labor rurícola.
4.As testemunhas ouvidas em juízo disseram que o autor atualmente continua como trabalhador
rural, a confirmar a narrativa inicial.
5.Mantida a data inicial do benefício quando do requerimento administrativo, ocasião em que o
autor já havia cumprido os requisitos para a obtenção da aposentadoria.
6.Juros e correção conforme entendimento do STF e Manual de Cálculos da Justiça Federal.
7. Improvimento do recurso do INSS e parcial provimento do recurso da parte autora, apenas em
relação aos juros e correção monetária. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DAR PARCIAL
PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
