Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5072342-45.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
20/01/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 12/02/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. ATIVIDADE RURAL PELO PERÍODO DE CARÊNCIA NÃO COMPROVADA.
APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. PROCESSO EXTINTO. TUTELA
REVOGADA.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
2. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
benefício conferido, em razão de sua atividade.
4. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
5. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
6. Feitas tais considerações, entendo que o conjunto probatório é frágil à comprovação de
atividade campesina dela em regime de economia familiar, em especial pelo período de carência
necessário, em razão de apresentar inconsistências e lacunas relevantes que não podem ser
ignoradas. Em que pese as testemunhas afirmarem o labor rural da autora por cerca de 20/25
anos em regime de economia familiar na cidade de Iguape/SP, a prova documental não
demonstra cabalmente o alegado. A Declaração de Exercício Rural da autora, apesar de não ser
considerada como início de prova material, pois não homologada, apresenta situação inverídica,
pois é inequívoco que a autora não poderia ter trabalhado em um sítio denominado “Ouro Verde”,
no município de Iguape/SP, no interregno de 29/11/1982 a 30/03/2017. As certidões de
nascimento de seus filhos, nascidos em 1983 e 1984, apontam que eles teriam nascido em
Pariquera-Açu/SP e Registro/SP, respectivamente. E por ocasião do óbito do esposo da autora,
ocorrido em 1989, é certo que o casal residiria em Ibiúna/SP, e não em Iguape/SP. Além disso,
em 2003, a autora teria adquirido um sofá e indicado seu endereço no Sítio Ponte de Aço, e não
no Sítio Ouro Verde. O contrato particular de parceria não pode ser considerado como início de
prova material, porquanto impossível saber quando foi produzido tal documento. Além disso, não
há dados que indiquem quando a autora e seu suposto companheiro começaram a conviver
maritalmente. Nem as testemunhas fizeram qualquer alusão a esse respeito. Dessa forma,
mesmo que fosse possível entender que a autora exerceu atividade campesina em regime de
economia familiar, ao menos depois de firmado o contrato de cessão de um imóvel rural em 2011,
não restaria completada a carência mínima necessária à concessão da benesse vindicada.
Assim, não restando comprovada a realização de trabalho rural pelo período de carência, entendo
que não restaram configurados os requisitos necessários à concessão da benesse vindicada,
motivo pelo qual a reforma da r. sentença seria medida imperativa.
7. Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP). Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito
previdenciário da parte autora, a extinção do processo sem julgamento do mérito.
8. Por fim, revogo a antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida. Comunique-se ao
INSS, pelo meio mais expedito, independentemente do trânsito em julgado. A questão relativa à
obrigatoriedade ou não de devolução dos valores recebidos pela parte autora deverá ser dirimida
pelo Juízo da Execução após a eventual revisão do entendimento firmado no Tema Repetitivo
692 pela C. Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça.
9. Apelação do INSS parcialmente provida. Processo extinto. Tutela revogada.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5072342-45.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA MADALENA ISIDIO DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: MARCIO LISBOA MARTINS - SP224010-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5072342-45.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA MADALENA ISIDIO DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: MARCIO LISBOA MARTINS - SP224010-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra a r. sentença de primeiro grau que julgou
procedente o pedido lançado na inicial, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso
I, do Código de Processo Civil, para condenar o INSS a conceder aposentadoria rural por idade
em favor da autora, desde 30/01/2017 (data do pedido administrativo). Concedeu a antecipação
de tutela para implantação do referido benefício. Condenou o INSS, ainda, ao pagamento de
honorários advocatícios, arbitrados em 10% do valor da condenação, abrangidas para este fim as
prestações vencidas até a data da r. sentença, nos termos da Súmula 111, do C. STJ,
consignando os consectários legais aplicáveis na espécie. Por fim, deixou de condenar o INSS ao
pagamento de custas processuais, por força de lei.
Sentença não submetida ao reexame necessário.
Sustenta o INSS, em suas razões recursais e em apertada síntese, que a parte autora não
comprovou o exercício de trabalho rural pelo período de carência e no momento imediatamente
anterior ao implemento do requisito etário, aduzindo que não foram apresentados documentos
suficientes para comprovar a atividade campesina da autora pelo período de carência, bem como
alega que o filho da autora possui vínculos empregatícios como empregado entre 2008 a 2018,
descaracterizando o regime de economia familiar sustentado. Subsidiariamente, pleiteia a
alteração dos consectários legais fixados e a fixação da verba honorária somente quando da
liquidação do julgado.
Com as contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5072342-45.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA MADALENA ISIDIO DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: MARCIO LISBOA MARTINS - SP224010-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado mostra-se formalmente regular,
motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação
(art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e
inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o e passo a apreciá-lo nos termos do artigo 1.011
do Código de Processo Civil.
A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos,
se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de atividade
rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal. Ademais, para a concessão de benefícios rurais, houve um
abrandamento no rigorismo da lei quanto à comprovação da condição de rurícola dos
trabalhadores do campo, permitindo-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até
mesmo dos pais aos filhos, ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os
cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da
atividade campesina não tenha se dado sob o regime de economia familiar.
Cumpre ressaltar que, em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social,
não se pode exigir dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições
previdenciárias, quando é de notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são
desenvolvidas, cumprindo aqui dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma
subordinação, haja vista que a contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos
chamados "gatos". Semelhante exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores
qualquer possibilidade de auferir o benefício conferido, em razão de sua atividade.
O art. 143 da Lei n.º 8.213/1991, com a redação dada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, dispõe
que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Quanto a se provar o efetivo exercício de atividade rural, o Superior Tribunal de Justiça considera
prescindível a abrangência de todo o período de carência previsto no art. 142 da Lei de
Benefícios pela prova material, desde que a prova testemunhal demonstre sua solidez, permitindo
sua vinculação ao tempo de carência. Tal solução, conhecida como "pro misero", se dá em
virtude da precariedade dos registros de vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda
comum em tempos recentes e bastante disseminada em outras épocas.
Saliento, ainda, que, segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp
1354908, em sede de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo
no momento em que completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade,
a fim de atender ao segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o
segurado especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
No caso dos autos, a parte autora (que percebe pensão por morte instituída por seu falecido
esposo desde 1989), nascida em 05/08/1961, comprovou o cumprimento do requisito etário no
ano de 2016. Assim, considerando que o implemento desse requisito se deu quando já havia
encerrada a prorrogação prevista no art. 143 da Lei de Benefícios, é necessária, após
31/12/2010, a comprovação do recolhimento de contribuições para os empregados rurais,
trabalhadores avulsos e diaristas, além da comprovação do cumprimento da carência de 180
meses, a teor do que dispõe o art. 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91, com vistas à concessão do
benefício.
Assim, considerando que o implemento do requisito em questão se deu quando já havia
encerrado a prorrogação prevista no art. 143, da Lei de Benefícios, é necessário, após
31/12/2010, a comprovação do recolhimento de contribuições para os empregados rurais,
trabalhadores avulsos e diaristas e o cumprimento da carência de 180 meses, a teor do que
dispõe o art. 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91, existindo a necessidade de comprovação de
recolhimentos de contribuições previdenciárias a fim de ser concedido o benefício.
Antes de analisar os requisitos relativos à qualidade de segurado e ao cumprimento da carência,
cumpre salientar que o esgotamento do prazo acima referido não constitui óbice à percepção de
benefícios previdenciários no valor de um salário mínimo, nos termos do disposto no art. 39, I, da
Lei nº 8.213/91.
No entanto, o exercício de atividades rurais relativo ao período encerrado em 31/12/2010 há de
ser comprovado de igual modo, ou seja, bastando a apresentação de início de prova material
corroborada por testemunhos. E, quanto ao período posterior, iniciado em 01/01/2011 até
31/12/2015, o labor rural deve ser comprovado por prova material, não bastando o início de
prova, correspondendo cada mês comprovado a três meses de carência, limitados a 12 meses
dentro do ano civil. E a partir de 01/01/2016 até 31/12/2020, o labor rural deve ser comprovado da
forma anteriormente consignada, correspondendo cada mês comprovado, agora, a dois meses de
carência, limitados a 12 meses dentro do ano civil,conforme as regras introduzidas pela Lei
11.718/08, em seu art. 2º, parágrafo único e art. 3º, incisos I, II e III.
Em suma, considera-se que a simples limitação temporal das regras prescritas pelo art. 143 da
Lei de Benefícios, por si só, não obsta a comprovação do exercício de atividades rurais nem a
percepção do benefício, desde que comprovado os recolhimentos obrigatórios, que passaram a
ser exigidos após o advento das novas regras introduzidas pela Lei nº 11.718/08.
Frise-se que, caso o labor campesino tenha se dado em regime de economia familiar, cuja
atividade não foi contemplada pela alteração da lei acima referida, o trabalho rural poderá ser
reconhecido sem a observação da alteração legal constante da Lei de Benefícios. Essa é a
hipótese trazida pela exordial.
Observo, por derradeiro, que o referido regime pressupõe a exploração de atividade primária pelo
indivíduo, como principal forma de sustento, acompanhado ou não pelo grupo familiar, mas sem o
auxílio de empregados (art. 11, VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91). Assim, nos termos do art. 11, VII,
da Lei 8.213/91, consideram-se segurados especiais, em regime de economia familiar, os
produtores, parceiros, meeiros, arrendatários rurais, pescadores artesanais e assemelhados, que
exerçam atividades individualmente ou com auxílio eventual de terceiros, bem como seus
respectivos cônjuges ou companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde que trabalhem,
comprovadamente, com o grupo familiar respectivo, residindo na área rural ou em imóvel próximo
ao local onde a atividade rural é exercida e com participação significativa nas atividades rurais do
grupo familiar.
Na exordial, a parte autora alegou genericamente que, in litteris:
“(...)
A autora nasceu no dia 05 de agosto de 1961, conforme se constata pelo documento de
identidade anexo, e vive na zona rural do município, conforme endereço acima e documentos que
comprovam o alegado, lugar em que também exerce a atividade de lavradora .
O seu trabalho exercido na lavoura é para a própria subsistência e da família, em regime de
economia familiar, atendendo, portanto, todos os requisitos para a concessão de aposentadoria
por idade, conforme os preceitos legais vigentes, em especial o artigo 48 da Lei 8.213/01.
A atividade de lavradora exercida pela autora pode ser constatada por meio da vasta
documentação acostada, como fotos; certidão de casamento, onde indica que o seu marido era
lavrador; certidão de óbito, onde também consta a profissão do seu falecido marido como
lavrador; certidão de nascimento dos seus filhos onde consta a sua profissão e a de seu marido
como lavradores; certidão do cartório eleitoral da comarca; filiação ao Sindicato dos
Trabalhadores Rurais de Iguape; contrato particular de cessão e transferência de direitos
possessórios e notas que demonstram a produção rural, sendo que a tese será oportunamente
confirmada pelas testemunhas abaixo arroladas.
Na tentativa de ter o seu benefício, a autora se dirigiu diretamente à uma agência do INSS, onde
lhe foi negado tal direito sob o fundamento de não ter cumprido a carência mínima exigida, motivo
pelo qual promove a presente ação.
(...)”
No que tange ao suposto exercício de atividade rural, para fins de comprovação de início de
prova material, a parte autora apresentou:
- 6 fotografias de uma pessoa com um objeto não identificável de madeira nas mãos, aparentando
efetuar atividade agrícola;
- Certidão de Casamento da autora com Gentil Gastão dos Santos, cujo enlace matrimonial
ocorreu aparentemente em 1978 no município de Iporanga/SP, onde consta a profissão dele
como “lavrador” e a autora como “do lar”;
- Certidão de óbito do falecido esposo da autora (Gentil Gastão dos Santos), cujo passamento
ocorreu aos 17/07/1989 em Ibiúna/SP, onde consta que ele seria “lavrador”;
- Certidão de Nascimento de um filho da autora (Leonilson), nascido em 11/03/1983 em
Pariquera-Açu/SP, onde consta que a autora e seu marido seriam “lavradores”;
- Certidão de Nascimento de uma filha da autora (Leide), nascida em 19/07/1984 em Registro/SP,
onde consta que a autora e seu marido seriam “lavradores”;
- Certidão do Cartório Eleitoral de Iguape/SP, emitida em 08/12/2016, onde consta que a autora
teria declarado sua ocupação como “agricultor”, que ressalta que tal dado é meramente
declaratório, sem valor probatório;
- Declaração de Atividade Rural do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Iguape emitida em
30/03/2017, onde consta a filiação da autora somente em 09/08/2012, na qual ela declarou ter
exercido atividade campesina em regime de economia familiar de 09/09/2011 a 30/03/2017 em
sítio de sua propriedade na cidade de Iguape/SP, com área de 0,1 hectares, como também em
outro sítio denominado “Ouro Verde”, no mesmo município de Iguape/SP e área de 8,0 hectares,
de 29/11/1982 a 30/03/2017, também em regime de economia familiar;
- Contrato Particular de Parceria Agrícola firmado entre Joel de Freitas Reis e Pedro Morato da
Costa (suposto companheiro da autora) relacionado a um imóvel rural denominado Sítio Ouro
Verde, sendo objeto da parceria a produção e comercialização de chuchu. Tal contrato teria
vigência de 3 anos e foi firmado aparentemente em 2006, sendo certo que as firmas ali apostas
não foram reconhecidas;
- Instrumento Particular de Cessão e Transferência de Direitos Possessórios firmado entre
Deusdete Pacheco Dias, de um lado, e a autora juntamente com Pedro Morato da Costa (que se
declarou como solteiro na ocasião), de outro lado, cujo objeto é a cessão de direitos possessórios
de um imóvel em área rural que mede 288 metros quadrados, localizado na cidade de Iguape/SP,
aparentemente firmado em 09/09/2011, onde consta um ilegível reconhecimento de firmas;
- Nota Fiscal de compra de um jogo de sofá pela autora em 2003, indicando que seu endereço
seria o Sítio Ponte de Aço em Iguape/SP;
- Documentos não especificados, a indicar que o suposto companheiro da autora efetuou venda
de chuchu a terceiros, no ano de 2001;
- Algumas poucas notas fiscais emitidas em 2014/2015, relacionadas à autora e seu suposto
companheiro, indicando a venda de pequena quantidade de produtos agrícolas;
Com relação ao labor rural, a jurisprudência do E. STJ firmou-se no sentido de que é insuficiente,
de forma isolada, a produção de prova testemunhal para a comprovação de atividade rural, na
forma da Súmula 149 - STJ, in verbis: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à com
provação da atividade rurícola, para efeito de obtenção de benefício previdenciário.".
A testemunha Eli disse conhecer a autora há 25 anos e disse que ela realiza algumas plantações,
quase sempre sozinha. Esclareceu que se trata de agricultura de subsistência, onde o excedente
é comercializado. Por sua vez, a testemunha Sidnei disse conhecer a autora também há cerca de
25 anos, sendo amigo dela. No entanto, restou compromissada pelo juízo e afirmou que ela
trabalha como dona de casa e na roça, plantando especialmente chuchu, juntamente com o
companheiro dela. Esclareceu que o excedente da produção é comercializado. Por fim, a
testemunha Sirlene, que disse ser amiga íntima da autora e não restou compromissada, afirmou
conhecê-la há cerca de 20 anos e que ela sempre trabalhou, nesse período, na “roça”, com a
ajuda de seu companheiro, situação essa que permaneceria inalterada até os dias atuais. Por fim,
tal como afirmado pelas demais testemunhas, disse que não há empregados no local e que o
excedente da produção realizada é comercializado.
Feitas tais considerações, entendo que o conjunto probatório é frágil à comprovação de atividade
campesina dela em regime de economia familiar, em especial pelo período de carência
necessário, em razão de apresentar inconsistências e lacunas relevantes que não podem ser
ignoradas. Em que pese as testemunhas afirmarem o labor rural da autora por cerca de 20/25
anos em regime de economia familiar na cidade de Iguape/SP, a prova documental não
demonstra cabalmente o alegado.
A Declaração de Exercício Rural da autora, apesar de não ser considerada como início de prova
material, pois não homologada, apresenta situação inverídica, pois é inequívoco que a autora não
poderia ter trabalhado em um sítio denominado “Ouro Verde”, no município de Iguape/SP, no
interregno de 29/11/1982 a 30/03/2017. As certidões de nascimento de seus filhos, nascidos em
1983 e 1984, apontam que eles teriam nascido em Pariquera-Açu/SP e Registro/SP,
respectivamente. E por ocasião do óbito do esposo da autora, ocorrido em 1989, é certo que o
casal residiria em Ibiúna/SP, e não em Iguape/SP. Além disso, em 2003, a autora teria adquirido
um sofá e indicado seu endereço no Sítio Ponte de Aço, e não no Sítio Ouro Verde.
O contrato particular de parceria não pode ser considerado como início de prova material,
porquanto impossível saber quando foi produzido tal documento. Além disso, não há dados que
indiquem quando a autora e seu suposto companheiro começaram a conviver maritalmente. Nem
as testemunhas fizeram qualquer alusão a esse respeito.
Dessa forma, mesmo que fosse possível entender que a autora exerceu atividade campesina em
regime de economia familiar, ao menos depois de firmado o contrato de cessão de um imóvel
rural em 2011, não restaria completada a carência mínima necessária à concessão da benesse
vindicada.
Assim, não restando comprovada a realização de trabalho rural pelo período de carência, entendo
que não restaram configurados os requisitos necessários à concessão da benesse vindicada,
motivo pelo qual a reforma da r. sentença seria medida imperativa.
Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP).
Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito previdenciário da parte autora,
a extinção do processo sem julgamento do mérito.
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), cuja
exigibilidade observará o disposto no artigo 12 da Lei nº 1.060/1950 (artigo 98, § 3º, do Código de
Processo Civil/2015), por ser beneficiária da justiça gratuita.
Por fim, revogo a antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida. Comunique-se ao
INSS, pelo meio mais expedito, independentemente do trânsito em julgado.
A questão relativa à obrigatoriedade ou não de devolução dos valores recebidos pela parte autora
deverá ser dirimida pelo Juízo da Execução após a eventual revisão do entendimento firmado no
Tema Repetitivo 692 pela C. Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça.
Por esses fundamentos, dou parcial provimento à apelação do INSS, extinguindo o processo nos
termos do artigo 485, IV, do CPC, conforme ora consignado.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. ATIVIDADE RURAL PELO PERÍODO DE CARÊNCIA NÃO COMPROVADA.
APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. PROCESSO EXTINTO. TUTELA
REVOGADA.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
2. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
4. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
5. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
6. Feitas tais considerações, entendo que o conjunto probatório é frágil à comprovação de
atividade campesina dela em regime de economia familiar, em especial pelo período de carência
necessário, em razão de apresentar inconsistências e lacunas relevantes que não podem ser
ignoradas. Em que pese as testemunhas afirmarem o labor rural da autora por cerca de 20/25
anos em regime de economia familiar na cidade de Iguape/SP, a prova documental não
demonstra cabalmente o alegado. A Declaração de Exercício Rural da autora, apesar de não ser
considerada como início de prova material, pois não homologada, apresenta situação inverídica,
pois é inequívoco que a autora não poderia ter trabalhado em um sítio denominado “Ouro Verde”,
no município de Iguape/SP, no interregno de 29/11/1982 a 30/03/2017. As certidões de
nascimento de seus filhos, nascidos em 1983 e 1984, apontam que eles teriam nascido em
Pariquera-Açu/SP e Registro/SP, respectivamente. E por ocasião do óbito do esposo da autora,
ocorrido em 1989, é certo que o casal residiria em Ibiúna/SP, e não em Iguape/SP. Além disso,
em 2003, a autora teria adquirido um sofá e indicado seu endereço no Sítio Ponte de Aço, e não
no Sítio Ouro Verde. O contrato particular de parceria não pode ser considerado como início de
prova material, porquanto impossível saber quando foi produzido tal documento. Além disso, não
há dados que indiquem quando a autora e seu suposto companheiro começaram a conviver
maritalmente. Nem as testemunhas fizeram qualquer alusão a esse respeito. Dessa forma,
mesmo que fosse possível entender que a autora exerceu atividade campesina em regime de
economia familiar, ao menos depois de firmado o contrato de cessão de um imóvel rural em 2011,
não restaria completada a carência mínima necessária à concessão da benesse vindicada.
Assim, não restando comprovada a realização de trabalho rural pelo período de carência, entendo
que não restaram configurados os requisitos necessários à concessão da benesse vindicada,
motivo pelo qual a reforma da r. sentença seria medida imperativa.
7. Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP). Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito
previdenciário da parte autora, a extinção do processo sem julgamento do mérito.
8. Por fim, revogo a antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida. Comunique-se ao
INSS, pelo meio mais expedito, independentemente do trânsito em julgado. A questão relativa à
obrigatoriedade ou não de devolução dos valores recebidos pela parte autora deverá ser dirimida
pelo Juízo da Execução após a eventual revisão do entendimento firmado no Tema Repetitivo
692 pela C. Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça.
9. Apelação do INSS parcialmente provida. Processo extinto. Tutela revogada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS, extinguindo o processo nos
termos do artigo 485, IV, do CPC, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
