Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5002062-49.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
12/03/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 22/03/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO ATINGIDOS.
CONJUNTO PROBATÓRIO FRÁGIL/INCONSISTENTE. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE
PROVIDA. TUTELA REVOGADA.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
2. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
4. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
5. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
6. Observo que a documentação apresentada no processado é frágil e insuficiente, em especial
no que se refere à comprovação do trabalho rural vindicado pelo período de carência necessário.
A CTPS de seu marido indica, apenas, que o exercício de atividade campesina é praticado
regularmente por ele. Estender, nesse tipo de situação, a atividade de trabalhador rural de seu
companheiro para a parte autora seria interpretar, equivocadamente, a jurisprudência em
questão, pois o labor exercido na qualidade de empregado é completamente diferente daquele
havido em regime de economia familiar, conforme já consignado nos termos deste arrazoado. (...)
Extrai-se da prova oral, de maneira cristalina, que jamais a autora trabalhou em regime de
economia familiar, pois o alegado trabalho rural teria se dado, segundo os depoimentos
prestados, sempre na condição de diarista/boia fria. E mesmo tal atividade não conseguiu ser
minimamente delineada, nem em Jussara/BA, nem em Sonora/MS: não se sabe quando começou
o trabalho rural, onde isso ocorreu ou mesmo por quanto tempo perdurou.
7. Dessa forma, diante da fragilidade/inconsistência do conjunto probatório, entendo que não
restaram configurados os requisitos necessários à concessão da benesse vindicada, motivo pelo
qual a reforma integral da r. sentença é medida que se impõe. Por outro lado, convém salientar
que, segundo o recente entendimento adotado pelo STJ, no julgamento do REsp 1352721/SP: "A
ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC,
implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo,
impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente
possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos
necessários à tal iniciativa." Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito
previdenciário da parte autora, a extinção do processo sem julgamento do mérito. (...) Por fim,
revogo a antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida, determinando a imediata
cessação do benefício concedido pela r. sentença. Expeça-se ofício ao INSS, com os
documentos necessários, para as providências cabíveis, independentemente do trânsito em
julgado. A questão relativa à obrigatoriedade ou não de devolução dos valores recebidos pela
parte autora deverá ser dirimida pelo Juízo da Execução após eventual revisão do entendimento
firmado no Tema Repetitivo 692 pela C. Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça.
8. Apelação do INSS parcialmente provida. Tutela revogada.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002062-49.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: MARIA DE LOURDES RIBEIRO LOPES
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Advogado do(a) APELADO: LUIS AFONSO FLORES BISELLI - MS12305-A
APELAÇÃO (198) Nº 5002062-49.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: MARIA DE LOURDES RIBEIRO LOPES
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Advogado do(a) APELADO: LUIS AFONSO FLORES BISELLI - MS12305-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra a r. sentença de primeiro grau que julgou
procedente o pedido inicial, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, para
condenar o INSS a implementar, em até 30 (trinta) dias após a intimação da r. sentença, o
benefício de aposentadoria rural por idade à autora, a contar da data do requerimento
administrativo (dia 21/02/2015 - fls. 23), no valor de 1 (um) salário mínimo mensal, sob pena de
multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais), até o limite de 20 (vinte dias), consoante autoriza o
art. 139, IV, do Código de Processo Civil. Determinou que os valores atrasados deverão ser
corrigidos conforme o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça
Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, conforme Resolução n. 237/13, concedendo
a tutela provisória de urgência satisfativa, na forma solicitada na inicial, para que o benefício seja
implementado de imediato, no prazo definido, independente do trânsito em julgado. Condenou o
INSS ao pagamento de honorários advocatícios em favor do patrono do autor, arbitrados em 10%
(dez por cento) sobre as parcelas vencidas até a data da prolação da r. sentença (art. 85, § 3º, I,
CPC) e em observância ao contido na Súmula n. 111 do STJ. Por fim, condenou, ainda, a
autarquia previdenciária ao pagamento das custas e despesas processuais.
Sentença não submetida ao reexame necessário.
Sustenta a autarquia apelante, em suas razões recursais e em apertada síntese, que não restou
comprovado o exercício de atividade campesina da parte autora durante o período de carência
exigido pela Lei de Benefícios, em regime de economia familiar. Aduz, ainda, que os documentos
apresentados não permitem que deles se extraia o suposto exercício de trabalho rural da parte
autora, em qualquer período. Por fim, alega que a prova testemunhal produzida é frágil, não
corroborando com a tese apresentada na exordial. Requer, nesses termos, a reforma integral da
r. sentença, com a improcedência do pleito inaugural. Subsidiariamente, pleiteia a alteração dos
consectários legais aplicados, requerendo a antecipação da tutela recursal para revogação da
tutela de urgência concedida e determinação para devolução dos valores pagos.
Com as contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o sucinto relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5002062-49.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: MARIA DE LOURDES RIBEIRO LOPES
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Advogado do(a) APELADO: LUIS AFONSO FLORES BISELLI - MS12305-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Em princípio, consigno que não entendo que a imediata execução da sentença ora recorrida
resulte, necessariamente, em lesão grave ou de difícil reparação à Previdência Social, uma vez
que se deve observar que, no presente caso, colidem o bem jurídico vida e o bem jurídico
pecuniário, daí porque aquele primeiro é que deve predominar, mesmo porque, embora, talvez,
não seja, realmente, possível a restituição dos valores pagos a título de tutela antecipada, se não
confirmada a r. sentença em grau recursal, ainda será factível a revogação do benefício
concedido, impedindo, destarte, a manutenção da produção de seus efeitos.
Além disso, ao menos em sede de cognição primária, verifico não ter sido apresentada pela parte
apelante qualquer fundamentação relevante que ensejasse o acolhimento do pedido de
antecipação de tutela recursal, nos termos do artigo 1.019 do Código de Processo Civil, motivo
pelo qual o seu pedido resta indeferido.
Passo, agora, à análise do mérito.
A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos,
se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de atividade
rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal. Ademais, para a concessão de benefícios rurais, houve um
abrandamento no rigorismo da lei quanto à comprovação da condição de rurícola dos
trabalhadores do campo, permitindo-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até
mesmo dos pais aos filhos, ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os
cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da
atividade campesina não tenha se dado sob o regime de economia familiar.
Cumpre ressaltar que, em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social,
não se pode exigir dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições
previdenciárias, quando é de notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são
desenvolvidas, cumprindo aqui dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma
subordinação, haja vista que a contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos
chamados "gatos". Semelhante exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores
qualquer possibilidade de auferir o benefício conferido, em razão de sua atividade.
O art. 143 da Lei n.º 8.213/1991, com a redação dada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, dispõe
que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Quanto a se provar o efetivo exercício de atividade rural, o Superior Tribunal de Justiça considera
prescindível a abrangência de todo o período de carência previsto no art. 142 da Lei de
Benefícios pela prova material, desde que a prova testemunhal demonstre sua solidez, permitindo
sua vinculação ao tempo de carência. Tal solução, conhecida como "pro misero", se dá em
virtude da precariedade dos registros de vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda
comum em tempos recentes e bastante disseminada em outras épocas.
Saliento, ainda, que, segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp
1354908, em sede de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo
no momento em que completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade,
a fim de atender ao segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o
segurado especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 1955, comprovou o cumprimento do requisito
etário no ano de 2010. Assim, considerando que o implemento do requisito em questão se deu
quando ainda não havia encerrado a prorrogação prevista no art. 143, da Lei de Benefícios, a
comprovação do trabalho campesino se dá por meio de início de prova material, corroborada por
prova testemunhal, consistente e idônea.
Observe-se, por derradeiro, que o trabalho rural exercido em regime de economia familiar
pressupõe a exploração de atividade primária pelo indivíduo, como principal forma de sustento,
acompanhado ou não pelo grupo familiar, mas sem o auxílio de empregados (art. 11, VII, "a" e §
1º, da Lei 8.213/91). Assim, nos termos do art. 11, VII, da Lei 8.213/91, consideram-se segurados
especiais, em regime de economia familiar, os produtores, parceiros, meeiros, arrendatários
rurais, pescadores artesanais e assemelhados, que exerçam atividades individualmente ou com
auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos, ou a
eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo,
residindo na área rural ou em imóvel próximo ao local onde a atividade rural é exercida e com
participação significativa nas atividades rurais do grupo familiar.
Pois bem. A autora afirma, na exordial, in litteris:
“(...)
DOS FATOS:
A Requerente nasceu e se criou na zona rural. Desde criança, com aproximadamente 10 anos de
idade começou a trabalhar na lavoura, em companhia de seus pais que também eram lavradores.
Contando, hoje, com 60 anos de idade e aproximadamente 45 anos de trabalhadora rural:
A Requerente sempre trabalhou como lavradora, em regime de economia familiar, juntamente
com a sua família:
Ressalta-se que ela sempre trabalhou como lavradora, em regime de economia familiar, no
cultivo de mantimento, tais como: de arroz, milho, feijão, mandioca, etc:
Deste modo, sendo pessoa humilde e ignorante de seus deveres e direitos, não contribuiu para a
Previdência Social, muito embora tenha trabalhado, praticamente, a sua vida inteira como
rurícola:
Entretanto, a idade pesa no ombro da valente Requerente e recentemente com grandes
dificuldades para trabalhar, foi procurar o INSS para requerer sua aposentadoria, quando lhe
informaram por processo administrativo da impossibilidade, em conseguir este benefício:
Inconformada, propõe a presente ação na esperança de que, através do Poder Judiciário,
obtenha a prestação jurisdicional de aposentadoria rural por idade:
A Requerente trabalhou por mais de 30 (trinta) anos na zona Rural prestando serviço, na lavoura,
no plantio de cereais e mantimentos, juntamente com sua família, conforme demonstra os
documentos inclusos, corroborando com o depoimento das testemunhas arroladas ao final;
Por isso, na condição de rurícola por todas essas décadas, preenche aos requisitos legais para a
concessão do benefício de aposentadoria rural por idade, no valor equivalente a 01 (um) salário
mínimo;
(...)”
A fim de comprovar o exercício de atividade rural, a autora apresentou a CTPS de seu marido, na
qual constam vínculos de origem rural, predominantemente, e outros de natureza urbana. Trouxe,
também, sua Certidão de Casamento, cujo enlace matrimonial ocorreu aos 27/09/1975, onde seu
marido fora qualificado como “lavrador” e a autora como “doméstica”.
Quanto à prova testemunhal, pacificado no C. Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que
apenas esta não basta, isoladamente, para a comprovação da atividade rural, requerendo a
existência de início razoável de prova material, conforme entendimento cristalizado na Súmula
149, que assim dispõe: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da
atividade rurícola, para efeito da obtenção do benefício previdenciário".
Feitas tais considerações, observo que a documentação apresentada no processado é frágil e
insuficiente, em especial no que se refere à comprovação do trabalho rural vindicado pelo período
de carência necessário. A CTPS de seu marido indica, apenas, que o exercício de atividade
campesina é praticado regularmente por ele. Estender, nesse tipo de situação, a atividade de
trabalhador rural de seu companheiro para a parte autora seria interpretar, equivocadamente, a
jurisprudência em questão, pois o labor exercido na qualidade de empregado é completamente
diferente daquele havido em regime de economia familiar, conforme já consignado nos termos
deste arrazoado.
A autora, em depoimento pessoal, desqualificou a tese da exordial de que a autora teria exercido
a atividade rural em regime de economia familiar, porquanto a própria afirmou, em depoimento
pessoal, ter realizado a atividade rural sempre na qualidade de “diarista”.
Por sua vez, as testemunhas, ouvidas em sede de contraditório, apesar de afirmarem o trabalho
rural da autora, não corroboraram adequadamente com as alegações trazidas pela peça
inaugural:
- Nildete da Silva Martins, compromissada, afirmou conhecer a autora da Bahia, onde ela
trabalhava como boia fria; no entanto, nunca trabalhou com ela. Disse, ainda, que o marido
trabalhava na “usina” e que a autora trabalha como boia fria, mas não sabe em que lugar ou para
quem ela trabalha;
- Eunice Ferreira Lopes, compromissada, disse conhecer a autora há cerca de quinze anos, da
Bahia, onde a viu trabalhando na roça, mas nunca trabalharam juntas; sabe que a autora trabalha
como boia fria em Sonora/MS, mas nunca a viu trabalhando;
- Antônio Abílio de Miranda Neto, compromissado, também disse conhecer a autora há cerca de
quinze anos, da cidade de Jussara/BA, e que viu a autora trabalhando em atividade rurais na
Bahia, mas, tal qual as testemunhas anteriores, não trabalharam juntos; que, ao mudar-se para
Sonora/MS, a autora trabalhou como boia fria, mas não exerce mais tal atividade.
Extrai-se da prova oral, de maneira cristalina, que jamais a autora trabalhou em regime de
economia familiar, pois o alegado trabalho rural teria se dado, segundo os depoimentos
prestados, sempre na condição de diarista/boia fria. E mesmo tal atividade não conseguiu ser
minimamente delineada, nem em Jussara/BA, nem em Sonora/MS: não se sabe quando começou
o trabalho rural, onde isso ocorreu ou mesmo por quanto tempo perdurou.
Dessa forma, diante da fragilidade/inconsistência do conjunto probatório, entendo que não
restaram configurados os requisitos necessários à concessão da benesse vindicada, motivo pelo
qual a reforma integral da r. sentença é medida que se impõe.
Por outro lado, convém salientar que, segundo o recente entendimento adotado pelo STJ, no
julgamento do REsp 1352721/SP: "A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial,
conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e
desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art.
267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do
CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito previdenciário da parte autora,
a extinção do processo sem julgamento do mérito.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais, além de honorários
advocatícios fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), cuja exigibilidade observará o disposto no artigo
12 da Lei nº 1.060/1950 (artigo 98, § 3º, do Código de Processo Civil/2015), por ser a autora
beneficiária da justiça gratuita.
Por fim, revogo a antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida, determinando a
imediata cessação do benefício concedido pela r. sentença. Expeça-se ofício ao INSS, com os
documentos necessários, para as providências cabíveis, independentemente do trânsito em
julgado.
A questão relativa à obrigatoriedade ou não de devolução dos valores recebidos pela parte autora
deverá ser dirimida pelo Juízo da Execução após a eventual revisão do entendimento firmado no
Tema Repetitivo 692 pela C. Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça.
Por esses fundamentos, dou parcial provimento à apelação do INSS, nos termos ora
consignados.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO ATINGIDOS.
CONJUNTO PROBATÓRIO FRÁGIL/INCONSISTENTE. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE
PROVIDA. TUTELA REVOGADA.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
2. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
4. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
5. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
6. Observo que a documentação apresentada no processado é frágil e insuficiente, em especial
no que se refere à comprovação do trabalho rural vindicado pelo período de carência necessário.
A CTPS de seu marido indica, apenas, que o exercício de atividade campesina é praticado
regularmente por ele. Estender, nesse tipo de situação, a atividade de trabalhador rural de seu
companheiro para a parte autora seria interpretar, equivocadamente, a jurisprudência em
questão, pois o labor exercido na qualidade de empregado é completamente diferente daquele
havido em regime de economia familiar, conforme já consignado nos termos deste arrazoado. (...)
Extrai-se da prova oral, de maneira cristalina, que jamais a autora trabalhou em regime de
economia familiar, pois o alegado trabalho rural teria se dado, segundo os depoimentos
prestados, sempre na condição de diarista/boia fria. E mesmo tal atividade não conseguiu ser
minimamente delineada, nem em Jussara/BA, nem em Sonora/MS: não se sabe quando começou
o trabalho rural, onde isso ocorreu ou mesmo por quanto tempo perdurou.
7. Dessa forma, diante da fragilidade/inconsistência do conjunto probatório, entendo que não
restaram configurados os requisitos necessários à concessão da benesse vindicada, motivo pelo
qual a reforma integral da r. sentença é medida que se impõe. Por outro lado, convém salientar
que, segundo o recente entendimento adotado pelo STJ, no julgamento do REsp 1352721/SP: "A
ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC,
implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo,
impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente
possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos
necessários à tal iniciativa." Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito
previdenciário da parte autora, a extinção do processo sem julgamento do mérito. (...) Por fim,
revogo a antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida, determinando a imediata
cessação do benefício concedido pela r. sentença. Expeça-se ofício ao INSS, com os
documentos necessários, para as providências cabíveis, independentemente do trânsito em
julgado. A questão relativa à obrigatoriedade ou não de devolução dos valores recebidos pela
parte autora deverá ser dirimida pelo Juízo da Execução após eventual revisão do entendimento
firmado no Tema Repetitivo 692 pela C. Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça.
8. Apelação do INSS parcialmente provida. Tutela revogada. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
