
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006436-51.2021.4.03.6104
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: SILVIO BATISTA DA SILVA, LOREN CRISTINA JOSE DA SILVA, RAFAEL JOSE
Advogado do(a) APELADO: CHARLES SIMAO DUEK ANEAS - SP288693-N
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006436-51.2021.4.03.6104
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: SILVIO BATISTA DA SILVA, LOREN CRISTINA JOSE DA SILVA, RAFAEL JOSE
Advogado do(a) APELADO: CHARLES SIMAO DUEK ANEAS - SP288693-N
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em face de sentença que julgou parcialmente procedente o pedido para reconhecer o direito da autora à aposentadoria por idade, desde o requerimento administrativo (DER 22/2/2019), com cessação na data de seu óbito, ocorrido em 6/1/2022, com acréscimo dos consectários legais.
Houve dispensa do reexame necessário.
Inconformada, a autarquia federal sustenta, em síntese, o não preenchimento dos requisitos necessários da aposentadoria por idade quando do primeiro requerimento administrativo (DER 22/2/2019).
Assevera, ainda, a impossibilidade de se computar tempo fictício decorrente de atividade especial para fins de carência e de acréscimo na renda mensal do benefício.
Subsidiariamente, questiona os consectários e suscita a necessidade de a parte autora apresentar declaração sobre cumulação entre benefícios de regimes diversos, em razão do disposto no artigo 24, §§ 1º e 2º, da Emenda Constitucional n. 103/2019.
Ao final, prequestiona a matéria para fins recursais.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006436-51.2021.4.03.6104
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: SILVIO BATISTA DA SILVA, LOREN CRISTINA JOSE DA SILVA, RAFAEL JOSE
Advogado do(a) APELADO: CHARLES SIMAO DUEK ANEAS - SP288693-N
V O T O
O recurso atende aos pressupostos de admissibilidade e merece ser conhecido.
Discute-se o direito da parte autora a benefício de aposentadoria por idade.
A aposentadoria por idade é garantida pela Constituição Federal em seu artigo 201, § 7º, II, para os segurados do regime geral de previdência social (RGPS), nos termos da lei e desde que obedecidas as seguintes condições:
“II - sessenta e cinco anos de idade, se homem, e sessenta anos de idade, se mulher, reduzido em cinco anos o limite para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal; (grifo nosso)”
A Lei n. 8.213/1991 (LBPS), em seu artigo 48, caput, regulamenta a matéria:
“Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) se mulher.
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinquenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. (Redação dada pela Lei nº. 9.876, de 1999)”
Em suma, para a concessão do benefício previdenciário, via de regra, é necessário verificar se a autora preenche os requisitos legais estabelecidos, a saber:
a) contingência ou evento, consistente na idade mínima;
b) período de carência, segundo os artigos 25, II, e 142 da LBPS;
c) filiação, a qual, no caso de aposentadoria por idade urbana, é dispensada no momento do atingimento da idade ou requerimento.
Quanto à qualidade de segurado, desde a vigência da Lei n. 10.666/2003 (art. 3º, § 1º) sua perda não será considerada para a concessão da aposentadoria em debate, ou seja, os requisitos legais (carência e idade) não precisam ser preenchidos simultaneamente.
No caso, a autora, consoante se constata dos documentos colacionados aos autos, cumpriu o requisito etário – 60 (sessenta) anos – em 2/2/2019, atendendo ao previsto no artigo 48, caput, da Lei n. 8.213/1991.
O INSS, no processo administrativo, apresentado em 22/2/2019, computou para fins de carência apenas 121 (cento e vinte e uma) contribuições, e indeferiu o requerimento de concessão do benefício por falta de carência.
Verifica-se, na peça vestibular, a intenção da parte autora quanto: (i) averbação no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) relativa aos períodos de 9/1982 a 12/1982, de 1/1983 a 10/1983, 10/1984 e 12/1984, 5/1987 e de 4/1989 a 6/1989; (ii) reconhecimento e cômputo dos períodos em gozo de auxílio-doença; (iii) reconhecimento dos recolhimentos efetuados na condição de segurado facultativo de baixa renda dos períodos de 10/2014 a 09/2015 e de 10/2017 a 11/2018; e (iv) reconhecimentos dos períodos laborados em condições especiais com conversão em comum dos períodos de 8/10/1979 a 1º/11/1979 e de 19/7/1980 a 8/9/1981.
Observa-se do procedimento administrativo (NB 203.288.973-5 – DER 28/10/2021), no qual foi concedida a aposentadoria por idade a parte autora, a superveniente perda parcial do interesse de agir, ante o cômputo administrativo dos períodos indicados a seguir: (i) de setembro a dezembro de 1982; (ii) de janeiro a outubro de 1983; (iii) de outubro e dezembro de 1984; (iv) maio de 1987; (v) de abril a junho de 1989; (vi) de 1º/5/2018 a 30/11/2018; (vii) períodos em gozo de benefício por incapacidade temporária de 28/6/2011 a 7/2/2012, de 19/7/2012 a 13/8/2013 e de 24/7/2019 a 3/3/2020.
Conforme se depreende do resumo de documentos para cálculo de tempo de contribuição na DER 22/2/2019, a autarquia federal não validou os períodos de 10/2014 a 9/2015 e de 10/2017 a 4/2018, já que vertido na qualidade de segurada facultativa baixa renda.
Registre-se que para que seja possível a contribuição sob o Código 1929 (Facultativo Baixa Renda - Mensal), é necessário que o segurado facultativo não possua renda própria, se dedique exclusivamente ao trabalho doméstico no âmbito de sua residência e pertença a família de baixa renda, nos termos do artigo 21, §2º, II, letra "b" da Lei n. 8.212/1991.
O § 4º do mesmo dispositivo prevê os requisitos para que a família seja considerada de baixa renda:
"§ 4º Considera-se de baixa renda, para os fins do disposto na alínea b do inciso II do § 2o deste artigo, a família inscrita no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal - CadÚnico cuja renda mensal seja de até 2 (dois) salários mínimos. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)"
Com efeito, a comprovação o critério de baixa renda é realizada mediante a inscrição no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico).
Verifica-se dos autos que a autora estava cadastrada no CadÚnico desde o dia 5/6/2012 e que atualizou o seu cadastro pela última vez em 12/5/2021.
Em razão disso, devem ser computados os períodos controversos para todos os fins.
Entretanto, no caso em tela, fala-se de concessão de aposentadoria por idade – requerida antes da vigência da Emenda Constitucional n. 103/2019, de 12 de novembro de 2019 – para a qual não se exigia demonstração de tempo de serviço, pela demandante, mas sim, efetivo recolhimento de contribuições mensais.
A especialidade do serviço constitui questão atinente às aposentadorias especial e por tempo de contribuição, configurando tema despiciendo para fins de aposentadoria por idade, isso porque não implica majoração do período de carência, à vista do artigo 24, caput, da Lei n. 8.213/1991, nem gera aumento da Renda Mensal Inicial (RMI) à luz do artigo 50 da mesma lei, pois este último é apurado com base em contribuições vertidas.
Assim, não se admite o aproveitamento da conversão do tempo de serviço em atividade especial para comum, para fins de totalização da carência e obtenção de aposentadoria por idade, nos moldes do artigo 50 da Lei n. 8.213/1991.
Nesse sentido, os precedentes do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Regional Federal da 3ª Região:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE URBANA. CONVERSÃO DE TEMPO ESPECIAL EM COMUM PARA PREENCHIMENTO DE CARÊNCIA. DESCABIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE CONTAGEM DE TEMPO FICTA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. O presente agravo regimental objetiva desconsiderar decisão que, em observância à jurisprudência do STJ, não permitiu o aproveitamento do tempo especial convertido em comum para preenchimento de carência da aposentadoria por idade urbana. 2. Observou-se a jurisprudência do STJ no sentido de que para concessão de aposentadoria por idade urbana, exige-se do segurado a efetiva contribuição, disso decorrendo que o tempo especial convertido em comum não pode ser aproveitado para fins de carência. 3. Agravo regimental não provido. (STJ – AgRg nos Edcl no Resp: 1558762 SP 2015/0254202-5, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data de Julgamento: 19/04/2016, T2 – SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: Dje 26/04/2016)
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR IDADE URBANA. REQUISITOS ANTERIORES À EC 103/19. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. COMPROVAÇÃO. CONVERSÃO EM TEMPO COMUM PARA FINS DE CARÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. CARÊNCIA NÃO CUMPRIDA. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO INDEVIDO. 1. O artigo 201, inciso I, da Constituição Federal elenca a idade avançada como contingência protegida pela Previdência Social. 2. A aposentadoria por idade é regulamentada nos artigos 48 a 51 da Lei nº 8.213/91 (LBPS), dispondo o artigo 48, caput, que este benefício será devido ao segurado que, cumprida a carência exigida, completar a idade de 65 (sessenta e cinco) anos, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. O artigo 25, inciso II, da LBPS, prevê a carência de 180 (cento e oitenta) contribuições mensais para o benefício em questão, salientando-se que, em relação ao segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até 24/07/1991, considera-se a tabela progressiva constante do artigo 142 desta Lei. 3. Os requisitos necessários à concessão do benefício de aposentadoria por idade são a idade mínima e a carência. 4. Na aposentadoria por idade urbana é exigida a efetiva contribuição ao RGPS, sendo vedada a contagem de tempo ficta, de modo que não cabe a conversão de tempo especial em comum para fins de preenchimento da carência. (...) 6. No caso dos autos, restou comprovada a especialidade das atividades desempenhadas nos períodos pleiteados, mas não foi cumprida a carência necessária para a concessão do benefício de aposentadoria por idade. Benefício não devido. Tutela de urgência revogada. 7. Condenação da parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil. Suspensão da sua exigibilidade ante a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, na forma do artigo 98, § 3º, do Código de Processo Civil. 8. Apelação do INSS parcialmente provida. (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5331218-72.2019.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal ALESSANDRO DIAFERIA, julgado em 26/04/2024, DJEN DATA: 30/4/2024)
Desse modo, a autora não faz jus ao acréscimo da conversão do tempo especial em comum (de 19/4/1980 a 8/9/1981).
Entretanto, mesmo com a exclusão do tempo ficto reconhecido, o requisito da carência foi cumprido, sendo possível a concessão do benefício de aposentadoria por idade urbana desde a DER (22/2/2019), conforme planilha de contagem acostada à sentença.
Considerando a sucumbência mínima da autora, fica mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado, nos moldes já fixados em sentença, excluindo-se as prestações vencidas após a data da sentença, consoante Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, do CPC.
Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se o valor da condenação ou do proveito econômico ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (art. 85, § 4º, II, do CPC).
Sobre as custas processuais, no Estado de São Paulo, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/1974, 8.620/1993 e 9.289/1996, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/1985 e 11.608/2003. Contudo, essa isenção não a exime do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Em relação à prescrição quinquenal, esta não se aplica ao caso concreto, por não ter decorrido, entre o requerimento na via administrativa e o ajuizamento desta ação, período superior a 5 (cinco) anos.
Tendo em vista as disposições da Emenda Constitucional n. 103/2019 sobre acumulação de benefícios em regimes de previdência social diversos (§§ 1º e 2º do art. 24), é necessária a apresentação de declaração, nos moldes do Anexo I da Portaria PRES/INSS n. 450/2020, na fase de cumprimento do julgado.
Ademais, possíveis valores não cumulativos com o benefício deferido ou recebidos a mais em razão de tutela provisória deverão ser compensados na fase de cumprimento do julgado.
Com relação ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade alguma à legislação federal ou a dispostos constitucionais.
Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação para, nos termos da fundamentação, excluir o acréscimo da conversão do tempo especial em comum (de 19/4/1980 a 8/9/1981).
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. SEGURADO FACULTATIVO DE BAIXA RENDA. CADÚNICO. VALIDAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE CÔMPUTO COMO CARÊNCIA DO RESULTADO DA CONVERSÃO DO TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM. PERÍODO DE CARÊNCIA CUMPRIDO. BENEFÍCIO DEVIDO.
- Para a concessão do benefício previdenciário, é necessário verificar se a autora preenche os requisitos legais estabelecidos, a saber: a) contingência ou evento, consistente na idade mínima; b) período de carência, segundo os artigos 25, II e 142 da Lei n. 8.213/1991 (LBPS); c) filiação, que no caso de aposentadoria por idade urbana é dispensada no momento do atingimento da idade ou requerimento.
- O implemento da idade depois da perda da qualidade de segurado não obsta o deferimento do benefício, desde que satisfeita a carência exigida a qualquer momento. Incidência do § 1º do artigo 3º da Lei n. 10.666/2003.
- Comprovação de que a família da parte autora possui inscrição no referido CadÚnico, sendo devido o cômputo dos períodos controversos para todos os fins.
- A especialidade do serviço constitui questão atinente às aposentadorias especial e por tempo de contribuição, configurando tema despiciendo para fins de aposentadoria por idade, isso porque não implica majoração do período de carência, à vista do artigo 24, caput, da Lei n. 8.213/1991, nem gera aumento da RMI à luz do artigo 50 da mesma lei, pois este último é apurado com base em contribuições vertidas.
- Mesmo com a exclusão do tempo ficto reconhecido, o requisito da carência foi cumprido, sendo possível a concessão do benefício de aposentadoria por idade urbana desde a DER (22/2/2019).
- Considerando a sucumbência mínima da autora, fica mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado, nos moldes já fixados em sentença, excluindo-se as prestações vencidas após a data da sentença, consoante Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, do CPC.
- A Autarquia Previdenciária está isenta das custas processuais no Estado de São Paulo. Contudo, essa isenção não a exime do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
- Apelação parcialmente provida.
