Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5000282-40.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
29/03/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 04/04/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO ATINGIDOS.
CONJUNTO PROBATÓRIO INCONSISTENTE, REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR NÃO
CONFIGURADO. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA. TUTELA REVOGADA.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
2. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
4. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
5. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
6. No caso dos autos, a parte autora, nascida em 1954, comprovou o cumprimento do requisito
etário no ano de 2009. Assim, considerando que o implemento do requisito em questão se deu
quando ainda não encerrada a prorrogação prevista no art. 143, da Lei de Benefícios, a
comprovação de atividade campesina se dá por meio de início de prova material, corroborada por
prova testemunhal, consistente e robusta.
7. Cumpre salientar, por derradeiro, que o referido regime pressupõe a exploração de atividade
primária pelo indivíduo, como principal forma de sustento, acompanhado ou não pelo grupo
familiar, mas sem o auxílio de empregados (art. 11, VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91). Assim, nos
termos do art. 11, VII, da Lei 8.213/91, consideram-se segurados especiais, em regime de
economia familiar, os produtores, parceiros, meeiros, arrendatários rurais, pescadores artesanais
e assemelhados, que exerçam atividades individualmente ou com auxílio eventual de terceiros,
bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde
que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo, residindo na área rural ou em
imóvel próximo ao local onde a atividade rural é exercida e com participação significativa nas
atividades rurais do grupo familiar.
8. Feitas tais considerações, entendo que o início de prova material apresentado permite
constatar, de forma inequívoca, que a atividade rurícola do casal não pode ser classificada, de
qualquer modo, como a exercida em regime de economia familiar, considerando não só o elevado
tamanho da propriedade apresentada como início de prova material (“Fazenda WM2”), mas
também verificando que o casal possui outros imóveis rurais de elevadas dimensões e a atividade
agropecuária de grande monta, o que desqualificaria a tese ventilada na exordial, de trabalho
campesino de regime de subsistência. Interessante notar que a autora deixou de apresentar
qualquer documento relativo à propriedade anterior do casal (Fazenda Santa Barbara –
denominada Barrinha), de modo que impossível saber o tamanho do referido imóvel e como seria
realizada a atividade exercida no referido local. E ainda que deixou de mencionar possuir outra
fazenda de sua titularidade, com cerca de 193 hectares (Fazenda WM), acostada à Fazenda
WM2.
9. Quanto à prova testemunhal, está pacificado no C. Superior Tribunal de Justiça o entendimento
de que apenas esta não basta, isoladamente, para a comprovação da atividade rural, requerendo
a existência de início razoável de prova material, conforme entendimento cristalizado na Súmula
149, que assim dispõe: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da
atividade rurícola, para efeito da obtenção do benefício previdenciário". Nesse contexto, e em que
pese as testemunhas terem afirmado o labor rural da autora, foram contraditórias quanto ao
tamanho da propriedade em questão (Fazenda WM2) e as atividades exercidas pela autora
naquele local. Assim, extrai-se do conjunto probatório que a autora e seu marido possuem
atividade campesina de grande monta, verdadeiro agronegócio, e não apenas atividade de mera
subsistência, situação essa que demanda a obrigatoriedade de recolhimento das contribuições
previdenciárias devidas, a qualificá-la, in casu, como contribuinte individual, na forma do artigo 11,
V, a, da Lei n.º 8.213/91. O elemento essencial identificador da qualidade de segurado especial,
para o fim da proteção extraordinária de segurado não contribuinte pelo Regime Geral de
Previdência Social, é o exercício das atividades especificadas na lei em regime de economia
familiar, indispensavelmente voltado à subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico da
família, em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados
permanentes, em área não superior a quatro módulos fiscais, situação essa não comprovada no
caso em análise.
11. Dessa forma, diante da inconsistência do conjunto probatório, restando desconfigurado o
regime de economia familiar alegado, entendo ausentes os requisitos necessários à concessão
da benesse vindicada, motivo pelo qual a reforma da r. sentença é medida que se impõe. (...) Por
fim, revogo a antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida. Comunique-se ao INSS,
pelo meio mais expedito, independentemente do trânsito em julgado. A questão relativa à
obrigatoriedade ou não de devolução dos valores recebidos pela parte autora deverá ser dirimida
pelo Juízo da Execução após a eventual revisão do entendimento firmado no Tema Repetitivo
692 pela C. Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça.
12. Apelação do INSS provida. Tutela revogada.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000282-40.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: CILENE GRACIANO MENDONCA
Advogado do(a) APELADO: LAURA CRISTINA RICCI CRISTOVAO TROUY - MS9099-A
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000282-40.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: CILENE GRACIANO MENDONCA
Advogado do(a) APELADO: LAURA CRISTINA RICCI CRISTOVAO TROUY - MS9099-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra a r. sentença de primeiro grau que julgou
procedente o pedido inicial, nos termos do artigo 487, I, do CPC/2015, para condenar o INSS a
conceder à autora o benefício de aposentadoria por idade rural, correspondente a 100% do
salário de benefício. Destacou que os valores em atraso serão devidos desde o requerimento
administrativo (12/12/2016), e sobre eles deverão incidir juros moratórios segundo o índice oficial
de remuneração básica da caderneta de poupança, na forma do artigo 1º-F, da Lei 9.494/97, com
redação da Lei 11.960/09, e correção monetária pelo IPCA-E1. Condenou a Autarquia
Previdenciária ao pagamento de honorários advocatícios em favor do patrono da autora,
arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor das prestações vencidas até a data da r.
sentença, nos termos do artigo 85, § 2º, do CPC/2015. Porém, isentou o INSS das custas
processuais. Por fim, concedeu a antecipação da tutela para implantação do benefício.
Dispensado o reexame necessário.
Sustenta o apelante, em apertada síntese, o não preenchimento dos requisitos exigidos para a
concessão do benefício pleiteado, em razão de ausência de comprovação da carência necessária
e pela inconsistência do conjunto probatório, em especial no que se refere à insuficiência de
prova testemunhal robusta para corroborar as alegações trazidas na exordial. Subsidiariamente,
requer a alteração dos critérios de incidência da correção monetária fixados.
Apresentadas as contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o sucinto relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000282-40.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: CILENE GRACIANO MENDONCA
Advogado do(a) APELADO: LAURA CRISTINA RICCI CRISTOVAO TROUY - MS9099-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado mostra-se formalmente regular,
motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação
(art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e
inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o e passo a apreciá-lo nos termos do artigo 1.011
do Código de Processo Civil.
A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos,
se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de atividade
rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal. Ademais, para a concessão de benefícios rurais, houve um
abrandamento no rigorismo da lei quanto à comprovação da condição de rurícola dos
trabalhadores do campo, permitindo-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até
mesmo dos pais aos filhos, ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os
cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da
atividade campesina não tenha se dado sob o regime de economia familiar.
Cumpre ressaltar que, em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social,
não se pode exigir dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições
previdenciárias, quando é de notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são
desenvolvidas, cumprindo aqui dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma
subordinação, haja vista que a contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos
chamados "gatos". Semelhante exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores
qualquer possibilidade de auferir o benefício conferido, em razão de sua atividade.
O art. 143 da Lei n.º 8.213/1991, com a redação dada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, dispõe
que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Quanto a se provar o efetivo exercício de atividade rural, o Superior Tribunal de Justiça considera
prescindível a abrangência de todo o período de carência previsto no art. 142 da Lei de
Benefícios pela prova material, desde que a prova testemunhal demonstre sua solidez, permitindo
sua vinculação ao tempo de carência. Tal solução, conhecida como "pro misero", se dá em
virtude da precariedade dos registros de vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda
comum em tempos recentes e bastante disseminada em outras épocas.
Saliento, ainda, que, segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp
1354908, em sede de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo
no momento em que completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade,
a fim de atender ao segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o
segurado especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 1954, comprovou o cumprimento do requisito
etário no ano de 2009. Assim, considerando que o implemento do requisito em questão se deu
quando ainda não encerrada a prorrogação prevista no art. 143, da Lei de Benefícios, a
comprovação de atividade campesina se dá por meio de início de prova material, corroborada por
prova testemunhal, consistente e robusta.
Cumpre salientar, por derradeiro, que o trabalho campesino exercido em regime de economia
familiar, hipótese trazida na exordial, pressupõe a exploração de atividade primária pelo indivíduo,
como principal forma de sustento, acompanhado ou não pelo grupo familiar, mas sem o auxílio de
empregados (art. 11, VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91). Assim, nos termos do art. 11, VII, da Lei
8.213/91, consideram-se segurados especiais, em regime de economia familiar, os produtores,
parceiros, meeiros, arrendatários rurais, pescadores artesanais e assemelhados, que exerçam
atividades individualmente ou com auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos
cônjuges ou companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde que trabalhem,
comprovadamente, com o grupo familiar respectivo, residindo na área rural ou em imóvel próximo
ao local onde a atividade rural é exercida e com participação significativa nas atividades rurais do
grupo familiar.
Pois bem.
No presente caso, a autor afirma na exordial, in litteris:
“(...)
A autora requereu em 4 de Novembro de 2016, junto ao INSTITUTO NACIONAL DE
SEGURIDADE SOCIAL – INSS, o benefício de Aposentadoria por Idade rural, com
reconhecimento de atividade rural, na condição de segurada especial, conforme Requerimento de
Benefícios, espécie 41, NB 154.006.037-0, Aposentadoria por Idade, conforme cópia da
COMUNICAÇÃO DE DECISÃO no processo Administrativo em anexo.
Em 15 de Dezembro de 2016, a autora teve seu pedido de aposentadoria indeferido, conforme
prova pela comunicação em anexo, visto que após análise da documentação apresentada e
entrevista realizada, não foi reconhecido o Direito ao benefício, pois o período de atividade rural,
de 1979 (com 25 anos de idade) desde que começou a morar na fazenda Santa Barbara até 2007
quando venderam a fazenda, não foi computado para efeito de carência, uma vez que se trata de
período sem contribuição para a Previdência Social.
Ocorre Excelência, que a autora residiu a maior parte de sua vida nas áreas rurais, o que está
provada através de notas fiscais de compras de produtos agrícolas, durante todo esse período.
A autora nunca teve registro como trabalhadora urbana, pois nunca trabalhou na área urbana,
somente na área rural.
A AUTORA, durante o período dos documentos supracitado, trabalhou como agricultora junto
com sua família, em condições de dependência e colaboração, por ser indispensável à própria
subsistência da família, sem a utilização de empregados, o que, pela lei, a torna segurada
especial perante a Autarquia, possibilitando assim a contagem do referido período para a
concessão da Aposentadoria por Idade.
Assim, esgotados os meios administrativos, e demonstrado o efetivo exercício de atividade rural,
a comprovação do tempo mínimo de contribuições exigidas e a idade mínima para aposentadoria,
resta a AUTORA recorrer à esfera judicial para fazer valer os seus direitos, motivo pelo qual
enseja a presente ação.
(...)”
A fim de comprovar o exercício de atividade rural, a autora apresentou:
- Declaração do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Chapadão do Sul/MS, emitida em
12/2016, na qual consta que a autora se dedicava à suposta atividade campesina em regime de
economia familiar na Fazenda Carreta da Fronteira (96 hectares), localizada no município de
Chapadão do Sul/MS, de propriedade dela e de seu esposo Waldemar Mendonça de Souza,
onde haveria produção de leiteria para elaboração de seus derivados (queijo, requeijão, etc.),
gado de corte, cultivo de hortas, criação de galinhas, porcos e carneiros e cultivo de soja e milho,
para subsistência;
- Certidão de Casamento da autora, cujo enlace matrimonial ocorreu aos 23/12/1972, onde seu
marido fora qualificado como “Fiscal de L.T.” e a autora como “doméstica”;
- Cópias do processo administrativo de requerimento do benefício, no qual consta entrevista rural
efetivada pela autora, onde ela informa que, depois de seu casamento, voltou a morar em
fazendas a partir de 1979 (Fazenda Santa Barbara – denominada Barrinha), no município de Bom
Jesus/MS, e que entre 2007/2008, o casal vendeu a referida fazenda e compraram a Fazenda
Carreta da Fronteira (denominada Fazenda WM2), no município de Chapadão do Sul/MS, onde o
casal continua trabalhando até os dias atuais, sem o auxílio de empregados, não possuindo
qualquer outra fonte de renda (somente o que produzem na fazenda);
- Notas fiscais de compra de insumos e vendas de produtos agrícolas/pecuários, relacionadas à
fazendas de propriedade do casal, localizadas nos munícipios de Bom Jesus de Goiás/MS e
Chapadão do Sul/MS, dos anos de 1998, 1999, 2000, 2001, 2002, 2003, 2004, 2006, 2007, 2008,
2009, 2010, 2011, 2012, 2014, 2015;
- Certificado de Cadastro de imóvel Rural – CCIR, comprovando a propriedade da Fazenda WM
em nome do esposo da parte autora, emitido aos 14/12/2009;
- Certidão Negativa de Débitos relativa ao ITR da Fazenda WM, emitida aos 07/11/2016;
- Escritura Pública de Compra e Venda lavrada em 28/09/2007, onde consta que a autora e seu
marido Waldemar Mendonça de Souza adquiriram um lote rural, originário de desmembramento
da Fazenda Carreta da Fronteira, que mede cerca de 96 hectares, passando a ser denominada
“Fazenda WM2”, fazenda essa cravada na divisa com a “Fazenda WM”, também de titularidade
de Waldemar Mendonça de Souza e outra, adquirida pelo valor de R$ 250.000,00;
- Certidão de Matrícula do imóvel rural acima descrito, onde a autora se encontra qualificada
como “do lar” e “produtora agropecuarista” e seu esposo como “pecuarista" e "agropecuarista”;
observa-se, ainda, de tal documento, que a outra fazenda pertencente ao casal (Fazenda WM)
possui 193,60 hectares, além de haver outros imóveis rurais de titularidade do casal, que foram
utilizados para substituição de garantia em financiamentos diversos firmados com o Banco do
Brasil;
Feitas tais considerações, entendo que o início de prova material apresentado permite constatar,
de forma inequívoca, que a atividade rurícola do casal não pode ser classificada, de qualquer
modo, como a exercida em regime de economia familiar, considerando não só o elevado tamanho
da propriedade apresentada como início de prova material (“Fazenda WM2”), mas também
verificando que o casal possui outros imóveis rurais de elevadas dimensões e a atividade
agropecuária de grande monta, o que desqualificaria a tese ventilada na exordial, de trabalho
campesino de regime de subsistência. Interessante notar que a autora deixou de apresentar
qualquer documento relativo à propriedade anterior do casal (Fazenda Santa Barbara –
denominada Barrinha), de modo que impossível saber o tamanho do referido imóvel e como seria
realizada a atividade exercida no referido local. E ainda que deixou de mencionar possuir outra
fazenda de sua titularidade, com cerca de 193 hectares (Fazenda WM), acostada à Fazenda
WM2.
Quanto à prova testemunhal, está pacificado no C. Superior Tribunal de Justiça o entendimento
de que apenas esta não basta, isoladamente, para a comprovação da atividade rural, requerendo
a existência de início razoável de prova material, conforme entendimento cristalizado na Súmula
149, que assim dispõe: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da
atividade rurícola, para efeito da obtenção do benefício previdenciário".
Nesse contexto, e em que pese as testemunhas terem afirmado o labor rural da autora, foram
contraditórias quanto ao tamanho da propriedade em questão (Fazenda WM2) e as atividades
exercidas pela autora naquele local. Assim, extrai-se do conjunto probatório que a autora e seu
marido possuem atividade campesina de grande monta, verdadeiro agronegócio, e não apenas
atividade de mera subsistência, situação essa que demanda a obrigatoriedade de recolhimento
das contribuições previdenciárias devidas, a qualificá-la, in casu, como contribuinte individual, na
forma do artigo 11, V, a, da Lei n.º 8.213/91. O elemento essencial identificador da qualidade de
segurado especial, para o fim da proteção extraordinária de segurado não contribuinte pelo
Regime Geral de Previdência Social, é o exercício das atividades especificadas na lei em regime
de economia familiar, indispensavelmente voltado à subsistência e ao desenvolvimento
socioeconômico da família, em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização
de empregados permanentes, em área não superior a quatro módulos fiscais, situação essa não
comprovada no caso em análise.
Dessa forma, diante da inconsistência do conjunto probatório, restando desconfigurado o regime
de economia familiar alegado, entendo ausentes os requisitos necessários à concessão da
benesse vindicada, motivo pelo qual a reforma da r. sentença é medida que se impõe.
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), cuja
exigibilidade observará o disposto no artigo 12 da Lei nº 1.060/1950 (artigo 98, § 3º, do Código de
Processo Civil/2015), por ser beneficiária da justiça gratuita.
Por fim, revogo a antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida. Comunique-se ao
INSS, pelo meio mais expedito, independentemente do trânsito em julgado.
A questão relativa à obrigatoriedade ou não de devolução dos valores recebidos pela parte autora
deverá ser dirimida pelo Juízo da Execução após a eventual revisão do entendimento firmado no
Tema Repetitivo 692 pela C. Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça.
Por esses fundamentos, dou provimento à apelação do INSS, nos termos ora consignados.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO ATINGIDOS.
CONJUNTO PROBATÓRIO INCONSISTENTE, REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR NÃO
CONFIGURADO. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA. TUTELA REVOGADA.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
2. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
4. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
5. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
6. No caso dos autos, a parte autora, nascida em 1954, comprovou o cumprimento do requisito
etário no ano de 2009. Assim, considerando que o implemento do requisito em questão se deu
quando ainda não encerrada a prorrogação prevista no art. 143, da Lei de Benefícios, a
comprovação de atividade campesina se dá por meio de início de prova material, corroborada por
prova testemunhal, consistente e robusta.
7. Cumpre salientar, por derradeiro, que o referido regime pressupõe a exploração de atividade
primária pelo indivíduo, como principal forma de sustento, acompanhado ou não pelo grupo
familiar, mas sem o auxílio de empregados (art. 11, VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91). Assim, nos
termos do art. 11, VII, da Lei 8.213/91, consideram-se segurados especiais, em regime de
economia familiar, os produtores, parceiros, meeiros, arrendatários rurais, pescadores artesanais
e assemelhados, que exerçam atividades individualmente ou com auxílio eventual de terceiros,
bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde
que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo, residindo na área rural ou em
imóvel próximo ao local onde a atividade rural é exercida e com participação significativa nas
atividades rurais do grupo familiar.
8. Feitas tais considerações, entendo que o início de prova material apresentado permite
constatar, de forma inequívoca, que a atividade rurícola do casal não pode ser classificada, de
qualquer modo, como a exercida em regime de economia familiar, considerando não só o elevado
tamanho da propriedade apresentada como início de prova material (“Fazenda WM2”), mas
também verificando que o casal possui outros imóveis rurais de elevadas dimensões e a atividade
agropecuária de grande monta, o que desqualificaria a tese ventilada na exordial, de trabalho
campesino de regime de subsistência. Interessante notar que a autora deixou de apresentar
qualquer documento relativo à propriedade anterior do casal (Fazenda Santa Barbara –
denominada Barrinha), de modo que impossível saber o tamanho do referido imóvel e como seria
realizada a atividade exercida no referido local. E ainda que deixou de mencionar possuir outra
fazenda de sua titularidade, com cerca de 193 hectares (Fazenda WM), acostada à Fazenda
WM2.
9. Quanto à prova testemunhal, está pacificado no C. Superior Tribunal de Justiça o entendimento
de que apenas esta não basta, isoladamente, para a comprovação da atividade rural, requerendo
a existência de início razoável de prova material, conforme entendimento cristalizado na Súmula
149, que assim dispõe: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da
atividade rurícola, para efeito da obtenção do benefício previdenciário". Nesse contexto, e em que
pese as testemunhas terem afirmado o labor rural da autora, foram contraditórias quanto ao
tamanho da propriedade em questão (Fazenda WM2) e as atividades exercidas pela autora
naquele local. Assim, extrai-se do conjunto probatório que a autora e seu marido possuem
atividade campesina de grande monta, verdadeiro agronegócio, e não apenas atividade de mera
subsistência, situação essa que demanda a obrigatoriedade de recolhimento das contribuições
previdenciárias devidas, a qualificá-la, in casu, como contribuinte individual, na forma do artigo 11,
V, a, da Lei n.º 8.213/91. O elemento essencial identificador da qualidade de segurado especial,
para o fim da proteção extraordinária de segurado não contribuinte pelo Regime Geral de
Previdência Social, é o exercício das atividades especificadas na lei em regime de economia
familiar, indispensavelmente voltado à subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico da
família, em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados
permanentes, em área não superior a quatro módulos fiscais, situação essa não comprovada no
caso em análise.
11. Dessa forma, diante da inconsistência do conjunto probatório, restando desconfigurado o
regime de economia familiar alegado, entendo ausentes os requisitos necessários à concessão
da benesse vindicada, motivo pelo qual a reforma da r. sentença é medida que se impõe. (...) Por
fim, revogo a antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida. Comunique-se ao INSS,
pelo meio mais expedito, independentemente do trânsito em julgado. A questão relativa à
obrigatoriedade ou não de devolução dos valores recebidos pela parte autora deverá ser dirimida
pelo Juízo da Execução após a eventual revisão do entendimento firmado no Tema Repetitivo
692 pela C. Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça.
12. Apelação do INSS provida. Tutela revogada. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
