
| D.E. Publicado em 06/12/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0011631-62.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra a sentença de primeiro grau, que julgou procedente o pedido inicial para condenar o réu a restabelecer o benefício de aposentadoria por idade rural em nome da autora, no valor de um salário mínimo mensal, a partir da data da cessação administrativa, devendo as parcelas vencidas ser atualizadas monetariamente. Condenou, ainda, o réu ao pagamento de honorários de advogado fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas.
Sustenta o apelante, em suas razões recursais, o não preenchimento dos requisitos exigidos para a concessão do benefício pleiteado, dado que a autora teria empregados trabalhando na propriedade na qual alegou trabalhar em regime de economia familiar. No mesmo sentido, alegou que o marido da autora se aposentou trabalhando como motorista, o que seria incompatível com o regime de economia familiar.
Apresentadas as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
A parte autora requer a antecipação da tutela.
É o relatório.
VOTO
A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material corroborado por prova testemunhal. Ademais, para a concessão de benefícios rurais, houve um abrandamento no rigorismo da lei quanto à comprovação da condição de rurícola dos trabalhadores do campo, permitindo-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos, ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não tenha se dado sob o regime de economia familiar.
Cumpre ressaltar que, em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o benefício conferido, em razão de sua atividade.
O art. 143 da Lei n.º 8.213/1991, com a redação dada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, dispõe que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Quanto a se provar o efetivo exercício de atividade rural, o Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante disseminada em outras épocas.
Saliento, ainda, que, segundo o entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
No caso dos autos, a autora, nascida em 1944, comprovou o cumprimento do requisito etário no ano de 1999. Assim, o implemento do requisito em questão se deu quando da prorrogação prevista no art. 143 da Lei de Benefícios.
No entanto, considerando que a autora pleiteia o benefício com base no labor rural exercido em regime de economia familiar e, tendo em conta que determinada atividade não foi contemplada pela alteração da lei acima referida, passo à análise dos requisitos legais para a concessão da benesse pretendida, sem a observação da alteração legal da Lei de Benefícios.
Nesse sentido, consideram-se segurados especiais, em regime de economia familiar (art. 11, VII, da Lei 8.213/91), os produtores, parceiros, meeiros, arrendatários rurais, pescadores artesanais e assemelhados, que exerçam atividades individualmente ou com auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo, residindo na área rural ou em imóvel próximo ao local onde a atividade rural é exercida e com participação significativa nas atividades rurais do grupo familiar.
Cumpre salientar que o referido regime pressupõe a exploração de atividade primária pelo indivíduo, como principal forma de sustento, acompanhado ou não pelo grupo familiar, mas sem o auxílio de empregados (art. 11, VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91). No entanto, admite-se o auxílio eventual de terceiros, prestados por ocasião de colheita ou plantio, desde que inexistente a subordinação ou remuneração, vez que a mão-de-obra assalariada o equipara a segurado contribuinte individual, previsto no art. 11, inciso V, da supracitada lei.
No que tange ao exercício de atividade rural, a autora apresentou certidão de casamento (fls. 25/v); certidões de nascimento (fls. 26/27); comprovantes de recolhimento do INCRA (fls. 27v/31); guias de ITR (fls. 31v/70v); escrituras imobiliárias (fls. 76v/94); declarações cadastrais de produtor (fls. 71/74); comprovante do CCIR (fls. 74v/76); notas fiscais da venda de cana de açúcar (fls. 101/102v); notas fiscais de compra de insumos agrícolas (fls. 95/99).
Todavia, nas guias de recolhimento do INCRA (fls. 27v/31), constam anotações de que haveriam trabalhadores contratados para laborar na propriedade da autora, contrariando o alegado pelas testemunhas entrevistadas, o que descaracteriza, a princípio, a alegada atividade rural em regime de economia familiar. A própria autora alega, no processo administrativo apensado aos autos, que a exploração da propriedade se dava com auxílio de mão de obra contratada. No recurso apresentado pela autora no processo administrativo, quando da cessação do benefício de aposentadoria concedido, ela alega que o marido trabalhou como caminhoneiro para complementar a renda familiar, inclusive servindo de motivação para recebimento de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, novamente, contrariando o relato das testemunhas. Por fim, as alegações das testemunhas de que os filhos da autora ajudariam com a lavoura, contraria os registros de trabalho urbano, inclusive alegados pela própria autora nos autos do processo administrativo.
Contudo, mesmo que fosse aceita a qualidade de rural da autora, não necessariamente ela se faria na qualidade de economia familiar. Tal regime pressupõe uma forma rudimentar de trabalho rural, onde os membros da família realizam trabalho indispensável à própria subsistência e mútua colaboração, conforme prescreve o art. 11, § 1º, da Lei nº 8.213/91: "Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes (incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)". A autora, além de residir em área urbana, apresenta provas e testemunhas contraditórias, não comprovando a atividade rural alegada.
Quanto à prova testemunhal, pacificado no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que apenas ela não basta para a comprovação da atividade rural, requerendo a existência de início de prova material, conforme entendimento cristalizado na Súmula 149, que assim dispõe: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção do benefício previdenciário". Em suma, a prova testemunhal deve corroborar a prova material, mas não a substitui.
As contradições entre os relatos das testemunhas e as provas acostadas aos autos, no lugar de reforçar o argumento da autora, acabam por fragilizar a alegação de trabalho em regime de economia familiar.
Desse modo, forçoso concluir que os documentos constantes nos autos não se mostram aptos a comprovar o exercício de atividade rural, na qualidade de economia familiar, por parte da autora pelo período de carência necessário à concessão do benefício.
Impõe-se, por isso, a improcedência da pretensão da parte autora.
Vale dizer não ser o caso de se aplicar o entendimento adotado pelo STJ, no julgamento do REsp 1352721/SP, uma vez que não se trata de mera insuficiência de prova da parte autora, já que restou afastada a sua condição de trabalhador rural, em regime de economia familiar.
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), cuja exigibilidade observará o disposto no artigo 98, § 3º, do Código de Processo Civil, por ser beneficiária da justiça gratuita.
Por esses fundamentos, dou provimento à apelação do INSS, para reformar a r. sentença e julgar improcedente o pedido formulado na inicial.
É o voto.
TORU YAMAMOTO
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 27/11/2018 17:43:10 |
