Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5000042-51.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
20/12/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 10/01/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. ATIVIDADE RURAL PELO PERÍODO DE CARÊNCIA E NO MOMENTO
IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO NÃO
COMPROVADAS. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. PROCESSO EXTINTO.
TUTELA REVOGADA.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
2. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
4. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
5. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
6. Feitas tais considerações, observo que o conjunto probatório é insuficiente à comprovação
vindicada, apresentando inconsistências relevantes. Os parcos documentos apresentados como
início de prova material são de épocas antigas e nunca qualificaram a autora como trabalhadora
rural, com exceção da recente Declaração de União Estável, produzida somente depois de já ter
sido completado o requisito etário. Não há qualquer indício de que a autora e seu esposo tenham
residido ou trabalhado no Sítio “Bacuri” em regime de economia familiar entre 2009/2013, pois a
declaração extemporânea apresentada não serve como início de prova material e não há
qualquer outro documento contemporâneo à época dos fatos, tal como notas fiscais/contratos de
arrendamento, parceria ou de empreita, a indicar a realização de eventual atividade rural no local
em questão e a veracidade das alegações. Os depoimentos prestados são genéricos e
imprecisos, não conseguindo pormenorizar, de forma minimamente razoável, onde a autora teria
trabalhado e por quanto tempo teria perdurado. Aliás, oportuno verificar que nenhuma
testemunha indicou o esposo da autora como motorista, profissão urbana essa que ele exerceu,
de forma incontroversa, entre 2003 a 2008, segundo consta de sua CTPS. Dessa forma, não
restando comprovada a realização de trabalho rural pelo período de carência e, também, no
momento imediatamente anterior ao implemento do requisito etário/requerimento administrativo,
não servindo a prova testemunhal exclusivamente para tal finalidade, entendo que não restaram
configurados os requisitos necessários à concessão da benesse vindicada, motivo pelo qual a
reforma da r. sentença seria medida imperativa.
7. Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP). Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito
previdenciário da parte autora, a extinção do processo sem julgamento do mérito.
8. Por fim, revogo a antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida. Comunique-se ao
INSS, pelo meio mais expedito, independentemente do trânsito em julgado. A questão relativa à
obrigatoriedade ou não de devolução dos valores recebidos pela parte autora deverá ser dirimida
pelo Juízo da Execução após a eventual revisão do entendimento firmado no Tema Repetitivo
692 pela C. Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça.
9. Apelação do INSS parcialmente provida. Processo extinto. Tutela revogada.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000042-51.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: ELZA BATISTA PEREIRA
Advogado do(a) APELADO: CRISTIANE PARREIRA RENDA DE OLIVEIRA CARDOSO -
SP119377-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000042-51.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: ELZA BATISTA PEREIRA
Advogado do(a) APELADO: CRISTIANE PARREIRA RENDA DE OLIVEIRA CARDOSO -
SP119377-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra a r. sentença de primeiro grau que, com fulcro
nos artigos 11, 48 a 51 e 143 da Lei 8.213/91, e artigo 487, I, do CPC, com apreciação do mérito
da lide, julgou procedente o pedido constante da exordial para condenar o INSS ao pagamento do
benefício de aposentadoria por idade em favor da parte autora, confirmando tutela anteriormente
concedida, na condição de trabalhadora rural, no valor de um salário mínimo mensal, a contar do
trânsito em julgado, com abono anual, em dezembro, também no valor de 01 um salário mínimo,
bem como ao pagamento dos valores retroativos, no prazo de 30 dias a contar do trânsito em
julgado da r. sentença. Consignou os consectários legais aplicáveis na espécie e condenou a
Autarquia Previdenciária ao pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% do valor
da condenação, consoante o previsto no art. 85, §3º, I, do CPC, observando que tais honorários
não abrangem prestações vencidas após a data da r. sentença, na forma da Súmula 111 do C.
STJ. Por fim, condenou o INSS ao pagamento das custas processuais.
Sentença não submetida ao reexame necessário.
Sustenta o INSS, em suas razões recursais e em apertada síntese, que a parte autora não
comprovou o exercício de trabalho rural pelo período de carência e no momento imediatamente
anterior ao implemento do requisito etário, motivando as razões de sua insurgência.
Subsidiariamente, pleiteia a alteração dos consectários legais fixados e a isenção das custas
processuais.
Com as contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000042-51.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: ELZA BATISTA PEREIRA
Advogado do(a) APELADO: CRISTIANE PARREIRA RENDA DE OLIVEIRA CARDOSO -
SP119377-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado mostra-se formalmente regular,
motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação
(art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e
inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o e passo a apreciá-lo nos termos do artigo 1.011
do Código de Processo Civil.
A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos,
se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de atividade
rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal. Ademais, para a concessão de benefícios rurais, houve um
abrandamento no rigorismo da lei quanto à comprovação da condição de rurícola dos
trabalhadores do campo, permitindo-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até
mesmo dos pais aos filhos, ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os
cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da
atividade campesina não tenha se dado sob o regime de economia familiar.
Cumpre ressaltar que, em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social,
não se pode exigir dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições
previdenciárias, quando é de notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são
desenvolvidas, cumprindo aqui dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma
subordinação, haja vista que a contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos
chamados "gatos". Semelhante exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores
qualquer possibilidade de auferir o benefício conferido, em razão de sua atividade.
O art. 143 da Lei n.º 8.213/1991, com a redação dada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, dispõe
que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Quanto a se provar o efetivo exercício de atividade rural, o Superior Tribunal de Justiça considera
prescindível a abrangência de todo o período de carência previsto no art. 142 da Lei de
Benefícios pela prova material, desde que a prova testemunhal demonstre sua solidez, permitindo
sua vinculação ao tempo de carência. Tal solução, conhecida como "pro misero", se dá em
virtude da precariedade dos registros de vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda
comum em tempos recentes e bastante disseminada em outras épocas.
Saliento, ainda, que, segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp
1354908, em sede de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo
no momento em que completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade,
a fim de atender ao segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o
segurado especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 10/04/1956, comprovou o cumprimento do
requisito etário no ano de 2011. Assim, considerando que o implemento desse requisito se deu
quando já havia encerrada a prorrogação prevista no art. 143 da Lei de Benefícios, é necessária,
após 31/12/2010, a comprovação do recolhimento de contribuições para os empregados rurais,
trabalhadores avulsos e diaristas, além da comprovação do cumprimento da carência de 180
meses, a teor do que dispõe o art. 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91, com vistas à concessão do
benefício.
Assim, considerando que o implemento do requisito em questão se deu quando já havia
encerrado a prorrogação prevista no art. 143, da Lei de Benefícios, é necessário, após
31/12/2010, a comprovação do recolhimento de contribuições para os empregados rurais,
trabalhadores avulsos e diaristas e o cumprimento da carência de 180 meses, a teor do que
dispõe o art. 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91, existindo a necessidade de comprovação de
recolhimentos de contribuições previdenciárias a fim de ser concedido o benefício.
Antes de analisar os requisitos relativos à qualidade de segurado e ao cumprimento da carência,
cumpre salientar que o esgotamento do prazo acima referido não constitui óbice à percepção de
benefícios previdenciários no valor de um salário mínimo, nos termos do disposto no art. 39, I, da
Lei nº 8.213/91.
No entanto, o exercício de atividades rurais relativo ao período encerrado em 31/12/2010 há de
ser comprovado de igual modo, ou seja, bastando a apresentação de início de prova material
corroborada por testemunhos. E, quanto ao período posterior, iniciado em 01/01/2011 até
31/12/2015, o labor rural deve ser comprovado por prova material, não bastando o início de
prova, correspondendo cada mês comprovado a três meses de carência, limitados a 12 meses
dentro do ano civil. E a partir de 01/01/2016 até 31/12/2020, o labor rural deve ser comprovado da
forma anteriormente consignada, correspondendo cada mês comprovado, agora, a dois meses de
carência, limitados a 12 meses dentro do ano civil, conforme as regras introduzidas pela Lei
11.718/08, em seu art. 2º, parágrafo único e art. 3º, incisos I, II e III.
Em suma, considera-se que a simples limitação temporal das regras prescritas pelo art. 143 da
Lei de Benefícios, por si só, não obsta a comprovação do exercício de atividades rurais nem a
percepção do benefício, desde que comprovado os recolhimentos obrigatórios, que passaram a
ser exigidos após o advento das novas regras introduzidas pela Lei nº 11.718/08.
Frise-se que, caso o labor campesino tenha se dado em regime de economia familiar, cuja
atividade não foi contemplada pela alteração da lei acima referida, o trabalho rural poderá ser
reconhecido sem a observação da alteração legal constante da Lei de Benefícios.
Observo, por derradeiro, que o referido regime pressupõe a exploração de atividade primária pelo
indivíduo, como principal forma de sustento, acompanhado ou não pelo grupo familiar, mas sem o
auxílio de empregados (art. 11, VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91). Assim, nos termos do art. 11, VII,
da Lei 8.213/91, consideram-se segurados especiais, em regime de economia familiar, os
produtores, parceiros, meeiros, arrendatários rurais, pescadores artesanais e assemelhados, que
exerçam atividades individualmente ou com auxílio eventual de terceiros, bem como seus
respectivos cônjuges ou companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde que trabalhem,
comprovadamente, com o grupo familiar respectivo, residindo na área rural ou em imóvel próximo
ao local onde a atividade rural é exercida e com participação significativa nas atividades rurais do
grupo familiar.
Na exordial, a parte autora alegou genericamente que:
“(...)
Nasceu a autora em 10 de abril de 1956, contando atualmente com mais de 56 (cinquenta e seis)
anos de idade, natural da cidade de Santa Rita do Araguaia - GO, filha de: Jorge Batista Pereira e
Ana Maria Pereira.
A autora é originária de família de lavradores, e desde à sua infância iniciou o labor rural,
fazendo-o por toda sua vida laborativa.
(...)”
No que tange ao exercício de atividade rural, para fins de comprovação de início de prova
material, a parte autora apresentou:
- Sua Certidão de Nascimento, onde não consta a qualificação profissional de seus genitores;
- Escritura Pública Declaratória de União Estável lavrada em 18/05/2012 (efetuada após o
implemento do requisito etário), onde a autora se declara como “trabalhadora rural” e diz ser
residente no “Sítio Bacuri”. Em tal documento, consta que o casal vive em união estável desde
24/05/1979 e que seu esposo estaria qualificado profissionalmente como “serviços gerais”;
- Certidão de Nascimento do esposo da autora, parcialmente legível, onde consta que o genitor
dele seria “lavrador”;
- Certidões de nascimento de dois filhos da autora (Humberto e Alberto), onde não constam as
qualificações profissionais dos genitores;
- Certidão de Nascimento de um filho da autora (Marcos Viturino), cujo nascimento ocorreu aos
27/08/1988, onde consta que ele teria nascido em domicílio (Fazenda Barro Branco);
- CTPS do esposo da autora, onde constam alguns vínculos laborais rurais dele, observando que
o último registro (parcialmente legível) se deu em atividade urbana como “Motorista”
(aparentemente de ônibus), no interregno de 02/05/2003 a 07/08/2008;
- Declaração efetuada por Edson Martins Morais (emitida aos 18/05/2012 – sem reconhecimento
de firmas), onde declara que a autora, juntamente com seu marido, estariam laborando em um
arrendamento de propriedade dele desde 2009 em regime de economia familiar, meeira e
empreita. Tal declaração, no entanto, não serve como início de prova material, pois o documento
se trata, apenas, de prova testemunhal reduzida a termo, com o agravante de não ter sido
produzida sob o crivo do contraditório.
Nada mais.
Com relação ao labor rural, a jurisprudência do E. STJ firmou-se no sentido de que é insuficiente,
de forma isolada, a produção de prova testemunhal para a comprovação de atividade rural, na
forma da Súmula 149 - STJ, in verbis: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à
comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção de benefício previdenciário.".
A testemunha Joel Roberto disse conhecer a autora há cerca de 15 anos na Fazenda Ribeirão,
sendo certo que ela e o marido trabalhavam no local, em atividades rurais. Esclareceu que se
recorda que a autora, ultimamente, teria trabalhado para Martins Moraes, em um arrendamento
que ele teve. Ela trabalhou no local até 2012/2013.
Por sua vez, a testemunha Edson Martins Moraes disse conhecer a autora há dez anos.
Esclareceu que arrendou uma fazenda denominada Bacuri e contratou o casal para tomar conta
do casal e que a autora sempre fez trabalho rural, com criações de pequenos animais e plantação
de horta. Tal trabalho teria persistido até 2012/2013.
Feitas tais considerações, observo que o conjunto probatório é insuficiente à comprovação
vindicada, apresentando inconsistências relevantes. Os parcos documentos apresentados como
início de prova material são de épocas antigas e nunca qualificaram a autora como trabalhadora
rural, com exceção da recente Declaração de União Estável, produzida somente depois de já ter
sido completado o requisito etário.
Não há qualquer indício de que a autora e seu esposo tenham residido ou trabalhado no Sítio
“Bacuri” em regime de economia familiar entre 2009/2013, pois a declaração extemporânea
apresentada não serve como início de prova material e não há qualquer outro documento
contemporâneo à época dos fatos, tal como notas fiscais/contratos de arrendamento, parceria ou
de empreita, a indicar a realização de eventual atividade rural no local em questão e a veracidade
das alegações.
Os depoimentos prestados são genéricos e imprecisos, não conseguindo pormenorizar, de forma
minimamente razoável, onde a autora teria trabalhado e por quanto tempo teria perdurado. Aliás,
oportuno verificar que nenhuma testemunha indicou o esposo da autora como motorista,
profissão urbana essa que ele exerceu, de forma incontroversa, entre 2003 a 2008, segundo
consta de sua CTPS.
Dessa forma, não restando comprovada a realização de trabalho rural pelo período de carência e,
também, no momento imediatamente anterior ao implemento do requisito etário/requerimento
administrativo, não servindo a prova testemunhal exclusivamente para tal finalidade, entendo que
não restaram configurados os requisitos necessários à concessão da benesse vindicada, motivo
pelo qual a reforma da r. sentença seria medida imperativa.
Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP).
Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito previdenciário da parte autora,
a extinção do processo sem julgamento do mérito.
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), cuja
exigibilidade observará o disposto no artigo 12 da Lei nº 1.060/1950 (artigo 98, § 3º, do Código de
Processo Civil/2015), por ser beneficiária da justiça gratuita.
Por fim, revogo a antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida. Comunique-se ao
INSS, pelo meio mais expedito, independentemente do trânsito em julgado.
A questão relativa à obrigatoriedade ou não de devolução dos valores recebidos pela parte autora
deverá ser dirimida pelo Juízo da Execução após a eventual revisão do entendimento firmado no
Tema Repetitivo 692 pela C. Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça.
Por esses fundamentos, dou parcial provimento à apelação do INSS, extinguindo o processo nos
termos do artigo 485, IV, do CPC, conforme ora consignado, revogando a tutela concedida.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. ATIVIDADE RURAL PELO PERÍODO DE CARÊNCIA E NO MOMENTO
IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO NÃO
COMPROVADAS. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. PROCESSO EXTINTO.
TUTELA REVOGADA.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
2. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
4. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
5. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
6. Feitas tais considerações, observo que o conjunto probatório é insuficiente à comprovação
vindicada, apresentando inconsistências relevantes. Os parcos documentos apresentados como
início de prova material são de épocas antigas e nunca qualificaram a autora como trabalhadora
rural, com exceção da recente Declaração de União Estável, produzida somente depois de já ter
sido completado o requisito etário. Não há qualquer indício de que a autora e seu esposo tenham
residido ou trabalhado no Sítio “Bacuri” em regime de economia familiar entre 2009/2013, pois a
declaração extemporânea apresentada não serve como início de prova material e não há
qualquer outro documento contemporâneo à época dos fatos, tal como notas fiscais/contratos de
arrendamento, parceria ou de empreita, a indicar a realização de eventual atividade rural no local
em questão e a veracidade das alegações. Os depoimentos prestados são genéricos e
imprecisos, não conseguindo pormenorizar, de forma minimamente razoável, onde a autora teria
trabalhado e por quanto tempo teria perdurado. Aliás, oportuno verificar que nenhuma
testemunha indicou o esposo da autora como motorista, profissão urbana essa que ele exerceu,
de forma incontroversa, entre 2003 a 2008, segundo consta de sua CTPS. Dessa forma, não
restando comprovada a realização de trabalho rural pelo período de carência e, também, no
momento imediatamente anterior ao implemento do requisito etário/requerimento administrativo,
não servindo a prova testemunhal exclusivamente para tal finalidade, entendo que não restaram
configurados os requisitos necessários à concessão da benesse vindicada, motivo pelo qual a
reforma da r. sentença seria medida imperativa.
7. Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP). Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito
previdenciário da parte autora, a extinção do processo sem julgamento do mérito.
8. Por fim, revogo a antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida. Comunique-se ao
INSS, pelo meio mais expedito, independentemente do trânsito em julgado. A questão relativa à
obrigatoriedade ou não de devolução dos valores recebidos pela parte autora deverá ser dirimida
pelo Juízo da Execução após a eventual revisão do entendimento firmado no Tema Repetitivo
692 pela C. Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça.
9. Apelação do INSS parcialmente provida. Processo extinto. Tutela revogada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS, extinguindo o processo nos
termos do artigo 485, IV, do CPC, revogando a tutela concedida, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
