
| D.E. Publicado em 06/06/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa necessária, e dar parcial provimento à apelação autárquica, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | DAVID DINIZ DANTAS:10074 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217051057D849 |
| Data e Hora: | 22/05/2017 17:09:25 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0010552-82.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Documentos acostados à exordial (fls. 21-103).
Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 104).
Citação, em 19/02/2016 (fl. 112).
A r. sentença, prolatada em 11/08/2016, julgou procedente o pedido. Deferida a concessão do benefício sub judice, no valor de um salário-mínimo mensal, desde a data do pedido administrativo, devendo as prestações em atraso ser pagas de uma só vez. As parcelas serão corrigidas monetariamente a partir do respectivo vencimento pela tabela prática do E. Tribunal de Justiça, e juros de mora desde a data do laudo, no percentual de 0,5% (meio por cento) ao mês, nos termos da Lei 9.494/97 Sentença submetida ao reexame necessário (fls. 210-213).
O INSS interpôs recurso de apelação. Requer a reforma total do julgado. No mérito, pleiteia, em suma, a reforma da sentença em virtude da ausência de comprovação do labor rural no período de carência. Para o caso de manutenção do decisum, requer a fixação da correção monetária e dos juros de mora de acordo com a nova redação do art. 1º-F da Lei 9.494/97, conferida pela Lei 12.703/12 (fls. 222-233).
Com contrarrazões, nas quais a parte autora requer a antecipação da tutela (fls. 236-248), subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | DAVID DINIZ DANTAS:10074 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217051057D849 |
| Data e Hora: | 22/05/2017 17:09:18 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0010552-82.2017.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Ab initio, insta salientar que em virtude da alteração legislativa decorrente da entrada em vigor do novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/15), a remessa oficial a qual foi submetida a r. sentença pelo douto Juiz a quo, não há de ser conhecida, consoante as seguintes considerações.
DA REMESSA NECESSÁRIA
O novo Estatuto processual trouxe inovações no tema da remessa ex officio, mais especificamente, estreitou o funil de demandas cujo trânsito em julgado é condicionado ao reexame pelo segundo grau de jurisdição, para tanto elevou o valor de alçada, verbis:
Convém recordar que no antigo CPC, dispensava do reexame obrigatório a sentença proferida nos casos CPC, art. 475, I e II sempre que a condenação, o direito controvertido, ou a procedência dos embargos em execução da dívida ativa não excedesse a 60 (sessenta) salários mínimos. Contrario sensu, aquelas com condenação superior a essa alçada deveriam ser enviadas à Corte de segundo grau para que pudesse receber, após sua cognição, o manto da coisa julgada.
Pois bem. A questão que se apresenta, no tema Direito Intertemporal, é de se saber se as demandas remetidas ao Tribunal antes da vigência do Novo Diploma Processual - e, consequentemente, sob a égide do antigo CPC -, vale dizer, demandas com condenações da União e autarquias federais em valor superior a 60 salários mínimos, mas inferior a 1.000 salários mínimos, se a essas demandas aplicar-se-ia o novel Estatuto e com isso essas remessas não seriam conhecidas (por serem inferiores a 1.000 SM), e não haveria impedimento - salvo recursos voluntários das partes - ao seu trânsito em julgado; ou se, pelo contrário, incidiria o antigo CPC (então vigente ao momento em que o juízo de primeiro grau determinou envio ao Tribunal) e persistiria, dessa forma, o dever de cognição pela Corte Regional para que, então, preenchida fosse a condição de eficácia da sentença.
Para respondermos, insta ser fixada a natureza jurídica da remessa oficial.
Natureza Jurídica Da Remessa Oficial
Cuida-se de condição de eficácia da sentença, que só produzirá seus efeitos jurídicos após ser ratificada pelo Tribunal.
Portanto, não se trata o reexame necessário de recurso, vez que a legislação não a tipificou com essa natureza processual.
Apenas com o reexame da sentença pelo Tribunal haverá a formação de coisa julgada e a eficácia do teor decisório.
Ao reexame necessário aplica-se o principio inquisitório (e não o principio dispositivo, próprio aos recursos), podendo a Corte de segundo grau conhecer plenamente da sentença e seu mérito, inclusive para modificá-la total ou parcialmente. Isso ocorre por não ser recurso, e por a remessa oficial implicar efeito translativo pleno, o que, eventualmente, pode agravar a situação da União em segundo grau.
Finalidades e estrutura diversas afastam o reexame necessário do capítulo recursos no processo civil.
Em suma, constitui o instituto em "condição de eficácia da sentença", e seu regramento será feito por normas de direito processual.
Direito Intertemporal
Como vimos, não possuindo a remessa oficial a natureza de recurso, na produz direito subjetivo processual para as partes, ou para a União. Esta, enquanto pessoa jurídica de Direito Público, possui direito de recorrer voluntariamente. Aqui temos direitos subjetivos processuais. Mas não os temos no reexame necessário, condição de eficácia da sentença que é.
A propósito oportuna lição de Nelson Nery Jr.:
Por consequência, como o Novo CPC modificou o valor de alçada para causas que devem obrigatoriamente ser submetidas ao segundo grau de jurisdição, dizendo que não necessitam ser confirmadas pelo Tribunal condenações da União em valores inferiores a 1.000 salários mínimos, esse preceito tem incidência imediata aos feitos em tramitação nesta Corte, inobstante remetidos pelo juízo a quo na vigência do anterior Diploma Processual.
Busca a parte autora a concessão do benefício previdenciário da aposentadoria por idade a trabalhador rural.
Discute-se, nestes autos, o preenchimento dos requisitos necessários à concessão de aposentadoria por idade ao rurícola, sendo necessária a comprovação da idade mínima e o desenvolvimento de atividade rural pelo período exigido na Lei 8.213/91.
A Lei 8.213/91, em seus artigos 39, inciso I, 48, 142 e 143, estabelece os requisitos necessários para a concessão de aposentadoria por idade a rurícola.
Além do requisito etário, o trabalhador rural deve comprovar o exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, em número de meses idêntico à carência do benefício.
O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o artigo 142, que assim dispõe:
No mais, segundo o RESP 1.354.908, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), necessária a comprovação do tempo de atividade rural no período imediatamente anterior à aquisição da idade:
Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência, como dever de verter contribuição por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício laboral durante o período respectivo.
No que se refere à comprovação do labor campesino, algumas considerações se fazem necessárias, uma vez que balizam o entendimento deste Relator no que diz com a valoração das provas comumente apresentadas.
Declarações de Sindicato de Trabalhadores Rurais fazem prova do quanto nelas alegado, desde que devidamente homologadas pelo Ministério Público ou pelo INSS, órgãos competentes para tanto, nos exatos termos do que dispõe o art. 106, III, da Lei 8.213/91, seja em sua redação original, seja com a alteração levada a efeito pela Lei 9.063/95.
Na mesma seara, declarações firmadas por supostos ex-empregadores ou subscritas por testemunhas, noticiando a prestação do trabalho na roça, não se prestam ao reconhecimento então pretendido, tendo em conta que equivalem a meros depoimentos reduzidos a termo, sem o crivo do contraditório, conforme entendimento já pacificado no âmbito desta Corte.
Igualmente não alcançam os fins pretendidos, a apresentação de documentos comprobatórios da posse da terra pelos mesmos ex-empregadores, visto que não trazem elementos indicativos da atividade exercida pela parte requerente.
Já a mera demonstração, por parte do autor, de propriedade rural, só se constituirá em elemento probatório válido desde que traga a respectiva qualificação como lavrador ou agricultor. No mesmo sentido, a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante a juntada dos respectivos comprovantes de pagamento das mensalidades.
Têm-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a qualificação da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos por órgãos públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge Scartezzini, v.u., DJ de 15.04.2002, p. 248.
Da mesma forma, a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a partir da celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos Tribunais.
Na atividade desempenhada em regime de economia familiar, toda a documentação comprobatória, como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida, em regra, em nome daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar. Ressalte-se, contudo, que nem sempre é possível comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua colheita por outros produtos de sua necessidade que um sitiante vizinho eventualmente tenha colhido ou a entrega como forma de pagamento pela parceria na utilização do espaço de terra cedido para plantar.
De qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº 463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em nome dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constituem início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos.
O trabalho urbano de membro da família não descaracteriza, por si só, o exercício de trabalho rural em regime de economia familiar de outro. Para ocorrer essa descaracterização, é necessária a comprovação de que a renda obtida com a atividade urbana é suficiente à subsistência da família.
O art. 106 da Lei 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura numerus clausus, já que o "sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento motivado" (AC nº 94.03.025723-7/SP, TRF 3ª Região, Rel. Juiz Souza Pires, 2º Turma, DJ 23.11.94, p. 67691), cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e a sua aceitação.
No que se refere ao recolhimento das contribuições previdenciárias, destaco que o dever legal de promover seu recolhimento junto ao INSS e descontar da remuneração do empregado a seu serviço compete exclusivamente ao empregador, por ser este o responsável pelo seu repasse aos cofres da Previdência, a quem cabe a sua fiscalização, possuindo, inclusive, ação própria para haver o seu crédito, podendo exigir do devedor o cumprimento da legislação. No caso da prestação de trabalho em regime de economia familiar, é certo que o segurado é dispensado do período de carência, nos termos do disposto no art. 26, III, da Lei de Benefícios e, na condição de segurado especial, assim enquadrado pelo art. 11, VII, da legislação em comento, caberia o dever de recolher as contribuições tão-somente se houvesse comercializado a produção no exterior, no varejo, isto é, para o consumidor final, a empregador rural pessoa física ou a outro segurado especial (art. 30, X, da Lei de Custeio).
Por fim, outra questão que suscita debates é a referente ao trabalho urbano eventualmente exercido pelo segurado ou por seu cônjuge, cuja qualificação como lavrador lhe é extensiva. Perfilho do entendimento no sentido de que o desempenho de atividade urbana, de per si, não constitui óbice ao reconhecimento do direito aqui pleiteado, desde que o mesmo tenha sido exercido por curtos períodos, especialmente em época de entressafra, quando o humilde campesino se vale de trabalhos esporádicos em busca da sobrevivência.
Da mesma forma, o ingresso no mercado de trabalho urbano não impede a concessão da aposentadoria rural, na hipótese de já restar ultimada, em tempo anterior, a carência exigida legalmente, considerando não só as datas do início de prova mais remoto e da existência do vínculo empregatício fora da área rural, como também que a prova testemunhal, segura e coerente, enseje a formação da convicção deste julgador acerca do trabalho campesino exercido no período.
A parte autora, nascida em 13/02/1955 completou a idade mínima de 60 (sessenta) anos em 13/02/2015, devendo comprovar o exercício de atividade rural por 180 meses (15 anos).
Para comprovar o período de labor campesino, a parte autora coligiu aos autos cópias das suas carteiras de trabalho (CTPS), com vínculos laborais de natureza rural, nos períodos de 10/07/1974 a 10/07/1976, de 16/07/1981 a 07/10/1981, de 11/06/1984 a 24/11/1984, de 01/06/1985 a 12/09/1987, de 30/09/1985 a 30/10/1985, de 23/12/1985 a 06/03/1986, de 02/07/1986 a 27/07/1986, de 28/07/1986 a 16/12/1990, de 07/05/1991 a 31/10/1991, de 13/05/1992 a 14/11/1992, de 06/05/1993 a 07/10/1993, de 09/02/1994 a 19/03/1994, de 19/05/1994 a 14/10/1994, de 14/08/1995 a 18/12/1995, de 12/01/1996 a 10/01/1999, 12/03/1996 a 10/01/1999, de 02/06/1999 a 26/12/1999, de 01/03/2000 a 28/04/2000, de 20/06/2000 a 29/11/2000, de 20/06/2001 a 21/02/2002, de 08/04/2002 a 20/12/2002, de 07/03/2003 a 23/05/2007, de 14/05/2008 a 03/10/2008, de 09/04/2009 a 12/09/2009, de 16/11/2009 a 30/03/2010, de 08/04/2010 a 20/08/2010, de 08/10/2010 a 01/03/2011, de 20/04/2011 a 09/09/2011, de 14/10/2011 a 01/03/2012, de 11/03/2013 a 29/10/2013, de 05/04/2012 a 17/08/2012, de 03/10/2012 a 01/02/2013, de, de 07/03/2014 a 01/08/2014, de 03/09/2014 a 30/12/2014, e de 02/04/2015 a 06/07/2015 (fls. 27-52, fls. 53-71 e fls. 72-86).
Cumpre observar que a parte autora colacionou prova plena de sua atividade como rurícola, dispensando-se, assim, a prova testemunhal.
Portanto, a certeza do exercício da atividade rural, inclusive por período superior ao legalmente previsto (26 anos 03 meses e 09 dias de labor rural, até a data do pedido administrativo, 18/02/2015), deriva do conjunto probatório produzido, qual seja, as cópias das carteiras de trabalho (CTPS) acostadas aos autos, com anotações relativas a relações empregatícias no qual o requerente figura como trabalhador rural, nos períodos acima especificados, ex vi do art. 106, I da Lei 8.213/91.
Por fim, descabe qualquer argumento no sentido de a parte autora não haver preenchido a condição laborativa por ela ter exercido atividades de natureza urbana nos períodos de 14/02/1981 a 28/06/1981, de 10/02/1982 a 10/05/1982, e de 11/03/2013 a 28/11/2013, uma vez que a legislação aplicável à espécie é clara quanto à desnecessidade de períodos ininterruptos de labor no campo (artigo 143, Lei 8.213/91), a significar que esporádicos períodos de trabalho na cidade ou eventuais intervalos de desemprego não descaracterizam a qualidade de trabalhador rural e, via de consequência, não obstam a concessão do benefício pleiteado.
Nesse sentido:
Dessa forma, ante o início de prova material apresentado, impõe-se reconhecer que a parte autora comprovou o exercício de atividade rural por período superior ao legalmente exigido, e até o período imediatamente anterior ao cumprimento do requisito etário.
Positivados os requisitos legais, é de se concluir que a parte autora tem direito à aposentação por idade, devendo, portanto, ser mantida integralmente a sentença prolatada, e, consequentemente, a tutela antecipada.
A correção monetária e os juros moratórios incidirão nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor, por ocasião da execução do julgado.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | DAVID DINIZ DANTAS:10074 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217051057D849 |
| Data e Hora: | 22/05/2017 17:09:21 |
