Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5005467-93.2018.4.03.9999
Data do Julgamento
17/11/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 24/11/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. CONJUNTO PROBATÓRIO FRÁGIL E INCONSISTENTE. PROCESSO
EXTINTO. ART. 485, IV, DO CPC. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
2. De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal. Ademais, para a concessão de benefícios rurais, houve um
abrandamento no rigorismo da lei quanto à comprovação da condição de rurícola dos
trabalhadores do campo, permitindo-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até
mesmo dos pais aos filhos, ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os
cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da
atividade campesina não tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Cumpre ressaltar que, em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência
Social, não se pode exigir dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições
previdenciárias, quando é de notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são
desenvolvidas, cumprindo aqui dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma
subordinação, haja vista que a contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos
chamados "gatos". Semelhante exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores
qualquer possibilidade de auferir o benefício conferido, em razão de sua atividade.
4. O art. 143 da Lei n.º 8.213/1991, com a redação dada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, dispõe
que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
5. Quanto a se provar o efetivo exercício de atividade rural, o Superior Tribunal de Justiça
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
considera prescindível a abrangência de todo o período de carência previsto no art. 142 da Lei de
Benefícios pela prova material, desde que a prova testemunhal demonstre sua solidez, permitindo
sua vinculação ao tempo de carência. Tal solução, conhecida como "pro misero", se dá em
virtude da precariedade dos registros de vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda
comum em tempos recentes e bastante disseminada em outras épocas.
6. Saliento, ainda, que, segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do
REsp 1354908, em sede de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no
campo no momento em que completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural
por idade, a fim de atender ao segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período
imediatamente anterior ao requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido,
na qual o segurado especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade
rural, já tenha preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e
idade.
7. Ao analisar o conjunto probatório, entendo que o alegado trabalho campesino da autora em
regime de economia familiar (pelo período de carência e no momento imediatamente anterior ao
implemento do requisito etário) não restou cabalmente configurado, porquanto há algumas
inconsistências relevantes no processado que não restaram esclarecidas. A concessão de
benefício de amparo social ao idoso em favor do companheiro da autora, no período de 2002 a
2010, é evidentemente contrário à tese de trabalho campesino do núcleo familiar exercido em
regime de economia familiar. Ademais, no processo apresentado aos autos, após convertido o
julgamento em diligência, consta que a família nem sequer residiria na área de assentamento, o
que é oposto à hipótese ventilada na inicial.
8. As testemunhas ouvidas no processado só conheceram a postulante a partir do momento em
que todos foram assentados no PA Uirapuru, de modo que eventual período anterior de trabalho
campesino não possui condições de ser comprovado. As motivações para negativa do pleito na
seara administrativa (ID 6772813 - pág. 7) indicam que diversos documentos ali colacionados não
foram aqui apresentados, pois aparentemente seriam destoantes com as alegações autorais,
apontando o concurso de mão-de-obra assalariada no local (o que descaracterizaria o regime de
economia familiar vindicado), além de fazer menção a notas fiscais com datas de emissão
incompatíveis com a data de confecção do talão respectivo. Anote-se, por fim, que ao contrário do
afirmado na exordial, seu companheiro nunca esteve aposentado como trabalhador rural,
estando, hodiernamente, percebendo o mesmo beneficio de amparo social que já lhe fora
concedido em oportunidade pretérita, situação essa que também não contribui com a alegação de
trabalho rural do núcleo familiar em regime de subsistência. Assim, mesmo que a prova
testemunhal possa corroborar parcialmente com o alegado na peça inaugural, ela não serve,
exclusivamente, para comprovação de atividade rural, na forma da Súmula 149 – STJ.
9. A reforma integral do r. julgado, nesse contexto, seria medida imperativa, já que não restou
exercido adequadamente o ônus probatório que cabia à demandante. Contudo, de acordo com o
atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a
inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição
e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art.
267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do
CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa." (REsp 1352721/SP). Impõe-se, por
isso, face à ausência de prova constitutiva do direito previdenciário da parte autora, a extinção do
processo sem julgamento do mérito.
10. Apelação do INSS parcialmente provida. Processo extinto.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5005467-93.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - JUIZ CONVOCADO FERNANDO MARCELO MENDES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: IZOLINA LIBERTI QUINTILIANO
Advogado do(a) APELADO: PAULO RENAN PACHE CORREA - MS13961-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5005467-93.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: IZOLINA LIBERTI QUINTILIANO
Advogado do(a) APELADO: PAULO RENAN PACHE CORREA - MS13961-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Toru Yamamoto (Relator):
Trata-se de ação previdenciária onde a parte autora postulou a concessão de aposentadoria por
idade rural.
A r. sentença julgou procedente a pretensão formulada na inicial para determinar ao INSS a
concessão de aposentadoria por idade rural em favor da parte autora, tendo como início a data do
pedido administrativo (15/06/2016), no valor de 01 (um) salário mínimo, nos termos do art. 143,
da Lei 8.213/91, bem como a pagar as diferenças vencidas e vincendas, com correção monetária,
desde o respectivo vencimento até o efetivo pagamento, consignando os consectários legais
aplicáveis na espécie. Condenou a Autarquia Previdenciária ao pagamento dos honorários
advocatícios no valor de 10% sobre as parcelas vencidas até a data da r. sentença, nos termos
da Súmula 111 do C. STJ, considerando os requisitos do artigo 85, §2º I à IV c/c §3º, II do Novo
Código de Processo Civil. Por fim, condenou o INSS, também, ao pagamento das custas
processuais devidas.
Sentença não submetida ao reexame necessário.
Sustenta o INSS, em suas razões recursais e em apertada síntese, que a parte autora não possui
direito à benesse vindicada, motivando as razões de sua insurgência. Requer, nesses termos, a
reforma da r. sentença, com a improcedência do pedido inaugural. Subsidiariamente, pleiteia a
alteração da DIB; redução da verba honorária fixada; alteração dos consectários legais e isenção
das custas processuais
Com as contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
O feito foi convertido em diligência para que o INSS providenciasse o fornecimento de cópias do
Processo Administrativo de concessão de aposentadoria por idade postulado pela parte autora
(NB 1755899936), bem como cópia do Processo Administrativo de concessão de Amparo Social
em favor do companheiro da autora, Sr. ERONIDES LOPES DE ALMEIDA (NB 1219665468), o
que restou parcialmente cumprido pela Autarquia Previdenciária, pois o processo de concessão
de Amparo Social mencionado restou acostado aos autos.
É o sucinto relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5005467-93.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: IZOLINA LIBERTI QUINTILIANO
Advogado do(a) APELADO: PAULO RENAN PACHE CORREA - MS13961-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Toru Yamamoto (Relator):
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado mostra-se formalmente regular,
motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação
(art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e
inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o e passo a apreciá-lo nos termos do artigo 1.011
do Código de Processo Civil.
A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos,
se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de atividade
rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal. Ademais, para a concessão de benefícios rurais, houve um
abrandamento no rigorismo da lei quanto à comprovação da condição de rurícola dos
trabalhadores do campo, permitindo-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até
mesmo dos pais aos filhos, ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os
cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da
atividade campesina não tenha se dado sob o regime de economia familiar.
Cumpre ressaltar que, em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social,
não se pode exigir dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições
previdenciárias, quando é de notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são
desenvolvidas, cumprindo aqui dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma
subordinação, haja vista que a contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos
chamados "gatos". Semelhante exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores
qualquer possibilidade de auferir o benefício conferido, em razão de sua atividade.
O art. 143 da Lei n.º 8.213/1991, com a redação dada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, dispõe
que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Quanto a se provar o efetivo exercício de atividade rural, o Superior Tribunal de Justiça considera
prescindível a abrangência de todo o período de carência previsto no art. 142 da Lei de
Benefícios pela prova material, desde que a prova testemunhal demonstre sua solidez, permitindo
sua vinculação ao tempo de carência. Tal solução, conhecida como "pro misero", se dá em
virtude da precariedade dos registros de vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda
comum em tempos recentes e bastante disseminada em outras épocas.
Saliento, ainda, que, segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp
1354908, em sede de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo
no momento em que completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade,
a fim de atender ao segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o
segurado especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 1960, comprovou o cumprimento do requisito
etário no ano de 2015. Assim, considerando que o implemento desse requisito se deu quando já
havia encerrada a prorrogação prevista no art. 143 da Lei de Benefícios, é necessária, após
31/12/2010, a comprovação do recolhimento de contribuições para os empregados rurais,
trabalhadores avulsos e diaristas, além da comprovação do cumprimento da carência de 180
meses, a teor do que dispõe o art. 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91, com vistas à concessão do
benefício.
No entanto, observo que, caso o labor campesino tenha se dado em regime de economia familiar
(segurado especial), cuja atividade não foi contemplada pela alteração da lei acima referida, o
trabalho rural poderá ser reconhecido sem a observação da alteração legal constante da Lei de
Benefícios. Essa é a hipótese ventilada na peça inaugural.
Cumpre salientar, por derradeiro, que o trabalho campesino exercido em regime de economia
familiar pressupõe a exploração de atividade primária pelo indivíduo, como principal forma de
sustento, acompanhado ou não pelo grupo familiar, mas sem o auxílio de empregados (art. 11,
VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91). Assim, nos termos do art. 11, VII, da Lei 8.213/91, consideram-se
segurados especiais, em regime de economia familiar, os produtores, parceiros, meeiros,
arrendatários rurais, pescadores artesanais e assemelhados, que exerçam atividades
individualmente ou com auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou
companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o
grupo familiar respectivo, residindo na área rural ou em imóvel próximo ao local onde a atividade
rural é exercida e com participação significativa nas atividades rurais do grupo familiar.
Na peça inaugural, a parte autora alega, in litteris:
“(...)
A Autora nasceu em 03 de dezembro de 1960, e está atualmente com 56 anos de idade.
Desde os 15 anos de idade trabalha no campo exercendo atividade rural.
No ano de 1980 passou a conviver com o Sr. Eronides Lopes de Almeida.
Sempre se dedicaram ao trabalho no campo. No início da convivência trabalharam no
Assentamento Colônia Nova, sendo que, no ano de 1999 passaram a exercer atividade rural no
lote 02 do Assentamento Uirapuru, mediante outorga do INCRA (documentos anexos).
Cultivam alimentos e criam alguns animais para subsistência.
Atualmente a Autora reside e trabalha no imóvel acima declinado, juntamente com seu
companheiro que já se encontra aposentado como trabalhador rural.
O exercício de atividade rural, pelo período acima descrito, foi testemunhado pelas pessoas
relacionadas ao final, que comparecerão à audiência a ser designada por Vossa Excelência,
independentemente de intimação.
Nesse sentido, tendo em vista que a autora nasceu em 03/12/1960 e iniciou o trabalho com
aproximadamente 15 anos de idade, fica claro que exerceu o trabalho rural por mais de 40 anos,
de modo que faz jus à percepção da aposentadoria rural por idade.
Ocorre que, o Instituto Requerido indeferiu o requerimento para concessão do benefício
previdenciário de aposentadoria por idade n.º 175.589.993-6, apresentado em 15/06/2016, sob a
alegação de que a Autora não comprovou o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de
forma descontínua.
(...)”
Quanto à documentação colacionada aos autos para fins de comprovação de início de prova
material, a parte autora juntou aos autos alguns documentos, sendo que os mais relevantes estão
relacionados a um imóvel campesino com cerca de 21 hectares, onde o companheiro da autora
teria sido assentado, a partir do ano de 2000, no P.A. Uirapuru, em Nioaque/MS, com o intuito de
tentar demonstrar o exercício de atividade rural (especialmente relacionado à criação de gado),
em regime de economia familiar.
Quanto à prova oral/testemunhal, restou assim resumida pela r. sentença:
“(...)
A testemunha Antonio Jorge da Silva Borba informou em juízo o seguinte: que conhece a
requerente há vinte anos; que conhece a requerente desde que entraram no acampamento
Uirapuru; que a requerente convive com Eronildes; que ele (testemunha) e a requerente foram
contemplados com um lote de terras no final de 1999; que possui um lote de terras próximo ao
lote de terras pertencente à requerente; que a requerente nunca se mudou do referido lote; que já
presenciou a requerente plantando milho, feijão, algodão; que a requerente possui "um pouco de
gado"; que o lote de terras pertencente à requerente possui cerca de 20 hectares; que a
requerente auxilia o companheiro na lida campesina.
A testemunha Damião Silva da Paz informou em juízo o seguinte: que conhece a requerente há
dezoito anos; que conheceu a requerente no acampamento rural localizado no município de
Nioaque; que a requerente foi contemplada com um lote de terras; que a requerente é casada
com Eronilde Lopes de Souza; que a requerente possui o lote de terras n. 02; que o lote de terras
pertencente a requerente possui cerca de 18 ou 20 hectares; que a requerente labora na lavoura,
plantando milho, feijão; que a requerente já plantou algodão; que a requerente possui cerca de 20
cabeças de gado; que a requerente tira leite para o consumo próprio; que, em 18 anos, a
requerente nunca se mudou ou trabalhou na cidade; que a requerente não possui funcionários
para auxiliá-la no labor rural; que a requerente reside com o esposo e um filho.
(...)”
Pois bem.
Ao analisar o conjunto probatório, entendo que o alegado trabalho campesino da autora em
regime de economia familiar (pelo período de carência e no momento imediatamente anterior ao
implemento do requisito etário) não restou cabalmente configurado, porquanto há algumas
inconsistências relevantes no processado que não restaram esclarecidas.
A concessão de benefício de amparo social ao idoso em favor do companheiro da autora, no
período de 2002 a 2010, é evidentemente contrário à tese de trabalho campesino do núcleo
familiar exercido em regime de economia familiar. Ademais, no processo apresentado aos autos,
após convertido o julgamento em diligência, consta que a família nem sequer residiria na área de
assentamento, o que é oposto à hipótese ventilada na inicial.
As testemunhas ouvidas no processado só conheceram a postulante a partir do momento em que
todos foram assentados no PA Uirapuru, de modo que eventual período anterior de trabalho
campesino não possui condições de ser comprovado.
As motivações para negativa do pleito na seara administrativa (ID 6772813 - pág. 7) indicam que
diversos documentos ali colacionados não foram aqui apresentados, pois aparentemente seriam
destoantes com as alegações autorais, apontando o concurso de mão-de-obra assalariada no
local (o que descaracterizaria o regime de economia familiar vindicado), além de fazer menção a
notas fiscais com datas de emissão incompatíveis com a data de confecção do talão respectivo.
Anote-se, por fim, que ao contrário do afirmado na exordial, seu companheiro nunca esteve
aposentado como trabalhador rural, estando, hodiernamente, percebendo o mesmo beneficio de
amparo social que já lhe fora concedido em oportunidade pretérita, situação essa que também
não contribui com a alegação de trabalho rural do núcleo familiar em regime de subsistência.
Assim, mesmo que a prova testemunhal possa corroborar parcialmente com o alegado na peça
inaugural, ela não serve, exclusivamente, para comprovação de atividade rural, na forma da
Súmula 149 - STJ, in verbis:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito
de obtenção de benefício previdenciário.".
A reforma integral do r. julgado, nesse contexto, seria medida imperativa, já que não restou
exercido adequadamente o ônus probatório que cabia à demandante.
Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP).
Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito previdenciário da parte autora,
a extinção do processo sem julgamento do mérito.
Condeno a parte autora em custas e despesas processuais, bem como em honorários
advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor dado à causa, observando-se, contudo, sua
condição de beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS para extinguir o processo, sem
resolução do mérito, com fulcro no art. 485, IV do CPC/2015, nos termos deste arrazoado.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. CONJUNTO PROBATÓRIO FRÁGIL E INCONSISTENTE. PROCESSO
EXTINTO. ART. 485, IV, DO CPC. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA.
1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
2. De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal. Ademais, para a concessão de benefícios rurais, houve um
abrandamento no rigorismo da lei quanto à comprovação da condição de rurícola dos
trabalhadores do campo, permitindo-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até
mesmo dos pais aos filhos, ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os
cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da
atividade campesina não tenha se dado sob o regime de economia familiar.
3. Cumpre ressaltar que, em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência
Social, não se pode exigir dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições
previdenciárias, quando é de notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são
desenvolvidas, cumprindo aqui dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma
subordinação, haja vista que a contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos
chamados "gatos". Semelhante exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores
qualquer possibilidade de auferir o benefício conferido, em razão de sua atividade.
4. O art. 143 da Lei n.º 8.213/1991, com a redação dada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, dispõe
que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
5. Quanto a se provar o efetivo exercício de atividade rural, o Superior Tribunal de Justiça
considera prescindível a abrangência de todo o período de carência previsto no art. 142 da Lei de
Benefícios pela prova material, desde que a prova testemunhal demonstre sua solidez, permitindo
sua vinculação ao tempo de carência. Tal solução, conhecida como "pro misero", se dá em
virtude da precariedade dos registros de vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda
comum em tempos recentes e bastante disseminada em outras épocas.
6. Saliento, ainda, que, segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do
REsp 1354908, em sede de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no
campo no momento em que completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural
por idade, a fim de atender ao segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período
imediatamente anterior ao requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido,
na qual o segurado especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade
rural, já tenha preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e
idade.
7. Ao analisar o conjunto probatório, entendo que o alegado trabalho campesino da autora em
regime de economia familiar (pelo período de carência e no momento imediatamente anterior ao
implemento do requisito etário) não restou cabalmente configurado, porquanto há algumas
inconsistências relevantes no processado que não restaram esclarecidas. A concessão de
benefício de amparo social ao idoso em favor do companheiro da autora, no período de 2002 a
2010, é evidentemente contrário à tese de trabalho campesino do núcleo familiar exercido em
regime de economia familiar. Ademais, no processo apresentado aos autos, após convertido o
julgamento em diligência, consta que a família nem sequer residiria na área de assentamento, o
que é oposto à hipótese ventilada na inicial.
8. As testemunhas ouvidas no processado só conheceram a postulante a partir do momento em
que todos foram assentados no PA Uirapuru, de modo que eventual período anterior de trabalho
campesino não possui condições de ser comprovado. As motivações para negativa do pleito na
seara administrativa (ID 6772813 - pág. 7) indicam que diversos documentos ali colacionados não
foram aqui apresentados, pois aparentemente seriam destoantes com as alegações autorais,
apontando o concurso de mão-de-obra assalariada no local (o que descaracterizaria o regime de
economia familiar vindicado), além de fazer menção a notas fiscais com datas de emissão
incompatíveis com a data de confecção do talão respectivo. Anote-se, por fim, que ao contrário do
afirmado na exordial, seu companheiro nunca esteve aposentado como trabalhador rural,
estando, hodiernamente, percebendo o mesmo beneficio de amparo social que já lhe fora
concedido em oportunidade pretérita, situação essa que também não contribui com a alegação de
trabalho rural do núcleo familiar em regime de subsistência. Assim, mesmo que a prova
testemunhal possa corroborar parcialmente com o alegado na peça inaugural, ela não serve,
exclusivamente, para comprovação de atividade rural, na forma da Súmula 149 – STJ.
9. A reforma integral do r. julgado, nesse contexto, seria medida imperativa, já que não restou
exercido adequadamente o ônus probatório que cabia à demandante. Contudo, de acordo com o
atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a
inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição
e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art.
267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do
CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa." (REsp 1352721/SP). Impõe-se, por
isso, face à ausência de prova constitutiva do direito previdenciário da parte autora, a extinção do
processo sem julgamento do mérito.
10. Apelação do INSS parcialmente provida. Processo extinto. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS para extinguir o processo, sem
resolução do mérito, com fulcro no artigo 485, IV do CPC/2015, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
