Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5000193-51.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
25/09/2018
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 04/10/2018
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO ATINGIDOS.
INÍCIO DE PROVA MATERIAL INSUFICIENTE. PROVA ORAL INAPTA À COMPROVAÇÃO DAS
ALEGAÇÕES. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA. TUTELA REVOGADA. DEVOLUÇÃO DOS
VALORES RECEBIDOS A TITULO DE TUTELA DETERMINADA.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
2. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
4. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
5. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
6. No entanto, observo que, caso o labor campesino tenha se dado em regime de economia
familiar, cuja atividade não foi contemplada pela alteração da lei acima referida, o trabalho rural
poderá ser reconhecido sem a observação da alteração legal constante da Lei de Benefícios.
Essa é a hipótese trazida pela exordial.
7. Cumpre salientar, por derradeiro, que o referido regime pressupõe a exploração de atividade
primária pelo indivíduo, como principal forma de sustento, acompanhado ou não pelo grupo
familiar, mas sem o auxílio de empregados (art. 11, VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91). Assim, nos
termos do art. 11, VII, da Lei 8.213/91, consideram-se segurados especiais, em regime de
economia familiar, os produtores, parceiros, meeiros, arrendatários rurais, pescadores artesanais
e assemelhados, que exerçam atividades individualmente ou com auxílio eventual de terceiros,
bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde
que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo, residindo na área rural ou em
imóvel próximo ao local onde a atividade rural é exercida e com participação significativa nas
atividades rurais do grupo familiar.
8. Dessa forma, diante da precariedade/insuficiência do início de prova material acostado aos
autos para comprovação do exercício de suposto trabalho campesino, não servindo a prova
testemunhal exclusivamente para tal finalidade, aliado ao fato de restar desconfigurado o regime
de economia familiar, entendo ausentes os requisitos necessários à concessão da benesse
vindicada, motivo pelo qual a reforma da r. sentença é medida que se impõe. (...) Por fim, revogo
a antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida e, tendo em vista o quanto decidido
pelo C. STJ, por ocasião do julgamento do REsp1.401.560/MT, processado segundo o rito do
artigo 543-C do CPC de 1973, determino a devolução dos valores recebidos pela parte autora por
força de tutela antecipada.
9. Apelação do INSS provida.
Acórdao
APELAÇÃO (198) Nº 5000193-51.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ELIZABETE TEXEIRA DE CASTRO
Advogado do(a) APELADO: ARNO ADOLFO WEGNER - MS12714-A
APELAÇÃO (198) Nº 5000193-51.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ELIZABETE TEXEIRA DE CASTRO
Advogado do(a) APELADO: ARNO ADOLFO WEGNER - MS1271400A
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra a r. sentença de primeiro grau que julgou
procedente o pedido inicial para, com fundamento nos artigos 48, 142 e 143, da Lei n.º 8.213/91,
determinar a implantação da aposentadoria por idade à parte requerente, na condição de
trabalhador rural, no valor de 01 (um) salário mínimo mensal, a contar da data do requerimento
administrativo, ou seja, em 15.1.2014, com abono anual, em dezembro, também no valor de 01
(um) salário mínimo. Consignou que, em razão da natureza alimentar, as prestações em atraso
deverão ser pagas de uma só vez. Destacou que a correção monetária incidirá sobre as
prestações em atraso desde as respectivas competências, na forma da legislação de vigência,
observando-se que a partir de 11.8.2006 deve ser considerado o INPC como índice de
atualização, conforme artigo 31 da Lei 10.741/2003 c.c. artigo 41-A da Lei 8.2013/91, não se
aplicando à correção monetária as disposições da Lei 11.960/09 (AgRg no REsp 1285274/CE e
REsp 1270439/PE) e que os juros de mora incidirão conforme disposto no Manual de Orientação
de Procedimento para Cálculos da Justiça Federal. Observou que o INSS pagará as custas
processuais, na forma do artigo 24, § 1º, da Lei Estadual n.º 3.779/09, uma vez que norma que
eventualmente confira isenção à União não pode ser estendida às autarquias, haja vista os
termos do artigo 111, II, CTN. Por fim, condenou a autarquia previdenciária ao pagamento de
honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da soma das prestações vencidas até a
data da prolação da r. sentença, nos termos do art. 20, § 3º, do CPC e Súmula 111 do STJ.
Dispensado o reexame necessário.
Sustenta o apelante, preliminarmente, em suas razões recursais, acerca da tempestividade do
recurso. No mérito, aduz o não preenchimento dos requisitos exigidos para a concessão do
benefício pleiteado, em especial pela fragilidade do início de prova material apresentado.
Subsidiariamente, requer a alteração da DIB e dos critérios de incidência da correção monetária e
dos juros de mora fixados, bem como pleiteia a redução da verba honorária fixada e isenção das
custas processuais.
Comunicada a implantação do benefício (ID 1574972 - pág. 98).
Apresentadas as contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o sucinto relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5000193-51.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ELIZABETE TEXEIRA DE CASTRO
Advogado do(a) APELADO: ARNO ADOLFO WEGNER - MS1271400A
V O T O
Em sede preliminar, observo que o recurso de apelação autárquico é tempestivo, pois, conforme
observado em consulta efetuada junto ao sistema processual da primeira instância, a intimação
do INSS com relação aos termos da r. sentença somente ocorreu aos 26/10/2016 (ID 1574972 -
pág. 75) e o respectivo comprovante de intimação foi juntado ao processado aos 05/11/2016.
Nesses termos, considerando que a juntada do recurso de apelação se deu aos 22/11/2016,
restou comprovado o requisito extrínseco de admissibilidade, qual seja, tempestividade.
Passo, portanto, à análise do mérito.
A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos,
se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de atividade
rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal. Ademais, para a concessão de benefícios rurais, houve um
abrandamento no rigorismo da lei quanto à comprovação da condição de rurícola dos
trabalhadores do campo, permitindo-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até
mesmo dos pais aos filhos, ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os
cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da
atividade campesina não tenha se dado sob o regime de economia familiar.
Cumpre ressaltar que, em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social,
não se pode exigir dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições
previdenciárias, quando é de notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são
desenvolvidas, cumprindo aqui dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma
subordinação, haja vista que a contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos
chamados "gatos". Semelhante exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores
qualquer possibilidade de auferir o benefício conferido, em razão de sua atividade.
O art. 143 da Lei n.º 8.213/1991, com a redação dada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, dispõe
que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Quanto a se provar o efetivo exercício de atividade rural, o Superior Tribunal de Justiça considera
prescindível a abrangência de todo o período de carência previsto no art. 142 da Lei de
Benefícios pela prova material, desde que a prova testemunhal demonstre sua solidez, permitindo
sua vinculação ao tempo de carência. Tal solução, conhecida como "pro misero", se dá em
virtude da precariedade dos registros de vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda
comum em tempos recentes e bastante disseminada em outras épocas.
Saliento, ainda, que, segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp
1354908, em sede de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo
no momento em que completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade,
a fim de atender ao segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o
segurado especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 1956, comprovou o cumprimento do requisito
etário no ano de 2011. Assim, considerando que o implemento do requisito em questão se deu
quando já havia encerrado a prorrogação prevista no art. 143, da Lei de Benefícios, é necessário,
após 31/12/2010, a comprovação do recolhimento de contribuições para os empregados rurais,
trabalhadores avulsos e diaristas e o cumprimento da carência de 180 meses, a teor do que
dispõe o art. 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91, existindo a necessidade de comprovação de
recolhimentos de contribuições previdenciárias a fim de ser concedido o benefício.
No entanto, observo que, caso o labor campesino tenha se dado em regime de economia familiar,
cuja atividade não foi contemplada pela alteração da lei acima referida, o trabalho rural poderá ser
reconhecido sem a observação da alteração legal constante da Lei de Benefícios. Essa é a
hipótese trazida pela exordial.
Cumpre salientar, por derradeiro, que o referido regime pressupõe a exploração de atividade
primária pelo indivíduo, como principal forma de sustento, acompanhado ou não pelo grupo
familiar, mas sem o auxílio de empregados (art. 11, VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91). Assim, nos
termos do art. 11, VII, da Lei 8.213/91, consideram-se segurados especiais, em regime de
economia familiar, os produtores, parceiros, meeiros, arrendatários rurais, pescadores artesanais
e assemelhados, que exerçam atividades individualmente ou com auxílio eventual de terceiros,
bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde
que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo, residindo na área rural ou em
imóvel próximo ao local onde a atividade rural é exercida e com participação significativa nas
atividades rurais do grupo familiar.
Pois bem.
No presente caso, a autor afirma na exordial, in litteris:
(...)
É filha de agricultores e com eles iniciou trabalhando em propriedade rural familiar localizada
neste município de Amambai-MS. Casando-se com o Sr. José Maria de Castro deu continuidade
no trabalho rural na Fazenda Guaicue localizada no município de Juti-MS. Separando-se do
esposo voltou a trabalhar e residir na propriedade rural dos pais neste município de Amambai/MS.
Posteriormente passou a conviver com o agricultor Eduardo de Souza Oliveira proprietário da
Chácara São Cristóvão. Atualmente a requerente e companheiro arrendaram o Sítio Caracol
Nova Esperança também localizado neste município de Amambai-MS. Atualmente reside e
trabalha no Sítio São Cristóvão o filho da requerente. A requerente exerce atividades rurais como
capina, plantio e colheita de milho, mandioca, batata, ordenha e feitio de queijo, criação de
galinhas, patos, porcos, gado leiteiro e cultivo de hortaliças.(...)”
A fim de comprovar o exercício de atividade rural, a autora apresentou:
- sua CTPS, onde não consta qualquer vínculo laboral;
- Certidão de Casamento sob nº 806, fls. 217, Livro B/6, ocorrido aos 29/11/1975, onde o ex-
esposo da requerente foi qualificado profissionalmente como “lavrador”. No entanto, ali a autora
qualificou-se profissionalmente como “lides domésticas”.
- Certidão de Casamento da autora, constando averbação de seu divórcio, onde, por sentença
prolatada aos 13/01/2011, foi decretado o referido divórcio do casal;
- Certidão de Nascimento da filha da requerente Rosa Cristina de Castro, nascida aos
20/03/1979, onde o ex-esposo da requerente foi qualificado profissionalmente como “campeiro”;
contudo, a autora ali qualificou-se profissionalmente como “do lar”.
- Contrato particular de arrendamento de imóvel rural Chácara Nova Esperança (7,5 hectares)
onde consta a profissão do suposto companheiro da requerente como “agropecuarista”, ano de
2010;
- Nota de energia elétrica da Enersul em nome do suposto companheiro da requerente,
comprovante a residência no Sítio Caracol – Nova Esperança, dos anos de 2011 e 2013;
- “Orçamentos” de aquisição de produtos agrícolas pelo suposto companheiro da requerente,
anos 2010 e 2012;
- Nota fiscal de aquisição de produtos agrícolas em nome do suposto companheiro da requerente,
ano de 2013.
Feitas tais considerações, entendo precário e insuficiente o início de prova material apresentado,
pois inexiste qualquer documento no processado a apontar que os genitores da autora, em
qualquer tempo, tenham sido proprietários de imóvel rural ou mesmo que tenham exercido
atividades rurícolas; aliás, conforme se observa do CNIS de seu ex-marido, este sempre exerceu
atividades rurais como “empregado”, situação essa que desqualifica o suposto trabalho exercido
em regime de economia familiar. Ademais, igualmente não há qualquer documento que comprove
a situação de união estável existente entre a autora e o Sr. Eduardo, observando que seu divórcio
somente foi homologado em 2011.
Quanto à prova testemunhal, está pacificado no C. Superior Tribunal de Justiça o entendimento
de que apenas esta não basta, isoladamente, para a comprovação da atividade rural, requerendo
a existência de início razoável de prova material, conforme entendimento cristalizado na Súmula
149, que assim dispõe: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da
atividade rurícola, para efeito da obtenção do benefício previdenciário". E também esta não se
mostrou apta a comprovar suas alegações, na medida em que, em depoimento pessoal, verificou-
se que o suposto companheiro da parte autora, já aposentado, arrendou imóvel rural de sua
propriedade para seu filho, e alugou outro imóvel rural em 2010, onde continuou a efetuar
criações de animais diversos (porcos, galinhas, cavalos, bovinos, patos), efetuando plantação de
insumos apenas para gerar ração aos animais.
Nesse contexto, impossível o acolhimento da tese de que a autora, juntamente com seu atual
esposo, exercem o trabalho campesino em regime de economia familiar, porquanto além dele
ainda estar, hodiernamente, percebendo proventos de aposentadoria, entendo que o trabalho ali
exercido não se mostra indispensável à sobrevivência do casal, se tratando, na realidade, de
verdadeiro agronegócio, ainda que de pequeno porte, gerando renda supletiva às suas
necessidades de subsistência, situação essa que demanda a obrigatoriedade de recolhimento
das contribuições previdenciárias devidas, a qualificá-la, in casu, como contribuinte individual, na
forma do artigo 11, V, a, da Lei n.º 8.213/91. O elemento essencial identificador da qualidade de
segurado especial, para o fim da proteção extraordinária de segurado não contribuinte pelo
Regime Geral de Previdência Social, é o exercício das atividades especificadas na lei em regime
de economia familiar, indispensavelmente voltado à subsistência e ao desenvolvimento
socioeconômico da família, em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização
de empregados permanentes, em área não superior a quatro módulos fiscais, situação essa não
verificada no caso em análise.
Dessa forma, diante da precariedade/insuficiência do início de prova material acostado aos autos
para comprovação do exercício de suposto trabalho campesino, não servindo a prova
testemunhal exclusivamente para tal finalidade, aliado ao fato de restar desconfigurado o regime
de economia familiar, entendo ausentes os requisitos necessários à concessão da benesse
vindicada, motivo pelo qual a reforma da r. sentença é medida que se impõe.
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), cuja
exigibilidade observará o disposto no artigo 12 da Lei nº 1.060/1950 (artigo 98, § 3º, do Código de
Processo Civil/2015), por ser beneficiária da justiça gratuita.
Por fim, revogo a antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida e, tendo em vista o
quanto decidido pelo C. STJ, por ocasião do julgamento do REsp1.401.560/MT, processado
segundo o rito do artigo 543-C do CPC de 1973, determino a devolução dos valores recebidos
pela parte autora por força de tutela antecipada.
Por esses fundamentos, dou provimento à apelação do INSS, nos termos ora consignados.
Expeça-se ofício ao INSS, com os documentos necessários para as providências cabíveis,
independentemente do trânsito em julgado.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO ATINGIDOS.
INÍCIO DE PROVA MATERIAL INSUFICIENTE. PROVA ORAL INAPTA À COMPROVAÇÃO DAS
ALEGAÇÕES. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA. TUTELA REVOGADA. DEVOLUÇÃO DOS
VALORES RECEBIDOS A TITULO DE TUTELA DETERMINADA.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
2. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
4. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
5. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
6. No entanto, observo que, caso o labor campesino tenha se dado em regime de economia
familiar, cuja atividade não foi contemplada pela alteração da lei acima referida, o trabalho rural
poderá ser reconhecido sem a observação da alteração legal constante da Lei de Benefícios.
Essa é a hipótese trazida pela exordial.
7. Cumpre salientar, por derradeiro, que o referido regime pressupõe a exploração de atividade
primária pelo indivíduo, como principal forma de sustento, acompanhado ou não pelo grupo
familiar, mas sem o auxílio de empregados (art. 11, VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91). Assim, nos
termos do art. 11, VII, da Lei 8.213/91, consideram-se segurados especiais, em regime de
economia familiar, os produtores, parceiros, meeiros, arrendatários rurais, pescadores artesanais
e assemelhados, que exerçam atividades individualmente ou com auxílio eventual de terceiros,
bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde
que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo, residindo na área rural ou em
imóvel próximo ao local onde a atividade rural é exercida e com participação significativa nas
atividades rurais do grupo familiar.
8. Dessa forma, diante da precariedade/insuficiência do início de prova material acostado aos
autos para comprovação do exercício de suposto trabalho campesino, não servindo a prova
testemunhal exclusivamente para tal finalidade, aliado ao fato de restar desconfigurado o regime
de economia familiar, entendo ausentes os requisitos necessários à concessão da benesse
vindicada, motivo pelo qual a reforma da r. sentença é medida que se impõe. (...) Por fim, revogo
a antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida e, tendo em vista o quanto decidido
pelo C. STJ, por ocasião do julgamento do REsp1.401.560/MT, processado segundo o rito do
artigo 543-C do CPC de 1973, determino a devolução dos valores recebidos pela parte autora por
força de tutela antecipada.
9. Apelação do INSS provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
