
| D.E. Publicado em 11/07/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação do INSS, ficando prejudicado o recurso de apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0011773-03.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de ação previdenciária, com vistas à concessão de aposentadoria por idade rural.
A r. sentença, prolatada em 18.04.2016, julgou parcialmente procedente o pedido para condenar o INSS a reconhecer o labor rural no período de 29.04.1967 a 11.05.1974, para utilização em benefício futuro. Tendo em vista a sucumbência mínima do INSS, condenou o autor ao pagamento dos honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, ficando a execução dos valores suspensa enquanto perdurar o benefício da justiça gratuita, nos termos e prazos dos artigos 11 e 12, da Lei nº 1.060/50 (fls. 60-63).
As partes apelaram.
A parte autora apelou requerendo a concessão da aposentadoria híbrida desde a citação, conforme previsão legal nos artigos 201§ 7º, II da Constituição Federal, artigos 48, 102 e 143 da Lei nº 8.213/91 (fls. 69-76).
Em suas razões de apelação, o INSS aduz, em síntese, que os documentos coligidos aos autos não constituem início de prova material exigido pela Lei nº 8.213/91, dessa forma o tempo de serviço supostamente trabalhado como rurícola não pode ser reconhecido baseado em prova exclusivamente testemunhal, devendo a sentença ser reformada para declarar a total improcedência do pedido da autora (fls. 78-87).
Sem as contrarrazões, subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0011773-03.2017.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Busca a parte autora, nascida em 29/04/1953, concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.
Discute-se, nestes autos, o preenchimento dos requisitos necessários à concessão de aposentadoria por idade ao rurícola, sendo necessária a comprovação da idade mínima e o desenvolvimento de atividade rural pelo período exigido na Lei n. 8.213/91.
A Lei nº 8.213/91, em seus artigos 39, inciso I, 48, 142 e 143, estabelece os requisitos necessários para a concessão de aposentadoria por idade a rurícola.
Além do requisito etário, o trabalhador rural deve comprovar o exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, em número de meses idêntico à carência do benefício.
O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o artigo 142, que assim dispõe:
No mais, segundo o RESP 1.354.908 , realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), necessária a comprovação do tempo de atividade rural no período imediatamente anterior à aquisição da idade:
Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência, como dever de verter contribuição por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício laboral durante o período respectivo.
No que se refere à comprovação do labor campesino, algumas considerações se fazem necessárias, uma vez que balizam o entendimento deste Relator no que diz com a valoração das provas comumente apresentadas.
Declarações de Sindicato de Trabalhadores Rurais fazem prova do quanto nelas alegado, desde que devidamente homologadas pelo Ministério Público ou pelo INSS, órgãos competentes para tanto, nos exatos termos do que dispõe o art. 106, III, da Lei nº 8.213/91, seja em sua redação original, seja com a alteração levada a efeito pela Lei nº 9.063/95.
Na mesma seara, declarações firmadas por supostos ex-empregadores ou subscritas por testemunhas, noticiando a prestação do trabalho na roça, não se prestam ao reconhecimento então pretendido, tendo em conta que equivalem a meros depoimentos reduzidos a termo, sem o crivo do contraditório, conforme entendimento já pacificado no âmbito desta Corte.
Igualmente não alcançam os fins pretendidos, a apresentação de documentos comprobatórios da posse da terra pelos mesmos ex-empregadores, visto que não trazem elementos indicativos da atividade exercida pela parte requerente.
Já a mera demonstração, por parte do autor, de propriedade rural, só se constituirá em elemento probatório válido desde que traga a respectiva qualificação como lavrador ou agricultor. No mesmo sentido, a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante a juntada dos respectivos comprovantes de pagamento das mensalidades.
Tem-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a qualificação da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos por órgãos públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge Scartezzini, v.u., DJ de 15.04.2002, p. 248.
Da mesma forma, a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a partir da celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos Tribunais.
Na atividade desempenhada em regime de economia familiar, toda a documentação comprobatória, como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida, em regra, em nome daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar. Ressalte-se, contudo, que nem sempre é possível comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua colheita por outros produtos de sua necessidade que um sitiante vizinho eventualmente tenha colhido ou a entrega como forma de pagamento pela parceria na utilização do espaço de terra cedido para plantar.
De qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº 463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em nome dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constituem início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos.
O trabalho urbano de membro da família não descaracteriza, por si só, o exercício de trabalho rural em regime de economia familiar de outro. Para ocorrer essa descaracterização, é necessária a comprovação de que a renda obtida com a atividade urbana é suficiente à subsistência da família.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura numerus clausus, já que o "sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento motivado" (AC nº 94.03.025723-7/SP, TRF 3ª Região, Rel. Juiz Souza Pires, 2º Turma, DJ 23.11.94, p. 67691), cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e a sua aceitação.
No que se refere ao recolhimento das contribuições previdenciárias, destaco que o dever legal de promover seu recolhimento junto ao INSS e descontar da remuneração do empregado a seu serviço compete exclusivamente ao empregador, por ser este o responsável pelo seu repasse aos cofres da Previdência, a quem cabe a sua fiscalização, possuindo, inclusive, ação própria para haver o seu crédito, podendo exigir do devedor o cumprimento da legislação. No caso da prestação de trabalho em regime de economia familiar, é certo que o segurado é dispensado do período de carência, nos termos do disposto no art. 26, III, da Lei de Benefícios e, na condição de segurado especial, assim enquadrado pelo art. 11, VII, da legislação em comento, caberia o dever de recolher as contribuições tão-somente se houvesse comercializado a produção no exterior, no varejo, isto é, para o consumidor final, a empregador rural pessoa física ou a outro segurado especial (art. 30, X, da Lei de Custeio).
Por fim, outra questão que suscita debates é a referente ao trabalho urbano eventualmente exercido pelo segurado ou por seu cônjuge, cuja qualificação como lavrador lhe é extensiva. Perfilho do entendimento no sentido de que o desempenho de atividade urbana, de per si, não constitui óbice ao reconhecimento do direito aqui pleiteado, desde que o mesmo tenha sido exercido por curtos períodos, especialmente em época de entressafra, quando o humilde campesino se vale de trabalhos esporádicos em busca da sobrevivência.
Da mesma forma, o ingresso no mercado de trabalho urbano não impede a concessão da aposentadoria rural, na hipótese de já restar ultimada, em tempo anterior, a carência exigida legalmente, considerando não só as datas do início de prova mais remoto e da existência do vínculo empregatício fora da área rural, como também que a prova testemunhal, segura e coerente, enseje a formação da convicção deste julgador acerca do trabalho campesino exercido no período.
Ao caso dos autos.
A parte autora completou a idade mínima em 29/04/2008 (fls. 11), devendo comprovar o exercício de atividade rural por 162 meses.
Nos termos da Súmula de nº 149 do Superior Tribunal de Justiça, é necessário que a prova testemunhal venha acompanhada de, pelo menos, um início razoável de prova documental, in verbis:
No caso em questão, para comprovar sua atividade rural a requerente apresentou cópias dos seguintes documentos: sua certidão de casamento, realizado em 18/05/1974, na qual consta a qualificação do seu cônjuge como lavrador (fls. 13) e certidão do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos da Comarca de Bariri-SP, na qual consta que o genitor da autora, qualificado neste documento como lavrador, adquiriu em 03/01/1959 imóvel rural por transmissão de herança e compra de direitos hereditários (fls. 15-15verso).
Quanto ao documento que qualifica o genitor da autora como lavrador e demonstra a aquisição por herança de bem imóvel de natureza rural, não configura o início de prova material requerido pela jurisprudência e doutrina, pois não restou comprovada a atividade rural em regime de economia familiar nos anos seguintes à aquisição do imóvel rural.
Ademais, a autora casou-se em 11/05/1974, não estando presente a hipótese na qual o Superior Tribunal de Justiça permite o uso de documentos do pai para a concessão do beneficio de aposentadoria rural, que seria o de mulher solteira que permaneça na companhia dos pais em idade adulta.
Quanto à certidão de casamento, embora seja pacífico o entendimento dos Tribunais, considerando as difíceis condições dos trabalhadores rurais, de admitir a extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou companheira, a prova oral é insuficiente para comprovar a atividade rural da parte autora pelo período exigido em lei, pois a testemunha ouvida declarou não saber onde a autora passou a trabalhar após o casamento. Observo ainda que referida testemunha apontou que o cônjuge da autora "tomava conta de fazendas", trabalhando ao menos em uma fazenda em Santa Maria da Serra como administrador, atividade que é considerada como de natureza urbana para fins previdenciários.
É certo que quem vive no campo ou conhece os costumes e características próprias das atividades de uma propriedade rural sabe que o trabalhador admitido como administrador ou encarregado pode, em alguns casos, estar sujeito a ter que desenvolvê-las com força braçal, um dia capinando, outro limpando estábulos, outro consertando cercas ou em atividades afins, desenvolvidas por um típico trabalhador rural .
No entanto, a Instrução Normativa nº 95, de 7 de outubro de 2003, que trata da filiação ao regime urbano e rural, no artigo 27 refere-se ao administrador da Fazenda como segurado urbano, exceto se demonstrado que as anotações profissionais não correspondem às atividades efetivamente exercidas, caso em que sua filiação será ao regime rural.
Neste sentido:
Ressalte-se que a autora não trouxe um documento sequer que a qualifique como lavradora durante o período apontado na inicial.
Nesse sentido, os seguintes julgados desta 8ª Turma:
Dessa forma, não preenchidos os requisitos legais, é indevido o reconhecimento de labor rural sem registro em CTPS, bem como o benefício de aposentadoria por idade rural.
E, não havendo tempo de labor rural a ser reconhecido, não há como analisar a questão relativa à aposentadoria híbrida por idade prevista no art. 48, §§3º e 4º da Lei 8.213/91.
Na espécie, sendo a parte autora beneficiária da justiça gratuita (fl. 43), é indevida sua condenação nas verbas de sucumbência, mesmo porque, segundo decidido pelo E. STF, descabe ao julgador proferir decisões condicionais, tocando-lhe avaliar a situação de pobreza quando do julgamento (RE 313348 AgR/RS, Primeira Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 15/04/2003, v.u., DJ 16/05/2003, p. 104).
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS PARA JULGAR IMPROCEDENTE O PEDIDO INICIAL E REFORMAR IN TOTUM A R. SENTENÇA PROLATADA. PREJUDICADA A APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
É como voto.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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| Signatário (a): | DAVID DINIZ DANTAS:10074 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217051057D849 |
| Data e Hora: | 27/06/2017 17:15:47 |
