Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5004192-12.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
07/08/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 20/08/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO ATINGIDOS.
CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. EXTINÇÃO DO FEITO MANTIDA. APELAÇÃO DA
PARTE AUTORA IMPROVIDA.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
2. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
4. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
5. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
6. Feitas tais considerações, entendo, tal como a r. sentença de primeiro grau, que o conjunto
probatório é parco, frágil e insuficiente para comprovação de eventual atividade campesina da
autora, pelo período de carência necessário, considerando que todos os documentos
apresentados foram produzidos apenas em 2012 (próximo ao implemento do requisito etário) e a
ficha de atendimento médico apresenta evidente rasura no campo relacionado à profissão da
demandante, como bem apontado em sede de contrarrazões. A prova testemunhal, como já
consignado, não possui o condão de, isoladamente, comprovar suas alegações.
7. Assim, considerando que o conjunto probatório foi insuficiente à comprovação da atividade
laborativa rurícola vindicada, a manutenção da r. sentença de extinção do feito é medida que se
impõe, esclarecendo, novamente, que o entendimento consolidado pelo C. STJ, em julgado
proferido sob a sistemática de recursos repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973 é no
sentido de que a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito, propiciando ao autor intentar novamente a ação, caso reúna os
elementos necessários.
8. Sentença de extinção mantida. Apelação da parte autora improvida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004192-12.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: CELINA FERREIRA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: ALYSSON DA SILVA LIMA - MS11852-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004192-12.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: CELINA FERREIRA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: ALYSSON DA SILVA LIMA - MS11852-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pela parte autora contra a r. sentença de primeiro grau que julgou
extinto o processo, sem resolução de mérito, na forma do artigo 485, inciso IV, do Código de
Processo Civil. Condenou a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários
advocatícios, esses fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, com fundamento no
parágrafo 2º do artigo 85 do CPC, observando que a exigibilidade de tais verbas ficará suspensa,
na forma do art. 98, §3º, do mesmo código processual.
Sustenta o recorrente, em suas razões recursais e em apertada síntese, o preenchimento dos
requisitos necessários à concessão da benesse pretendida, alegando ter apresentado início de
prova material suficiente para a comprovação de suas alegações, o qual foi corroborado pela
prova testemunhal produzida. Requer, nesses termos, a reforma da r. sentença para julgar
procedente o pleito inaugural.
Com as contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004192-12.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: CELINA FERREIRA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: ALYSSON DA SILVA LIMA - MS11852-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado mostra-se formalmente regular,
motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação
(art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e
inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o e passo a apreciá-lo nos termos do artigo 1.011
do Código de Processo Civil.
A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos,
se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), bem como a demonstração do exercício de
atividade rural, além do cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei (art.
201, § 7º, II, da CF/88 e arts. 48, 49, 142 e 143, da Lei nº 8.213/91).
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal. Ademais, para a concessão de benefícios rurais, houve um
abrandamento no rigorismo da lei quanto à comprovação da condição de rurícola dos
trabalhadores do campo, permitindo a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até
mesmo dos pais para os filhos, ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os
cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da
atividade campesina não tenha se dado sob o regime de economia familiar.
Cumpre ressaltar que, em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social,
não se pode exigir dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições
previdenciárias, quando é de notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são
desenvolvidas, cumprindo aqui dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma
subordinação, haja vista que a contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos
chamados "gatos". Semelhante exigência equivaleria a retirar destes qualquer possibilidade de
auferir o benefício conferido em razão de sua atividade.
O art. 143 da Lei n.º 8.213/1991, com redação determinada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995,
dispõe que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Saliento, ainda, que, segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp
1354908, em sede de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo
no momento em que completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade,
a fim de atender ao segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o
segurado especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 1959, comprovou o cumprimento do requisito
etário no ano de 2014. Assim, considerando que o implemento desse requisito se deu quando já
havia encerrada a prorrogação prevista no art. 143 da Lei de Benefícios, é necessária, após
31/12/2010, a comprovação do recolhimento de contribuições para os empregados rurais,
trabalhadores avulsos e diaristas, além da comprovação do cumprimento da carência de 180
meses, a teor do que dispõe o art. 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91, com vistas à concessão do
benefício.
No entanto, observo que, caso o labor campesino tenha se dado em regime de economia familiar,
cuja atividade não foi contemplada pela alteração da lei acima referida, o trabalho rural poderá ser
reconhecido sem a observação da alteração legal constante da Lei de Benefícios. Essa é a
hipótese ventilada na peça inaugural, em especial após o ano de 2012.
Observe-se, por derradeiro, que o referido regime pressupõe a exploração de atividade primária
pelo indivíduo, como principal forma de sustento, acompanhado ou não pelo grupo familiar, mas
sem o auxílio de empregado s (art. 11, VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91). Assim, nos termos do art.
11, VII, da Lei 8.213/91, consideram-se segurados especiais, em regime de economia familiar, os
produtores, parceiros, meeiros, arrendatários rurais, pescadores artesanais e assemelhados, que
exerçam atividades individualmente ou com auxílio eventual de terceiros, bem como seus
respectivos cônjuges ou companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde que trabalhem,
comprovadamente, com o grupo familiar respectivo, residindo na área rural ou em imóvel próximo
ao local onde a atividade rural é exercida e com participação significativa nas atividades rurais do
grupo familiar.
Pois bem.
Na exordial, a parte autora afirma que, in litteris:
“(...)
O Peticionário nasceu em 10 de junho de 1959, completando 55 (cinqüenta e cinco) anos de
idade no ano de 2014. Idade esta necessária para se aposentar como segurada especial –
trabalhador rural que sempre fora.
Ao completar os requisitos legais para a concessão do Beneficio de Aposentadoria por Idade
Rural nos termos da Lei 8213/91, a parte Autora ingressou com pedido administrativo junto ao
INSS em 17/09/2014.
Levando toda documentação competente para o deferimento do seu pleito.
No entanto para o seu espanto a Autarquia Federal, injustamente negou o pedido administrativo
de Aposentadoria, alegando o não cumprimento da carência nos termos do art. 142 da Lei
8213/91 para a concessão do Beneficio de Aposentadoria por Idade Rural.
Porem Excelência como de costume a Autarquia- Ré faz exigência de provas minuciosa dos anos
de labor rural, exercidos pelos segurados especiais, ignorando a simplicidade das pessoas do
campo e a informalidade nas contrações de mão de obra nas lides campesinas.
No entanto acompanha esta Peça Vestibular, toda documentação necessária no intuito de provar
o seu labor campesino de longa data.
Nas próximas linhas será cabalmente demonstrado o preenchimento por parte da demandante
dos requisitos legais para a concessão do beneficio de aposentadoria por idade rural, já que
desde a infância, labora no campo e até o presente momento.
A Peticionaria, desde infante, na companhia dos pais, labora no meio campesino, a família
possuía uma chácara na região do Rio do Peixe município de Rio Negro (MS).
Após foi laborar na propriedade rural do Sr Francisco, localizada na mesma região da chácara
dos seus pais, permaneceu ali exercendo atividade campesina por longos 20 (vinte ) anos,
plantando milho feijão e mandioca.
Depois laborou na propriedade rural do Sr Agenor Correia onde também plantava milho feijão e
mandioca. Depois laborou na propriedade do Sr Valdeci onde crivava pequenos animais (galinha
e porco) bem como cultivava hortifrutigranjeiro.
Trabalho nas terras do Sr Teruo Higashi, cultivando milho.
A partir do ano de 2012, firmou contrato de comodato com o Sr. Luiz Gonçalves, onde utiliza a
Chacara Vista Alegre para plantar mandioca, milho, hortifrutigranjeiro para fins de sustento
básico.
Repisa-se Excelência a Requerente jamais saiu do meio rural, laborando todos esses anos na
qualidade de segurado especial do INSS.
Sendo que a documentação acostada, é robusta em apontar o labor campesino de longa data da
Requerente, evidenciando o ato expurio da autarquia federal, ao negar o Beneficio de
Aposentadoria por Idade.
Portanto não pode prosperar a missiva negativa do INSS, que ao arrepio da legislação
previdenciária bem como da doutrina dominante, negou o justo beneficio de Aposentadoria por
Idade rural ao Requerente.
Excelência, pelo manuseio dos autos, e analise da documentação acostada, somados aos
testemunhos de pessoas idôneas que presenciaram por todos esses anos o labor rural do
requerente, não restará duvida que a Autora atingiu com folga o tempo exigido por lei para se
aposentar como rurícola, uma vez que a autora desde criança labora no meio rural em regime de
economia familiar, sendo que primeiramente laborou com o seu pais e irmãos e de forma
individual por longos anos e hoje labora ao lado seu esposo.
(...)”
Para comprovar o início de prova material, a parte autora apresentou, apenas:
- Carteira do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Rio Negro/MS, no qual consta sua filiação
em 22/11/2012;
- Recibo de pagamento de inscrição/mensalidade no referido Sindicato, datado de 20/12/2012;
- ficha de atendimento de médico da autora, onde, em sua profissão, consta como “trabalhadora
rural”, com aparente rasura no campo referido;
- Instrumento Particular de Contrato de Comodato Rural, com data de 01/08/2012, onde consta
que a autora teria recebido uma área de 2 hectares para plantio de milho, feijão e mandioca, a
título gratuito.
Quanto à prova testemunhal, a jurisprudência do E. STJ firmou-se no sentido de que ela,
isoladamente, é insuficiente para a comprovação de atividade rural vindicada, na forma da
Súmula 149 - STJ, in verbis:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à com provação da atividade rurícola, para efeito
de obtenção de benefício previdenciário.".
Pois bem.
Feitas tais considerações, entendo, tal como a r. sentença de primeiro grau, que o conjunto
probatório é parco, frágil e insuficiente para comprovação de eventual atividade campesina da
autora, pelo período de carência necessário, considerando que todos os documentos
apresentados foram produzidos apenas em 2012 (próximo ao implemento do requisito etário) e a
ficha de atendimento médico apresenta evidente rasura no campo relacionado à profissão da
demandante, como bem apontado em sede de contrarrazões. A prova testemunhal, como já
consignado, não possui o condão de, isoladamente, comprovar suas alegações.
Assim, considerando que o conjunto probatório foi insuficiente à comprovação da atividade
laborativa rurícola vindicada, a manutenção da r. sentença de extinção do feito é medida que se
impõe, esclarecendo, novamente, que o entendimento consolidado pelo C. STJ, em julgado
proferido sob a sistemática de recursos repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973 é no
sentido de que a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito, propiciando ao autor intentar novamente a ação, caso reúna os
elementos necessários.
Por oportuno, transcrevo:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR
IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA
ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E
DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO
DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE DOS
ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO ESPECIAL
DO INSS DESPROVIDO.
1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os seus
procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas
previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em conta
os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto social
adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários.
2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais da
Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência
Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a
parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização
dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica
previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as
normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação
previdenciária a que faz jus o segurado.
3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística
civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar
prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas
demandas.
4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual
garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir
como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo
certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente
dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura
previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela
via da assistência social.
5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do
CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo,
impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente
possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos
necessários à tal iniciativa.
6. Recurso Especial do INSS desprovido". (REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES
MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016).
Determino, por fim, a majoração da verba honorária em 2% (dois por cento) a título de
sucumbência recursal, nos termos do §11 do artigo 85 do CPC/2015, observando-se a justiça
gratuita concedida.
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora, nos termos deste arrazoado.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO ATINGIDOS.
CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. EXTINÇÃO DO FEITO MANTIDA. APELAÇÃO DA
PARTE AUTORA IMPROVIDA.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
2. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
4. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
5. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
6. Feitas tais considerações, entendo, tal como a r. sentença de primeiro grau, que o conjunto
probatório é parco, frágil e insuficiente para comprovação de eventual atividade campesina da
autora, pelo período de carência necessário, considerando que todos os documentos
apresentados foram produzidos apenas em 2012 (próximo ao implemento do requisito etário) e a
ficha de atendimento médico apresenta evidente rasura no campo relacionado à profissão da
demandante, como bem apontado em sede de contrarrazões. A prova testemunhal, como já
consignado, não possui o condão de, isoladamente, comprovar suas alegações.
7. Assim, considerando que o conjunto probatório foi insuficiente à comprovação da atividade
laborativa rurícola vindicada, a manutenção da r. sentença de extinção do feito é medida que se
impõe, esclarecendo, novamente, que o entendimento consolidado pelo C. STJ, em julgado
proferido sob a sistemática de recursos repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973 é no
sentido de que a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito, propiciando ao autor intentar novamente a ação, caso reúna os
elementos necessários.
8. Sentença de extinção mantida. Apelação da parte autora improvida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
