Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5001156-25.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
31/05/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 06/06/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO ATINGIDOS.
CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA.
PROCESSO EXTINTO. ART. 485, IV, DO CPC. TUTELA REVOGADA.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
2. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
4. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
5. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
6. Por não se desincumbir do ônus probatório que lhe competia, não restando comprovado que a
autora tenha exercido a atividade campesina em regime de economia familiar, pelo período
necessário de carência e, também, no período imediatamente anterior ao implemento do requisito
etário/requerimento administrativo, a reforma da r. sentença é medida que se impõe.
7. Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP). Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito
previdenciário da parte autora, a extinção do processo sem julgamento do mérito.
8. Apelação do INSS parcialmente provida. Processo extinto.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001156-25.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: LUZIA DA LUZ FRANCO
Advogado do(a) APELADO: ANTONIO CICALISE NETTO - MS4580-A
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001156-25.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: LUZIA DA LUZ FRANCO
Advogado do(a) APELADO: ANTONIO CICALISE NETTO - MS4580-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra a r. sentença de primeiro grau que julgou
procedente o pedido inaugural para conceder à autora a aposentadoria rural por idade, julgando
extinto o processo com julgamento do mérito, na forma do artigo 269, I do CPC. Definiu que a
data de início do benefício é a data da entrada do requerimento administrativo, protocolizado em
18.1.2018 e que as parcelas pretéritas deverão ser atualizadas monetariamente, desde as
respectivas competências, conforme Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na
Justiça Federal. Consignou, ainda, que os juros moratórios e correção monetária devem ser
calculados nos termos do art. 1-F da Lei 9.494/97 e as parcelas pretéritas deverão ser pagas de
uma só vez, devidamente corrigidas e acrescidas dos juros. Por fim, condenou a Autarquia
Previdenciária ao pagamento de custas, despesas processuais e honorários advocatícios, fixados
em 10% sobre o valor das prestações vencidas até a data da r. sentença (Súmula n. 111 do STJ).
Dispensado o reexame necessário.
Sustenta a Autarquia apelante, em apertada síntese, o não preenchimento dos requisitos exigidos
para a concessão do benefício pleiteado, aduzindo que está ausente início de prova material
contemporâneo e idôneo da suposta atividade campesina exercida e que a autora reside em área
urbana, consoante se verifica do CNIS. Alega, ainda, que a autora é proprietária de grande área
rural (Sítio Erval – 175 hectares), não havendo dos autos notícias acerca de sua eventual divisão
entre os proprietários. Complementa suas razões recursais afirmando que a declaração prestada
pelo Sindicato de trabalhadores rurais da região foi emitida no mesmo dia do requerimento
administrativo, apenas para tentar fazer prova perante a Autarquia Previdenciária e que não
foram apresentados nos autos quaisquer documentos em nome da autora aptos a comprovar que
ela, no sítio em questão, exerce o labor rural, como, por exemplo, notas fiscais de compra/venda
de produtos e insumos. Por fim, salienta que a simples propriedade de um imóvel rural não
pressupõe que a postulante trabalhe, efetivamente, no local, além de fazer considerações acerca
do eventual aproveitamento da condição de segurado especial dos ex-cônjuges. Requer, nesses
termos, a reforma integral da r. sentença. Subsidiariamente, pleiteia a alteração da DIB, da verba
honorária fixada e dos consectários legais aplicados. Requer, ainda, a isenção das custas
processuais.
Apresentadas as contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o sucinto relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001156-25.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: LUZIA DA LUZ FRANCO
Advogado do(a) APELADO: ANTONIO CICALISE NETTO - MS4580-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado mostra-se formalmente regular,
motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação
(art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e
inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o e passo a apreciá-lo nos termos do artigo 1.011
do Código de Processo Civil.
A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos,
se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de atividade
rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal. Ademais, para a concessão de benefícios rurais, houve um
abrandamento no rigorismo da lei quanto à comprovação da condição de rurícola dos
trabalhadores do campo, permitindo-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até
mesmo dos pais aos filhos, ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os
cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da
atividade campesina não tenha se dado sob o regime de economia familiar.
Cumpre ressaltar que, em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social,
não se pode exigir dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições
previdenciárias, quando é de notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são
desenvolvidas, cumprindo aqui dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma
subordinação, haja vista que a contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos
chamados "gatos". Semelhante exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores
qualquer possibilidade de auferir o benefício conferido, em razão de sua atividade.
O art. 143 da Lei n.º 8.213/1991, com a redação dada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, dispõe
que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Quanto a se provar o efetivo exercício de atividade rural, o Superior Tribunal de Justiça considera
prescindível a abrangência de todo o período de carência previsto no art. 142 da Lei de
Benefícios pela prova material, desde que a prova testemunhal demonstre sua solidez, permitindo
sua vinculação ao tempo de carência. Tal solução, conhecida como "pro misero", se dá em
virtude da precariedade dos registros de vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda
comum em tempos recentes e bastante disseminada em outras épocas.
Saliento, ainda, que, segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp
1354908, em sede de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo
no momento em que completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade,
a fim de atender ao segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o
segurado especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 1957, comprovou o cumprimento do requisito
etário no ano de 2012. Assim, considerando que o implemento desse requisito se deu quando já
havia encerrada a prorrogação prevista no art. 143 da Lei de Benefícios, é necessária, após
31/12/2010, a comprovação do recolhimento de contribuições para os empregados rurais,
trabalhadores avulsos e diaristas, além da comprovação do cumprimento da carência de 180
meses, a teor do que dispõe o art. 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91, com vistas à concessão do
benefício.
No entanto, observo que, caso o labor campesino tenha se dado em regime de economia familiar
(segurado especial), cuja atividade não foi contemplada pela alteração da lei acima referida, o
trabalho rural poderá ser reconhecido sem a observação da alteração legal constante da Lei de
Benefícios. Essa é a hipótese ventilada na peça inaugural.
Cumpre salientar, por derradeiro, que o trabalho campesino exercido em regime de economia
familiar pressupõe a exploração de atividade primária pelo indivíduo, como principal forma de
sustento, acompanhado ou não pelo grupo familiar, mas sem o auxílio de empregados (art. 11,
VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91). Assim, nos termos do art. 11, VII, da Lei 8.213/91, consideram-se
segurados especiais, em regime de economia familiar, os produtores, parceiros, meeiros,
arrendatários rurais, pescadores artesanais e assemelhados, que exerçam atividades
individualmente ou com auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou
companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o
grupo familiar respectivo, residindo na área rural ou em imóvel próximo ao local onde a atividade
rural é exercida e com participação significativa nas atividades rurais do grupo familiar.
Na peça inaugural, a parte autora afirma, in litteris:
“(...)
A Autora é trabalhadora rural, contando atualmente com 61 anos de idade.
A requerente, como dito alhures, é TRABALHADORA RURAL, tendo vivido deste labor por toda
sua vida, no regime e de agricultura familiar.
A Autora Exa., inclusive já possui cadastro neste SAJ onde consta sua profissão de rurícola.
A requerente é divorciada de seu primeiro esposo, Mário Franco, também trabalhador rural, e,
após o divórcio, viveu em companhia de ADÃO PORFIRIO DA SILVA, igualmente trabalhador
rural, e aposentado como tal.
Adão Porfirio da Silva é falecido, tendo seu falecimento, ocorrido em 02/05/2013, no distrito de
Cipolândia, nesta cidade (certidão anexa).
Com ele não teve filhos, todavia sempre ostentaram o status de marido e mulher, assim sendo
reconhecidos onde viviam, perante a sociedade local, e dele dependia economicamente para sua
subsistência.
Apenas para demonstrar a veracidade dos fatos, as partes casaram-se no religioso em
31/12/2009, na cidade de Aquidauana - MS, consoante comprova certidão anexa, porém, desde
há muito tempo já viviam em união estável, laborando no campo, no regime de economia familiar.
Este fato também comprova e serve como prova de sua condição de trabalhadora rural, e,
portanto detentora do direto a tal beneficia.
Na condição de trabalhadora especial, sempre laborou na produção da terra, tendo comprovado,
documentalmente, o referido trabalho desde tenra idade, nunca se ausentando do meio rural
onde sempre trabalhou, a maior parte da sua vida como agricultora em regime de economia
familiar.
Sendo assim, na data de 29 de março de 2017, após ter completado 60 anos de idade e não
tendo mais condições de laborar, a autora requereu junto ao INSS no ano de 2018 sua
aposentadoria rural, que foi indeferida também neste ano de 2018. (doc. anexo)
Entretanto, a autora através de documentos em anexo comprova sua condição de trabalhadora
rural, e que está necessitando do auxilio de aposentadoria e que preenche os requisitos para a
obtenção da mesma, repete-se na condição de trabalhadora Rural.
Tal afirmação condiz com a verdade, uma vez que a mesma, como dito alhures, sempre trabalhou
em propriedade rural e hoje em dia o mesmo, ainda que sem qualquer condição física, em razão
da necessidade de prover seu sustento, com extrema dificuldade, labora no Sito Erval, no distrito
de Cipolândia no Município de Aquidauana/MS, trabalhando, em regime de economia familiar.
(...)”
A fim de comprovar o exercício de atividade rural, a autora apresentou:
- Certidão de Casamento da autora com Mario Franco, cujo enlace matrimonial ocorreu aos
29/09/1973, onde ele fora qualificado como “lavrador”. No entanto, na ocasião, ela se qualificou
na condição de “lides do lar”; consta no verso da referida certidão averbação demonstrando que o
casal em questão se divorciou, separação essa homologada por sentença prolatada em
26/03/1992;
- “Certificado de Matrimônio” da autora, firmado por um padre, onde consta que a autora teria se
casado em 31/12/2009, no Sítio Erval, com Adão Porfírio da Silva, não havendo no documento
qualquer outra qualificação das partes;
- Certidão de Matrimônio, firmada pelo padre da Paróquia Nossa Senhora Imaculada Conceição,
atestando que a autora teria se casado em 31/12/2009 com Adão Profírio da Silva em
31/12/2009, no Sítio Erval; de tal documento, não há qualquer qualificação profissional do casal;
- Declaração da Secretaria de Trabalho e Assistência Social do Governo do Mato Grosso do Sul,
datada de 21/05/2013, declarando que o Sr. Adão Porfírio da Silva, falecido em 02/05/2013, faz
parte da composição familiar do cadastro do Programa Vale Renda realizado em nome de sua
companheira Luiza da Luz Franco;
- Contrato celebrado entre o Sr. Adão Porfírio da Silva com a empresa de serviços póstumos PAX
UNIVERSAL, datado de 2005, onde consta a autora como dependente (esposa); no entanto,
observa-se de tal documento que ele residiria na Rua Cipolândia, em Aquidauana;
- Certidão de Óbito do Sr. Adão Porfírio da Silva, cujo falecimento ocorreu aos 02/05/2013 em
decorrência de eletrocussão – choque elétrico, no Sítio Erval;
- Ficha de atendimento médico (Saúde da Família), em nome da autora, contendo histórico de
seus atendimentos, em 2013, onde consta que ela residiria no Sítio Erval;
- Carta de exigências do INSS e Protocolo de pedido de pensão de morte relativo ao Sr. Adão
Porfírio da Silva, ambos de 22/05/2013, onde consta que a autora residiria no seguinte endereço:
Projetada um, quadra 342, lote 19, casa, bairro Alto – Aquidauana/MS;
- Carta de Indeferimento de seu pedido de aposentadoria por idade rural, onde consta o mesmo
endereço acima mencionado; no entanto, em formulário do INSS datado de 24/01/2018
(Requerimento de Benefício ou CTC), está consignado seu endereço como “Sítio Eval”;
- Declaração de Exercício de Atividade Rural do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Aquidauana/MS, datado de 18/01/2018, onde consta que a autora teria exercido a atividade rural,
em regime de economia familiar, de 26/10/2004 a 18/01/2018, em imóvel rural de sua propriedade
e de demais condôminos (Sítio Erval);
- Declaração de trabalho rural prestada pela autora junto ao INSS, postulando o reconhecimento
do mesmo interregno acima mencionado;
- Escritura Pública de Compra e Venda de um imóvel, datada de 26/10/2004, onde conta que a
autora e sua genitora e irmãos adquiriram um imóvel rural com cerca de 175 hectares de
Naturama Agro-Pecuária Ltda. No referido documento, a autora está qualificada como divorciada
e “do lar”;
- No CAFIR (Cadastro de Imóveis Rurais), consta como contribuinte do referido imóvel o Sr.
Constâncio da Luz (irmão da autora) e como demais condôminos do imóvel: AUGUSTA DE O. DA
LUZ, DORALINO OLIVEIRA, ALÍSIO FRANCO, MARTA DA LUZ FRANCO, LUZIA DA LUZ
FRANCO, HELIA DA LUZ, MERCISE DA LUZ, DERCI DA LUZ SOUZA, PEDRO DA LUZ E
ANICETO DA LUZ, cabendo a cada qual sua cota-parte. A mesma informação consta dos ITR’s
apresentados do imóvel em questão, dos anos de 2005 a 2017.
Quanto à prova testemunhal, pacificado no C. Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que
apenas esta não basta, isoladamente, para a comprovação da atividade rural, requerendo a
existência de início razoável de prova material, conforme entendimento cristalizado na Súmula
149, que assim dispõe: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da
atividade rurícola, para efeito da obtenção do benefício previdenciário".
Em depoimento pessoal, a autora disse que mora no Sítio Erval, tendo nascido e se criado lá,
onde permanece até hoje. Afirmou que reside com dois irmãos no local. Esclareceu que o
endereço relacionado à Travessa Projetada é o endereço da filha da postulante. Disse que o sítio
em questão pertence a ela e seus irmãos.
A testemunha Narciso Franco disse conhecer a autora há cerca de 55 anos, pois seria seu
vizinho. Disse que ela permanece morando no local, mas não sabe se a filha dela reside na
cidade. Disse que, pelo que sabe, os familiares trabalham na propriedade, não conseguindo
esclarecer se há empregados no local. Por fim, disse que a família vende o excedente de sua
produção na cidade.
A testemunha José Marques da Silva disse conhecer a autora por meio da filha dela. Disse
comprar dela queijos, doces e rapadura, que a autora traz quando ela vem até a cidade para
fazer compras. Disse que nunca a viu morando na cidade.
Por sua vez, a testemunha Moacir Pereira de Melo disse que possui uma propriedade rural
próximo de onde ela reside. Afirmou que a autora sempre morou naquele local e que a família
trabalha na lavoura, com plantação, e também possui criação de porcos/galinhas. Disse que ela
tem filhos e todos moram no local. Disse que no local o trabalho é de subsistência e a área do
Sítio Erval é pequena. Esclareceu, ao ser indagado nesse sentido, que a autora tem uma filha
que mora na cidade e nunca soube que ela tenha morado em outra localidade que não seja o
sítio em questão.
Pois bem.
Feitas tais observações, entendo que o conjunto probatório não se mostrou robusto o suficiente
para apoiar, de forma consistente, a hipótese trazida pela exordial. De fato, a propriedade rural
possui um tamanho elevado (175 hectares), superior a 4 módulos fiscais, e a autora afirmou que
mora no local com apenas 2 irmãos. Nesse ponto, pouco crível que apenas três pessoas possam
exercer a alegada campesina, sem o auxílio de maquinários e/ou funcionários, plantando,
colhendo, cuidando de animais, tirando leite, fazendo doces e rapaduras, entre outras atividades.
Ao contrário do que disse a testemunha Moacir, os filhos da autora não moram no local, pois ela
mesma não consignou a presença de sua prole residindo no sítio por ocasião de seu depoimento
pessoal.
O elemento essencial identificador da qualidade de segurado especial, para o fim da proteção
extraordinária de segurado não contribuinte pelo Regime Geral de Previdência Social, é o
exercício das atividades especificadas na lei em regime de economia familiar, indispensavelmente
voltado à subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico da família, em condições de mútua
dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes, em área não superior
a quatro módulos fiscais, situação essa não adequadamente comprovada no caso em análise.
Nas declarações feitas pelo Sindicato e para o INSS, a parte autora somente vindica sua
condição de trabalhadora rural a partir de 26/10/2004. Nesse ponto, oportuno observar que, de tal
data até os dias atuais, não se configura a carência necessária para obtenção da benesse
pretendida (15 anos).
Na Certidão de Casamento com Mario Franco, cujo enlace matrimonial ocorreu aos 29/09/1973,
ela fora qualificada como “lides do lar”; e na escritura de aquisição do Sítio Erval, em 10/2004,
como “do lar”. Nunca como trabalhadora rural. Aliás, mesmo depois de estabelecer um novo
relacionamento marital com Adão Porfírio, não é possível afirmar que ela tenha exercido a
atividade rural no local. Na narrativa constante da exordial, é afirmado, categoricamente, que a
autora dependia economicamente de seu novo companheiro para sua subsistência, o que é
estranho, já que, além de perceber um benefício assistencial do Governo do Estado do Mato
Grosso do Sul (Programa Vale Renda), trabalharia no sítio em regime de economia familiar para
suprir suas necessidades básicas. Entendo, desse modo, que quem se sustenta por meio do
próprio trabalho, não dependeria exclusivamente do cônjuge para sobreviver.
E em que pese ser possível, apesar da controvérsia instalada, que ela sempre tenha residido no
sítio e nunca na cidade, isso não conduz ao entendimento de que exerceria no local a atividade
rural, propriamente dita. Como bem salientado pela peça recursal, a simples propriedade rural
não pressupõe o exercício de atividade campesina no local, nem mesmo conduz ao entendimento
que todos os condôminos ou moradores façam as tarefas rotineiras do campo.
A ausência de notas fiscais de compra/venda de insumos produtos também é sinal indicativo de
que a situação ventilada pela peça inaugural possa não corresponder com a realidade dos fatos.
A prova oral, por sua vez, não foi suficiente para alterar tal entendimento, pois, em seus relatos,
observa-se que as testemunhas, genéricas e imprecisas, não possuem elementos para afirmar
quem, efetivamente, trabalha no local, e o que cada pessoa faria na localidade.
Assim, por não se desincumbir do ônus probatório que lhe competia, não restando comprovado
que a autora tenha exercido a atividade campesina em regime de economia familiar, pelo período
necessário de carência e, também, no período imediatamente anterior ao implemento do requisito
etário/requerimento administrativo, a reforma da r. sentença é medida imperativa.
Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP).
Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito previdenciário da parte autora,
a extinção do processo sem julgamento do mérito.
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), cuja
exigibilidade observará o disposto no artigo 12 da Lei nº 1.060/1950 (artigo 98, § 3º, do Código de
Processo Civil/2015), por ser beneficiária da justiça gratuita.
Por esses fundamentos, dou parcial provimento à apelação do INSS para extinguir o processo
sem resolução do mérito, com fundamento no art. 485, IV, do CPC.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO ATINGIDOS.
CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA.
PROCESSO EXTINTO. ART. 485, IV, DO CPC. TUTELA REVOGADA.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
2. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
4. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
5. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
6. Por não se desincumbir do ônus probatório que lhe competia, não restando comprovado que a
autora tenha exercido a atividade campesina em regime de economia familiar, pelo período
necessário de carência e, também, no período imediatamente anterior ao implemento do requisito
etário/requerimento administrativo, a reforma da r. sentença é medida que se impõe.
7. Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP). Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito
previdenciário da parte autora, a extinção do processo sem julgamento do mérito.
8. Apelação do INSS parcialmente provida. Processo extinto.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS para extinguir o processo sem
resolução do mérito, com fundamento no art. 485, IV, do CPC, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
