Processo
ApReeNec - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO / MS
5001472-72.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
04/12/2018
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 07/12/2018
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REMESSA OFICIAL NÃO
CONHECIDA. REQUISITOS NÃO ATINGIDOS. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA.
1. Observo ser inaplicável a disposição sobre o reexame necessário ao caso em tela, vez que o
disposto no parágrafo 3º do artigo 496 do CPC atual dispensa do reexame necessário o caso em
questão, por se tratar de direito controvertido inferior ao limite previsto no citado dispositivo legal.
2. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
3. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
4. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
benefício conferido, em razão de sua atividade.
5. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
6. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
7. No entanto, observo que, caso o labor campesino tenha se dado em regime de economia
familiar, cuja atividade não foi contemplada pela alteração da lei acima referida, o trabalho rural
poderá ser reconhecido sem a observação da alteração legal constante da Lei de Benefícios.
Essa é a hipótese trazida pela exordial.
8. Cumpre salientar, por derradeiro, que o referido regime pressupõe a exploração de atividade
primária pelo indivíduo, como principal forma de sustento, acompanhado ou não pelo grupo
familiar, mas sem o auxílio de empregados (art. 11, VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91). Assim, nos
termos do art. 11, VII, da Lei 8.213/91, consideram-se segurados especiais, em regime de
economia familiar, os produtores, parceiros, meeiros, arrendatários rurais, pescadores artesanais
e assemelhados, que exerçam atividades individualmente ou com auxílio eventual de terceiros,
bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde
que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo, residindo na área rural ou em
imóvel próximo ao local onde a atividade rural é exercida e com participação significativa nas
atividades rurais do grupo familiar.
9. Delineado o conjunto probatório, e independentemente da prova testemunhal produzida,
entendo que não restou configurada a tese ventilada na exordial. Extrai-se dos autos que a
autora, na realidade, nunca exerceu a atividade campesina, e em especial em regime de
economia familiar. Na primeira fazenda onde morou com seu esposo (Fazenda Marieta), ambos
foram registrados em CTPS, e ela não exercia atividade rural, e sim a atividade doméstica. Nas
duas últimas fazendas onde residiram, somente seu esposo foi empregado rural regularmente
registrado em CTPS, exercendo a atividade campesina remunerada. A autora era dona de casa
e, nos quintais colocados à sua disposição nas respectivas fazendas, fazia pequenas hortas e
criações de animais para consumo. Nada mais. O leite in natura que seu marido recebe se trata
de complementação de seu salário, e começou a ser transacionado pela autora de forma
aparentemente fraudulenta, pois ela firmou contrato de comodato fictício com terceira pessoa com
o intuito de obter benefício previdenciário indevido, conforme se observa de sua confissão no
documento ID 1786221 – pág. 46. O depoimento pessoal dela, em juízo, também confirma
parcialmente essa versão, pois na oportunidade ela disse ter colocado o leite que seu marido
recebe como complementação de salário em “nome próprio” para comercialização. Além disso,
frise-se que certidão recente do Cartório Eleitoral, emitida em 2014, aponta a autora como dona
de casa, e não como trabalhadora rural, situação essa declarada por ela própria na ocasião;
declaração particular firmada pelos supostos representante da empresa DICA DEODÁPOLIS
INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE ALIMENTOS LTDA também aponta inconsistência relevante, ao
indicar que a autora seria fornecedora de leite desde 01/2004, situação essa que não encontra
respaldo tanto na CTPS de seu marido, como na Declaração de exercício de atividade rural
expedida pelo Sindicato dos Trabalhadores na Agricultura Familiar de Rio Brilhante e Região, pois
tais documentos afirmariam que somente após maio de 2004 o esposo da autora teria começado
a trabalhar na região.
10. Dessa forma, não configurado o alegado trabalho rural da autora, constata-se a
impossibilidade de concessão da benesse vindicada. A reforma integral da r. sentença, nesse
contexto, é medida que se impõe. (...) Por fim, considerando o observado no presente feito,
determino a extração de cópia integral do processado e encaminhamento ao Ministério Público
Federal, para as providências que entender cabíveis.
11. Remessa oficial não conhecida. Apelação do INSS provida.
Acórdao
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 5001472-72.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: LEONICE DEODATO DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: ATILA DUARTE ENZ - MS17497-A
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 5001472-72.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: LEONICE DEODATO DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: ATILA DUARTE ENZ - MS17497-A
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra a r. sentença de primeiro grau que acolheu o
pedido inicial, extinguindo o feito com resolução de mérito, com base no art. 487, inc. I, do Código
de Processo Civil, para o fim de condenar o INSS à concessão do benefício de aposentadoria
rural por idade em favor da requerente, a contar da data do requerimento administrativo
(13.03.2014), no valor de 1(um) salário mínimo mensal. Condenou, ainda, a Autarquia
Previdenciária, ao pagamento das custas processuais (art. 24, §1º, da Lei Estadual 3.779/09) e
honorários advocatícios, esses fixados em 10% do valor da condenação, nos termos do art. 85,
§3º, I, do CPC, já considerado o teor da Súmula 111 do STJ.
Sentença submetida ao reexame necessário.
Sustenta o apelante, em apertada síntese, pelo não preenchimento dos requisitos exigidos para a
concessão do benefício pleiteado, aduzindo, entre outros fatores, a ausência de comprovação de
segurada especial e a insuficiência do início de prova material apresentado. Subsidiariamente,
requer a alteração da DIB, alteração dos consectários legais fixados e isenção das custas
processuais.
Apresentadas as contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o sucinto relatório.
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 5001472-72.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: LEONICE DEODATO DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: ATILA DUARTE ENZ - MS17497-A
V O T O
De início, observo ser inaplicável a disposição sobre o reexame necessário ao caso em tela, vez
que o disposto no parágrafo 3º do artigo 496 do CPC atual dispensa do reexame necessário o
caso em questão, por se tratar de direito controvertido inferior ao limite previsto no citado
dispositivo legal, conforme se verifica abaixo, in verbis:
"Art. 496. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de
confirmada pelo tribunal, a sentença:
I - proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas
autarquias e fundações de direito público;
II - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal.
§ 1o Nos casos previstos neste artigo, não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará a
remessa dos autos ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal avocá-los-á.
§ 2o Em qualquer dos casos referidos no § 1o, o tribunal julgará a remessa necessária.
§ 3o Não se aplica o disposto neste artigo quando a condenação ou o proveito econômico obtido
na causa for de valor certo e líquido inferior a:
I - 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito
público;
II - 500 (quinhentos) salários-mínimos para os Estados, o Distrito Federal, as respectivas
autarquias e fundações de direito público e os Municípios que constituam capitais dos Estados;
III - 100 (cem) salários-mínimos para todos os demais Municípios e respectivas autarquias e
fundações de direito público." (g.n.)
Por conseguinte, considerando os valores atrasados a que a parte autora eventualmente fará jus,
caso mantida a r. sentença, conclui-se que o valor da condenação, obviamente, não ultrapassará
1000 (mil) salários-mínimos, o que permite a aplicação da regra constante do dispositivo legal
supracitado. Desse modo, não conheço da remessa oficial.
Passo, agora, à análise do mérito recursal.
A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos,
se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de atividade
rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal. Ademais, para a concessão de benefícios rurais, houve um
abrandamento no rigorismo da lei quanto à comprovação da condição de rurícola dos
trabalhadores do campo, permitindo-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até
mesmo dos pais aos filhos, ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os
cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da
atividade campesina não tenha se dado sob o regime de economia familiar.
Cumpre ressaltar que, em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social,
não se pode exigir dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições
previdenciárias, quando é de notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são
desenvolvidas, cumprindo aqui dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma
subordinação, haja vista que a contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos
chamados "gatos". Semelhante exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores
qualquer possibilidade de auferir o benefício conferido, em razão de sua atividade.
O art. 143 da Lei n.º 8.213/1991, com a redação dada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, dispõe
que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Quanto a se provar o efetivo exercício de atividade rural, o Superior Tribunal de Justiça considera
prescindível a abrangência de todo o período de carência previsto no art. 142 da Lei de
Benefícios pela prova material, desde que a prova testemunhal demonstre sua solidez, permitindo
sua vinculação ao tempo de carência. Tal solução, conhecida como "pro misero", se dá em
virtude da precariedade dos registros de vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda
comum em tempos recentes e bastante disseminada em outras épocas.
Saliento, ainda, que segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp
1354908, em sede de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo
no momento em que completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade,
a fim de atender ao segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o
segurado especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 1957, comprovou o cumprimento do requisito
etário no ano de 2012. Assim, considerando que o implemento do requisito em questão se deu
quando já havia encerrado a prorrogação prevista no art. 143, da Lei de Benefícios, é necessário,
após 31/12/2010, a comprovação do recolhimento de contribuições para os empregados rurais,
trabalhadores avulsos e diaristas e o cumprimento da carência de 180 meses, a teor do que
dispõe o art. 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91, existindo a necessidade de comprovação de
recolhimentos de contribuições previdenciárias a fim de ser concedido o benefício.
No entanto, observo que, caso o labor campesino tenha se dado em regime de economia familiar,
cuja atividade não foi contemplada pela alteração da lei acima referida, o trabalho rural poderá ser
reconhecido sem a observação da alteração legal constante da Lei de Benefícios. Essa é a
hipótese trazida pela exordial.
Cumpre salientar, por derradeiro, que o referido regime pressupõe a exploração de atividade
primária pelo indivíduo, como principal forma de sustento, acompanhado ou não pelo grupo
familiar, mas sem o auxílio de empregados (art. 11, VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91). Assim, nos
termos do art. 11, VII, da Lei 8.213/91, consideram-se segurados especiais, em regime de
economia familiar, os produtores, parceiros, meeiros, arrendatários rurais, pescadores artesanais
e assemelhados, que exerçam atividades individualmente ou com auxílio eventual de terceiros,
bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde
que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo, residindo na área rural ou em
imóvel próximo ao local onde a atividade rural é exercida e com participação significativa nas
atividades rurais do grupo familiar.
No presente caso, a autora afirma na exordial, in litteris:
“(...)
A Parte Autora desenvolveu atividade rural, em regime de economia familiar tanto quanto foi
diarista, na Fazenda Alvorada localizada no município de Ponta Porã – MS e na Fazenda Vale do
Boi, localizada no município e comarca de Nova Alvorada do Sul - MS, permanecendo na
atividade rurícola no período de 1979 até o presente momento, sendo certo que, nesse período
fazia diárias nas Fazendas citadas, ajudando no plantio e na colheita de mandioca, amendoim,
arroz, bem como no exercia atividade em regime de economia familiar, para sustento seu e de
sua família, sendo assim, exerciam tais atividades:
• plantavam: mandioca, abóbora, plantio de árvores frutíferas (Laranja, limão, banana, manga,
poncã, maracujá, acerola, seringuela, jabuticaba e goiaba), maxixe, quiabo, melancia e pastagem
para gados;
• cultivavam: hortaliças, colorau e entre outros;
• criavam: porcos, galinhas, gados leiteiros • comercializavam: ovos caipiras, leite e
hortifrutigranjeiros;
Ainda assim, residiu de 1.984 à 1.988 no município de Jateí-MS, onde exercia a função de bóia-
fria e lavradora, sendo que posteriormente trabalhou registrada por um período inferior a um ano
em uma fazenda no município de Caraapó-MS. Depois disso retornou a residir na Zona Rural do
município de Jatéi-MS, conforme histórico escolar dos filhos da Parte Autora, permanecendo lá
até meados de 1.994.
(...)”
A fim de comprovar o suposto exercício de atividade rural, a autora apresentou:
- sua Certidão de Casamento, cujo enlace matrimonial ocorreu aos 11/05/1979, onde seu marido
fora qualificado como “lavrador”, embora a postulante estivesse qualificada como “doméstica”;
- Certidão do Cartório Eleitoral, emitida aos 04/08/2014, onde consta a autora qualificada como
“Dona de Casa”;
- CTPS da autora, onde consta apenas um vínculo laboral, exercido entre 01/03/1989 a
14/01/1990, contratada pelo proprietário da Fazenda “Marieta”, para o cargo de “Prendas
domésticas;
- CTPS do marido da autora, onde constam três vínculos laborais rurais, a seguir descritos:
Fazenda Marieta (de 01/03/1989 a 14/01/1990), Fazenda Alvorada (de 02/05/1992 a 12/01/2001)
e Fazenda Vale do Sol (de 01/05/2004 até os dias atuais);
- Entrevista rural feita pelo INSS, por ocasião do requerimento administrativo, onde a autora
alegou ter trabalhado na condição de lavradora na Fazenda Alvorada, em Ponta Porã/MS, entre
1992 a 2001 e na Fazenda Vale do Sol, em Nova Alvorado do Sul/MS, de 2004 até os dias atuais.
Naquela oportunidade, esclareceu que, na Fazenda Alvorada, moravam no local e a requerente
cuidava da casa, onde foi cedido um quintal para plantar frutas e hortaliças, além de criar alguns
animais; não trabalhou como diarista no local e sua função era cuidar da casa e produzir para
subsistência. A mesma situação se repetiu na Fazenda Vale do Sol. Afirmou, por fim, ter firmado
contrato de comodato com terceira pessoa, em 2007, pelo prazo de 10 anos, cuja finalidade seria
“tirar” as notas produtoras para obtenção de benefício previdenciário, alegando nunca ter
trabalhado no local;
- Comprovante de inscrição no cadastro da Agropecuária da Secretaria de Estado da Fazenda de
MS, onde consta que a autora seria criadora de bovinos para leite;
- Contrato de Comodato a título gratuito firmado pela autora, relativo a um imóvel rural, com área
a ela destinada de 10 hectares, supostamente firmado aos 20/02/2007, com prazo de 10 anos;
- Declaração particular de Maria Antonia de Souza, professora aposentada, afirmando que foi
professora da autora entre 1965 a 1968, em escola rural mista de Jateí;
- Declaração particular de DICA DEODÁPOLIS INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE ALIMENTOS
LTDA, afirmando que a autora teria comercializado leite in natura para aquele estabelecimento,
de 01/2004 até 10/2011 e que, em razão do fechamento da empresa, não possui mais as notas
fiscais de venda;
- Declaração de exercício de atividade rural expedida pelo Sindicato dos Trabalhadores na
Agricultura Familiar de Rio Brilhante e Região, não homologada pelo INSS, atestando a filiação
da autora no sindicato em 18/03/2014 e o trabalho da autora na Fazenda Alvorada (de
02/05/1992 a 12/01/2001) e na Fazenda Vale do Boi (de 01/05/2004 até os diais atuais);
- Notas fiscais de compra de leite supostamente produzido pela autora, para fins de
industrialização, dos anos de 2007, 2008, 2009, 2012, 2013 e 2014;
- Requerimentos de matrículas e históricos escolares de seus filhos.
Considerados tais documentos como aptos ao início razoável de prova material requerido pela
jurisprudência, destaco que, quanto à prova testemunhal, está pacificado no C. Superior Tribunal
de Justiça o entendimento de que apenas esta não basta para a comprovação da atividade rural,
requerendo a existência de início razoável de prova material, conforme entendimento cristalizado
na Súmula 149, que assim dispõe: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à
comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção do benefício previdenciário".
Em depoimento pessoal, observa-se que a autora afirma residir com seu marido na Fazenda Vale
do Boi e que ele trabalha com gado no local, na qualidade de empregado, há cerca de treze anos.
Esclareceu que ela não percebe qualquer tipo de remuneração e que seu marido recebe do
empregador, a título de complementação de salário, certa quantidade de leite in natura para
futura comercialização; cria no local alguns animais para consumo próprio.
Delineado o conjunto probatório, e independentemente da prova testemunhal produzida, entendo
que não restou configurada a tese ventilada na exordial.
Extrai-se dos autos que a autora, na realidade, nunca exerceu a atividade campesina, e em
especial em regime de economia familiar. Na primeira fazenda onde morou com seu esposo
(Fazenda Marieta), ambos foram registrados em CTPS, e ela não exercia atividade rural, e sim a
atividade doméstica. Nas duas últimas fazendas onde residiram, somente seu esposo foi
empregado rural regularmente registrado em CTPS, exercendo a atividade campesina
remunerada. A autora era dona de casa e, nos quintais colocados à sua disposição nas
respectivas fazendas, fazia pequenas hortas e criações de animais para consumo. Nada mais.
O leite in natura que seu marido recebe se trata de complementação de seu salário, e começou a
ser transacionado pela autora de forma aparentemente fraudulenta, pois ela firmou contrato de
comodato fictício com terceira pessoa com o intuito de obter benefício previdenciário indevido,
conforme se observa de sua confissão no documento ID 1786221 – pág. 46. O depoimento
pessoal dela, em juízo, também confirma parcialmente essa versão, pois ela disse ter colocado o
leite que seu marido recebe como complementação de salário em “nome próprio” para
comercialização.
Além disso, frise-se que certidão recente do Cartório Eleitoral, emitida em 2014, aponta a autora
como dona de casa, e não como trabalhadora rural, situação essa declarada por ela própria na
ocasião; declaração particular firmada pelos supostos representante da empresa DICA
DEODÁPOLIS INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE ALIMENTOS LTDA também aponta inconsistência
relevante, ao indicar que a autora seria fornecedora de leite desde 01/2004, situação essa que
não encontra respaldo tanto na CTPS de seu marido, como na Declaração de exercício de
atividade rural expedida pelo Sindicato dos Trabalhadores na Agricultura Familiar de Rio Brilhante
e Região, pois tais documentos afirmariam que somente após maio de 2004 o esposo da autora
teria começado a trabalhar na região.
Dessa forma, não configurado o alegado trabalho rural da autora, constata-se a impossibilidade
de concessão da benesse vindicada. A reforma integral da r. sentença, nesse contexto, é medida
que se impõe.
Condeno a parte autora ao pagamento de custas e despesas processuais, além de honorários
fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), cuja exigibilidade observará o disposto no artigo 12 da Lei nº
1.060/1950 (artigo 98, § 3º, do Código de Processo Civil/2015), por ser beneficiária da justiça
gratuita.
Por fim, considerando o observado no presente feito, determino a extração de cópia integral do
processado e encaminhamento ao Ministério Público Federal, para as providências que entender
cabíveis.
Por esses fundamentos, não conheço da remessa oficial e dou provimento à apelação do INSS,
nos termos ora consignados.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REMESSA OFICIAL NÃO
CONHECIDA. REQUISITOS NÃO ATINGIDOS. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA.
1. Observo ser inaplicável a disposição sobre o reexame necessário ao caso em tela, vez que o
disposto no parágrafo 3º do artigo 496 do CPC atual dispensa do reexame necessário o caso em
questão, por se tratar de direito controvertido inferior ao limite previsto no citado dispositivo legal.
2. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
3. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
4. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
5. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
6. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
7. No entanto, observo que, caso o labor campesino tenha se dado em regime de economia
familiar, cuja atividade não foi contemplada pela alteração da lei acima referida, o trabalho rural
poderá ser reconhecido sem a observação da alteração legal constante da Lei de Benefícios.
Essa é a hipótese trazida pela exordial.
8. Cumpre salientar, por derradeiro, que o referido regime pressupõe a exploração de atividade
primária pelo indivíduo, como principal forma de sustento, acompanhado ou não pelo grupo
familiar, mas sem o auxílio de empregados (art. 11, VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91). Assim, nos
termos do art. 11, VII, da Lei 8.213/91, consideram-se segurados especiais, em regime de
economia familiar, os produtores, parceiros, meeiros, arrendatários rurais, pescadores artesanais
e assemelhados, que exerçam atividades individualmente ou com auxílio eventual de terceiros,
bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde
que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo, residindo na área rural ou em
imóvel próximo ao local onde a atividade rural é exercida e com participação significativa nas
atividades rurais do grupo familiar.
9. Delineado o conjunto probatório, e independentemente da prova testemunhal produzida,
entendo que não restou configurada a tese ventilada na exordial. Extrai-se dos autos que a
autora, na realidade, nunca exerceu a atividade campesina, e em especial em regime de
economia familiar. Na primeira fazenda onde morou com seu esposo (Fazenda Marieta), ambos
foram registrados em CTPS, e ela não exercia atividade rural, e sim a atividade doméstica. Nas
duas últimas fazendas onde residiram, somente seu esposo foi empregado rural regularmente
registrado em CTPS, exercendo a atividade campesina remunerada. A autora era dona de casa
e, nos quintais colocados à sua disposição nas respectivas fazendas, fazia pequenas hortas e
criações de animais para consumo. Nada mais. O leite in natura que seu marido recebe se trata
de complementação de seu salário, e começou a ser transacionado pela autora de forma
aparentemente fraudulenta, pois ela firmou contrato de comodato fictício com terceira pessoa com
o intuito de obter benefício previdenciário indevido, conforme se observa de sua confissão no
documento ID 1786221 – pág. 46. O depoimento pessoal dela, em juízo, também confirma
parcialmente essa versão, pois na oportunidade ela disse ter colocado o leite que seu marido
recebe como complementação de salário em “nome próprio” para comercialização. Além disso,
frise-se que certidão recente do Cartório Eleitoral, emitida em 2014, aponta a autora como dona
de casa, e não como trabalhadora rural, situação essa declarada por ela própria na ocasião;
declaração particular firmada pelos supostos representante da empresa DICA DEODÁPOLIS
INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE ALIMENTOS LTDA também aponta inconsistência relevante, ao
indicar que a autora seria fornecedora de leite desde 01/2004, situação essa que não encontra
respaldo tanto na CTPS de seu marido, como na Declaração de exercício de atividade rural
expedida pelo Sindicato dos Trabalhadores na Agricultura Familiar de Rio Brilhante e Região, pois
tais documentos afirmariam que somente após maio de 2004 o esposo da autora teria começado
a trabalhar na região.
10. Dessa forma, não configurado o alegado trabalho rural da autora, constata-se a
impossibilidade de concessão da benesse vindicada. A reforma integral da r. sentença, nesse
contexto, é medida que se impõe. (...) Por fim, considerando o observado no presente feito,
determino a extração de cópia integral do processado e encaminhamento ao Ministério Público
Federal, para as providências que entender cabíveis.
11. Remessa oficial não conhecida. Apelação do INSS provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu não conhecer da remessa oficial e dar provimento à apelação do INSS, nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
