Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5086876-57.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
20/01/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 17/02/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. ATIVIDADE RURAL NÃO COMPROVADA. APELAÇÃO DO INSS
PARCIALMENTE PROVIDA. PROCESSO EXTINTO.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
2. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
4. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
5. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
6. Feitas tais considerações, entendo que o conjunto probatório é frágil à comprovação de
atividade campesina dela, em razão de o feito apresentar inconsistências relevantes que não
podem ser ignoradas. Verifica-se dos autos que a autora, durante sua vida laboral, apresentou
apenas parcos vínculos formais de trabalho campesino, exercidos somente entre 1996 a 1998 em
outro município, não havendo qualquer documentação a partir de 1998 e até 2014, ou seja, por
cerca de 16 anos, que a indique na qualidade de trabalhadora rural: a recente Certidão de
inteiroteor de casamento da filha da autora (Ana Lúcia do Nascimento), cujo enlace matrimonial
ocorreu em 2005, a qualifica como “do lar” e não como trabalhadora rural; no entanto, a Certidão
de Casamento de um enlace matrimonial ocorrido entre JOVANE DANIEL DE SORDI e LUCIANA
DO NASCIMENTO (filha da autora), cujo enlace matrimonial ocorreu aos 1º/12/2007, aponta a
autora e seu esposo como “agricultores”. Tal documento indica, contudo, que o genro da autora
seria filho de ROQUE MIGUEL DE SORDI e MARIA APARECIDA ALMEIDA DE SORDI, que são,
exatamente, as mesmas pessoas que foram arroladas como testemunhas pela autora e disseram
não possuir relação de parentesco com ela, situação essa que põe em dúvida as afirmações
lançadas em seus depoimentos. Ademais, oportuno observar que nunca viram a autora
trabalhando. Os Contratos de Parceria, por sua vez, foram firmados com pessoa que possui o
mesmo sobrenome das testemunhas e, decerto, possuem relação de parentesco com elas. Em
cerca de três anos, foram emitidas apenas três notas fiscais sequenciais (nrs. 001 a 003), e duas
delas, as primeiras, acusando venda de mercadorias para o próprio parceiro, o que causa
fundada estranheza. Dessa forma, entendo que não restaram configurados os requisitos
necessários à concessão da benesse vindicada, pois não restou comprovado o trabalho rural dela
exercido de maneira informal ou em regime de economia familiar, motivo pelo qual a reforma da r.
sentença seria medida imperativa.
7. Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP). Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito
previdenciário da parte autora, a extinção do processo sem julgamento do mérito.
8. Apelação do INSS parcialmente provida. Processo extinto.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5086876-57.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MILTA MARIA DE PAULA
Advogado do(a) APELADO: DENNER PERUZZETTO VENTURA - SP322359-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5086876-57.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MILTA MARIA DE PAULA
Advogado do(a) APELADO: DENNER PERUZZETTO VENTURA - SP322359-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra a r. sentença de primeiro grau que julgou
procedente o pedido inicial, extinguindo o feito com resolução de mérito e fundamento no artigo
487, I, do CPC, condenando o INSS a conceder à parte autora o benefício previdenciário de
aposentadoria por idade rural, com DIB na data do requerimento administrativo. Consignou os
consectários legais aplicáveis na espécie e condenou a Autarquia Previdenciária ao pagamento
de honorários advocatícios da parte adversa, fixados em 10% (dez por cento) sobre o débito
existente por ocasião da r. sentença. No entanto, deixou de condená-la ao pagamento das custas
processuais, considerando que a Súmula 178, do Superior Tribunal de Justiça, não se aplica ao
Estado de São Paulo, diante da existência de Lei Estadual que isenta o instituto requerido desse
encargo (artigo 5o, Lei no 11.608/03).
Sentença não submetida ao reexame necessário.
Sustenta o INSS, em suas razões recursais e em apertada síntese, que a parte autora não
comprovou o exercício de trabalho rural pelo período de carência e no momento imediatamente
anterior ao implemento do requisito etário, motivando as razões de sua insurgência.
Subsidiariamente, pleiteia a aplicação da Lei nº 11.960/09 quanto à correção monetária até a
modulação dos efeitos no RE 870.947.
Com as contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5086876-57.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MILTA MARIA DE PAULA
Advogado do(a) APELADO: DENNER PERUZZETTO VENTURA - SP322359-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado mostra-se formalmente regular,
motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação
(art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e
inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o e passo a apreciá-lo nos termos do artigo 1.011
do Código de Processo Civil.
A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos,
se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de atividade
rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal. Ademais, para a concessão de benefícios rurais, houve um
abrandamento no rigorismo da lei quanto à comprovação da condição de rurícola dos
trabalhadores do campo, permitindo-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até
mesmo dos pais aos filhos, ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os
cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da
atividade campesina não tenha se dado sob o regime de economia familiar.
Cumpre ressaltar que, em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social,
não se pode exigir dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições
previdenciárias, quando é de notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são
desenvolvidas, cumprindo aqui dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma
subordinação, haja vista que a contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos
chamados "gatos". Semelhante exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores
qualquer possibilidade de auferir o benefício conferido, em razão de sua atividade.
O art. 143 da Lei n.º 8.213/1991, com a redação dada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, dispõe
que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Quanto a se provar o efetivo exercício de atividade rural, o Superior Tribunal de Justiça considera
prescindível a abrangência de todo o período de carência previsto no art. 142 da Lei de
Benefícios pela prova material, desde que a prova testemunhal demonstre sua solidez, permitindo
sua vinculação ao tempo de carência. Tal solução, conhecida como "pro misero", se dá em
virtude da precariedade dos registros de vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda
comum em tempos recentes e bastante disseminada em outras épocas.
Saliento, ainda, que segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp
1354908, em sede de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo
no momento em que completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade,
a fim de atender ao segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o
segurado especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
No caso dos autos, a parte autora (que reside na área central do município de Divinolândia/SP,
conforme ID 22035689 - pág. 3), nascida em 12/04/1962, comprovou o cumprimento do requisito
etário no ano de 2017. Assim, considerando que o implemento desse requisito se deu quando já
havia encerrada a prorrogação prevista no art. 143 da Lei de Benefícios, é necessária, após
31/12/2010, a comprovação do recolhimento de contribuições para os empregados rurais,
trabalhadores avulsos e diaristas, além da comprovação do cumprimento da carência de 180
meses, a teor do que dispõe o art. 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91, com vistas à concessão do
benefício.
Antes de analisar os requisitos relativos à qualidade de segurado e ao cumprimento da carência,
cumpre salientar que o esgotamento do prazo acima referido não constitui óbice à percepção de
benefícios previdenciários no valor de um salário mínimo, nos termos do disposto no art. 39, I, da
Lei nº 8.213/91.
No entanto, o exercício de atividades rurais relativo ao período encerrado em 31/12/2010 há de
ser comprovado de igual modo, ou seja, bastando a apresentação de início de prova material
corroborada por testemunhos. E, quanto ao período posterior, iniciado em 01/01/2011 até
31/12/2015, o labor rural deve ser comprovado por prova material, não bastando o início de
prova, correspondendo cada mês comprovado a três meses de carência, limitados a 12 meses
dentro do ano civil. E a partir de 01/01/2016 até 31/12/2020, o labor rural deve ser comprovado da
forma anteriormente consignada, correspondendo cada mês comprovado, agora, a dois meses de
carência, limitados a 12 meses dentro do ano civil,conforme as regras introduzidas pela Lei
11.718/08, em seu art. 2º, parágrafo único e art. 3º, incisos I, II e III.
Em suma, considera-se que a simples limitação temporal das regras prescritas pelo art. 143 da
Lei de Benefícios, por si só, não obsta a comprovação do exercício de atividades rurais nem a
percepção do benefício, desde que comprovados os recolhimentos obrigatórios, que passaram a
ser exigidos após o advento das novas regras introduzidas pela Lei nº 11.718/08.
Frise-se, pois pertinente, que caso o labor campesino tenha se dado em regime de economia
familiar, cuja atividade não foi contemplada pela alteração da lei acima referida, o trabalho rural
poderá ser reconhecido sem a observação da alteração legal constante da Lei de Benefícios.
Observe-se, por derradeiro, que o referido regime pressupõe a exploração de atividade primária
pelo indivíduo, como principal forma de sustento, acompanhado ou não pelo grupo familiar, mas
sem o auxílio de empregado s (art. 11, VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91). Assim, nos termos do art.
11, VII, da Lei 8.213/91, consideram-se segurados especiais, em regime de economia familiar, os
produtores, parceiros, meeiros, arrendatários rurais, pescadores artesanais e assemelhados, que
exerçam atividades individualmente ou com auxílio eventual de terceiros, bem como seus
respectivos cônjuges ou companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde que trabalhem,
comprovadamente, com o grupo familiar respectivo, residindo na área rural ou em imóvel próximo
ao local onde a atividade rural é exercida e com participação significativa nas atividades rurais do
grupo familiar.
Na exordial, a parte autora alegou, in litteris:
“(...)
A autora é TRABALHADORA RURAL, sendo ao longo de sua vida segurada do RGPS na
qualidade de BOIA FRIA (DIARISTA) E SEGURADA ESPECIAL, contando atualmente com 56
anos de idade conforme documentos anexo.
Em data de 05.09.2017 a autora postulou junto ao requerido a concessão do benefício de
aposentadoria por idade rural, o qual foi protocolado sob nº 183.026.421-1 (cópia do processo
administrativo anexo – DOC. 01).
Todavia, o pedido supramencionado foi negado administrativamente, sob a alegação de que não
comprovou a autora o “efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua no
período correspondente à carência do benefício imediatamente anterior ao requerimento ou na
data em que implementou a idade exigida necessária” (FLS. 48/49).
O resumo de cálculo da carência em atividade rural realizado pela Autarquia apurou tempo
exacerbadamente inferior ao verdadeiramente trabalhado pela autora, no total de 01 ano, 04
meses e 10 dias (FLS. 44 DO PROCESSO ADMINISTRATIVO).
Em que pese a apresentação dos documentos necessários para concessão da benesse, a
Autarquia Ré deixou de homologar os períodos trabalhados pela autora de:
01.01.1999 A 31.07.2014, na qualidade de trabalhadora rural BÓIA FRIA (DIARISTA), no plantio,
cultivo e colheita de CAFÉ, BATATA, CEBOLA, MILHO, FEIJÃO, dentre outras atividades
inerentes ao árduo trabalho rurícola, em diversas propriedades localizadas no município de
Divinolândia/SP após sua mudança com a família do município de Tapiratiba/SP.
Dentre as várias propriedades em que a autora exerceu suas atividades laborativas na categoria
de EVENTUAL (DIARISTA) acima descrita, faz-se necessário o destaque de algumas em que a
autora trabalhou, inclusive, na companhia de seu marido, a seguir exposto:
VALDOMIRO RICETTO SÍTIO CONTENDAS
MARCELO FELTRAN SÍTIO CONTENDAS
JOSE RAMOS SÍTIO CONTENDAS
JOSÉ MESQUITA SÍTIO ÁGUA FRIA
MARCIO MOREIRA SÍTIO ÁGUA FRIA
As atividades foram desempenhadas EVENTUALMENTE, mas durante todo o ano, em várias
propriedades e os pagamentos eram realizados semanalmente de acordo com a produção
auferida ou até mesmo pelo dia de trabalho.
30.08.2014 ATÉ PRESENTE DATA no SÍTIO EUCALIPTOS, localizado no município de
Divinolândia/SP, de propriedade do SR. ANTONIO DONIZETE DE SORDI, na qualidade de
PARCEIRA AGRÍCOLA, sendo tal atividade desempenhada no plantio, cultivo e colheita de
CAFÉ, MILHO E FEIJÃO, dentre outras atividades inerentes ao árduo trabalho na lavoura.
O trabalho é realizado em conjunto com seu esposo, sem contratação de empregados, em uma
área aproximada de 2,7 ha, com a utilização de mão de obra exclusiva familiar.
Com a soma dos períodos em que a autora exerceu atividade na qualidade de trabalhadora rural
EMPREGADA, BÓIA FRIA E SEGURADA ESPECIAL (PARCERIA), resta comprovado a carência
maior que 15 anos para concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.
Os períodos acima descritos não foram homologados, segundo consta da decisão administrativa,
sob justificativas lamentáveis, sem qualquer respaldo legal ou embasamento jurídico.
(...)”
No que tange ao suposto exercício de atividade rural, para fins de comprovação de início de
prova material, a parte autora apresentou:
- Procuração firmada pela autora, conferindo poderes para uma Funcionária Pública Federal
aposentada representá-la junto ao INSS;
- CTPS da autora, que aponta que ela teve cinco vínculos como trabalhadora rural, todos de curta
duração e prestados no município de Tapiratiba/SP, entre 1996/1998;
- Certidão de Casamento religioso da autora e seu companheiro, cujo enlace matrimonial teria
ocorrido no município de Caconde/SP, em 28/05/1988, onde não consta a qualificação
profissional do casal;
- Certidão de Nascimento da autora, onde não consta a qualificação profissional dos genitores;
- Certidão de inteiroteor de casamento da filha da autora (Ana Lúcia do Nascimento), cujo enlace
matrimonial ocorreu em 2005, onde o esposo da autora foi qualificado como “lavrador” e a autora
como “do lar”;
- Certidão de Nascimento de um filho da autora (Emerson), nascido em 10/01/1991, onde consta
que a autora seria “doméstica” e seu esposo “lavrador”, ambos residentes em Guaxupé/MG;
- Certidão de Casamento de um enlace matrimonial ocorrido entre JOVANE DANIEL DE SORDI e
LUCIANA DO NASCIMENTO (filha da autora), cujo enlace matrimonial ocorreu aos 1º/12/2007.
No referido documento, verifica-se que o noivo seria residente no Sítio São Miguel e seria filho de
ROQUE MIGUEL DE SORDI e MARIA APARECIDA ALMEIDA DE SORDI. A noiva, por sua vez,
seria residente no bairro Contendas (em Divinolândia/SP) e seus genitores seriam “agricultores”;
- Certidão de Casamento de uma filha da autora (Édina), onde consta que ela teria nascido em
Tapiratiba/SP em 21/04/1995 e que seus genitores seriam “lavradores”;
- Certidão de Nascimento do Companheiro da autora (Cilson), nascido aos 27/02/1963, onde
consta que o genitor dele seria “lavrador”;
- CTPS do companheiro da autora, onde constam os seguintes vínculos de trabalho rural: de
02/01/1988 a 05/11/1988 na Fazenda Macuco em Caconde/SP; de 07/11/1988 a 29/06/1989 na
Fazenda Cachoeirinha em Tapiratiba/SP; de 01/10/1989 a 31/01/1992 na Faz. Anunciato em
Guaxupé/MG; de 01/03/1993 a 23/11/1998 na Fazenda São Geraldo em Tapiratiba/SP;
- Contrato Particular de Parceria Agrícola firmado entre o Sr. Antônio Donizete de Sordi (parceiro
outorgante) e a autora e seu esposo (parceiros outorgados), onde consta que o outorgante seria
proprietário de um imóvel rural denominado Sítio Eucaliptos e teria cedido aos outorgados uma
gleba de terras com área aproximada de 2,7 hectares, contendo 2.500 pés de café, juntamente
com um imóvel residencial e máquinas e equipamentos para a lavoura, sendo combinado que, da
produção total havida, 60% pertencerá para o outorgante e 40% para os outorgados. Tal contrato
teria vigência de 30/08/2014 a 29/08/2016 e está datado de 01/08/2014, mas não há
reconhecimento de firmas ou testemunhas.
- Contrato Particular de Parceria Agrícola firmado entre o Sr. Antônio Donizete de Sordi (parceiro
outorgante) e a autora e seu esposo (parceiros outorgados), onde consta que o outorgante seria
proprietário de um imóvel rural denominado Sítio Eucaliptos e teria cedido aos outorgados uma
gleba de terras com área aproximada de 2,7 hectares, contendo 2.500 pés de café, juntamente
com um imóvel residencial e máquinas e equipamentos para a lavoura, sendo combinado que, da
produção total havida, 60% pertencerá para o outorgante e 40% para os outorgados. Tal contrato
teria vigência de 30/08/2016 a 29/08/2020 e está datado de 30/08/2014, mas o reconhecimento
de firmas dos signatários somente ocorreu em 14/11/2016. Não há testemunhas.
- Cadastro da autora e de seu marido no Cadastro de Contribuintes do ICMS, como produtores
rurais, efetuado em 2015;
- Três notas fiscais, emitidas pela autora e seu marido em ordem sequencial, apenas uma por
ano, as duas primeiras (dos anos de 2015 e 2016) constando como destinatário o próprio
proprietário do sítio e a última (de 2017), constando com destinatário Nossa Terra Comércio e
Exportação de Café – Eireli.
Com relação ao labor rural, a jurisprudência do E. STJ firmou-se no sentido de que é insuficiente,
de forma isolada, a produção de prova testemunhal para a comprovação de atividade rural, na
forma da Súmula 149 - STJ, in verbis: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à com
provação da atividade rurícola, para efeito de obtenção de benefício previdenciário.".
A testemunha MARIA APARECIDA ALMEIDA DE SORDI disse não ser parente ou amiga íntima
da autora, apenas “conhecida”. Depois de compromissada, disse conhecer a autora há cerca de
20 anos e que ela trabalharia na “roça” para diversas pessoas, sem registro. Esclareceu que
nunca a viu trabalhando, mas que a via indo para o trabalho. Afirmou que o marido dela também
trabalha em lavoura e que ambos laboraram na condição de boia-fria até 4 anos atrás, quando
então “pegaram” uma plantação de café para tomar conta, mas não sabe indicar onde é e como
se realiza o trabalho no local. Por sua vez, a testemunha ROQUE MIGUEL DE SORDI disse não
ter relação de parentesco com a autora. Depois de compromissada, disse conhecer a autora há
cerca de 20 anos e que ela trabalharia como boia-fria, juntamente com o marido, em diversas
propriedades. Disse a testemunha que ela trabalhou como diarista no Sítio Santo Antônio por dois
anos. Depois esclareceu que ela apenas morava no sítio em questão, e trabalharia para terceiras
pessoas. Afirma, no entanto, que nunca a presenciou trabalhando, mas sabe que ela laborava
junto com o marido, pois os via saindo para trabalhar. Por fim afirma que ela trabalha em um sítio
há cerca de 4 anos, em esquema de “porcentagem”, sem haver empregados ou maquinários no
local. O proprietário seria ANTÔNIO DONIZETE DE SORDI.
Pois bem.
Feitas tais considerações, entendo que o conjunto probatório é frágil à comprovação de atividade
campesina dela, em razão de o feito apresentar inconsistências relevantes que não podem ser
ignoradas.
Verifica-se dos autos que a autora, durante sua vida laboral, apresentou apenas parcos vínculos
formais de trabalho campesino, exercidos somente entre 1996 a 1998 em outro município, não
havendo qualquer documentação a partir de 1998 e até 2014, ou seja, por cerca de 16 anos, que
a indique na qualidade de trabalhadora rural: a recente Certidão de Interior teor de casamento da
filha da autora (Ana Lúcia do Nascimento), cujo enlace matrimonial ocorreu em 2005, a qualifica
como “do lar” e não como trabalhadora rural; no entanto, a Certidão de Casamento de um enlace
matrimonial ocorrido entre JOVANE DANIEL DE SORDI e LUCIANA DO NASCIMENTO (filha da
autora), cujo enlace matrimonial ocorreu aos 1º/12/2007, aponta a autora e seu esposo como
“agricultores”.
Tal documento indica, contudo, que o genro da autora seria filho de ROQUE MIGUEL DE SORDI
e MARIA APARECIDA ALMEIDA DE SORDI, que são, exatamente, as mesmas pessoas que
foram arroladas como testemunhas pela autora e disseram não possuir relação de parentesco
com ela, situação essa que põe em dúvida as afirmações lançadas em seus depoimentos.
Ademais, oportuno observar que nunca viram a autora trabalhando.
Os Contratos de Parceria, por sua vez, foram firmados com pessoa que possui o mesmo
sobrenome das testemunhas e, decerto, possuem relação de parentesco com elas. Em cerca de
três anos, foram emitidas apenas três notas fiscais sequenciais (nrs. 001 a 003), e duas delas, as
primeiras, acusando venda de mercadorias para o próprio parceiro, o que causa fundada
estranheza.
Dessa forma, entendo que não restaram configurados os requisitos necessários à concessão da
benesse vindicada, pois não restou comprovado o trabalho rural dela exercido de maneira
informal ou em regime de economia familiar, motivo pelo qual a reforma da r. sentença seria
medida imperativa.
Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP).
Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito previdenciário da parte autora,
a extinção do processo sem julgamento do mérito.
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), cuja
exigibilidade observará o disposto no artigo 12 da Lei nº 1.060/1950 (artigo 98, § 3º, do Código de
Processo Civil/2015), por ser beneficiária da justiça gratuita.
Por esses fundamentos, dou parcial provimento à apelação do INSS, extinguindo o processo nos
termos do artigo 485, IV, do CPC, conforme ora consignado.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. ATIVIDADE RURAL NÃO COMPROVADA. APELAÇÃO DO INSS
PARCIALMENTE PROVIDA. PROCESSO EXTINTO.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
2. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
4. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
5. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
6. Feitas tais considerações, entendo que o conjunto probatório é frágil à comprovação de
atividade campesina dela, em razão de o feito apresentar inconsistências relevantes que não
podem ser ignoradas. Verifica-se dos autos que a autora, durante sua vida laboral, apresentou
apenas parcos vínculos formais de trabalho campesino, exercidos somente entre 1996 a 1998 em
outro município, não havendo qualquer documentação a partir de 1998 e até 2014, ou seja, por
cerca de 16 anos, que a indique na qualidade de trabalhadora rural: a recente Certidão de
inteiroteor de casamento da filha da autora (Ana Lúcia do Nascimento), cujo enlace matrimonial
ocorreu em 2005, a qualifica como “do lar” e não como trabalhadora rural; no entanto, a Certidão
de Casamento de um enlace matrimonial ocorrido entre JOVANE DANIEL DE SORDI e LUCIANA
DO NASCIMENTO (filha da autora), cujo enlace matrimonial ocorreu aos 1º/12/2007, aponta a
autora e seu esposo como “agricultores”. Tal documento indica, contudo, que o genro da autora
seria filho de ROQUE MIGUEL DE SORDI e MARIA APARECIDA ALMEIDA DE SORDI, que são,
exatamente, as mesmas pessoas que foram arroladas como testemunhas pela autora e disseram
não possuir relação de parentesco com ela, situação essa que põe em dúvida as afirmações
lançadas em seus depoimentos. Ademais, oportuno observar que nunca viram a autora
trabalhando. Os Contratos de Parceria, por sua vez, foram firmados com pessoa que possui o
mesmo sobrenome das testemunhas e, decerto, possuem relação de parentesco com elas. Em
cerca de três anos, foram emitidas apenas três notas fiscais sequenciais (nrs. 001 a 003), e duas
delas, as primeiras, acusando venda de mercadorias para o próprio parceiro, o que causa
fundada estranheza. Dessa forma, entendo que não restaram configurados os requisitos
necessários à concessão da benesse vindicada, pois não restou comprovado o trabalho rural dela
exercido de maneira informal ou em regime de economia familiar, motivo pelo qual a reforma da r.
sentença seria medida imperativa.
7. Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP). Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito
previdenciário da parte autora, a extinção do processo sem julgamento do mérito.
8. Apelação do INSS parcialmente provida. Processo extinto.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS, extinguindo o processo nos
termos do artigo 485, IV, do CPC, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
