Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5158246-62.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
15/06/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 19/06/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO: APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. CNIS. LONGO
PERÍODO DE EXERCÍCIO DE ATIVIDADE URBANA. DESCARACTERIZAÇÃO DA CONDIÇÃO
DE RURÍCOLA. INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA.
1. O exercício de atividade urbana por longo período descaracteriza a condição de rurícola.
2. Emerge do CNIS trazido aos autos (ID 123919426) que a parte autora exerceu atividade
urbana como empregada doméstica de 01/01/99 a 31/03/2005 , contrariando, inclusive, o alegado
na inicial.
3. Inversão do ônus da sucumbência. Exigibilidade condicionada à hipótese prevista no § 3º do
artigo 98 do Código de Processo Civil/2015 ( artigo 12 da Lei nº 1.060/50).
4. Apelação provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5158246-62.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELADO: MARIA JOSE PEREIRA DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: IRINEU DILETTI - SP180657-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5158246-62.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
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APELADO: MARIA JOSE PEREIRA DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: IRINEU DILETTI - SP180657-N
R E L A T Ó R I O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de
apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em face da sentença que
julgou procedente o pedido de concessão do benefício de aposentadoria por idade de trabalhador
rural, condenando-o a pagar o benefício, verbis:
"Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido da parte autora para declarar como efetivo
exercício da atividade de trabalhador rural o período compreendido entre junho de 1973 a outubro
de 1990 e de março de 2009 a novembro de 2015, e condeno a autarquia a conceder-lhe o
benefício de APOSENTADORIA POR IDADE rural, no valor de um salário mínimo, bem como a
pagar as prestações vencidas, devidas a partir da data do requerimento administrativo (dia
22.02.2018 fls. 60). Assim, extingo o processo com resolução do mérito, nos termos do artigo
487, inciso I, do Código de Processo Civil. Em razão do julgado nas ADIs 4.357 e 4.425, que
declarou inconstitucional, por arrastamento, o art. 1º-F da Lei nº 9.494, com a redação dada pelo
art. 5º da Lei nº 11.960, de 29.07.2009, bem como o decidido no REsp 1.270.439/PR, sob a
sistemática dos recursos repetitivos, a correção monetária será devida, nos termos da Lei nº
6.899, de 08.4.1981 (Súmula nº 148 do Superior Tribunal de Justiça), a partir de cada vencimento
(Súmula nº 8 do Tribunal Regional Federal da Terceira Região), e pelo mesmo critério de
atualização dos benefícios previdenciários previsto na legislação respectiva, o qual está resumido
no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela
Resolução nº 134, de 21 de dezembro de 2010, do Conselho da Justiça Federal. Os juros de
mora são devidos a partir da citação, à taxa de 0,5% ao mês, aplicados de uma só vez (TRF4,
APELREEX 0017447-71.2013.404.9999, Quinta Turma, Relator Luiz Carlos de Castro Lugon,
D.E. 29/11/2013). Outrossim, condeno a Autarquia-ré ao pagamento de honorários advocatícios
que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, incidentes sobre as prestações
vencidas até a data da publicação da sentença (Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça).
Dispensado o reexame necessário, nos termos do art. 496, §3º, inciso I, do Código de Processo
Civil, pois, considerada a renda do benefício e o tempo transcorrido desde o indeferimento do
pedido administrativo, o valor da condenação evidentemente fica abaixo do patamar de 1.000
(mil) salários mínimos. Sem custas (art. 4º da Lei 9.289/96). P.I.C.."
O recorrente pede a reforma da sentença, em síntese, sob o fundamento de que não há
comprovação dos requisitos necessários à concessão do benefício pleiteado.
Regularmente processado o feito, os autos subiram a este Eg. Tribunal.
É O RELATÓRIO.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5158246-62.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA JOSE PEREIRA DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: IRINEU DILETTI - SP180657-N
V O T O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Inicialmente,
recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015 e, em razão de sua
regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo
Civil.
Segundo a inicial, desde tenra idade a autora trabalhou em serviços gerais de lavouras em
companhia de seus genitores, por várias propriedades rurais da região de Guaraçaí/SP, em
vários tipos de lavouras, tais como na Fazenda Perobas. Em 25.07.1981, casou-se como o Sr.
JOÃO HONÓRIO DA SILVA, também lavrador, passando, desta feita, a trabalhar em sua
companhia junto à Fazenda Palmares, localizada também no município de Guaraçaí/SP, de
propriedade da família “Murai”. Em seguida, trabalhou informalmente nas condições de diaristas,
empreitadas e etc., em lavouras no Sítio do Sr. Minoru, localizado no Município de Murutinga do
Sul, bem como na Fazenda Ipê, do Sr. “Luiz Possente” e Fazenda Formosa do Sr. “Keisuki
Korim”, ambas localizadas no Município de Guaraçaí/SP, o que fez até o ano de 2009. Já em
2009, a autora e e seu Marido foram contemplados com um Lote de Terras rurícolas através do
INCRA, localizado no Bairro Moinho, no Município de Murutinga do Sul, o qual, denominado de
Sítio Três irmãos, onde, em regime de subsistência familiar, dedicaram-se ao serviço rurícola de
criação de bovinos para recria e abate e, neste trabalho permaneceu até 04/11/2015, quando,
então, se deu o divórcio do casal.
A parte autora ajuizou a presente ação objetivando a concessão de aposentadoria por idade rural,
trazendo aos autos para comprovar o implemento dos requisitos necessários, cópias dos
seguintes documentos: documentos escolares, onde consta sua residência na Fazenda Perobas,
onde consta a profissão de seu Genitor JOSÉ PEREIRA DA SILVA como a de LAVRADOR
(1973); de sua certidão de casamento, onde consta a profissão do seu marido de LAVRADOR
(1981); de certidão de nascimento de seu filho MARCO ANTONIO, onde consta a profissão do
genitor JOÃO HONORIO DA SILVA, como a de LAVRADOR (1982); de certidão de nascimento
de sua filha ANA PAULA, onde consta a profissão do genitor JOÃO HONORIO DA SILVA a de
LAVRADOR (1985); de certidão de nascimento de sua filha LUANA APARECIDA PEREIRA DA
SILVA, onde consta a profissão do genitor JOÃO HONORIO DA SILVA, como a de LAVRADOR
(1990); Notas fiscais de produtor rural em nome de seu marido JOÃO HONORIO DA SILVA,
emitidas no período de 2009 a 2015.
O INSS alega que a parte autora não comprovou exercer o labor rural no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, pois ficou demonstrado que ela exercia atividade urbana .
Ingresso na análise do recurso.
Para a concessão da aposentadoria por idade rural, prevista no artigo 48, §§1º e 2º da Lei nº
8.213/91, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) idade
mínima e (ii) efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período
imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao da carência exigida para
a sua concessão.
No que tange à carência, considerando o ano em que o rurícola implementou todas as condições
necessárias à obtenção do benefício, o artigo 142 da Lei nº 8.213/91 estabelece regra de
transição a ser observada pelos segurados inscritos na Previdência Social até 24/07/91.
Por sua vez, a regra de transição prevista na Lei nº 8.213/91, em seu artigo 143, estabelece que
"O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência
Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode
requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício."
Em outras palavras, facultou-se aos trabalhadores rurais, atualmente enquadrados como
segurados obrigatórios, que requeressem até o ano de 2006 (15 anos da data de vigência da Lei
n.º 8.213/91) aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, bastando apenas a
comprovação do exercício de trabalho rural em número de meses idêntico à carência do
benefício, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao seu
requerimento.
Com o advento da Lei nº 11.718/2008, referido prazo foi prorrogado, exaurindo-se em
31/12/2010, a partir de quando se exige o recolhimento de contribuições, na forma estabelecida
em seu art. 3º.
Portanto, em se tratando de segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até 24/07/91,
deve ser considerada a tabela progressiva inserta no artigo 142 da Lei de Benefícios, não
havendo que se falar em exigência de contribuição ao trabalhador rural, bastando a comprovação
do efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, em número de meses
idêntico à carência do referido benefício.
Aos que ingressaram no sistema após essa data, aplica-se a regra prevista no art. 25, inc. II, da
Lei de Benefícios que exige a comprovação de 180 contribuições mensais.
Em relação aos segurados especiais, o artigo 39 da Lei n.º 8.213/91 estabelece que para a
obtenção da aposentadoria por idade, o segurado especial deverá comprovar o exercício de
atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência, conforme
preceitua o artigo 39, inciso I, da lei mencionada. Em outras palavras, não se exige o
cumprimento de carência do segurado especial, mas o efetivo exercício de atividade rural, na
forma especificada no dispositivo em comento.
Tema dos mais controvertidos na jurisprudência é a imediatidade do trabalho rural, impondo-se
sua análise caso a caso.
A propósito, o próprio C. STJ entende não ser imprescindível que a prova material abranja todo o
período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, desde que a prova testemunhal
amplie a sua eficácia, permitindo sua vinculação ao tempo de carência.
Entretanto, sobre a necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em
período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário, o C. STJ estabeleceu, no
julgamento do REsp nº 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de
controvérsia repetitiva, que:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE
RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE
TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991.REQUISITOS QUE DEVEM SER
PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º
combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que
estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural,
momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo
48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter
atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo
descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito.
Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os
requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.
2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência.
Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil." (In DJe de 10/02/2016, Relator Ministro
MAURO CAMPBELL MARQUES, REsp 1354908 / SP)
Forçoso concluir que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar
a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu
benefício. Se ao alcançar a faixa etária exigida no art. 48, §1º, da Lei 8.213/91, o segurado
especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não
fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios
legalmente previstos para a aquisição do direito.
No caso concreto, alguns dos documentos apresentados constituem início de prova material do
exercício da atividade rural.
Entretanto, emerge do CNIS trazido aos autos (ID 123919426) que a parte autora exerceu
atividade urbana como empregada doméstica de 01/01/99 a 31/03/2005 , contrariando, inclusive,
o alegado na inicial.
Logo, o extrato do CNIS demonstra que a parte autora exerceu atividade urbana por longo
período, descaracterizando a sua condição de rurícola, sendo de rigor a improcedência do
pedido.
Por fim, ao ajuizar a presente ação, a parte autora não havia implementado a idade necessária à
concessão de eventual aposentação mista ou híbrida.
Não satisfeitos os requisitos necessários à implantação do benefício, a improcedência da ação é
de rigor.
Inverto o ônus da sucumbência e condeno a parte autora ao pagamento de honorários de
advogado que ora fixo em 10% (dez por cento) do valor da causa atualizado, de acordo com o
§6º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, cuja exigibilidade, diante da assistência
judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98
do Código de Processo Civil/2015.
Ante o exposto, dou provimento à apelação para julgar improcedente o pedido.
É COMO VOTO.
/gabiv/soliveir..
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO: APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. CNIS. LONGO
PERÍODO DE EXERCÍCIO DE ATIVIDADE URBANA. DESCARACTERIZAÇÃO DA CONDIÇÃO
DE RURÍCOLA. INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA.
1. O exercício de atividade urbana por longo período descaracteriza a condição de rurícola.
2. Emerge do CNIS trazido aos autos (ID 123919426) que a parte autora exerceu atividade
urbana como empregada doméstica de 01/01/99 a 31/03/2005 , contrariando, inclusive, o alegado
na inicial.
3. Inversão do ônus da sucumbência. Exigibilidade condicionada à hipótese prevista no § 3º do
artigo 98 do Código de Processo Civil/2015 ( artigo 12 da Lei nº 1.060/50).
4. Apelação provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação , nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
