Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0000293-47.2020.4.03.6305
Relator(a)
Juiz Federal MAIRA FELIPE LOURENCO
Órgão Julgador
11ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
04/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 10/02/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.
RECURSO DO INSS.
1. Pedido de concessão de benefício de aposentadoria por idade rural, mediante o
reconhecimento de período rural.
2. Sentença de procedência lançada nos seguintes termos:
“(...) previdenciário de aposentadoria por idade rural.
Em petição inicial, a parte autora sustenta, em síntese, que, desde os 12 (doze) anos de idade,
exerce atividade rural (evento 1):
[...] A Autora nasceu no sitio dos Pais no bairro Vargem Grande dos Caros na cidade de
Jaboticatubas em Minas Gerais, e ali ficou até seus 17 anos de idade se dedicando junto com os
Pais na lavoura de arroz, feijão, milho, amendoim e cana de açúcar, onde fazia pinga, rapadura e
vendia em poucas quantidades para o próprio sustento, logo após em 1981 com seus 17 anos de
idade se casou e foi morar em São Paulo junto com seu esposo, onde cuidava somente da casa,
porém em 1997 já com 34 anos de idade veio a se separar e voltou a morar junto com os pais e
seu irmão no Sitio São Francisco na região de Juquiá, sitio o qual seus pais compraram com a
venda do sitio de Minas Gerais, porém no mesmo ano de 1997 seu pai veio a falecer. Assim a
autora começou a se dedicar junto com seu irmão e sua mãe no cultivo de Bananas, milho e
palmito onde continua a trabalhar até os dias atuais.
[...]
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Ao final, formula os seguintes pedidos (principais):
[...] c.1. declarar os períodos trabalhados pela autora como trabalhadora rural sem a devida
inserção em Carteira de Trabalho (CTPS), consoante demonstram os fatos narrados e os
documentos ora anexados, que certamente serão corroborados pela oitiva das testemunhas, na
oportuna fase instrutória dos autos;
c.2. Em seguida, condenar o Requerido a pagar a Autora a Aposentadoria por Idade Rural e o
décimo terceiro salário vigente à época, desde a data do pedido administrativo apresentado em
18 de dezembro de 2019, atualizada monetariamente até a data do efetivo pagamento, mais juros
legais à partir da citação e até a data da apresentação do precatório ou RPV, conforme previsto
no Manual de Orientação de Cálculos da Justiça Federal em vigor (Res. 267/2013 CNJ, capítulo
5);
[...]
Juntou documentos (evento 2).
Citado, o INSS apresenta contestação padrão, pela qual requer a improcedência do pedido, pois
o autor não teria comprovado o exercício de atividade rural no período de carência exigido pela lei
(contracapa dos autos).
Adiante, juntado o procedimento administrativo, em que indeferido o benefício previdenciário
(evento 8).
Realizada audiência de instrução, conciliação e julgamento. Sem conciliação.
(...)
Nos casos em que o(a) autor(a) completa a idade para a aposentadoria por idade rural após
31.12.2010, já não se submete às regras de transição dos arts. 142 e 143, e deve preencher os
requisitos previstos no art. 48, §§ 1º e 2º, da
Lei n. 8.213/91, com a redação que lhe foi dada pela Lei n. 11.718/2008): 60 (sessenta) anos de
idade, se homem, 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, tempo de efetiva atividade
rural, ainda que de forma descontínua, no período correspondente à carência exigida para o
benefício, isto é, 180 (cento e oitenta) meses, e imediatamente anterior ao requerimento.
(TRF/3R, 3ª Seção, APELAÇÃO (198) Nº 5002812-51.2018.4.03.9999, RELATOR: Gab. 31 -
DES. FED. DALDICE SANTANA, voto do Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias, j.
07.01.2019)
O art. 106 da Lei 8.213/1991 enumera os documentos aptos à comprovação da atividade, rol que
não é taxativo, admitindo-se outras provas, na forma do entendimento jurisprudencial dominante.
O reconhecimento de trabalho rural exercido na qualidade de diarista ou em regime de economia
familiar depende da apresentação de início de prova material contemporânea aos fatos, conforme
previsto no art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, corroborado por posicionamento jurisprudencial
consolidado na Súmula 149 do STJ.
No mais, segundo o RESP 1.354.908, julgamento realizado segundo a sistemática de recurso
representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), necessária a comprovação do tempo de
atividade rural no período imediatamente anterior à aquisição da idade:
(...)
Caso concreto:
A autora, ZILDA MARIA DA SILVA CÂNDIDO (mulher), alega que trabalha nas lides rurais,
individualmente e/ou boia-fria (diarista), tendo cumprido a carência (=tempo de serviço rural)
exigida na Lei nº 8.213/91.
Para ter direito à aposentadoria por idade rural, a parte autora precisaria demonstrar o
preenchimento dos seguintes requisitos: (a) qualidade de segurada na DER, ou quando do
implemento do requisito etário; (b) idade mínima de 55 anos na DER; (c) tempo de trabalho igual
a 180 meses anteriores ao implemento do requisito etário (11/12/2018) ou ao requerimento
administrativo (DER: 18/12/2019), nos termos do art. 25, inc. II da Lei nº 8.213/91.
O quesito idade mínima (55 anos) foi cumprido, conforme o documento de identidade, à fl. 08 dos
documentos anexados com a inicial (evento 2), haja vista que a parte autora nasceu em
11/12/1963.
Conforme os artigos 55, § 3º, e 106, parágrafo único, ambos da Lei nº 8.213/1991 c/c Súmula 149
do STJ, é necessário início de prova material para reconhecimento do labor rural, não bastando a
prova testemunhal do referido trabalho.
No intuito de comprovar o exercício de atividade do campo, como trabalhador rural, durante o
período de tempo igual a da carência, o requerente apresentou como prova documental para
compor o início de prova material:
i) Carteira de afiliada ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Juquiá/SP (fl. 15 do evento 2);
ii) Certificado de cadastro de imóvel rural referente ao “Sítio São Francisco”, situado em
Juquiá/SP, em nome do pai da parte autora, José Maria da Silva, nos anos de
1993,2006,2007,2008,2009,2015,2016 e 2019 (fls. 23/25 e 30/ do evento
2);
iii) Contribuição Sindical Agricultor Familiar em nome do pai da parte autora, José Maria da Silva,
referente aos anos de 2012, 2013, 2014, 2015, 2016, (fls. 26/27 e 38/40 do evento 2);
iv) ITR referente ao “Sítio São Francisco”, situado em Juquiá/SP, em nome do pai da parte autora,
José Maria da Silva, nos anos de 2009 e 2019 (fls. 28/29 e 31/34 do evento 2);
v) Carteira de afiliado ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Juquiá/SP em nome do pai da
parte autora, José Maria da Silva (fls. 43/44 do evento 2);
vi) Nota fiscal do produtor rural, em nome do irmão da parte autora, José Maria da Silva Júnior,
referente à venda de palmito pupunha in natura, nos anos de 2019 (fls. 51/53 do evento 2); e
vii) Fotografias de bananal, palmeiras e outras árvores (fls. 54/56 do evento 2).
Adiante juntado o CNIS em nome da parte autora (evento 17), em que consta curto vínculo
urbano no período de 01/03/1980 a 17/07/1980. Tal fato que não impede a pretensão veiculada
no feito, a teor da Súmula nº 46 da TNU: “O exercício de atividade urbana intercalada não impede
a concessão de benefício previdenciário de trabalhador rural, condição que deve ser analisada no
caso concreto”.
Ressalto que outros documentos apresentados nos autos virtuais (como DIRPF em nome do pai
da parte autora, declaração para cadastro de imóvel rural, contrato particular de compra e venda)
são extemporâneos ao período da carência (teor da S. 34 da TNU).
Segundo a Súmula 14 da TNU: “Para a concessão de aposentadoria rural por idade, não se exige
que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício”.
Assim, não se faz necessário comprovar todo o período de labor rural, para fins de concessão de
benefício previdenciário de aposentadoria por idade rural.
Todavia, o início de prova material do trabalho rural deve ser contemporâneo ao exercício da
atividade rural. Nesse sentido, cito precedente.
(...)
No caso em tela, buscou a parte autora ver reconhecido o tempo de serviço rural laborado na
condição de segurada especial, em REF, na vigência da Lei n° 8.213/1991. Ou seja, é
considerado segurado especial aquele que trabalha individualmente ou com o auxílio do núcleo
familiar, dependendo da atividade rural para garantir sua subsistência e a de sua família. A
caracterização do regime de economia familiar, por sua vez, fica condicionada à comprovação de
que o trabalho rural é realizado pelos integrantes do núcleo familiar em condições de
dependência e colaboração mútua, sem a utilização de empregados e necessário à subsistência
do trabalhador e de sua família.
O fim buscado pelo legislador foi amparar pessoas, que, se excluídas do rol dos segurados, não
teriam, na velhice ou na doença, como fazer frente às necessidades mais básicas, uma vez que
nunca colaboraram para a Previdência. Daí ser necessária a exata comprovação da condição de
segurado especial, nos termos do artigo 11, VII, da Lei 8.213/91, por ser uma exceção ao
princípio da contraprestação.
Consigno que parte da documentação encontra-se em nome de terceiros, o pai da requerente.
Com efeito, a jurisprudência é pacífica, no sentido de admitir essa prova, desde que corroborada
por prova oral robusta e satisfatória.
Trago julgado nesse viés:
(...)
Cumpre ressaltar que a maioria dos documentos inseridos no inicio da prova material encontra-se
em nome de terceiros. No caso o pai da autora, Sr. José Maria da Silva, o qual é falecido desde o
ano de 1977 (certidão respectiva, fl. 41, evento 2) e, mais recentemente, em nome do irmão da
autora, Sr. José Maria da Silva Júnior, a saber, NF de venda de produtos do ano de 2019 (igual
ano da DER).
Em resumo, há início de prova material atual, como, as notas fiscais do produtor rural em nome
do irmão da parte autora, José Maria da Silva Junior, referente ao ano de 2019. Cumprindo
registrar que a atividade rural em sítios, como o explorado pela autora, se dá com documentos
emitidos em nome do pai, quiçá do irmão homem. Por isso, a falta de documentos em nome da
autora.
A prova oral colhida, em audiência, realizada nesta data, revelou que a parte autora mora num
sitio, propriedade que era de seus pais, situado no bairro Ribeirão Fundo de Baixo, km 15, em
Juquiá/SP; nesse sítio a autora trabalha em serviço rural plantando palmito e banana.
As testemunhas, em resumo, disseram:
José: que mora no bairro Ribeirão Fundo de Baixo, km 15, em Juquiá/SP; que não tem sítio; que
conhece a autora há mais de 20 anos; que nunca trabalhou com a autora; que é vizinho da
autora; que o sítio que mora a autora era do pai dela, Sr. José Maria, que já é falecido; que a
autora trabalha no sítio plantando milho, palmito, banana; que a autora vende os produtos
plantados todo mês; que conhece autora a mais de 20 anos, mas não sabe precisar desde
quando eles tem o sítio; que antes o pai da autora trabalhava com gado e, depois que faleceu,
autora começou com produção de palmito, banana no sítio.
Fábio: que mora no bairro Ribeirão Fundo de Baixo, km 15, em Juquiá/SP; que é aposentado;
que antes trabalhava como vaqueiro, na fazenda Flora, em Sete Barras/SP; que é vizinho da
autora; que a autora tem sítio, o qual era dos pais dela; que os pais da autora são falecidos; que,
hoje, moram a autora e seu irmão, que a ajuda no sítio; que a autora casou saiu da cidade e,
depois de separar retornou ao sítio; que a autora casou e por um tempo morou em outra cidade,
mas depois que separou retornou ao sítio dos pais; que há mais de 20 anos ela mora e trabalha
nesse sítio; que a autora planta palmito e banana; que vende quando aparece vendedor, mas não
é sempre; que desde 1997 estão no sítio; que não sabe o nome do sítio da autora; que ela
sempre trabalhou no sítio e que ainda planta no local.
Antônio: que mora no bairro Ribeirão Fundo de Baixo, km 15, em Juquiá/SP; que tem uma
chácara vizinha ao sitio da autora; que a autora mora lá há 20 anos, sempre trabalhando no sítio;
que a autora planta palmito, banana e milho; que até hoje trabalha; que ela mora junto com o
irmão, chamado José Maria, que também a ajuda; que o pai da autora é falecido; que o sítio
antes era do pai da autora; que o pai da autora faleceu há muito tempo; que via ele no sítio; que a
autora já trabalhava no sítio nessa época.
A prova do labor rural da parte autora, por tempo de trabalho igual ao período de carência e nos
momentos do implemento do requisito etário, ou mesmo da DER, restou demonstrada na prova
inserida no feito JEF.
DISPOSITIVO
Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO, para condenar o INSS a conceder à parte
autora o benefício de aposentadoria por idade rural, desde 18/12/2019 (DIB), cuja renda mensal
inicial – RMI e renda mensal atual - RMA fixo no valor de um salário mínimo, pagando os
atrasados devidos, desde aquela data até a efetiva implantação (DIP: 01/07/2021), acrescidos de
juros e correção monetária até o efetivo pagamento, nos termos do Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observada nova Resolução (Res. nº
658/2020-CJF de 10/08/2020) (...)”
3. Recurso do INSS, em que se alega, em apertada síntese, que não há qualquer documento que
indique atividade rural, não sendo possível a sua qualificação como segurada especial, e que
“não há prova de exercício de atividade rural no período imediatamente anterior ao requisito etário
(1991, no caso da autora), como exigido pelo artigo 143 da Lei 8.213/91”. Diz que “(...) Pelo
conjunto probatório, fica claro que a recorrida se casou em 1981. Para aproveitar os documentos
emitidos em nome de seus pais deveria ter provado que voltou a morar com eles, ou com sua
mãe ainda viva após 1997, o que não fez em momento algum Ela se filiou ao sindicato rural
apenas por ocasião de sua aposentadoria. No mais, juntou apenas documentos tributários
referentes à gleba, pertencente à família. Ainda assim, por período pequeno (pouco mais de 7
anos). Notas fiscais apenas para o ano de 2019, e em nome do irmão (...).”
4.Para o reconhecimento de período trabalhado em atividade rural sem registro, o ordenamento
jurídico exige, ao menos, início razoável de prova material contemporânea, nos termos do § 2º do
art. 55 da Lei n.º 8.213/91. Não é admissível prova exclusivamente testemunhal. Por outro lado, é
admissível documento em nome de terceiros, consoante jurisprudência pacífica da TNU.
5.Como a parte autora nasceu em 11/12/1963, completou 55 anos em 11/12/2018e deve
comprovar o exercício de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento do
benefício, pelo período de 180meses. Portanto, deve comprovar o exercício de atividade rural de
2003a 2018, ou de 2004 a 2019 (ano da DER). Os documentos em nome do pai da parte autora
não constituem início de prova material, na medida em que ele faleceu em 1997, conforme
certidão de óbito que instrui os autos. O único documento em nome próprio é a carteira de afiliada
ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Juquiá. Comofoi emitida somente em 2018, não é
documento hábil a comprovar a o exercício de labor rural desde 2003 ou 2004. Por fim, consta
uma nota fiscal de produtor rural,em nome do irmão da parte autora e datado de 2019.
Considerando a fragilidade da prova documental, bem como o fato dela estar restrita aos anos de
2018 e 2019, julgo não comprovado o exercício de atividade rural pelo lapso temporal exigido
pela Lei 8.213/91. Ressalto ser inadmissível fazer prova de cerca de 13 anos de labor rural
apenas com base no depoimento de testemunhas, sem nenhum respaldo em início de prova
material.
6. RECURSO A QUE SE DÁ PROVIMENTO, para julgar improcedente o pedido de concessão do
benefício de aposentadoria por idade rural.
7. Sem condenação ao pagamento de honorários advocatícios.
MAÍRA FELIPE LOURENÇO
JUÍZA FEDERAL RELATORA
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
11ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000293-47.2020.4.03.6305
RELATOR:32º Juiz Federal da 11ª TR SP
RECORRENTE: ZILDA MARIA DA SILVA CANDIDO
Advogados do(a) RECORRENTE: CASSIA MARTUCCI MELILLO BERTOZO - SP211735-N,
JOSE LUCAS VIEIRA DA SILVA - SP425633-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000293-47.2020.4.03.6305
RELATOR:32º Juiz Federal da 11ª TR SP
RECORRENTE: ZILDA MARIA DA SILVA CANDIDO
Advogados do(a) RECORRENTE: CASSIA MARTUCCI MELILLO BERTOZO - SP211735-N,
JOSE LUCAS VIEIRA DA SILVA - SP425633-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Relatório dispensado na forma do artigo 38, "caput", da Lei n. 9.099/95.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000293-47.2020.4.03.6305
RELATOR:32º Juiz Federal da 11ª TR SP
RECORRENTE: ZILDA MARIA DA SILVA CANDIDO
Advogados do(a) RECORRENTE: CASSIA MARTUCCI MELILLO BERTOZO - SP211735-N,
JOSE LUCAS VIEIRA DA SILVA - SP425633-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Voto-ementa conforme autorizado pelo artigo 46, primeira parte, da Lei n. 9.099/95.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.
RECURSO DO INSS.
1. Pedido de concessão de benefício de aposentadoria por idade rural, mediante o
reconhecimento de período rural.
2. Sentença de procedência lançada nos seguintes termos:
“(...) previdenciário de aposentadoria por idade rural.
Em petição inicial, a parte autora sustenta, em síntese, que, desde os 12 (doze) anos de idade,
exerce atividade rural (evento 1):
[...] A Autora nasceu no sitio dos Pais no bairro Vargem Grande dos Caros na cidade de
Jaboticatubas em Minas Gerais, e ali ficou até seus 17 anos de idade se dedicando junto com
os Pais na lavoura de arroz, feijão, milho, amendoim e cana de açúcar, onde fazia pinga,
rapadura e vendia em poucas quantidades para o próprio sustento, logo após em 1981 com
seus 17 anos de idade se casou e foi morar em São Paulo junto com seu esposo, onde cuidava
somente da casa, porém em 1997 já com 34 anos de idade veio a se separar e voltou a morar
junto com os pais e seu irmão no Sitio São Francisco na região de Juquiá, sitio o qual seus pais
compraram com a venda do sitio de Minas Gerais, porém no mesmo ano de 1997 seu pai veio a
falecer. Assim a autora começou a se dedicar junto com seu irmão e sua mãe no cultivo de
Bananas, milho e palmito onde continua a trabalhar até os dias atuais.
[...]
Ao final, formula os seguintes pedidos (principais):
[...] c.1. declarar os períodos trabalhados pela autora como trabalhadora rural sem a devida
inserção em Carteira de Trabalho (CTPS), consoante demonstram os fatos narrados e os
documentos ora anexados, que certamente serão corroborados pela oitiva das testemunhas, na
oportuna fase instrutória dos autos;
c.2. Em seguida, condenar o Requerido a pagar a Autora a Aposentadoria por Idade Rural e o
décimo terceiro salário vigente à época, desde a data do pedido administrativo apresentado em
18 de dezembro de 2019, atualizada monetariamente até a data do efetivo pagamento, mais
juros legais à partir da citação e até a data da apresentação do precatório ou RPV, conforme
previsto no Manual de Orientação de Cálculos da Justiça Federal em vigor (Res. 267/2013 CNJ,
capítulo 5);
[...]
Juntou documentos (evento 2).
Citado, o INSS apresenta contestação padrão, pela qual requer a improcedência do pedido,
pois o autor não teria comprovado o exercício de atividade rural no período de carência exigido
pela lei (contracapa dos autos).
Adiante, juntado o procedimento administrativo, em que indeferido o benefício previdenciário
(evento 8).
Realizada audiência de instrução, conciliação e julgamento. Sem conciliação.
(...)
Nos casos em que o(a) autor(a) completa a idade para a aposentadoria por idade rural após
31.12.2010, já não se submete às regras de transição dos arts. 142 e 143, e deve preencher os
requisitos previstos no art. 48, §§ 1º e 2º, da
Lei n. 8.213/91, com a redação que lhe foi dada pela Lei n. 11.718/2008): 60 (sessenta) anos de
idade, se homem, 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, tempo de efetiva atividade
rural, ainda que de forma descontínua, no período correspondente à carência exigida para o
benefício, isto é, 180 (cento e oitenta) meses, e imediatamente anterior ao requerimento.
(TRF/3R, 3ª Seção, APELAÇÃO (198) Nº 5002812-51.2018.4.03.9999, RELATOR: Gab. 31 -
DES. FED. DALDICE SANTANA, voto do Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo
Zacharias, j. 07.01.2019)
O art. 106 da Lei 8.213/1991 enumera os documentos aptos à comprovação da atividade, rol
que não é taxativo, admitindo-se outras provas, na forma do entendimento jurisprudencial
dominante.
O reconhecimento de trabalho rural exercido na qualidade de diarista ou em regime de
economia familiar depende da apresentação de início de prova material contemporânea aos
fatos, conforme previsto no art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, corroborado por posicionamento
jurisprudencial consolidado na Súmula 149 do STJ.
No mais, segundo o RESP 1.354.908, julgamento realizado segundo a sistemática de recurso
representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), necessária a comprovação do tempo de
atividade rural no período imediatamente anterior à aquisição da idade:
(...)
Caso concreto:
A autora, ZILDA MARIA DA SILVA CÂNDIDO (mulher), alega que trabalha nas lides rurais,
individualmente e/ou boia-fria (diarista), tendo cumprido a carência (=tempo de serviço rural)
exigida na Lei nº 8.213/91.
Para ter direito à aposentadoria por idade rural, a parte autora precisaria demonstrar o
preenchimento dos seguintes requisitos: (a) qualidade de segurada na DER, ou quando do
implemento do requisito etário; (b) idade mínima de 55 anos na DER; (c) tempo de trabalho
igual a 180 meses anteriores ao implemento do requisito etário (11/12/2018) ou ao
requerimento administrativo (DER: 18/12/2019), nos termos do art. 25, inc. II da Lei nº 8.213/91.
O quesito idade mínima (55 anos) foi cumprido, conforme o documento de identidade, à fl. 08
dos documentos anexados com a inicial (evento 2), haja vista que a parte autora nasceu em
11/12/1963.
Conforme os artigos 55, § 3º, e 106, parágrafo único, ambos da Lei nº 8.213/1991 c/c Súmula
149 do STJ, é necessário início de prova material para reconhecimento do labor rural, não
bastando a prova testemunhal do referido trabalho.
No intuito de comprovar o exercício de atividade do campo, como trabalhador rural, durante o
período de tempo igual a da carência, o requerente apresentou como prova documental para
compor o início de prova material:
i) Carteira de afiliada ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Juquiá/SP (fl. 15 do evento 2);
ii) Certificado de cadastro de imóvel rural referente ao “Sítio São Francisco”, situado em
Juquiá/SP, em nome do pai da parte autora, José Maria da Silva, nos anos de
1993,2006,2007,2008,2009,2015,2016 e 2019 (fls. 23/25 e 30/ do evento
2);
iii) Contribuição Sindical Agricultor Familiar em nome do pai da parte autora, José Maria da
Silva, referente aos anos de 2012, 2013, 2014, 2015, 2016, (fls. 26/27 e 38/40 do evento 2);
iv) ITR referente ao “Sítio São Francisco”, situado em Juquiá/SP, em nome do pai da parte
autora, José Maria da Silva, nos anos de 2009 e 2019 (fls. 28/29 e 31/34 do evento 2);
v) Carteira de afiliado ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Juquiá/SP em nome do pai da
parte autora, José Maria da Silva (fls. 43/44 do evento 2);
vi) Nota fiscal do produtor rural, em nome do irmão da parte autora, José Maria da Silva Júnior,
referente à venda de palmito pupunha in natura, nos anos de 2019 (fls. 51/53 do evento 2); e
vii) Fotografias de bananal, palmeiras e outras árvores (fls. 54/56 do evento 2).
Adiante juntado o CNIS em nome da parte autora (evento 17), em que consta curto vínculo
urbano no período de 01/03/1980 a 17/07/1980. Tal fato que não impede a pretensão veiculada
no feito, a teor da Súmula nº 46 da TNU: “O exercício de atividade urbana intercalada não
impede a concessão de benefício previdenciário de trabalhador rural, condição que deve ser
analisada no caso concreto”.
Ressalto que outros documentos apresentados nos autos virtuais (como DIRPF em nome do
pai da parte autora, declaração para cadastro de imóvel rural, contrato particular de compra e
venda) são extemporâneos ao período da carência (teor da S. 34 da TNU).
Segundo a Súmula 14 da TNU: “Para a concessão de aposentadoria rural por idade, não se
exige que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do
benefício”.
Assim, não se faz necessário comprovar todo o período de labor rural, para fins de concessão
de benefício previdenciário de aposentadoria por idade rural.
Todavia, o início de prova material do trabalho rural deve ser contemporâneo ao exercício da
atividade rural. Nesse sentido, cito precedente.
(...)
No caso em tela, buscou a parte autora ver reconhecido o tempo de serviço rural laborado na
condição de segurada especial, em REF, na vigência da Lei n° 8.213/1991. Ou seja, é
considerado segurado especial aquele que trabalha individualmente ou com o auxílio do núcleo
familiar, dependendo da atividade rural para garantir sua subsistência e a de sua família. A
caracterização do regime de economia familiar, por sua vez, fica condicionada à comprovação
de que o trabalho rural é realizado pelos integrantes do núcleo familiar em condições de
dependência e colaboração mútua, sem a utilização de empregados e necessário à
subsistência do trabalhador e de sua família.
O fim buscado pelo legislador foi amparar pessoas, que, se excluídas do rol dos segurados, não
teriam, na velhice ou na doença, como fazer frente às necessidades mais básicas, uma vez que
nunca colaboraram para a Previdência. Daí ser necessária a exata comprovação da condição
de segurado especial, nos termos do artigo 11, VII, da Lei 8.213/91, por ser uma exceção ao
princípio da contraprestação.
Consigno que parte da documentação encontra-se em nome de terceiros, o pai da requerente.
Com efeito, a jurisprudência é pacífica, no sentido de admitir essa prova, desde que
corroborada por prova oral robusta e satisfatória.
Trago julgado nesse viés:
(...)
Cumpre ressaltar que a maioria dos documentos inseridos no inicio da prova material encontra-
se em nome de terceiros. No caso o pai da autora, Sr. José Maria da Silva, o qual é falecido
desde o ano de 1977 (certidão respectiva, fl. 41, evento 2) e, mais recentemente, em nome do
irmão da autora, Sr. José Maria da Silva Júnior, a saber, NF de venda de produtos do ano de
2019 (igual ano da DER).
Em resumo, há início de prova material atual, como, as notas fiscais do produtor rural em nome
do irmão da parte autora, José Maria da Silva Junior, referente ao ano de 2019. Cumprindo
registrar que a atividade rural em sítios, como o explorado pela autora, se dá com documentos
emitidos em nome do pai, quiçá do irmão homem. Por isso, a falta de documentos em nome da
autora.
A prova oral colhida, em audiência, realizada nesta data, revelou que a parte autora mora num
sitio, propriedade que era de seus pais, situado no bairro Ribeirão Fundo de Baixo, km 15, em
Juquiá/SP; nesse sítio a autora trabalha em serviço rural plantando palmito e banana.
As testemunhas, em resumo, disseram:
José: que mora no bairro Ribeirão Fundo de Baixo, km 15, em Juquiá/SP; que não tem sítio;
que conhece a autora há mais de 20 anos; que nunca trabalhou com a autora; que é vizinho da
autora; que o sítio que mora a autora era do pai dela, Sr. José Maria, que já é falecido; que a
autora trabalha no sítio plantando milho, palmito, banana; que a autora vende os produtos
plantados todo mês; que conhece autora a mais de 20 anos, mas não sabe precisar desde
quando eles tem o sítio; que antes o pai da autora trabalhava com gado e, depois que faleceu,
autora começou com produção de palmito, banana no sítio.
Fábio: que mora no bairro Ribeirão Fundo de Baixo, km 15, em Juquiá/SP; que é aposentado;
que antes trabalhava como vaqueiro, na fazenda Flora, em Sete Barras/SP; que é vizinho da
autora; que a autora tem sítio, o qual era dos pais dela; que os pais da autora são falecidos;
que, hoje, moram a autora e seu irmão, que a ajuda no sítio; que a autora casou saiu da cidade
e, depois de separar retornou ao sítio; que a autora casou e por um tempo morou em outra
cidade, mas depois que separou retornou ao sítio dos pais; que há mais de 20 anos ela mora e
trabalha nesse sítio; que a autora planta palmito e banana; que vende quando aparece
vendedor, mas não é sempre; que desde 1997 estão no sítio; que não sabe o nome do sítio da
autora; que ela sempre trabalhou no sítio e que ainda planta no local.
Antônio: que mora no bairro Ribeirão Fundo de Baixo, km 15, em Juquiá/SP; que tem uma
chácara vizinha ao sitio da autora; que a autora mora lá há 20 anos, sempre trabalhando no
sítio; que a autora planta palmito, banana e milho; que até hoje trabalha; que ela mora junto
com o irmão, chamado José Maria, que também a ajuda; que o pai da autora é falecido; que o
sítio antes era do pai da autora; que o pai da autora faleceu há muito tempo; que via ele no
sítio; que a autora já trabalhava no sítio nessa época.
A prova do labor rural da parte autora, por tempo de trabalho igual ao período de carência e nos
momentos do implemento do requisito etário, ou mesmo da DER, restou demonstrada na prova
inserida no feito JEF.
DISPOSITIVO
Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO, para condenar o INSS a conceder à
parte autora o benefício de aposentadoria por idade rural, desde 18/12/2019 (DIB), cuja renda
mensal inicial – RMI e renda mensal atual - RMA fixo no valor de um salário mínimo, pagando
os atrasados devidos, desde aquela data até a efetiva implantação (DIP: 01/07/2021),
acrescidos de juros e correção monetária até o efetivo pagamento, nos termos do Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observada nova Resolução
(Res. nº 658/2020-CJF de 10/08/2020) (...)”
3. Recurso do INSS, em que se alega, em apertada síntese, que não há qualquer documento
que indique atividade rural, não sendo possível a sua qualificação como segurada especial, e
que “não há prova de exercício de atividade rural no período imediatamente anterior ao requisito
etário (1991, no caso da autora), como exigido pelo artigo 143 da Lei 8.213/91”. Diz que “(...)
Pelo conjunto probatório, fica claro que a recorrida se casou em 1981. Para aproveitar os
documentos emitidos em nome de seus pais deveria ter provado que voltou a morar com eles,
ou com sua mãe ainda viva após 1997, o que não fez em momento algum Ela se filiou ao
sindicato rural apenas por ocasião de sua aposentadoria. No mais, juntou apenas documentos
tributários referentes à gleba, pertencente à família. Ainda assim, por período pequeno (pouco
mais de 7 anos). Notas fiscais apenas para o ano de 2019, e em nome do irmão (...).”
4.Para o reconhecimento de período trabalhado em atividade rural sem registro, o ordenamento
jurídico exige, ao menos, início razoável de prova material contemporânea, nos termos do § 2º
do art. 55 da Lei n.º 8.213/91. Não é admissível prova exclusivamente testemunhal. Por outro
lado, é admissível documento em nome de terceiros, consoante jurisprudência pacífica da TNU.
5.Como a parte autora nasceu em 11/12/1963, completou 55 anos em 11/12/2018e deve
comprovar o exercício de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento do
benefício, pelo período de 180meses. Portanto, deve comprovar o exercício de atividade rural
de 2003a 2018, ou de 2004 a 2019 (ano da DER). Os documentos em nome do pai da parte
autora não constituem início de prova material, na medida em que ele faleceu em 1997,
conforme certidão de óbito que instrui os autos. O único documento em nome próprio é a
carteira de afiliada ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Juquiá. Comofoi emitida somente
em 2018, não é documento hábil a comprovar a o exercício de labor rural desde 2003 ou 2004.
Por fim, consta uma nota fiscal de produtor rural,em nome do irmão da parte autora e datado de
2019. Considerando a fragilidade da prova documental, bem como o fato dela estar restrita aos
anos de 2018 e 2019, julgo não comprovado o exercício de atividade rural pelo lapso temporal
exigido pela Lei 8.213/91. Ressalto ser inadmissível fazer prova de cerca de 13 anos de labor
rural apenas com base no depoimento de testemunhas, sem nenhum respaldo em início de
prova material.
6. RECURSO A QUE SE DÁ PROVIMENTO, para julgar improcedente o pedido de concessão
do benefício de aposentadoria por idade rural.
7. Sem condenação ao pagamento de honorários advocatícios.
MAÍRA FELIPE LOURENÇO
JUÍZA FEDERAL RELATORA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira
Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento ao recurso Participaram do julgamento os
Senhores Juízes Federais: Maíra Felipe Lourenço, Caio Moyses de Lima e Luciana Melchiori
Bezerra, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
