Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5000392-39.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
20/01/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 18/02/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. ATIVIDADE RURAL PELO PERÍODO DE CARÊNCIA NÃO COMPROVADA.
APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. PROCESSO EXTINTO.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
2. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
4. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
5. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
6. Feitas tais considerações, entendo que o conjunto probatório é frágil à comprovação de
atividade campesina dela em regime de economia familiar por todo o período de carência, em
razão de o feito apresentar inconsistências e lacunas relevantes que não podem ser ignoradas.
Em que pese as testemunhas afirmarem o labor rural da autora em regime de economia familiar
na produção de verduras por período superior à carência necessária, a prova documental
colacionada aos autos é predominantemente recente, produzida depois de implementado o
requisito etário dela e não demonstra cabalmente o alegado. A Declaração de Exercício Rural da
autora não pode ser considerada como início de prova material, pois não homologada. O Contrato
de Aluguel é recente e foi firmado apenas em 2015, com vigência até 2017. A declaração de
União Estável foi produzida somente em 2017. O CNIS demonstra que ela já exerceu atividades
urbanas, o que contraria a alegação constante da exordial de que ela teria dedicado sua vida ao
labor rural. Não foram apresentadas quaisquer notas fiscais de aquisição de insumos e/ou
sementes ou mesmo de comercialização da suposta produção feita pelo casal. Não há qualquer
documento a indicar, a que título, ela teria residido na Fazenda/Assentamento Santa Olga. E pelo
confronto entre o Contrato de Aluguel e a Declaração de União Estável é possível verificar que o
suposto companheiro dela seria casado em 2015 e divorciado em 2017, de modo a tornar
duvidosa a tese de que a autora conviveria com ele em união estável desde 1998. Dessa forma,
não restando comprovada a realização de trabalho rural da autora em regime de economia
familiar pelo período de carência, entendo que não restaram configurados os requisitos
necessários à concessão da benesse vindicada, motivo pelo qual a reforma da r. sentença seria
medida imperativa.
7. Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP). Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito
previdenciário da parte autora, a extinção do processo sem julgamento do mérito.
8. Apelação do INSS parcialmente provida. Processo extinto.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000392-39.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: VERA LUCIA NOBUKO SHIROMA
Advogado do(a) APELADO: REGIS FERNANDO HIGINO MEDEIROS - SP201984-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000392-39.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: VERA LUCIA NOBUKO SHIROMA
Advogado do(a) APELADO: REGIS FERNANDO HIGINO MEDEIROS - SP201984-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra a r. sentença de primeiro grau que, declarando
a prescrição das verbas relativas aos cinco anos anteriores ao ajuizamento da presente demanda
(artigo 103, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91), julgou procedente a pretensão da requerente em
face do INSS para, com fundamento nos artigos 48, 142 e 143, da lei nº 8.213/91, determinar a
implantação da aposentadoria por idade rural à requerente, no valor de 01 (um) salário mínimo
mensal, a contar da data do requerimento administrativo, com abono anual, em dezembro,
também no valor de 01 (um) salário mínimo. Consignou que, nos termos do artigo 1º -F da Lei
11.960/09, deverão incidir para fins de correção monetária e compensação da mora, uma única
vez, até o efetivo pagamento, os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à
caderneta de poupança, a partir da citação. Por fim, consoante o disposto nos parágrafos 1º e 2º
do artigo 24 da Lei Estadual 3.779, de 11/11/2009 (Regimento de Custas do Estado de Mato
Grosso do Sul), condenou a Autarquia Previdenciária ao pagamento das custas processuais, bem
como em verba honorária fixada em 10% sobre o valor da soma das prestações vencidas até a
data da prolação da r. sentença, nos termos do art. 85, §3º inciso I, do CPC, e da Súmula 111 do
C. STJ.
Sentença não submetida ao reexame necessário.
Sustenta o INSS, em suas razões recursais e em apertada síntese, que a parte autora não
comprovou o exercício de trabalho rural pelo período de carência e no momento imediatamente
anterior ao implemento do requisito etário, motivando as razões de sua insurgência.
Subsidiariamente, pleiteia a alteração dos consectários legais fixados e a fixação da verba
honorária somente quando da liquidação do julgado.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000392-39.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: VERA LUCIA NOBUKO SHIROMA
Advogado do(a) APELADO: REGIS FERNANDO HIGINO MEDEIROS - SP201984-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado mostra-se formalmente regular,
motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação
(art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e
inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o e passo a apreciá-lo nos termos do artigo 1.011
do Código de Processo Civil.
A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos,
se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de atividade
rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal. Ademais, para a concessão de benefícios rurais, houve um
abrandamento no rigorismo da lei quanto à comprovação da condição de rurícola dos
trabalhadores do campo, permitindo-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até
mesmo dos pais aos filhos, ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os
cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da
atividade campesina não tenha se dado sob o regime de economia familiar.
Cumpre ressaltar que, em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social,
não se pode exigir dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições
previdenciárias, quando é de notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são
desenvolvidas, cumprindo aqui dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma
subordinação, haja vista que a contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos
chamados "gatos". Semelhante exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores
qualquer possibilidade de auferir o benefício conferido, em razão de sua atividade.
O art. 143 da Lei n.º 8.213/1991, com a redação dada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, dispõe
que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Quanto a se provar o efetivo exercício de atividade rural, o Superior Tribunal de Justiça considera
prescindível a abrangência de todo o período de carência previsto no art. 142 da Lei de
Benefícios pela prova material, desde que a prova testemunhal demonstre sua solidez, permitindo
sua vinculação ao tempo de carência. Tal solução, conhecida como "pro misero", se dá em
virtude da precariedade dos registros de vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda
comum em tempos recentes e bastante disseminada em outras épocas.
Saliento, ainda, que, segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp
1354908, em sede de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo
no momento em que completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade,
a fim de atender ao segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o
segurado especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 25/02/1955, comprovou o cumprimento do
requisito etário no ano de 2010. Assim, considerando que o implemento desse requisito se deu
quando ainda não encerrada a prorrogação prevista no art. 143 da Lei de Benefícios, a
comprovação de atividade campesina se dá por maio de início razoável de prova material,
corroborada por prova testemunhal.
Frise-se, por derradeiro, que o regime de economia familiar pressupõe a exploração de atividade
primária pelo indivíduo, como principal forma de sustento, acompanhado ou não pelo grupo
familiar, mas sem o auxílio de empregados (art. 11, VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91). Assim, nos
termos do art. 11, VII, da Lei 8.213/91, consideram-se segurados especiais, em regime de
economia familiar, os produtores, parceiros, meeiros, arrendatários rurais, pescadores artesanais
e assemelhados, que exerçam atividades individualmente ou com auxílio eventual de terceiros,
bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde
que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo, residindo na área rural ou em
imóvel próximo ao local onde a atividade rural é exercida e com participação significativa nas
atividades rurais do grupo familiar.
Na exordial, a parte autora alegou genericamente que, in litteris:
“(...)
A requerente nasceu no dia 25 de fevereiro de 1955, encontrando-se atualmente com 62 anos de
idade, vida esta dedicada ao labor rural.
A Parte Autora, na qualidade de trabalhador rural, requereu em 10/01/2018 a concessão do
benefício de aposentadoria por idade rural na agência da Previdência Social da sua cidade,
sendo que o mesmo foi agendado somente para 24/01/2018 ás 12:00 sob o número de protocolo
nº 133.668.0983, onde aguarda o resultado em casa.
Todavia, a Parte Autora preenche todos os requisitos necessários a concessão do benefício.
Desta forma, a limitação apresentada pelo INSS não se justifica, razão pela qual busca o Poder
Judiciário para ver seu direito reconhecido.
(...)”
No que tange ao suposto exercício de atividade rural, para fins de comprovação de início de
prova material, a parte autora apresentou:
- CTPS da autora, emitida em 1997, sem apresentação de cópias das partes relacionadas a
eventuais contratos de trabalho;
- Escritura Pública de Declaração de União estável da autora, lavrada em 03/08/2017, onde ela e
seu companheiro (Manoel Kasuo Yoshihara – qualificado como divorciado no documento),
declararam viver em união estável desde 05/04/1998;
- Contrato de Locação Comercial, aparentemente firmado em 09/05/2015, constando apenas o
reconhecimento de firma da autora em 11/09/2015 na qualidade de fiadora de tal contrato (não
foram assinadas as firmas dos demais signatários), onde consta que o suposto companheiro
(qualificado como agricultor e casado no documento), alugou um imóvel rural com área de 9,68
hectares. O aluguel se refere a uma área de 16.000 metros quadrados e inclui uma casa
residencial, sendo certo que o restante da área do imóvel (incluindo pastagens) continuarão a ser
utilizados pela locadora. O contrato possui vigência de 10/09/2015 a 09/09/2017;
- Ficha de admissão da autora junto ao Sindicato de Trabalhadores Rurais de Batayporã,
constando sua admissão junto ao referido sindicato em 2001 e que ela seria residente no
Assentamento Santa Olga – Lote 48 e viveria em união estável;
- Declaração de Exercício de Atividade Rural do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Batayporã/MS, onde consta que a autora teria exercido a atividade campesina no período de
2000 a 2017 em regime de economia familiar no mesmo imóvel objeto do contrato de locação
acima descrito, na produção de hortaliças;
Nada mais.
Com relação ao labor rural, a jurisprudência do E. STJ firmou-se no sentido de que é insuficiente,
de forma isolada, a produção de prova testemunhal para a comprovação de atividade rural, na
forma da Súmula 149 - STJ, in verbis: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à com
provação da atividade rurícola, para efeito de obtenção de benefício previdenciário.".
A testemunha José Aparecido Ferreira disse conhecer a autora há 12 anos e, hodiernamente, ela
trabalha em uma chácara alugada, na produção e comercialização de verduras, juntamente como
o marido. Não sabe se a autora exerceu atividades urbanas ou trabalhou como diarista.
Esclareceu que, anteriormente, a autora trabalhava na Fazenda Santa Olga, local que se tornou
assentamento, e que sempre viveu em união estável com seu companheiro. Por sua vez, a
testemunha Eunice Medeiros de Farias disse conhecer a autora há cerca de 17 anos e que ela,
até hoje em dia, trabalha com verduras em uma chácara alugada. No local morariam a esposa e
seu companheiro. Disse que a autora já trabalhou, anteriormente, na Santa Olga, e que a
atividade dela sempre foi rural.
Feitas tais considerações, entendo que o conjunto probatório é frágil à comprovação de atividade
campesina dela em regime de economia familiar por todo o período de carência, em razão de o
feito apresentar inconsistências e lacunas relevantes que não podem ser ignoradas. Em que pese
as testemunhas afirmarem o labor rural da autora em regime de economia familiar na produção
de verduras por período superior à carência necessária, a prova documental colacionada aos
autos é predominantemente recente, produzida depois de implementado o requisito etário dela e
não demonstra cabalmente o alegado.
A Declaração de Exercício Rural da autora não pode ser considerada como início de prova
material, pois não homologada. O Contrato de Aluguel é recente e foi firmado apenas em 2015,
com vigência até 2017. A declaração de União Estável foi produzida somente em 2017. O CNIS
demonstra que ela já exerceu atividades urbanas, o que contraria a alegação constante da
exordial de que ela teria dedicado sua vida ao labor rural. Não foram apresentadas quaisquer
notas fiscais de aquisição de insumos e/ou sementes ou mesmo de comercialização da suposta
produção feita pelo casal. Não há qualquer documento a indicar, a que título, ela teria residido na
Fazenda/Assentamento Santa Olga. E pelo confronto entre o Contrato de Aluguel e a Declaração
de União Estável é possível verificar que o suposto companheiro dela seria casado em 2015 e
divorciado em 2017, de modo a tornar duvidosa a tese de que a autora conviveria com ele em
união estável desde 1998.
Dessa forma, não restando comprovada a realização de trabalho rural da autora em regime de
economia familiar pelo período de carência, entendo que não restaram configurados os requisitos
necessários à concessão da benesse vindicada, motivo pelo qual a reforma da r. sentença seria
medida imperativa.
Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP).
Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito previdenciário da parte autora,
a extinção do processo sem julgamento do mérito.
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), cuja
exigibilidade observará o disposto no artigo 12 da Lei nº 1.060/1950 (artigo 98, § 3º, do Código de
Processo Civil/2015), por ser beneficiária da justiça gratuita.
Por esses fundamentos, dou parcial provimento à apelação do INSS, extinguindo o processo nos
termos do artigo 485, IV, do CPC, conforme ora consignado.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. ATIVIDADE RURAL PELO PERÍODO DE CARÊNCIA NÃO COMPROVADA.
APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. PROCESSO EXTINTO.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
2. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
4. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
5. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
6. Feitas tais considerações, entendo que o conjunto probatório é frágil à comprovação de
atividade campesina dela em regime de economia familiar por todo o período de carência, em
razão de o feito apresentar inconsistências e lacunas relevantes que não podem ser ignoradas.
Em que pese as testemunhas afirmarem o labor rural da autora em regime de economia familiar
na produção de verduras por período superior à carência necessária, a prova documental
colacionada aos autos é predominantemente recente, produzida depois de implementado o
requisito etário dela e não demonstra cabalmente o alegado. A Declaração de Exercício Rural da
autora não pode ser considerada como início de prova material, pois não homologada. O Contrato
de Aluguel é recente e foi firmado apenas em 2015, com vigência até 2017. A declaração de
União Estável foi produzida somente em 2017. O CNIS demonstra que ela já exerceu atividades
urbanas, o que contraria a alegação constante da exordial de que ela teria dedicado sua vida ao
labor rural. Não foram apresentadas quaisquer notas fiscais de aquisição de insumos e/ou
sementes ou mesmo de comercialização da suposta produção feita pelo casal. Não há qualquer
documento a indicar, a que título, ela teria residido na Fazenda/Assentamento Santa Olga. E pelo
confronto entre o Contrato de Aluguel e a Declaração de União Estável é possível verificar que o
suposto companheiro dela seria casado em 2015 e divorciado em 2017, de modo a tornar
duvidosa a tese de que a autora conviveria com ele em união estável desde 1998. Dessa forma,
não restando comprovada a realização de trabalho rural da autora em regime de economia
familiar pelo período de carência, entendo que não restaram configurados os requisitos
necessários à concessão da benesse vindicada, motivo pelo qual a reforma da r. sentença seria
medida imperativa.
7. Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP). Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito
previdenciário da parte autora, a extinção do processo sem julgamento do mérito.
8. Apelação do INSS parcialmente provida. Processo extinto.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS, extinguindo o processo nos
termos do artigo 485, IV, do CPC, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
