Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5002675-69.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
07/05/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 17/05/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO ATINGIDOS.
CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. RESP
REPETITIVO 1352721/SP. ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA MANTIDO. APELAÇÃO DA PARTE
AUTORA PREJUDICADA.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
2. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
benefício conferido, em razão de sua atividade.
4. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
5. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
6. Feitas tais considerações, considero, tal qual a r. sentença de primeiro grau, que o conjunto
probatório, frágil tanto em relação ao início de prova material apresentado como pela prova oral
produzida, não se mostrou apto a indicar que a autora tenha exercido o trabalho rural pelo
período de carência necessário à obtenção da benesse requerida, porquanto não restou
comprovado seu trabalho rural, nem na condição de boia-fria (o que demandaria, ainda, o
recolhimento de certa quantidade de contribuições previdenciárias a partir de 2011, situação
inocorrente no processado), nem como exercido em regime de economia familiar, pois verifica-se
do processado que o esposo da autora sempre foi empregado, o que afastaria, em tese, a
hipótese de atividade campesina em regime de subsistência.
7. Assim, considerando que o conjunto probatório foi insuficiente à comprovação da atividade
laborativa pelo período previsto em lei, seria o caso de se julgar improcedente a ação, não tendo
a parte autora se desincumbido do ônus probatório que lhe cabe, ex vi do art. 373, I, do
CPC/2015. Entretanto, o entendimento consolidado pelo C. STJ, em julgado proferido sob a
sistemática de recursos repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973 é no sentido de que a
ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, implica a carência de pressuposto de
constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do
mérito, propiciando ao autor intentar novamente a ação, caso reúna os elementos necessários.
8. Mantenho, por fim, a condenação da parte autora no pagamento dos honorários advocatícios,
observados os benefícios da assistência judiciária gratuita (arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei
1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC), já que deu causa à extinção do processo
sem resolução do mérito.
9. Processo extinto de ofício. Apelação da parte autora prejudicada.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002675-69.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: DORACI RUBITALTI AMORIM
Advogado do(a) APELANTE: RUBENS DARIO FERREIRA LOBO JUNIOR - PR29759-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002675-69.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: DORACI RUBITALTI AMORIM
Advogado do(a) APELANTE: RUBENS DARIO FERREIRA LOBO JUNIOR - PR29759-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pela parte autora contra a r. sentença de primeiro grau que julgou
improcedente o pedido formulado na exordial, com resolução de mérito, na forma do artigo 487, I,
do CPC. Condenou a autora ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios,
fixados em R$ 500,00, suspendendo a exigibilidade da cobrança desses valores, pois a autora
litiga ao abrigo da justiça gratuita.
Sustenta a apelante, em suas razões recursais e em apertada síntese, o preenchimento dos
requisitos exigidos para a concessão do benefício pleiteado, porquanto alega ter apresentado
prova material suficiente, corroborada por testemunhos válidos, em regime de economia familiar,
na condição de boia-fria.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o sucinto relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002675-69.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: DORACI RUBITALTI AMORIM
Advogado do(a) APELANTE: RUBENS DARIO FERREIRA LOBO JUNIOR - PR29759-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos,
se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de atividade
rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal. Ademais, para a concessão de benefícios rurais, houve um
abrandamento no rigorismo da lei quanto à comprovação da condição de rurícola dos
trabalhadores do campo, permitindo-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até
mesmo dos pais aos filhos, ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os
cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da
atividade campesina não tenha se dado sob o regime de economia familiar.
Cumpre ressaltar que, em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social,
não se pode exigir dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições
previdenciárias, quando é de notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são
desenvolvidas, cumprindo aqui dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma
subordinação, haja vista que a contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos
chamados "gatos". Semelhante exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores
qualquer possibilidade de auferir o benefício conferido, em razão de sua atividade.
O art. 143 da Lei n.º 8.213/1991, com a redação dada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, dispõe
que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Quanto a se provar o efetivo exercício de atividade rural, o Superior Tribunal de Justiça considera
prescindível a abrangência de todo o período de carência previsto no art. 142 da Lei de
Benefícios pela prova material, desde que a prova testemunhal demonstre sua solidez, permitindo
sua vinculação ao tempo de carência. Tal solução, conhecida como "pro misero", se dá em
virtude da precariedade dos registros de vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda
comum em tempos recentes e bastante disseminada em outras épocas.
Saliento, ainda, que, segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp
1354908, em sede de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo
no momento em que completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade,
a fim de atender ao segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o
segurado especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 1957, comprovou o cumprimento do requisito
etário no ano de 2012. Assim, considerando que o implemento do requisito em questão se deu
quando já havia encerrada a prorrogação prevista no art. 143, da Lei de Benefícios, é necessário,
após 31/12/2010, a comprovação do recolhimento de contribuições para os empregados rurais,
trabalhadores avulsos e diaristas e o cumprimento da carência de 180 meses, a teor do que
dispõe o art. 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91, existindo a necessidade de comprovação de
recolhimentos de contribuições previdenciárias a fim de ser concedido o benefício.
No entanto, observo que, caso o labor campesino tenha se dado em regime de economia familiar,
cuja atividade não foi contemplada pela alteração da lei acima referida, o trabalho rural poderá ser
reconhecido sem a observação da alteração legal constante da Lei de Benefícios.
Observe-se, por derradeiro, que o referido regime pressupõe a exploração de atividade primária
pelo indivíduo, como principal forma de sustento, acompanhado ou não pelo grupo familiar, mas
sem o auxílio de empregado s (art. 11, VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91). Assim, nos termos do art.
11, VII, da Lei 8.213/91, consideram-se segurados especiais, em regime de economia familiar, os
produtores, parceiros, meeiros, arrendatários rurais, pescadores artesanais e assemelhados, que
exerçam atividades individualmente ou com auxílio eventual de terceiros, bem como seus
respectivos cônjuges ou companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde que trabalhem,
comprovadamente, com o grupo familiar respectivo, residindo na área rural ou em imóvel próximo
ao local onde a atividade rural é exercida e com participação significativa nas atividades rurais do
grupo familiar.
Pois bem. No presente caso, a autora afirma na exordial, apenas, que:
“(...)
A Autora, nascida em 22 de abril de 1957, atualmente com mais de 59 anos de idade, laborou na
atividade rural desde longeva data juntamente com seu esposo Sr. Pedro de Souza Amorim. Tal
situação permanece até hoje. Destaca-se que em nenhum momento houve afastamento das
atividades do campo.
(...)”
A fim de comprovar o exercício de atividade rural, a autora apresentou Certidão de Nascimento
de seu filho Gilmar, ocorrido em 1975, onde consta o marido da postulante qualificado como
“lavrador”, embora a requerente esteja ali qualificada como “do lar”; documentos relacionados ao
Assentamento Água Viva, aparentemente recibos, onde consta a autora como assentada no lote
nº 148, firmados por terceira pessoa (Zulema Aparecida Amorim Ribeiro Paz - ID 2009431 –
págs. 15/16); nota fiscal de venda de gado, onde constam a autora e seu esposo como
remetentes, datada de 2011, relativo ao lote 148 do assentamento já mencionado, constando
terceira pessoa como “produtor” (Zulema Aparecida Amorim Ribeiro Paz); outro documento
relacionado ao lote 148, onde consta que a área total por família é de 8,3 hectares e o
investimento aplicado será de R$ 20.000,00 (ID 2009431 – p[ag. 19), também firmada por terceira
pessoa (Zulema Aparecida Amorim Ribeiro Paz); guia de transferência escolar de sua filha Sueli,
de 1980, no qual não consta a atividade laborativa dos genitores; e fichas de atendimento
ambulatorial da Secretaria Municipal de Saúde de Tacuru, onde consta que a autora residiria em
bairro rural (do ano de 2011). Por fim, em sede de contestação, foi apresentado o CNIS do
esposo da parte autora, onde consta que ele, desde 1985, trabalha exclusivamente com registro
formal de trabalho, estando aposentado por idade desde 2007 e, mesmo aparentemente
ocupando um lote de assentamento, possuiu registro formal de trabalho, junto à empresa Agronil
Agropecuária Nova Invernada S/A, de 01/02/2011 a 30/04/2014.
Quanto à prova testemunhal, pacificado no C. Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que
apenas esta não basta, isoladamente, para a comprovação da atividade rural, requerendo a
existência de início razoável de prova material, conforme entendimento cristalizado na Súmula
149, que assim dispõe: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da
atividade rurícola, para efeito da obtenção do benefício previdenciário".
A testemunha Benedito dos Santos, que foi administradora da Fazenda Santa Magdalena, disse
que conhece a autora há cerca de 18 anos, pois o marido dela trabalhou naquele local, onde a
autora ajudaria nas atividades; afirmou que eles ficaram trabalhando naquele local até 2012,
quando então se mudaram para um assentamento onde o casal teria continuado a trabalhar das
lides campesinas. Esclareceu que o autor encontra-se adoentado atualmente e que a autora fazia
diárias esporádicas na Fazenda Santa Magdalena, observando que eram emitidos recibos dessas
tais “diárias”, mas não sabe dizer se a autora chegou a apresentá-los no processado. Por sua
vez, a testemunha Angélica Soltovski de Souza disse que conhece a autora desde 1983, da
Fazenda Pinheirinho. Afirmou que a autora possui, hodiernamente, uma casinha na cidade, e que
o casal encontra-se residindo ali, em razão de tratamento de saúde que seu esposo está
realizando. Afirmou, por fim, que eles possuem um pequeno lote de assentamento e que eles
ficam residindo um pouco de tempo no referido lote e um pouco de tempo na cidade, havendo
pessoas que tomam conta do referido lote para eles.
Feitas tais considerações, considero, tal qual a r. sentença de primeiro grau, que o conjunto
probatório, frágil tanto em relação ao início de prova material apresentado como pela prova oral
produzida, não se mostrou apto a indicar que a autora tenha exercido o trabalho rural pelo
período de carência necessário à obtenção da benesse requerida, porquanto não restou
comprovado seu trabalho rural, nem na condição de boia-fria (o que demandaria, ainda, o
recolhimento de certa quantidade de contribuições previdenciárias a partir de 2011, situação
inocorrente no processado), nem como exercido em regime de economia familiar, pois verifica-se
do processado que o esposo da autora sempre foi empregado, o que afastaria, em tese, a
hipótese de atividade campesina em regime de subsistência.
Assim, considerando que o conjunto probatório foi insuficiente à comprovação da atividade
laborativa pelo período previsto em lei, seria o caso de se julgar improcedente a ação, não tendo
a parte autora se desincumbido do ônus probatório que lhe cabe, ex vi do art. 373, I, do
CPC/2015.
Entretanto, o entendimento consolidado pelo C. STJ, em julgado proferido sob a sistemática de
recursos repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973 é no sentido de que a ausência de
conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, implica a carência de pressuposto de constituição e
desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito,
propiciando ao autor intentar novamente a ação, caso reúna os elementos necessários.
Por oportuno, transcrevo:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR
IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA
ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E
DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO
DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE DOS
ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO ESPECIAL
DO INSS DESPROVIDO.
1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os seus
procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas
previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em conta
os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto social
adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários.
2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais da
Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência
Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a
parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização
dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica
previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as
normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação
previdenciária a que faz jus o segurado.
3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística
civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar
prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas
demandas.
4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual
garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir
como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo
certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente
dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura
previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela
via da assistência social.
5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do
CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo,
impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente
possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos
necessários à tal iniciativa.
6. Recurso Especial do INSS desprovido". (REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES
MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016).
Mantenho, por fim, a condenação da parte autora no pagamento dos honorários advocatícios,
observados os benefícios da assistência judiciária gratuita (arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei
1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC), já que deu causa à extinção do processo
sem resolução do mérito.
Ante o exposto, DE OFÍCIO, extingo o processo, sem resolução do mérito, com fulcro no art. 485,
IV do CPC/2015, diante da não comprovação do trabalho rural, julgando prejudicado o apelo da
parte autora, nos termo deste arrazoado.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO ATINGIDOS.
CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. RESP
REPETITIVO 1352721/SP. ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA MANTIDO. APELAÇÃO DA PARTE
AUTORA PREJUDICADA.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
2. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
4. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
5. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
6. Feitas tais considerações, considero, tal qual a r. sentença de primeiro grau, que o conjunto
probatório, frágil tanto em relação ao início de prova material apresentado como pela prova oral
produzida, não se mostrou apto a indicar que a autora tenha exercido o trabalho rural pelo
período de carência necessário à obtenção da benesse requerida, porquanto não restou
comprovado seu trabalho rural, nem na condição de boia-fria (o que demandaria, ainda, o
recolhimento de certa quantidade de contribuições previdenciárias a partir de 2011, situação
inocorrente no processado), nem como exercido em regime de economia familiar, pois verifica-se
do processado que o esposo da autora sempre foi empregado, o que afastaria, em tese, a
hipótese de atividade campesina em regime de subsistência.
7. Assim, considerando que o conjunto probatório foi insuficiente à comprovação da atividade
laborativa pelo período previsto em lei, seria o caso de se julgar improcedente a ação, não tendo
a parte autora se desincumbido do ônus probatório que lhe cabe, ex vi do art. 373, I, do
CPC/2015. Entretanto, o entendimento consolidado pelo C. STJ, em julgado proferido sob a
sistemática de recursos repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973 é no sentido de que a
ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, implica a carência de pressuposto de
constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do
mérito, propiciando ao autor intentar novamente a ação, caso reúna os elementos necessários.
8. Mantenho, por fim, a condenação da parte autora no pagamento dos honorários advocatícios,
observados os benefícios da assistência judiciária gratuita (arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei
1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC), já que deu causa à extinção do processo
sem resolução do mérito.
9. Processo extinto de ofício. Apelação da parte autora prejudicada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu DE OFÍCIO, extinguir o processo, sem resolução do mérito, com fulcro no
art. 485, IV do CPC/2015, diante da não comprovação do trabalho rural, julgando prejudicado o
apelo da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
