Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0000935-66.2020.4.03.6322
Relator(a)
Juiz Federal PAULO CEZAR NEVES JUNIOR
Órgão Julgador
11ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
04/03/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 09/03/2022
Ementa
VOTO-EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SENTENÇA DE
IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA. SENTENÇA MANTIDA NOS TERMOS DO
ARTIGO 46 DA LEI 9.099/95.
1. Pedido de concessão de aposentadoria por idade rural.
2. Sentença de improcedência, proferida nos seguintes termos:
“[...] Os requisitos para a concessão de aposentadoria por idade ao trabalhador rural são:
a) idade de 60 (sessenta) anos, homem, ou 55 (cinquenta e cinco) anos, mulher (art. 201, § 7º, II
da Constituição Federal e art. 48, § 1º da LBPS); e
b) efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento administrativo, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício (art. 39, I e art. 48, § 2º da LBPS).
O art. 48, §§ 3º e 4º da Lei 8.213/1991, conforme alteração operada pela Lei 11.718/2008, passou
a dispor que os trabalhadores rurais que não consigam comprovar o efetivo exercício de atividade
rural necessária para a obtenção de aposentadoria por idade, mas que satisfaçam essa condição
se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao
benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos,
se mulher.
A aposentadoria por idade híbrida também pode ser concedida a trabalhador urbano que
pretenda computar período anterior de carência na qualidade de trabalhador rural, mesmo que
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
anterior à Lei 8.213/1991, independente do recolhimento de contribuição previdenciária ou
indenização respectiva (STJ, 1ª Seção, REsp 1.674.221/SP, Relator Ministro Napoleão Nunes
Maia, DJe 04.09.2019).
A carência a ser considerada é de 180 (cento e oitenta) meses, nos termos do art. 25, II da LBPS,
a não ser para o segurado que já estava filiado ao RGPS ou exercia atividade rural antes de
24.07.1991, hipótese em que se aplica a tabela de transição prevista no art. 142 da LBPS.
Não obstante a dicção do art. 48, § 2º da LBPS, que se refere à comprovação da atividade rural
no período imediatamente anterior ao requerimento, é certo que o segurado, se à época do
implemento do requisito etário, exercia atividade rural por tempo equivalente à carência, fará jus
ao benefício, ainda que posteriormente deixe o labor rural, porquanto o direito ao benefício já terá
se incorporado ao seu patrimônio jurídico (Súmula 54 da Turma Nacional de Uniformização dos
Juizados Especiais Federais e art. 51, § 1º do Decreto 3.048/1999.
A atividade rural deve ser comprovada mediante pelo menos início de prova material, não sendo
admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou
caso fortuito, conforme disposto no art. 55, § 3º da LBPS e Súmula 149 do Superior Tribunal de
Justiça.
A prova oral, robusta e idônea, deve estar amparada em início de prova material, entendendo-se
como tal o documento contemporâneo ao período de labor que se pretende comprovar e que faça
alguma referência à profissão ou à atividade a que se dedicava o interessado, ainda que não se
refira à integralidade do período a ser comprovado.
No mesmo diapasão, a Súmula 34 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais
Federais dispõe que “para fins de comprovação do tempo de labor rural, o início de prova material
deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar”.
A Súmula 577 do Superior Tribunal de Justiça estabelece que “ é possível reconhecer o tempo de
serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em
convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório”.
Assim, não se exige que o segurado tenha documentos correspondentes a todo o período
equivalente à carência, nos termos da Súmula 14 da Turma Nacional de Uniformização dos
Juizados Especiais Federais: “para a concessão de aposentadoria rural por idade, não se exige
que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência”.
Por força do princípio do tempus regit actum, “a prestação de serviço rural por menor de 12 a 14
anos, até o advento da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser
reconhecida para fins previdenciários”, nos termos da Súmula 05 da Turma Nacional de
Uniformização dos Juizados Especiais Federais.
O art. 106 da LBPS discrimina os documentos hábeis a comprovar o labor rurícola, dentre os
quais CTPS, contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural, declaração de sindicato de
trabalhadores rurais, desde que homologada pelo INSS, bloco de notas de produtor rural, certidão
de cadastro do imóvel rural no INCRA, notas fiscais de entrada de mercadorias, emitidas pela
empresa adquirente da produção, documentos fiscais relativos à entrega da produção rural à
cooperativa agrícola, declaração de imposto de renda, com indicação de renda proveniente da
comercialização da produção rural etc.
Tem-se entendido que o rol de documentos previstos no art. 106 da LBPS não é taxativo,
podendo-se utilizar outros tais como certidão de casamento, certidão de nascimento, certificado
de alistamento militar ou eleitoral ou atestado de frequência escolar em que em que conste a
profissão de lavrador do segurado, carteira de sócio e guia de recolhimento da contribuição para
sindicato de trabalhadores rurais etc.
Ainda, tendo em vista que as relações de trabalho no campo são marcadas pela informalidade,
tem-se admitido que o documento em nome do pai de família estende sua eficácia probatória em
favor de todos os componentes do grupo familiar (STJ, 5ª Turma, REsp. 386.538/RS, Relator
Ministro Jorge Scartezzini, DJ 07.04.2003, p. 310 e Súmula 06 da Turma Nacional de
Uniformização dos Juizados Especiais Federais).
A declaração firmada por sindicato de trabalhadores rurais não homologada pelo INSS não serve
como início de prova material (STJ, 3ª Seção, AgRg nos EREsp. 1.140.733/SP, Relator Ministro
Og Fernandes, DJe 31.05.2013). O mesmo ocorre com declaração de ex-empregador, a qual só
pode ser admitida como início de prova material se contemporânea aos fatos a comprovar (STJ,
3ª Seção, AR 3.963/SP, Relator Ministro Sebastião Reis Júnior, DJe 25.06.2013).
No caso de segurado especial, o exercício por curtos períodos de trabalho urbano intercalados
com o serviço rural não descaracteriza sua condição, inclusive a Lei 11.718/2008 alterou a LBPS
para prever que durante a entressafra o segurado especial pode trabalhar em outra atividade por
até 120 (cento e vinte) dias no ano, sem perder a filiação.
Não é outro o entendimento da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais
Federais, que na Súmula 46 estipula que “o exercício de atividade urbana intercalada não impede
a concessão de benefício previdenciário de trabalhador rural, condição que deve ser analisada no
caso concreto”.
Embora seja admissível a comprovação de atividade rural mediante a qualificação de lavrador do
cônjuge ou ascendente em documento escrito, é inaceitável a utilização desse documento como
início de prova material quando se constata que o referido membro da família, apontado como
rurícola, vem posteriormente a exercer atividade urbana de forma regular (STJ, 5ª Turma, AgRg
no REsp. 947.379/SP, Relatora Ministra Laurita Vaz, DJ 26.11.2007).
Outrossim, “o trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si
só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade
do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar ” (STJ, 1ª Seção, REsp. 1.304.479/SP,
Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 19.12.2012).
No caso em tela, a idade mínima está comprovada, tendo em vista que o autor nasceu em
24.04.1959, portanto possui idade superior a 60 anos.
Considerando que a idade mínima foi atingida em 24.04.2019, deve comprovar 180 meses de
carência, nos termos do art. 25, II da Lei 8.213/1991.
O autor, em seu depoimento pessoal, informou que há dois anos e meio, pelo menos, deixou de
exercer atividade rural, pois, ao catar laranja os galhos batiam no seu olho e ele não conseguia
trabalhar. Que, nessa época, chegou a ser orientado por seu advogado a solicitar benefício por
incapacidade em razão do problema de visão, mas que preferiu continuar trabalhando recolhendo
materiais recicláveis. Reiterou que há mais de dois anos não exerce atividade rural em razão do
problema de visão.
A testemunha Gilmar disse que o autor trabalhou para ele, na área rural, na década de 1980. Que
atualmente ele recolhe reciclagem. Que o autor reside ao lado da casa do depoente.
E a testemunha Augusto disse que o autor trabalhou para ele de 2005 a 2012, na área rural. Que
o autor trabalha recolhendo material reciclável há aproximadamente três anos. Que possui um
estabelecimento comercial perto da residência de um irmão do autor, onde ele guarda os
recicláveis que recolhe.
O art. 39, I e o art. 48, § 2º da Lei 8.213/1991, como já mencionado, exigem que o segurado, para
a obtenção de aposentadoria por idade rural, comprove o exercício de atividade rural, ainda que
de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao
número de meses correspondentes à carência do benefício requerido.
O autor e as testemunhas informaram que ele não exerce atividade rural há mais de dois anos, o
que remete ao ano de 2018.
Logo, não tem direito à redução da idade mínima, que é devida somente ao segurado que
exerceu atividade rural no período imediatamente anterior à data do requerimento ou do
implemento do requisito etário, que, no caso dos autos, ocorreram 24.05.2019 e 24.04.2019,
respectivamente.
Ante o exposto, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I do
Código de Processo Civil, julgo improcedente o pedido.
Não há condenação em custas e honorários advocatícios nesta instância (art. 55 da Lei
9.099/1995).
Após o trânsito em julgado, dê-se baixa e arquive-se, com as cautelas de praxe.
Publique-se. Sentença registrada eletronicamente. Intimem-se”.
3. Recurso da parte autora: pede a reforma da sentença, alegando que a ausência de
comprovação do exercício de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento
administrativo não impede a concessão de aposentadoria por idade, desde que comprovado que
o segurado, à época, já havia implementado o requisito etário exigido, conforme prevê o art. 102,
§1º, da Lei nº 8.213/91; aduz que a regra prevista pelo art. 143 da lei de benefícios, no sentido de
que a atividade rural deve ser comprovada no período imediatamente anterior ao requerimento do
benefício, deve ser interpretada favoravelmente ao segurado; no caso, a idade foi implementada
em 24/04/2019, momento em que já havia cumprido 180 meses de serviço rural; argumenta que a
prova produzida nos autos demonstra o exercício de atividade rural por quase quarenta anos,
tendo deixado as atividades campesinas pouco antes de completar 60 anos, quando passou a
exercer a atividade de catador de recicláveis; alega que: “salvo melhor juízo, se considerarmos
que o autor completou idade em 24.04.2019, tendo afirmado de boa-fé ter deixado as lides rurais
há 2 anos e meio, ou seja, 03.2018, data da oitiva, não nos parece razoável, tampouco
proporcional, inferir que este segurado não tenha comprovado exercício de atividade rural no
período imediatamente anterior ao implemento da idade. Frisa-se, não há na legislação vigente
dispositivo que discipline expressamente quanto é o período imediatamente anterior ao
implemento da idade, bem ainda, não se mostra crível que num intervalo de quase cinquenta
anos, o período de apenas um ano antes da idade teria o condão de retirar o direito à
aposentadoria por idade rural (...) Lado outro, como a lei não trata expressamente qual o período
imediatamente anterior ao requisito etário, devemos usar da analogia aos segurados urbanos
para encontrarmos um período mínimo de manutenção da qualidade de segurado, de sorte que
se considerarmos o longo período como segurado especial e as regras que disciplinam a
manutenção da qualidade de segurado (art. 15, da Lei nº 8.213/91), constatamos que o autor na
data do adimplemento da idade indubitavelmente ostentava ainda a qualidade de segurado
especial”.
4.No que se refere à possibilidade de concessão de aposentadoria por idade rural, a
jurisprudência se encontra pacificada no sentido de que o segurado deve comprovar atividade
rural no período imediatamente anterior ao implemento da idade ou ao requerimento
administrativo, tal como assentado no julgamento do RESP 1354908/SP (Tema 642), pelo e. STJ,
em que restou firmada a seguinte tese: “O segurado especial tem que estar laborando no campo,
quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá
requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial,
embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma
concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade” (trânsito em julgado em
08/09/2016). A Turma Nacional de Uniformização também já se manifestou sobre o assunto, no
julgamento dos PEDILEF’s nº 2006.71.95.018143-8/RS, 2006.71.95.008818-9/RS e 0000643-
35.2011.4.03.6310/SP, fixando a tese de que “para a obtenção de aposentadoria por idade rural é
indispensável o exercício e a demonstração da atividade campesina correspondente à carência
no período imediatamente anterior ao implemento da idade mínima ou à data do requerimento
administrativo”.
5. A lei não especifica o que deve ser entendido como “período imediatamente anterior”, de forma
que a questão deve ser examinada pelo julgador dentro da sistemática prevista pela Lei n.
8.213/91. Neste passo, possível a adoção, como critério razoável, do maior prazo de manutenção
da qualidade de segurado previsto na Lei de Benefícios, ou seja, 36 meses. De fato, tendo a Lei
8.213/91, em seu art. 15, estabelecido um período de graça, no qual se prorroga a qualidade de
segurado independentemente de contribuições, deve esse dispositivo ser aplicado aos
trabalhadores urbanos e rurais sem distinção, de modo a garantir a concessão do benefício
quando comprovado o labor rural pelo período de carência, e o implemento da idade mínima
ocorra em até 36 meses (maior dilação do período de graça) do afastamento da atividade rural.
Desta forma, para fazer jus ao benefício do art. 143, o segurado deve comprovar o exercício de
atividade rural pelo período correspondente ao ano em que implementou a idade, não sendo
relevante que os períodos sejam descontínuos, desde que entre a cessação do exercício de
atividade e a data do implemento da idade não tenha decorrido um prazo maior que 36 meses (in
Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social, 8ª ed., p. 143/144.). No entanto, no caso,
de acordo com o próprio cálculo de tempo de serviço apresentado pelo autor com sua petição
inicial (documento), após 2011, somente se verifica um vínculo rural de um mês e 14 dias em
2018, quando, então, já estaria desconfigurada sua situação de trabalhador rural para os fins ora
pretendidos. Destaco que não há prova documental referente a eventual trabalho rural entre 2011
e 2018 e as testemunhas não podem fazer tal prova "de per si". Aliás, nenhuma afirma ter
trabalhado com o autor ou ter sido o autor empregado rural delas naquele período. Portanto, não
há realmente como ser a parte autora beneficiada com a redução da idade mínima para o
benefício pretendido.
6. No mais, verifico que a sentença abordou de forma exaustiva todas as questões arguidas pela
parte recorrente, tendo aplicado o direito de modo irreparável, razão pela qual deve ser mantida
por seus próprios fundamentos, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95. Eventual direito a
benefício por incapacidade rural deve ser discutido em pedido administrativo e ação própria, uma
vez que não há fungibilidade a ser reconhecida neste caso.
7. Recurso a que se nega provimento.
8. Condenação da recorrente vencida ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em
10% (dez por cento) do valor da causa (art. 55 da Lei nº 9.099/95), devidamente atualizado
conforme os parâmetros estabelecidos pela Resolução CJF nº 658/2020, cuja execução fica
suspensa na hipótese de gratuidade de justiça.
9. É o voto.
PAULO CEZAR NEVES JUNIOR
JUIZ FEDERAL RELATOR
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
11ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000935-66.2020.4.03.6322
RELATOR:31º Juiz Federal da 11ª TR SP
RECORRENTE: AIRTON ADALBERTO SANITA ALVARENGA
Advogado do(a) RECORRENTE: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-
N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000935-66.2020.4.03.6322
RELATOR:31º Juiz Federal da 11ª TR SP
RECORRENTE: AIRTON ADALBERTO SANITA ALVARENGA
Advogado do(a) RECORRENTE: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-
N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
RELATÓRIO
Relatório dispensado na forma do artigo 38, "caput", da Lei n. 9.099/95.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000935-66.2020.4.03.6322
RELATOR:31º Juiz Federal da 11ª TR SP
RECORRENTE: AIRTON ADALBERTO SANITA ALVARENGA
Advogado do(a) RECORRENTE: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-
N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
VOTO
Voto-ementa conforme autorizado pelo artigo 46, primeira parte, da Lei n. 9.099/95.
VOTO-EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SENTENÇA DE
IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA. SENTENÇA MANTIDA NOS TERMOS
DO ARTIGO 46 DA LEI 9.099/95.
1. Pedido de concessão de aposentadoria por idade rural.
2. Sentença de improcedência, proferida nos seguintes termos:
“[...] Os requisitos para a concessão de aposentadoria por idade ao trabalhador rural são:
a) idade de 60 (sessenta) anos, homem, ou 55 (cinquenta e cinco) anos, mulher (art. 201, § 7º,
II da Constituição Federal e art. 48, § 1º da LBPS); e
b) efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período
imediatamente anterior ao requerimento administrativo, por tempo igual ao número de meses de
contribuição correspondente à carência do benefício (art. 39, I e art. 48, § 2º da LBPS).
O art. 48, §§ 3º e 4º da Lei 8.213/1991, conforme alteração operada pela Lei 11.718/2008,
passou a dispor que os trabalhadores rurais que não consigam comprovar o efetivo exercício de
atividade rural necessária para a obtenção de aposentadoria por idade, mas que satisfaçam
essa condição se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do
segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se
homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher.
A aposentadoria por idade híbrida também pode ser concedida a trabalhador urbano que
pretenda computar período anterior de carência na qualidade de trabalhador rural, mesmo que
anterior à Lei 8.213/1991, independente do recolhimento de contribuição previdenciária ou
indenização respectiva (STJ, 1ª Seção, REsp 1.674.221/SP, Relator Ministro Napoleão Nunes
Maia, DJe 04.09.2019).
A carência a ser considerada é de 180 (cento e oitenta) meses, nos termos do art. 25, II da
LBPS, a não ser para o segurado que já estava filiado ao RGPS ou exercia atividade rural antes
de 24.07.1991, hipótese em que se aplica a tabela de transição prevista no art. 142 da LBPS.
Não obstante a dicção do art. 48, § 2º da LBPS, que se refere à comprovação da atividade rural
no período imediatamente anterior ao requerimento, é certo que o segurado, se à época do
implemento do requisito etário, exercia atividade rural por tempo equivalente à carência, fará jus
ao benefício, ainda que posteriormente deixe o labor rural, porquanto o direito ao benefício já
terá se incorporado ao seu patrimônio jurídico (Súmula 54 da Turma Nacional de Uniformização
dos Juizados Especiais Federais e art. 51, § 1º do Decreto 3.048/1999.
A atividade rural deve ser comprovada mediante pelo menos início de prova material, não
sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força
maior ou caso fortuito, conforme disposto no art. 55, § 3º da LBPS e Súmula 149 do Superior
Tribunal de Justiça.
A prova oral, robusta e idônea, deve estar amparada em início de prova material, entendendo-
se como tal o documento contemporâneo ao período de labor que se pretende comprovar e que
faça alguma referência à profissão ou à atividade a que se dedicava o interessado, ainda que
não se refira à integralidade do período a ser comprovado.
No mesmo diapasão, a Súmula 34 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados
Especiais Federais dispõe que “para fins de comprovação do tempo de labor rural, o início de
prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar”.
A Súmula 577 do Superior Tribunal de Justiça estabelece que “ é possível reconhecer o tempo
de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em
convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório”.
Assim, não se exige que o segurado tenha documentos correspondentes a todo o período
equivalente à carência, nos termos da Súmula 14 da Turma Nacional de Uniformização dos
Juizados Especiais Federais: “para a concessão de aposentadoria rural por idade, não se exige
que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência”.
Por força do princípio do tempus regit actum, “a prestação de serviço rural por menor de 12 a 14
anos, até o advento da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser
reconhecida para fins previdenciários”, nos termos da Súmula 05 da Turma Nacional de
Uniformização dos Juizados Especiais Federais.
O art. 106 da LBPS discrimina os documentos hábeis a comprovar o labor rurícola, dentre os
quais CTPS, contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural, declaração de sindicato de
trabalhadores rurais, desde que homologada pelo INSS, bloco de notas de produtor rural,
certidão de cadastro do imóvel rural no INCRA, notas fiscais de entrada de mercadorias,
emitidas pela empresa adquirente da produção, documentos fiscais relativos à entrega da
produção rural à cooperativa agrícola, declaração de imposto de renda, com indicação de renda
proveniente da comercialização da produção rural etc.
Tem-se entendido que o rol de documentos previstos no art. 106 da LBPS não é taxativo,
podendo-se utilizar outros tais como certidão de casamento, certidão de nascimento, certificado
de alistamento militar ou eleitoral ou atestado de frequência escolar em que em que conste a
profissão de lavrador do segurado, carteira de sócio e guia de recolhimento da contribuição
para sindicato de trabalhadores rurais etc.
Ainda, tendo em vista que as relações de trabalho no campo são marcadas pela informalidade,
tem-se admitido que o documento em nome do pai de família estende sua eficácia probatória
em favor de todos os componentes do grupo familiar (STJ, 5ª Turma, REsp. 386.538/RS,
Relator Ministro Jorge Scartezzini, DJ 07.04.2003, p. 310 e Súmula 06 da Turma Nacional de
Uniformização dos Juizados Especiais Federais).
A declaração firmada por sindicato de trabalhadores rurais não homologada pelo INSS não
serve como início de prova material (STJ, 3ª Seção, AgRg nos EREsp. 1.140.733/SP, Relator
Ministro Og Fernandes, DJe 31.05.2013). O mesmo ocorre com declaração de ex-empregador,
a qual só pode ser admitida como início de prova material se contemporânea aos fatos a
comprovar (STJ, 3ª Seção, AR 3.963/SP, Relator Ministro Sebastião Reis Júnior, DJe
25.06.2013).
No caso de segurado especial, o exercício por curtos períodos de trabalho urbano intercalados
com o serviço rural não descaracteriza sua condição, inclusive a Lei 11.718/2008 alterou a
LBPS para prever que durante a entressafra o segurado especial pode trabalhar em outra
atividade por até 120 (cento e vinte) dias no ano, sem perder a filiação.
Não é outro o entendimento da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais
Federais, que na Súmula 46 estipula que “o exercício de atividade urbana intercalada não
impede a concessão de benefício previdenciário de trabalhador rural, condição que deve ser
analisada no caso concreto”.
Embora seja admissível a comprovação de atividade rural mediante a qualificação de lavrador
do cônjuge ou ascendente em documento escrito, é inaceitável a utilização desse documento
como início de prova material quando se constata que o referido membro da família, apontado
como rurícola, vem posteriormente a exercer atividade urbana de forma regular (STJ, 5ª Turma,
AgRg no REsp. 947.379/SP, Relatora Ministra Laurita Vaz, DJ 26.11.2007).
Outrossim, “o trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si
só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a
dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar ” (STJ, 1ª Seção, REsp.
1.304.479/SP, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 19.12.2012).
No caso em tela, a idade mínima está comprovada, tendo em vista que o autor nasceu em
24.04.1959, portanto possui idade superior a 60 anos.
Considerando que a idade mínima foi atingida em 24.04.2019, deve comprovar 180 meses de
carência, nos termos do art. 25, II da Lei 8.213/1991.
O autor, em seu depoimento pessoal, informou que há dois anos e meio, pelo menos, deixou de
exercer atividade rural, pois, ao catar laranja os galhos batiam no seu olho e ele não conseguia
trabalhar. Que, nessa época, chegou a ser orientado por seu advogado a solicitar benefício por
incapacidade em razão do problema de visão, mas que preferiu continuar trabalhando
recolhendo materiais recicláveis. Reiterou que há mais de dois anos não exerce atividade rural
em razão do problema de visão.
A testemunha Gilmar disse que o autor trabalhou para ele, na área rural, na década de 1980.
Que atualmente ele recolhe reciclagem. Que o autor reside ao lado da casa do depoente.
E a testemunha Augusto disse que o autor trabalhou para ele de 2005 a 2012, na área rural.
Que o autor trabalha recolhendo material reciclável há aproximadamente três anos. Que possui
um estabelecimento comercial perto da residência de um irmão do autor, onde ele guarda os
recicláveis que recolhe.
O art. 39, I e o art. 48, § 2º da Lei 8.213/1991, como já mencionado, exigem que o segurado,
para a obtenção de aposentadoria por idade rural, comprove o exercício de atividade rural,
ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento do
benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido.
O autor e as testemunhas informaram que ele não exerce atividade rural há mais de dois anos,
o que remete ao ano de 2018.
Logo, não tem direito à redução da idade mínima, que é devida somente ao segurado que
exerceu atividade rural no período imediatamente anterior à data do requerimento ou do
implemento do requisito etário, que, no caso dos autos, ocorreram 24.05.2019 e 24.04.2019,
respectivamente.
Ante o exposto, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I do
Código de Processo Civil, julgo improcedente o pedido.
Não há condenação em custas e honorários advocatícios nesta instância (art. 55 da Lei
9.099/1995).
Após o trânsito em julgado, dê-se baixa e arquive-se, com as cautelas de praxe.
Publique-se. Sentença registrada eletronicamente. Intimem-se”.
3. Recurso da parte autora: pede a reforma da sentença, alegando que a ausência de
comprovação do exercício de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento
administrativo não impede a concessão de aposentadoria por idade, desde que comprovado
que o segurado, à época, já havia implementado o requisito etário exigido, conforme prevê o
art. 102, §1º, da Lei nº 8.213/91; aduz que a regra prevista pelo art. 143 da lei de benefícios, no
sentido de que a atividade rural deve ser comprovada no período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício, deve ser interpretada favoravelmente ao segurado; no caso, a idade
foi implementada em 24/04/2019, momento em que já havia cumprido 180 meses de serviço
rural; argumenta que a prova produzida nos autos demonstra o exercício de atividade rural por
quase quarenta anos, tendo deixado as atividades campesinas pouco antes de completar 60
anos, quando passou a exercer a atividade de catador de recicláveis; alega que: “salvo melhor
juízo, se considerarmos que o autor completou idade em 24.04.2019, tendo afirmado de boa-fé
ter deixado as lides rurais há 2 anos e meio, ou seja, 03.2018, data da oitiva, não nos parece
razoável, tampouco proporcional, inferir que este segurado não tenha comprovado exercício de
atividade rural no período imediatamente anterior ao implemento da idade. Frisa-se, não há na
legislação vigente dispositivo que discipline expressamente quanto é o período imediatamente
anterior ao implemento da idade, bem ainda, não se mostra crível que num intervalo de quase
cinquenta anos, o período de apenas um ano antes da idade teria o condão de retirar o direito à
aposentadoria por idade rural (...) Lado outro, como a lei não trata expressamente qual o
período imediatamente anterior ao requisito etário, devemos usar da analogia aos segurados
urbanos para encontrarmos um período mínimo de manutenção da qualidade de segurado, de
sorte que se considerarmos o longo período como segurado especial e as regras que
disciplinam a manutenção da qualidade de segurado (art. 15, da Lei nº 8.213/91), constatamos
que o autor na data do adimplemento da idade indubitavelmente ostentava ainda a qualidade de
segurado especial”.
4.No que se refere à possibilidade de concessão de aposentadoria por idade rural, a
jurisprudência se encontra pacificada no sentido de que o segurado deve comprovar atividade
rural no período imediatamente anterior ao implemento da idade ou ao requerimento
administrativo, tal como assentado no julgamento do RESP 1354908/SP (Tema 642), pelo e.
STJ, em que restou firmada a seguinte tese: “O segurado especial tem que estar laborando no
campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que
poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado
especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma
concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade” (trânsito em julgado em
08/09/2016). A Turma Nacional de Uniformização também já se manifestou sobre o assunto, no
julgamento dos PEDILEF’s nº 2006.71.95.018143-8/RS, 2006.71.95.008818-9/RS e 0000643-
35.2011.4.03.6310/SP, fixando a tese de que “para a obtenção de aposentadoria por idade rural
é indispensável o exercício e a demonstração da atividade campesina correspondente à
carência no período imediatamente anterior ao implemento da idade mínima ou à data do
requerimento administrativo”.
5. A lei não especifica o que deve ser entendido como “período imediatamente anterior”, de
forma que a questão deve ser examinada pelo julgador dentro da sistemática prevista pela Lei
n. 8.213/91. Neste passo, possível a adoção, como critério razoável, do maior prazo de
manutenção da qualidade de segurado previsto na Lei de Benefícios, ou seja, 36 meses. De
fato, tendo a Lei 8.213/91, em seu art. 15, estabelecido um período de graça, no qual se
prorroga a qualidade de segurado independentemente de contribuições, deve esse dispositivo
ser aplicado aos trabalhadores urbanos e rurais sem distinção, de modo a garantir a concessão
do benefício quando comprovado o labor rural pelo período de carência, e o implemento da
idade mínima ocorra em até 36 meses (maior dilação do período de graça) do afastamento da
atividade rural. Desta forma, para fazer jus ao benefício do art. 143, o segurado deve comprovar
o exercício de atividade rural pelo período correspondente ao ano em que implementou a idade,
não sendo relevante que os períodos sejam descontínuos, desde que entre a cessação do
exercício de atividade e a data do implemento da idade não tenha decorrido um prazo maior
que 36 meses (in Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social, 8ª ed., p. 143/144.).
No entanto, no caso, de acordo com o próprio cálculo de tempo de serviço apresentado pelo
autor com sua petição inicial (documento), após 2011, somente se verifica um vínculo rural de
um mês e 14 dias em 2018, quando, então, já estaria desconfigurada sua situação de
trabalhador rural para os fins ora pretendidos. Destaco que não há prova documental referente
a eventual trabalho rural entre 2011 e 2018 e as testemunhas não podem fazer tal prova "de per
si". Aliás, nenhuma afirma ter trabalhado com o autor ou ter sido o autor empregado rural delas
naquele período. Portanto, não há realmente como ser a parte autora beneficiada com a
redução da idade mínima para o benefício pretendido.
6. No mais, verifico que a sentença abordou de forma exaustiva todas as questões arguidas
pela parte recorrente, tendo aplicado o direito de modo irreparável, razão pela qual deve ser
mantida por seus próprios fundamentos, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95. Eventual
direito a benefício por incapacidade rural deve ser discutido em pedido administrativo e ação
própria, uma vez que não há fungibilidade a ser reconhecida neste caso.
7. Recurso a que se nega provimento.
8. Condenação da recorrente vencida ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em
10% (dez por cento) do valor da causa (art. 55 da Lei nº 9.099/95), devidamente atualizado
conforme os parâmetros estabelecidos pela Resolução CJF nº 658/2020, cuja execução fica
suspensa na hipótese de gratuidade de justiça.
9. É o voto.
PAULO CEZAR NEVES JUNIOR
JUIZ FEDERAL RELATOR ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Décima Primeira
Turma Recursal, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
