
| D.E. Publicado em 09/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0043021-84.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pela autora contra a sentença de primeiro grau, que julgou improcedente o pedido o pedido aduzido na inicial e, em consequência, condenou o autor no pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em R$500,00, nos termos do artigo 85, §2°, do Código de Processo Civil, suspendendo o pagamento nos termos do artigo 98, §3º, do mesmo diploma legal. P.R.I.C.
Sustenta a apelante, em suas razões recursais, o preenchimento dos requisitos exigidos para a concessão do benefício pleiteado, visto que comprovou o labor rural no período imediatamente anterior à data do implemento etário, bem como o período de carência, os últimos 15 anos, não sendo útil a descaracterizar a qualidade de trabalhador rural o único vinculo de trabalho urbano, exercido há mais de 28 anos e as contribuições individuais não elidem o labor rural, visto que não é vedado ao trabalhador rural o recolhimento de contribuições, além de constar dos autos, várias notas fiscais de sua pequena propriedade rural no mesmo período em que verteu as referidas contribuições. Requer a reforma da sentença e a procedência do pedido.
Sem as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o breve relatório.
VOTO
A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material corroborado por prova testemunhal. Ademais, para a concessão de benefícios rurais, houve um abrandamento no rigorismo da lei quanto à comprovação da condição de rurícola dos trabalhadores do campo, permitindo-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos, ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não tenha se dado sob o regime de economia familiar.
Cumpre ressaltar que, em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o benefício conferido, em razão de sua atividade.
O art. 143 da Lei n.º 8.213/1991, com a redação dada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, dispõe que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Quanto a se provar o efetivo exercício de atividade rural, o Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante disseminada em outras épocas.
Saliento, ainda, que, segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
No caso dos autos, o autor, nascido em 02/09/1954, comprovou o cumprimento do requisito etário no ano de 2014. Assim, considerando que o implemento desse requisito se deu quando já havia encerrado a prorrogação prevista no art. 143 da Lei de Benefícios, é necessária, após 31/12/2010, a comprovação do recolhimento de contribuições para os empregados rurais, trabalhadores avulsos e diaristas, além da comprovação do cumprimento da carência de 180 meses, a teor do que dispõe o art. 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91, com vistas à concessão do benefício.
Antes de analisar os requisitos relativos à qualidade de segurado e ao cumprimento da carência, cumpre salientar que o esgotamento do prazo acima referido não constitui óbice à percepção de benefícios previdenciários no valor de um salário mínimo, nos termo do disposto no art. 39, I, da Lei nº 8.213/91.
No entanto, o exercício de atividades rurais relativo ao período encerrado em 31/12/2010 há de ser comprovado de igual modo, ou seja, bastando a apresentação de início de prova material corroborada por testemunhos. E, quanto ao período posterior, iniciado em 01/01/2011 até 31/12/2015, o labor rural deve ser comprovado por prova material, não bastando o início de prova, correspondendo cada mês comprovado a três meses de carência, limitados a 12 meses dentro do ano civil, conforme as regras introduzidas pela Lei 11.718/08, em seu art. 2º, parágrafo único e art. 3º, incisos I e II.
Em suma, considera-se que a simples limitação temporal das regras prescritas pelo art. 143 da Lei de Benefícios, por si só, não obsta a comprovação do exercício de atividades rurais nem a percepção do benefício, desde que comprovado os recolhimentos obrigatórios, que passaram a ser exigido após o advento das novas regras introduzidas pela Lei nº 11.718/08.
No entanto, no presente caso o trabalho realizado pelo autor se deu em regime de economia familiar, cuja atividade não foi contemplada pela alteração da lei acima referida, podendo ser reconhecido o tempo rural sem a observação da alteração legal da Lei de Benefícios.
Cumpre salientar que o referido regime pressupõe a exploração de atividade primária pelo indivíduo, como principal forma de sustento, acompanhado ou não pelo grupo familiar, mas sem o auxílio de empregados (art. 11, VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91).
Assim, nos termos do art. 11, VII, da Lei 8.213/91, consideram-se segurados especiais, em regime de economia familiar, os produtores, parceiros, meeiros, arrendatários rurais, pescadores artesanais e assemelhados, que exerçam atividades individualmente ou com auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo, residindo na área rural ou em imóvel próximo ao local onde a atividade rural é exercida e com participação significativa nas atividades rurais do grupo familiar.
E, para comprovar o labor rural durante todo período indicado a parte autora apresentou declaração de exercício de atividade rural expedida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Guaraçaí/SP (fls. 16/19), apresentando informações do trabalho desempenhado pela autora em regime de economia familiar nos períodos de 1977 a 1978, 1978 a 1979, 2011 a 2014 e 2013 a 2016, que embora tenha apresentado locais e área de trabalho, não constituem, isoladamente, início de prova material, vez que referidas informações se deram por declaração da própria autora e as declarações não foram homologadas pelo Ministério Público do Trabalho; documento escolar referente ao ano de 1961, em que consta a profissão de seu genitor como sendo lavrador e contrato de arrendamento rural (fls. 26/27), constando a informação de nota de credito rural em nome de seu genitor, na data de 13/06/1979.
In casu, o autor juntou aos autos, como início de prova material do exercício de atividade rural, cópia da certidão de dispensa militar, expedido em 18/03/1975, data em que se declarou como agricultor; cópia da certidão de casamento, contraído em 06/05/1978, quando se declarou lavrador; cópia das certidões de nascimento dos filhos, com assentos nos anos de 1979 e 1980, constando sua profissão como lavrador, bem como autorização de documentos fiscais para emissão de talonário de notas, requerido no ano de 1998; autorização para impressão de notas e documentos fiscais, com pedido em 14/11/2001; declaração cadastral de produtor referente ao ano de 1998 a 2003 e 2005, constando a exploração de produtos de olericultura, em uma área de 2,0 hectares de terras.
Posteriormente, após a autarquia apresentar informações do CNIS, onde se verifica um contrato de trabalho exercido pelo autor em hospital psiquiátrico no período de 01/02/1979 a 24/07/1988 e vários períodos em que o autor verteu contribuição como trabalhador autônomo de 01/09/1990 a 31/03/1991 e como contribuinte individual, nos períodos de 01/12/2005 a 31/01/2006, 01/03/2006 a 31/03/2006, 01/05/2006 a 31/07/2006, 01/09/2006 a 31/12/2006, 01/02/2007 a 31/11/2007, 01/01/2008 a 31/11/2008 e 01/10/2011 a 31/05/2014, a parte autora apresentou várias notas fiscais de venda de produtos em seu nome e de sua pequena propriedade, referente aos anos de 1995 a 2016, em diversos meses e em todo período intercalado entre os referidos anos.
Quanto à prova testemunhal, pacificado no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que apenas ela não basta para a comprovação da atividade rural, requerendo a existência de início de prova material, conforme entendimento cristalizado na Súmula 149, que assim dispõe: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção do benefício previdenciário". Em suma, a prova testemunhal deve corroborar a prova material, mas não a substitui e no presente caso, surge em apoio à pretensão inicial, inequívoca em robustecer o início de prova material ao confirmar, sob compromisso e inquirição do juiz singular, o exercício de atividades rurais pelo autor, de forma contínua em trabalhos rurais, por todo período que o conhecem, ou seja, há mais de 40 anos.
Dessa forma, diante da prova material e testemunhal acostada aos autos, restou demonstrado o labor rural do autor pelo período de carência necessário para a concessão da aposentadoria por idade rural, cabendo afastar a alegação de que o autor tenha exercido atividade urbana e que isso desfaz sua condição de trabalhador rural, visto que, apesar de ter exercido atividade urbana por mais de 11 anos, isto se deu há mais de 26 anos e, portanto, não é útil a descaracterizar sua qualidade de trabalhador rural, visto que comprovado seu trabalho em atividade exclusivamente rural no período anterior e posterior ao período urbano, tendo exercido atividade rural em regime de economia familiar, devidamente comprovado, por mais de 26 anos ininterruptos, abrangendo todo o período de carência de 15 anos após a vigência da lei de benefícios.
Ademais, cumpre salientar que as contribuições individuais vertidas pelo autor não tem o condão de descaracterizar seu labor rural e sua condição de segurado especial, conforme art. 11, V, "a", da lei 8.213/91, assim como, verifica-se dos autos a existência de notas fiscais de sua pequena propriedade rural e no mesmo período em que contribuiu para a previdência.
Assim, restando comprovado o labor rural exercido pelo autor, pelo período mínimo de carência até a data do implemento do requisito etário, faz jus ao benefício de aposentadoria por idade rural, nos termos do art. 48, §1º, da lei 8.213/91, com termo inicial a partir da data do requerimento administrativo (02/09/1954), nos termos do disposto no art. 49 do mesmo diploma legal.
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária aplicam-se os critérios estabelecidos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do RE 870947.
A verba honorária de sucumbência incide no montante de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, conforme entendimento desta Turma (artigo 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil), aplicada a Súmula 111 do C. Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual os honorários advocatícios, nas ações de cunho previdenciário, não incidem sobre o valor das prestações vencidas após a data da prolação da sentença.
A autarquia previdenciária está isenta do pagamento de custas e emolumentos, nos termos do art. 4º, I, da Lei 9.289/96; do art. 24-A da MP 2.180-35/01 e do art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/92.
Por esses fundamentos, dou provimento à apelação da autora para condenar o réu a implantar o benefício de aposentadoria por idade rural em seu nome, nos termos acima expostos.
Independentemente do trânsito em julgado, determino, com fundamento no artigo 497 do novo Código de Processo Civil, a expedição de e-mail ao INSS, instruído com os documentos da segurada Antônio Carlos Vieira Machado, para que cumpra a obrigação de fazer consistente na imediata implantação do beneficio de aposentadoria por idade rural, com data de início - DIB em 02/09/1954 (data do requerimento administrativo), e renda mensal a ser calculada de acordo com a legislação vigente.
É o voto.
TORU YAMAMOTO
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 01/08/2018 15:29:07 |
