Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5061647-32.2018.4.03.9999
Relator(a) para Acórdão
Juiz Federal Convocado VANESSA VIEIRA DE MELLO
Relator(a)
Juiz Federal Convocado RODRIGO ZACHARIAS
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
06/03/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 12/03/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. PRESENÇA DE INÍCIO DE
PROVA MATERIAL. PROVA DO MARIDO EXTENSÍVEL À ESPOSA. PROVA TESTEMUNHAL
HARMÔNICA. REQUISITOS PREENCHIDOS. TERMO INICIAL MANTIDO NA DATA DE
ENTREGA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO.
- A obtenção da aposentadoria por idade de trabalhador rural está condicionada ao implemento
de idade mínima de 60 anos, para os homens, e de 55 anos, para mulheres. Também se exige
comprovação de exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período anterior
ao requerimento do benefício, ficando afastada a obrigatoriedade de contribuições.
- Juntada de Certidão de Casamento da autora, em que seu cônjuge encontra-se qualificado
como lavrador. Entendo extensíveis à mulher, a partir da celebração do matrimônio ou do limiar
da união estável, os documentos em que os cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados
como lavradores. Precedentes do STJ.
- Juntada de CTPS em nome próprio com anotações de vínculos empregatícios rurais.
- A prova testemunhal produzida favorece o pleito autoral, sendo coesa e harmônica no que tange
à prestação do trabalho rural, pelo interregno necessário à concessão do benefício requerido.
- Termo inicial do benefício mantido na data de entrega do requerimento administrativo.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Precedentes dessa Turma.
- Apelação do INSS desprovida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5061647-32.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: MARIA APARECIDA MAURILIO DE MORAIS
Advogado do(a) APELADO: DENNER PERUZZETTO VENTURA - SP322359-N
APELAÇÃO (198) Nº 5061647-32.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: MARIA APARECIDA MAURILIO DE MORAIS
Advogado do(a) APELADO: DENNER PERUZZETTO VENTURA - SP322359-N
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Cuida-se de apelação interposta em
face da r. sentença que julgou procedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade
rural à parte autora, desde a data do requerimento administrativo, acrescido dos consectários
legais, dispensado o reexame necessário.
Em suas razões, o INSS requer a reforma do julgado para que seja negado o pedido, porque não
comprovado os requisitos necessários para concessão do benefício. Prequestiona a matéria.
Contrarrazões apresentadas.
Subiram os autos a esta egrégia Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO (198) Nº5061647-32.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: MARIA APARECIDA MAURILIO DE MORAIS
Advogado do(a) APELADO: DENNER PERUZZETTO VENTURA - SP322359-N
VOTO DIVERGENTE
Trata-se de recurso de apelação, interposto pelo INSS - Instituto Nacional do Seguro Social.
Pertine à sentença de procedência de concessão de benefício de aposentadoria por idade de
trabalhador rural.
O ilustre relator deu provimento ao apelo autárquico, ao entendimento de que não estão
presentes os requisitos autorizadores à concessão do benefício citado, notadamente
comprovação de exercício de labor rural pela requerente.
Peço vênia para divergir do ilustre relator, pelas razões expostas.
A obtenção da aposentadoria por idade de trabalhador rural está condicionada ao implemento de
idade mínima de 60 anos, para os homens, e de 55 anos, para mulheres. Também se exige
comprovação de exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período anterior
ao requerimento do benefício, ficando afastada a obrigatoriedade de contribuições.
Nesse sentido, entendo estar demonstrado o labor rurícola da requerente no lapso
correspondente.
Com efeito, compulsando-se os autos, verifica-se que foi colacionada cópia da Certidão de
Casamento da autora, celebrado em 22/12/1984, em que seu cônjuge encontra-se qualificado
como “lavrador”. A respeito de tal questão, entendo extensíveis à mulher, a partir da celebração
do matrimônio ou do limiar da união estável, os documentos em que os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores (v.g., STJ, AGARESP 201402280175, Relatora Min.
Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJE 11/12/2014).
Ademais, a requerente carreou à inicial CTPS – Carteira de Trabalho da Previdência Social
própria e extrato do CNIS com registros de vínculos empregatícios de natureza rural de
01/03/2011 a 08/03/2011 e de 03/04/2017 a 26/07/2018, ambos com a CBO 6210-05 -
Trabalhador Agropecuário em Geral.
Quanto às testemunhas, ouvidas em 29/08/2018, Osvaldo Galharde informou que conhece a
autora há, aproximadamente, 20 anos; que a demandante laborava como boia-fria para diversas
pessoas, citando Joaquim, Ângelo Sérgio e Moreira; que o cônjuge da requerente também é
rurícola; que já presenciou o trabalho da autora, pois possui um sítio.
Maria José Trevisan da Silva atestou que conhece a autora há 25 anos; que a autora sempre
trabalhou como rurícola, já havendo laborado para Joaquim Troina e Osmar Trevisan, em
lavouras de batata, milho, café e feijão; que o cônjuge da autora também é trabalhador rural; que
o último trabalho da requerente foi para o irmão da depoente, José Carlos Trevisan, na lavoura.
Nesse contexto, concluo que a prova testemunhal produzida favorece o pleito autoral, sendo
coesa e harmônica no que tange à prestação do trabalho rural, pelo interregno necessário à
concessão do benefício requerido, a acenar à procedência do pedido deduzido.
Ainda, não merece acolhimento o pleito subsidiário da autarquia de fixação termo inicial do
benefício na data da sentença. De acordo com o artigo 49, II, da Lei nº 8.213/91 e com o
entendimento esposado pela jurisprudência dominante, o termo inicial do benefício deve ser
estabelecido a partir do requerimento administrativo. Nesse sentido: Apelação Cível nº 0024180-
75.2016.4.03.9999, Nona Turma, Relator Juiz Convocado Rodrigo Zacharias, e-DJF3 10/10/2016;
Apelação Cível nº 0000299-69.2016.4.03.9999, Relator Desembargador Federal Gilberto Jordan,
e-DJF3 13/6/2016.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
DECLARAÇÃO DE VOTO
A Desembargadora Federal MARISA SANTOS: Cuida-se de declarar o voto proferido no
julgamento da apelação interposta pelo INSS contra sentença que julgou procedente o pedido de
concessão de aposentadoria por idade rural, a partir do requerimento administrativo.
Na sessão de 20 de fevereiro de 2019, o senhor Relator deu provimento à apelação do INSS para
julgar improcedente o pedido.
Passo a declarar o voto divergente.
Os requisitos para concessão da aposentadoria por idade de trabalhador rural estão fixados nos
arts. 142 e 143 da Lei 8213/1991, e, quando segurado especial em regime de economia familiar,
nos arts. 39, I, e 142 da mesma lei.
A carência estatuída no art. 25, II, não tem aplicação integral imediata, devendo ser escalonada e
progressiva, na forma estabelecida no art. 142, levando-se em conta o ano em que o segurado
implementou as condições necessárias à obtenção do benefício. Trata-se de regra de transição
destinada àqueles que já estavam no sistema antes da modificação legislativa.
Embora o art. 2º da Lei 11.718/2008 tenha estabelecido que "para o trabalhador rural empregado,
o prazo previsto no art. 143 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31
de dezembro de 2010", mesmo a partir de 01.01.2011 é possível a concessão do benefício,
contudo, com base em fundamento legal diverso.
A aposentadoria por idade continua sendo devida aos rurícolas, não mais nos termos do art. 143
do PBPS, mas, sim, com fulcro no art. 48 e parágrafos da Lei 8.213/91, com as modificações
introduzidas pela Lei 11.718/2008:
Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
(Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995).
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de
trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na
alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 1999).
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1º deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo
exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior
ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008).
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no § 2º
deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição
sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco)
anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela Lei nº 11.718, de
2008).
§ 4o Para efeito do § 3º deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de
acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-
de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-
contribuição da Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008).
Nos casos em que o(a) autor(a) completa a idade para a aposentadoria por idade rural após
31.12.2010, já não se submete às regras de transição dos arts. 142 e 143, e deve preencher os
requisitos previstos no art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei n. 8.213/91, com a redação que lhe foi dada pela
Lei n. 11.718/2008): 60 (sessenta) anos de idade, se homem, 55 (cinquenta e cinco) anos de
idade, se mulher, tempo de efetiva atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período
correspondente à carência exigida para o benefício, isto é, 180 (cento e oitenta) meses, e
imediatamente anterior ao requerimento.
A inicial sustentou que a autora é trabalhadora rural, tendo exercido sua atividade na condição de
diarista/boia-fria.
A interpretação sistemática da legislação previdenciária permite concluir que a exigência de
comprovação do exercício da atividade no período imediatamente anterior ao do requerimento do
benefício só tem sentido quando ainda não completado o tempo necessário para a concessão, na
forma prevista no art. 142 da Lei 8.213/91. Se a parte deixou as lides rurais após trabalhar pelo
período exigido no art. 143, não tem sentido negar-lhe o benefício. Aplicando o princípio da
uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços para populações urbanas e rurais, descrito
no art. 194, II, da Constituição Federal, é de se entender que, à semelhança dos urbanos, a
posterior perda da condição de segurado não obsta à concessão do benefício quando já cumprida
a carência.
Comprovado o exercício da atividade rural, não há que se falar em perda da qualidade de
segurado, uma vez o trabalhador rural deve apenas comprovar os requisitos idade e tempo de
atividade.
O conceito de carência, para o diarista e para o segurado especial, tem sentido peculiar, que se
satisfaz com o exercício da atividade, dispensando o pagamento das contribuições
previdenciárias.
Nesse sentido, a jurisprudência do STJ:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO, RECURSO ESPECIAL. DISSÍDIO PRETORIANO
NÃO DEMONSTRADO. NÃO CONHECIMENTO. INCIDÊNCIA DO ÓBICE DA SÚMULA 284/STF.
RURÍCOLA. APOSENTADORIA. VALOR MÍNIMO. CARÊNCIA. INEXIGIBILIDADE.
...
2. Até 1995, quando do advento da Lei nº 9.032, além do fator idade (60 anos para os homens e
55 anos para as mulheres) a fruição do benefício da aposentadoria de valor mínimo pelo rurícola
condiciona-se apenas ao trabalho rural por um tempo de cinco anos, ainda que em forma
descontínua, não se reclamando período de carência de 180 (cento e oitenta) contribuições
mensais (Lei nº 8.213/91 - arts. 26, III, 39, I, 48, § 1º e 143, II, redação anterior à alteração
introduzida pela Lei nº 9.063, de 14 de junho de 1995).
3. In casu, há início razoável de prova material a comprovar a condição de rurícola do
beneficiário.
4. Recurso especial conhecido em parte (letra "a"), e, nesta extensão, provido.
(RESP 189521 - Proc. 199800707751/SP - Rel. Fernando Gonçalves - DJ 24/05/1999).
A autora completou 55 anos em 19/2/2017, portanto, fará jus ao benefício se comprovar sua
condição de rurícola pelo período de 180 meses.
O art. 106 da Lei 8.213/1991 enumera os documentos aptos à comprovação da atividade, rol que
não é taxativo, admitindo-se outras provas, na forma do entendimento jurisprudencial dominante.
Para comprovar sua condição de rurícola, a autora juntou os documentos.
Documentos expedidos por órgãos públicos, nos quais conste a qualificação da autora como
lavradora ou de seu marido como lavrador, podem ser utilizados como início de prova material,
como exige o art. 55, § 3º, da Lei 8213/91, para comprovar a sua condição de rurícola, se
confirmada por prova testemunhal.
Entendo que a perda da condição de segurado que não impede a concessão do benefício àquele
que cumpriu a carência também se aplica aos trabalhadores rurais.
Entretanto, essa norma, como todas as demais, não comporta leitura e interpretação isoladas.
Deve ser analisada dentro do sistema que a alberga e, no caso, com vistas à proteção
previdenciária dada aos trabalhadores rurais.
Daí que cabe investigar o real significado da exigência contida no art. 143 da Lei 8.213/91, o quê
realmente deve ser exigido do trabalhador rural para que tenha direito à sua aposentadoria por
idade. Deve estar trabalhando no dia imediatamente anterior ao requerimento? Um ano antes?
Dois anos antes? Qual o período de interrupção do trabalho rural que pode ser considerado
imediatamente anterior ao requerimento do benefício?
Penso que a resposta está no próprio art. 143, cuja infeliz redação, ensejadora de tantas
discussões, tem em vista a proteção do trabalhador rural.
No regime anterior à Constituição de 1.988, os trabalhadores rurais estavam expressamente
excluídos do Regime Geral de Previdência Social, e tinham algum amparo apenas dentro dos
limites do Prorural.
A Constituição de 1988 estabelece que, para fins de seguridade social, trabalhadores urbanos e
rurais devem ter tratamento uniforme e equivalente, o que impõe que os trabalhadores rurais
tenham a mesma proteção previdenciária dada aos urbanos.
O novo Regime Geral de Previdência Social, conforme previsto na Constituição, foi implementado
com as Leis 8.212 e 8.213/91.
Instituído o novo RGPS, era necessário dar proteção àqueles trabalhadores rurais que, antes da
nova legislação, estavam expressamente excluídos da cobertura previdenciária, e essa proteção
veio, justamente, na forma prevista no art. 143 da Lei 8.213/91: aposentadoria por idade, desde
que comprovado o efetivo exercício da atividade rural pelo período correspondente à carência
prevista no art. 143, e no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício.
A "mens legis" foi, sem dúvida, proteger aquele trabalhador rural que antes do novo regime
previdenciário não tivera proteção previdenciária, ou seja, que fizera das lides rurais o seu meio
de vida. É verdade que a lei tolera que a atividade rural tenha sido exercida de forma
descontínua. Entretanto, não admite que tenha aquele trabalhador perdido a sua natureza
rurícola.
A lei implicitamente reconhece que o trabalhador rural nem sempre consegue emprego, em
especial em época de entressafras, o que o obriga a aceitar trabalho de natureza urbana. Não é
raro encontrar trabalhadores rurais que, por não encontrarem trabalho no campo, acabam por
trabalhar como pedreiros, ou jardineiros, atividades tipicamente urbanas.
Para que se caracterize tipicamente como rural, com direito à aposentadoria com idade reduzida,
o trabalhador deve, então, comprovar que exerceu atividade rural pelo menos por um período
que, mesmo que descontínuo, some o total correspondente à carência exigida.
A análise só pode ser feita no caso concreto. É a história laboral do interessado que pode levar à
conclusão de que permaneceu, ou não, essencialmente, trabalhador rural.
Se das provas surgir a comprovação de que o trabalho rural não foi determinante para a
sobrevivência do interessado, não se tratará de trabalhador rural com direito à proteção
previdenciária prevista no art. 143 da Lei 8.213/91.
O STJ decidiu, reiteradamente, em sede de recurso repetitivo:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE
RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE
TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER
PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º
combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que
estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural,
momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo
48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter
atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo
descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito.
Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os
requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.
2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência.
Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil.
(REsp 1.354.908/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 10/2/2016).
O reconhecimento de trabalho rural exercido na qualidade de diarista ou em regime de economia
familiar depende da apresentação de início de prova material contemporânea aos fatos, conforme
previsto no art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, corroborado por posicionamento jurisprudencial
consolidado na Súmula 149 do STJ.
A prova material apresentada deve guardar a necessária correlação lógica e pertinente com a
prova oral, devendo considerar, ainda, as situações peculiares do rurícola diarista, que não possui
similaridade com a do rurícola em regime de economia familiar, pois o primeiro trabalha de forma
avulsa, com vínculo não empregatício com o tomador do serviço, e mediante remuneração, e o
segundo trabalha por conta própria, em regra, com a cooperação de familiares, sem qualquer
vínculo de dependência financeira com terceiros, visando a subsistência ou o rendimento
decorrente da venda da produção.
Evidente, portanto, que a prova material de cada modalidade de trabalho rural possui
características próprias, principalmente quanto ao alcance e à possibilidade de seu
aproveitamento por outrem.
O trabalho rural em regime de economia familiar permite o aproveitamento do início de prova
material em reciprocidade entre os membros da entidade familiar, sendo permitida a comunicação
da qualificação profissional de um membro para outro, como ocorre entre os cônjuges, entre pais
e filhos, e em outras hipóteses nas quais presente o parentesco.
No reconhecimento do trabalho rural do diarista não se permite, em regra, o aproveitamento da
prova material, que não em nome próprio, em razão do caráter solitário e avulso do trabalho
desempenhado.
Assim, o diarista só poderá aproveitar o início de prova material produzida em nome de outrem,
mesmo que de algum familiar, se devidamente amparado pelas demais provas dos autos.
Ocorre que, se de um lado a jurisprudência alarga o conceito de início de prova material, por
outro lado, o início de prova material, por si só, não serve para comprovar o trabalho rural, sendo
indispensável a existência de prova testemunhal convincente.
Nesse sentido:
(...)
2. "A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação
administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada
em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na
ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento." (artigo
55, parágrafo 3º, da Lei 8.213/91).
3. O início de prova material, de acordo com a interpretação sistemática da lei, é aquele feito
mediante documentos que comprovem o exercício da atividade nos períodos a serem contados,
devendo ser contemporâneos dos fatos a comprovar, indicando, ainda, o período e a função
exercida pelo trabalhador.
4. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que para fins de concessão do benefício de
aposentadoria por idade, o início de prova material deverá ser corroborado por idônea e robusta
prova testemunhal.
5. Em havendo o acórdão recorrido afirmado que, a par de não bastante à demonstração do
tempo de serviço a prova documental, a testemunhal era insuficiente à comprovação da atividade
rural desempenhada pelo segurado, a preservação da improcedência do pedido de aposentadoria
por idade é medida que se impõe.
6. Ademais, a 3ª Seção desta Corte tem firme entendimento no sentido de que a simples
declaração prestada em favor do segurado, sem guardar contemporaneidade com o fato
declarado, carece da condição de prova material, exteriorizando, apenas, simples testemunho
escrito que, legalmente, não se mostra apto a comprovar a atividade laborativa para fins
previdenciários (EREsp 205.885/SP, Relator Ministro Vicente Leal, in DJ 30/10/2000).
7. Recurso não conhecido.
(STJ, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, REsp 434015/CE, DJ 17.03.2003).
Em recurso repetitivo (Resp 1352791-SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgamento em
27/11/2013), o STJ firmou posicionamento de que os períodos em que o rurícola trabalhou com
registro em CTPS na atividade rural devem ser computados para efeito de carência, mesmo em
outras modalidades de aposentadoria. Isto porque o responsável pelo recolhimento para o
Funrural era o empregador, não o empregado.
No mesmo sentido, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, em 19
de agosto de 2015, firmou a tese de que o INSS deve computar, para efeito de carência, o
período trabalhado como empregado rural, registrado por empresas agroindustriais ou
comerciais, em aposentadoria por tempo de serviço rural (Processo nº 0516170-
28.2009.4.05.8300).
Com relação ao reconhecimento do trabalho rural, já decidi em outras ocasiões que o ano do
documento mais remoto, onde conste a qualificação de lavrador, era o termo inicial dessa
atividade, ainda que a prova testemunhal se reportasse a período anterior. Contudo, com o
julgamento do REsp n. 1.348.633/SP, representativo de controvérsia, de relatoria do Ministro
Arnaldo Esteves Lima, a jurisprudência do STJ admitiu o reconhecimento de tempo de serviço
rural em período anterior ao documento mais antigo, desde que corroborado por convincente
prova testemunhal.
Ao caso dos autos.
Para comprovar a condição de rurícola, a parte autora apresentou os seguintes documentos:
- cópias de sua CTPS com um vínculo rural, no período de 3/4/2017 a 26/7/2018 e
- cópia de sua certidão de casamento – celebrado em 22/12/1984 -, na qual o marido foi
qualificado como lavrador.
A jurisprudência consolidou-se no sentido de que "para a concessão de aposentadoria rural por
idade, não se exige que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à
carência do benefício" (Súmula nº 14 TNU) e ainda que o rol de documentos previsto no art. 106,
parágrafo único, da Lei nº 8.213/91 é meramente exemplificativo.
Quanto à contemporaneidade dos documentos, a prova material indiciária precisa ter sido
formada em qualquer instante do período de atividade rural que se pretende comprovar. Dentro
do intervalo que se pretende comprovar, o documento pode ter sido formado no início, no meio ou
no fim do período. A prova material pode ser contemporânea ao início do período de carência e
ter sua eficácia probatória estendida prospectivamente (para o futuro) se conjugada com prova
testemunhal complementar convincente e harmônica. Igualmente, pode ser contemporânea ao
final do período de carência e ter sua eficácia estendida retroativamente (para o passado) se
conjugada com prova testemunhal complementar convincente e harmônica. A jurisprudência da
TNU está pacificada no sentido de admitir a eficácia retrospectiva e prospectiva dos documentos
indiciários do exercício de atividade rural.
A consulta ao CNIS confirma a existência do vínculo anotado em CTPS, além de outro de curta
duração, também de natureza rural no período de 1 a 8/3/2011.
As testemunhas ouvidas em juízo, em agosto de 2018, confirmaram a condição de rurícola da
autora.
A testemunha Osvaldo Galharde contou que “conhece a autora há uns 20 anos. Na época ele
trabalhava como boia-fria, para diversas pessoas, dentre elas, trabalhou para Joaquim, Ângelo
Sérgio, Moreira, etc. A autora trabalha dessa maneira desde que a conheceu até o ano passado,
continuamente. O marido da autora também é lavrador. Atualmente ela está trabalhando para os
Trevizan, como doméstica. Já presenciou o trabalho da autora, pois possui um sitio. Também já
viu a autora saindo para o trabalho”.
Já a testemunha Maria José Trevisan da Silva afirmou que “conhece a autora há 25 anos. Ela
sempre trabalhou na roça. Sabe que ela já trabalhou para Joaquim Troina e Osmar Trevisan, nas
culturas de batata, milho, café, etc., continuamente. A autora trabalhou dessa forma até dias
atrás. O marido da autora também é lavrador. A autora nunca trabalhou na cidade. O ultimo
trabalho da autora foi para o irmão da depoente, José Carlos Trevisan, "mexendo na lavoura".
Portanto, a prova testemunhal confirmou o trabalho da autora na atividade rural, inclusive quando
completou 55 anos de idade, nos termos do REsp 1.354.908/SP.
Desse modo, restaram comprovados os requisitos necessários previstos na legislação
previdenciária para obtenção da aposentadoria por idade pretendida, devendo ser mantida a
sentença.
Com essas considerações, pedindo vênia ao senhor Relator, nego provimento à apelação do
INSS.
É como voto.
APELAÇÃO (198) Nº 5061647-32.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: MARIA APARECIDA MAURILIO DE MORAIS
Advogado do(a) APELADO: DENNER PERUZZETTO VENTURA - SP322359-N
V O T O
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: O recurso preenche os pressupostos de
admissibilidade e merece ser conhecido.
Discute-se nos autos o direito da parte autora a benefício de aposentadoria por idade rural.
A aposentadoria por idade, rural e urbana, é garantida pela Constituição Federal em seu artigo
201, § 7º, inciso II, para os segurados do regime geral de previdência social (RGPS), nos termos
da lei e desde que obedecidas as seguintes condições:
"II - sessenta e cinco anos de idade, se homem, e sessenta anos de idade, se mulher, reduzido
em cinco anos o limite para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que exerçam
suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e
o pescador artesanal;"
Discute-se o atendimento das exigências à concessão de aposentadoria por idade ao rurícola, a
saber: a comprovação da idade mínima e o desenvolvimento de atividade rural no período
imediatamente anterior ao requerimento, consoante o disposto na Lei n. 8.213/91.
A questão relativa à comprovação de atividade rural se encontra pacificada no Superior Tribunal
de Justiça, que exige início de prova material e afasta por completo a prova exclusivamente
testemunhal (Súmula 149 do STJ).
De acordo com o que restou definido quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado
segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), aplica-se a
súmula acima aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a
apresentação de início de prova material, corroborada com provas testemunhal, para
comprovação de tempo de serviço.
Ressalta-se que o início de prova material, exigido pelo § 3º do artigo 55 da Lei 8.213/91, não
significa que o segurado deverá demonstrar mês a mês, ano a ano, por meio de documentos, o
exercício de atividade na condição de rurícola, pois isto importaria em se exigir que todo o
período de trabalho fosse comprovado documentalmente, sendo de nenhuma utilidade a prova
testemunhal para demonstração do labor rural.
Contudo, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar, na forma
da súmula nº 34 da TNU.
Admite-se, ainda, a extensão da qualificação de lavrador de um cônjuge ao outro. Para além,
segundo a súmula nº 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: "Admite-se como início de
prova material do efetivo exercício de trabalho rural, em regime de economia familiar, documentos
de terceiros, membros do grupo parental".
No mais, segundo o RESP 1.354.908, realizado segundo a sistemática de recurso representativo
da controvérsia (CPC, art. 543-C), necessária a comprovação do tempo de atividade rural no
período imediatamente anterior à aquisição da idade:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE
RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE
TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER
PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Tese
delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º
combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que
estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural,
momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo
48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter
atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo
descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito.
Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os
requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício. 2. Recurso especial do INSS
conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código
de Processo Civil (RECURSO ESPECIAL Nº 1.354.908 - SP (2012/0247219-3), RELATOR:
MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES, DJ 09/09/2015)."
Em relação às contribuições previdenciárias, é assente o entendimento de serem desnecessárias,
sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural (STJ, REsp
207.425, 5ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de 25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge
Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5ª Turma, j. em 14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361,
Rel. Ministra Laurita Vaz).
Noutro passo, com relação ao art. 143 da Lei 8.213/91, a regra transitória assegurou aos rurícolas
o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze)
anos, contados da vigência da referida Lei, nos seguintes termos:
"Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do artigo 11 desta
Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de 1 (um) salário mínimo, durante 15
(quinze) anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício
de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do
benefício, em número de meses idênticos à carência do referido benefício (Redação determinada
pela Lei 9.063/1995)."
Assim, o prazo de 15 (quinze) anos do artigo 143 da Lei 8.213/91 expiraria em 25/07/2006.
Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como
segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a
uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 02
(dois) anos, estendendo-se até 25/07/2008, em face do disposto na MP 312/06, convertida na Lei
11.368/06.
Posteriormente, a Medida Provisória nº 410/07, convertida na Lei 11.718/08, estabeleceu nova
prorrogação para o prazo previsto no artigo 143 da Lei 8.213/91, nos seguintes termos:
"Art. 2º Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 143 da Lei nº 8.213, de 24 de
julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo ao trabalhador rural enquadrado na
categoria de segurado contribuinte individual que presta serviços de natureza rural, em caráter
eventual, a 1 (uma) ou mais empresas, sem relação de emprego.
Art. 3o Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural, em valor equivalente ao
salário mínimo, serão contados para efeito de carência: I - até 31 de dezembro de 2010, a
atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991; II - de janeiro
de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 3 (três),
limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e III - de janeiro de 2016 a dezembro
de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a 12 (doze)
meses dentro do respectivo ano civil.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo e respectivo inciso I ao trabalhador
rural enquadrado na categoria de segurado contribuinte individual que comprovar a prestação de
serviço de natureza rural, em caráter eventual, a 1 (uma) ou mais empresas, sem relação de
emprego."
Observe-se que, nos termos do artigo 2º da Lei nº 11.718/08, o prazo estabelecido no referido
artigo 143 da LBPS passou a vigorar até 31/12/2010. Bizarramente, com flagrante antinomia com
o artigo 2º, o artigo 3º da Lei nº 11.718/08 acaba por indiretamente estender o prazo até
31/12/2020, além de criar tempo de serviço ficto.
Abstração feita da hipotética ofensa à Constituição Federal, por falta de relevância e urgência da
medida provisória, e por possível ofensa ao princípio hospedado no artigo 194, § único, II, do
Texto Magno, o fato é que a Lei nº 11.718/08 não contemplou o trabalhador rural que se
enquadra na categoria de segurado especial.
No caso do segurado especial, definido no artigo 11, inciso VII, da Lei 8.213/91, remanesce o
disposto no artigo 39 desta última lei. Diferentemente dos demais trabalhadores rurais, trata-se de
segurado que mantém vínculo com a previdência social mediante contribuição descontada em
percentual incidente sobre a receita oriunda da venda de seus produtos, na forma do artigo 25,
caput e incisos, da Lei nº 8.212/91. Vale dizer: após 25/07/2006, a pretensão do segurado
especial ao recebimento de aposentadoria por idade deverá ser analisada conforme o disposto no
artigo 39, inciso I, da Lei 8.213/91.
Ademais, não obstante o "pseudo-exaurimento" da regra transitória insculpida no artigo 143 da
Lei n. 8.213/91, para os empregados rurais e contribuintes individuais eventuais, fato é que a
regra permanente do artigo 48 dessa norma continua a exigir, para concessão de aposentadoria
por idade a rurícolas, a comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que de forma
descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao
número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido", consoante
§ 1º e § 2º do referido dispositivo.
A questão já foi apreciada, por ora sem muita profundidade, por nossos tribunais, conforme se
infere dos seguintes julgados:
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR
RURAL. PRAZO PREVISTO NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/91. PRORROGAÇÃO. EXTINÇÃO
DO PROCESSO ANTES DA PRODUÇÃO DA PROVA TESTEMUNHAL. CERCEAMENTO DO
DIREITO DE DEFESA. 1. O prazo de 15 anos previsto no artigo 143 da Lei 8.213/91 para o
requerimento de aposentadoria rural por idade de trabalhador rural, que venceria a 24 de julho de
2006, foi prorrogado pela Lei 11.368 de 09 de novembro de 2006, por mais 2 anos e,
posteriormente, ganhou nova prorrogação pela Medida Provisória 410 de 28 de dezembro de
2007, convertida na Lei nº 11.718, de 20 de junho de 2008, que estabeleceu que o referido prazo
deve extinguir-se a 31 de dezembro de 2010. 2. "As alterações na Lei Previdenciária não podem
retroagir para alcançar fatos anteriores a ela, em face do princípio do tempus regit actum". (STJ -
AgRg no AgRg no REsp 543261/SP, Sexta Turma, DJ de 13.06.2005). 3. A sentença que
extingue o processo ajuizado a 19.09.2007, por segurada nascida a 13.12.1929, pretextando a
extinção do prazo de 15 anos previsto no artigo 143 para requerimento do benefício, antes da
produção de prova testemunhal necessária à apreciação final do pedido, incorre em cerceamento
do direito de defesa da pretensão deduzida, pois que a autora fica impedida de cumprir com a
exigência do artigo 55, § 3º, da Lei 8.213/91 (Precedentes. TRF-1 - Segunda Turma - AC
2007.01.99.015403-8/MG, DJ de 24.11.2008). 4. Sentença anulada, determinando-se o retorno
dos autos à origem para o seu normal prosseguimento. 5. Recurso de apelação provido." (TRF -
1ª Região, AC 200801990042175, 2ª Turma, j. em 10/12/2008, v.u., DJ de 19/02/2009, página 76,
Rel. Juiz Fed. Conv. Iran Velasco Nascimento).
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL. INDEFERIMENTO DA INICIAL. PRAZO PARA
REQUERIMENTO. ART. 143 DA LEI Nº 8.213/91. MP 312/06, CONVERTIDA NA LEI Nº
11.368/06 E MP 410/2007. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL
DEVE SER VIABILIZADA. SENTENÇA ANULADA. 1. Tratando-se de segurado especial
enquadrado no art. 11, VII, da Lei 8.213/91, após o decurso do prazo fixado pelo regramento
afeto à matéria, a pretensão deve ser analisada à luz do art. 39, I, do citado diploma legal, para
fins de aposentadoria rural por idade. 2. O prazo consignado no art. 143 da lei previdenciária foi
estendido até 26 de julho de 2008, em face da edição da MP nº. 312/06, convertida na Lei nº.
11.368/06. E, em face da MP nº 410/2007, esse prazo foi prorrogado até 31 de dezembro de
2010. 3. A certidão de casamento presente nos autos evidencia a condição de trabalhador rural e
constitui início razoável de prova material da atividade rurícola da parte autora, podendo,
inclusive, ser estendida ao cônjuge. 4. A prova testemunhal é indispensável nos casos de
aposentadoria rural por idade com início de prova material, e deve ser viabilizada pelo Juízo "a
quo". 5. Impossibilidade da análise do mérito, nos termos do § 3º do art. 515 do Código de
Processo Civil, ante a ausência de prova testemunhal. 6. Apelação provida. Sentença anulada,
para determinar o retorno dos autos ao Juízo de origem com regular processamento e julgamento
do feito." (TRF - 1ª Região, AC 200801990185280, 2ª Turma, j. em 02/07/2008, v.u., DJ de
28/08/2008, Rel. Juiz Fed. Conv. André Prado de Vasconcelos).
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. PRAZO PARA REQUERIMENTO.
1. O artigo 143 da Lei 8.213/91, tratando genericamente do trabalhador rural, que passou a ser
enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social ( na forma da
alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do Art. 11), assegurou-lhe o direito de requerer
aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir
da data de sua vigência, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que
descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de
meses idêntico à carência exigida. 2. Tratando-se de segurado especial enquadrado no artigo 11,
VII, da Lei n°. 8.213/91, após aquele ínterim, a pretensão deve ser analisada à luz do artigo 39, I,
para fins de aposentadoria rural por idade. 3. Conforme MP n° 312/06, convertida na Lei n°
11.368/06, o prazo referido no artigo 143 da Lei n° 8.213/91 foi prorrogado até 2008. 4. Sentença
reformada." (TRF - 4ª Região, AC 200770990037250, Turma Suplementar, j. em 25/04/2007, v.u.,
DE de 11/05/2007, Rel. Des. Fed. Ricardo Teixeira do Valle Pereira).
No caso em discussão, o requisito etário restou preenchido em 19/2/2017, quando a autora
completou 55 (cinquenta e cinco) anos de idade.
A parte autora alega que trabalhara na lide rural desde tenra idade, como boia-fria, tendo
cumprido a carência exigida na Lei nº 8.213/91.
Para tanto, a autora juntou apenas cópia de sua CTPS com apenas um único vínculo
empregatício rural, no interstício de 3/4/2017 a 26/7/2018 (vide CNIS), e de sua certidão de
casamento – celebrado em 22/12/1984 -, na qual o cônjuge Carmo Cesar de Morais foi
qualificado como lavrador. Nada mais.
É inegável que há um lapso considerável de anos, desprovido de qualquer sustentáculo material,
não logrando a autora a carrear indícios razoáveis e contemporâneos de prova material capazes
de demonstrar a faina agrária aventada como boia-fria.
O pequeno vínculo empregatício da autora para “Romualdo Oliveira da Silva e Outros”, entre
1º/3/2011 e 8/3/2011, não altera tal constatação, pois ausente qualquer prova no sentido de esse
vínculo fosse rural.
Frise-se que a autora apresentou apenas a pág. 12 de sua CTPS, na qual foi anotado o trabalho
rural a partir de abril de 2017.
Da mesma forma que se louva a flexibilização hermenêutica, que decorreu da atenção prestadas
às dificuldades da vida no campo, é razoável que a mesma não deve ser estendida ao ponto de
se admitir início de prova, em nome próprio, extremamente precário e recente para demonstrar o
trabalho rural entre 2003 e 2017.
No mais, diferentemente de tempos pretéritos, não é razoável que a parte autora não possua
alguma anotação de vínculo empregatício em sua CTPS, em relação a períodos anteriores ao
ano de 2017, já que alega que trabalhou em diversas propriedades localizadas no município de
Divinolândia, Estado de São Paulo.
Outrossim, os testemunhos colhidos em audiência foram insuficientes para comprovar todo o
mourejo asseverado, principalmente no que tange o período imediatamente anterior ao
implemento do requisito etário. Mesmo que fosse possível considerar os documentos juntados
pela autora para os fins a que se almeja, as testemunhas arroladas apenas trouxeram relatos
inconsistentes e superficiais acerca da suposta rotina rural vivenciada por ela, não sendo seus
relatos dotados da robustez necessária para respaldar o reconhecimento da atividade rural em
período juridicamente relevante (art. 48, § 2º, da LBPS e entendimento do Resp 1.354.908).
Eis os depoimentos à luz da r. sentença:
“A testemunha Osvaldo Galharde contou que conhece a autora há uns 20 anos. Na época ele
trabalhava como boia-fria, para diversas pessoas, dentre elas, trabalhou para Joaquim, Ângelo
Sérgio, Moreira, etc. A autora trabalha dessa maneira desde que a conheceu até o ano passado,
continuamente. O marido da autora também é lavrador. Atualmente ela está trabalhando para os
Trevizan, como doméstica. Já presenciou o trabalho da autora, pois possui um sitio. Também já
viu a autora saindo para o trabalho.
Já a testemunha Maria José Trevisan da Silva afirmou que conhece a autora há 25 anos. Ela
sempre trabalhou na roça. Sabe que ela já trabalhou para Joaquim Troina e Osmar Trevisan, nas
culturas de batata, milho, café, etc., continuamente. A autora trabalhou dessa forma até dias
atrás. O marido da autora também é lavrador. A autora nunca trabalhou na cidade. O ultimo
trabalho da autora foi para o irmão da depoente, José Carlos Trevisan, "mexendo na lavoura".”
Enfim, tenho que a parte autora não fez prova suficiente dos fatos de seu interesse e constitutivos
de seu direito, não se desincumbindo satisfatoriamente do ônus probatório que lhe competia,
merecendo o decreto de improcedência.
Em decorrência, concluo pelo não preenchimento dos requisitos exigidos à concessão do
benefício pretendido.
Em decorrência, concluo pelo não preenchimento dos requisitos exigidos à concessão do
benefício pretendido.
Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de
advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados
em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do Novo CPC.
Porém, fica suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser
beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto, conheço da apelação autárquica e lhe dou provimento, para julgar
improcedente o pedido.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. PRESENÇA DE INÍCIO DE
PROVA MATERIAL. PROVA DO MARIDO EXTENSÍVEL À ESPOSA. PROVA TESTEMUNHAL
HARMÔNICA. REQUISITOS PREENCHIDOS. TERMO INICIAL MANTIDO NA DATA DE
ENTREGA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO.
- A obtenção da aposentadoria por idade de trabalhador rural está condicionada ao implemento
de idade mínima de 60 anos, para os homens, e de 55 anos, para mulheres. Também se exige
comprovação de exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período anterior
ao requerimento do benefício, ficando afastada a obrigatoriedade de contribuições.
- Juntada de Certidão de Casamento da autora, em que seu cônjuge encontra-se qualificado
como lavrador. Entendo extensíveis à mulher, a partir da celebração do matrimônio ou do limiar
da união estável, os documentos em que os cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados
como lavradores. Precedentes do STJ.
- Juntada de CTPS em nome próprio com anotações de vínculos empregatícios rurais.
- A prova testemunhal produzida favorece o pleito autoral, sendo coesa e harmônica no que tange
à prestação do trabalho rural, pelo interregno necessário à concessão do benefício requerido.
- Termo inicial do benefício mantido na data de entrega do requerimento administrativo.
Precedentes dessa Turma.
- Apelação do INSS desprovida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por maioria,
decidiu negar provimento ao apelo do INSS, nos termos do voto da Juíza Federal Convocada
Vanessa Mello, que foi acompanhada pela Desembargadora Federal Marisa Santos e pelo
Desembargador Federal Gilberto Jordan (que votou nos termos do art. 942 caput e § 1º do CPC).
Vencido o Relator que lhe dava provimento. Julgamento nos termos do disposto no artigo 942
caput e § 1º do CPC. Lavrará acórdão a Juíza Federal Convocada Vanessa Mello
, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
