Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5001141-27.2017.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
09/08/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 16/08/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. REGIME DE
ECONOMIA FAMILIAR NÃO CARACTERIZADO.
I- As provas exibidas não constituem um conjunto harmônico de molde a colmatar a convicção no
sentido de que o requerente tenha exercido atividades no campo como pequeno produtor rural
em regime de economia familiar.
II- Os documentos apresentados descaracterizam a alegada atividade como pequeno produtor
rural em regime de economia familiar, no qual o trabalho dos membros da família é indispensável
à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a
utilização de empregados.
III- Não preenchidos, in casu, os requisitos necessários à concessão do benefício, consoante
dispõe os arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios.
IV- Apelação do INSS provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001141-27.2017.4.03.9999
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, PROCURADORIA-
REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: ALCIDES LUIZ MAIER
Advogado do(a) APELADO: EMILIO DUARTE - MS9386-A
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001141-27.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, PROCURADORIA-
REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: ALCIDES LUIZ MAIER
Advogado do(a) APELADO: EMILIO DUARTE - MS9386-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de
ação ajuizada em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando à concessão de
aposentadoria rural por idade.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.
O Juízo a quo julgou procedente o pedido, concedendo o benefício a partir do requerimento
administrativo (24/7/14), acrescido de correção monetária e juros moratórios nos termos da Lei nº
11.960/09. Os honorários advocatícios foram arbitrados em 10% sobre o valor das parcelas
vencidas até a data da prolação da sentença.
Inconformada, apelou a autarquia, pleiteando a reforma da R. sentença. Subsidiariamente, requer
que o termo inicial do benefício seja fixado a partir da audiência de instrução e julgamento.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001141-27.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, PROCURADORIA-
REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: ALCIDES LUIZ MAIER
Advogado do(a) APELADO: EMILIO DUARTE - MS9386-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Dispunha o art.
143 da Lei nº 8.213/91, in verbis:
"O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório do Regime Geral de Previdência
Social, na forma da alínea 'a' do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, ou os seus
dependentes, podem requerer, conforme o caso:
(...)
II - aposentadoria por idade, no valor de 1 (um) salário mínimo, durante 15 (quinze) anos,
contados a partir da data da vigência desta Lei, desde que seja comprovado o exercício de
atividade rural nos últimos 5 (cinco) anos anteriores à data do requerimento, mesmo de forma
descontínua, não se aplicando, nesse período, para o segurado especial, o disposto no inciso I do
art. 39."
O referido artigo foi alterado pela Lei n.º 9.063/95, in verbis:
"O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência
Social, na forma da alínea 'a' do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer
aposentadoria por idade, no valor de 1 (um) salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados a
partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que
descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de
meses idêntico à carência do referido benefício."
O prazo para o trabalhador rural requerer a aposentadoria prevista no artigo acima mencionado
foi prorrogado até 31/12/10, nos termos do art. 2º da Lei nº 11.718, de 20/6/08.
Por sua vez, dispõe o art. 48 da Lei de Benefícios, com a redação dada pela Lei nº 11.718/08:
"A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei,
completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinquenta e cinco anos no caso de
trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea "a" do inciso I, na
alínea "g" do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1º deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo
exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior
ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei.
(...)"
Da simples leitura dos dispositivos legais, depreende-se que os requisitos para a concessão da
aposentadoria por idade ao trabalhador rural compreendem a idade (55 anos, se mulher, e 60
anos, se homem) e a comprovação de efetivo exercício de atividade no campo em número de
meses idêntico à carência do referido benefício.
Quanto às contribuições previdenciárias, ao rurícola basta, apenas, provar o efetivo exercício de
atividade no campo no período equivalente à carência, ainda que de forma descontínua.
O art. 142 da Lei nº 8.213/91 estabelece regra de transição relativa à carência a ser observada
pelos segurados inscritos na Previdência Social até 24/7/91. Para aqueles que ingressaram no
sistema após a referida data, aplica-se a regra permanente prevista no art. 25, inc. II, da Lei de
Benefícios (180 contribuições mensais).
Quadra mencionar que o § 1º do art. 3º da Lei nº 10.666/03 dirige-se ao trabalhador urbano (e
não ao trabalhador rural), conforme posicionamento firmado pela Terceira Seção do C. Superior
Tribunal de Justiça, no julgamento do Incidente de Uniformização (Petição nº 7.476/PR), em
sessão de 13/12/10. O E. Ministro Relator para acórdão Jorge Mussi deixou bem explicitada a
regra que se deve adotar ao afirmar: "se ao alcançar a faixa etária exigida no art. 48, § 1º, da Lei
n. 8.213/91, o segurado especial deixar de exercer atividade como rurícola sem ter atendido a
citada regra de carência, não fará jus à aposentação rural pelo descumprimento de um dos dois
únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. (...) O que não se mostra
possível é conjugar de modo favorável ao trabalhador rural a norma do § 1º do art. 3º da Lei n.
10.666/2003, que permitiu a dissociação da comprovação dos requisitos para os benefícios que
especificou: aposentadoria por contribuição, especial e por idade urbana, os quais pressupõem
contribuição" (grifos meus).
Ressalto, ainda, que o C. STJ, no julgamento proferido no Recurso Especial Representativo de
Controvérsia nº 1.354.908 (art. 543-C do CPC/73), firmou posicionamento "no sentido de que o
segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se
aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se ao alcançar a
faixa etária exigida no art. 48, §1º, da Lei 8.213/91, o segurado especial deixar de exercer
atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por
idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a
aquisição do direito."
Passo à análise do caso concreto.
A parte autora, nascida em 11/9/48, implementou o requisito etário (60 anos) em 11/9/08,
precisando comprovar, portanto, o exercício de atividade no campo por 162 meses.
Relativamente à prova da condição de rurícola, encontram-se acostadas à exordial as cópias dos
seguintes documentos:
1) Escritura pública de divisão amigável, datada de 17/8/11, qualificando o autor como agricultor e
coproprietário de 160 ha, sendo o mesmo titular de 48 hectares ;
2) Matrículas do referido imóvel rural, datadas de 13/12/11, qualificando o autor como agricultor e
coproprietário do referido imóvel rural;
3) Certificado de cadastro de imóvel rural, referente aos anos de 2006 a 2009, em nome do autor,
qualificando o outro imóvel rural como pequena propriedade, no tamanho de 48 ha;
4) Declarações de exercício de atividade rural, datada de 28/3/12 e 21/5/12, atestando que o
autor exerceu labor no campo em regime de economia familiar de 1996 a 2012;
5) Notas fiscais de produtor dos anos 1996 a 2011, em nome do autor, referentes à
comercialização de soja em grãos aos preços de R$7.531,28, R$9.783,90, R$14.674,00,e
R$26.757,00 e R$36.620,00;
6) Cartões de produtor rural dos anos de 2001 e 2002, em nome do requerente;
7) Declarações de área cultivada da Coordenadoria de fiscalização da agricultura, datadas de
1996 a 2014, com estimativa de colheita de 1996 de 150 toneladas de milho e quantidade da
colheita no semestre anterior de 270 toneladas;
8) Declarações anuais de produtor rural dos anos de 2001 e 2010, em nome do autor;
9) Comprovantes de inscrição no cadastro da agropecuária da Secretaria de Estado da Fazenda
do Mato Grosso do Sul, datada de 23/4/13, constando o nome do autor como proprietário das
fazendas “Moeda” e “Jatobá” e na produção de cereais, grãos e outros produtos agrícolas
cultivados.
Recolhimentos de junho/98 a julho/99 e agosto/99 a outubro/10
Os documentos supramencionados não demonstram que o autor exerceu atividade como
trabalhador rural em regime de economia familiar. A quantidade de imóveis rurais, o tamanho da
área rural, a quantidade de produto comercializado e os valores das notas fiscais descaracterizam
a alegada atividade de trabalhador rural em regime de economia familiar, no qual no qual o
trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em
condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados.
Versando sobre a matéria em análise, merecem destaque os acórdãos abaixo, in verbis:
"EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. ART. 143 DA LEI 8.213/91. TRABALHO
RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AUSÊNCIA DE PROVA. PROVA MATERIAL
DA CONDIÇÃO DE EMPREGADOR RURAL. AUSÊNCIA DE CONTRIBUIÇÕES
PREVIDENCIÁRIAS. BENEFÍCIO INDEVIDO. VERBA DE SUCUMBÊNCIA.
1. A prova testemunhal que corrobore início de prova material é suficiente para a comprovação do
trabalho rural, nos termos do § 3º do art. 55 da Lei nº 8.213/91 e Súmula 149 do Superior Tribunal
de Justiça.
2. Trabalho rural em regime de economia familiar não caracterizado, em razão de o conjunto
probatório demonstrar a inviabilidade da alegação de que o Autor exercia suas atividades sem
empregados , apenas com o auxílio da família.
3. Caracterizando-se como produtor rural, o Autor é segurado obrigatório da Previdência Social,
estando obrigado ao recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias para fazer jus ao
benefício (inciso V, letra "a", do artigo 11, da Lei nº 8.213/91). Carência não cumprida; benefício
indevido.
4. Sem condenação do Autor ao pagamento de honorários advocatícios, por ser o mesmo
beneficiário da Assistência Judiciária Gratuita. Precedente do STF.
5. Apelação do INSS provida."
(TRF - 3ª Região, AC nº 2004.03.99.038286-5, 10ª Turma, Relator Des. Fed. Galvão Miranda, j.
15/2/05, v.u., DJU 14/3/05, grifos meus)
"RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO.
VALORAÇÃO DE PROVA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADA POR PROVA
TESTEMUNHAL. INOCORRÊNCIA.
1. O conhecimento do recurso especial fundado na alínea "c" da Constituição da República
requisita, em qualquer caso, a transcrição dos trechos dos acórdãos que configurem o dissídio,
mencionando-se as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados, não
se oferecendo, como bastante, a simples transcrição de ementas, votos ou notícias de
julgamento.
2. "A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação
administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada
em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na
ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento." (artigo
55, parágrafo 3º, da Lei 8.213/91).
3. O início de prova material, de acordo com a interpretação sistemática da lei, é aquele feito
mediante documentos que comprovem o exercício da atividade nos períodos a serem contados,
devendo ser contemporâneos dos fatos a comprovar, indicando, ainda, o período e a função
exercida pelo trabalhador.
4. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que para fins de concessão do benefício de
aposentadoria por idade, o início de prova material deverá ser corroborado por idônea e robusta
prova testemunhal.
5. Em havendo o acórdão recorrido afirmado que, a par de não bastante à demonstração do
tempo de serviço a prova documental, a testemunhal era insuficiente à comprovação da atividade
rural desempenhada pelo segurado, a preservação da improcedência do pedido de aposentadoria
por idade é medida que se impõe.
6. Ademais, a 3ª Seção desta Corte tem firme entendimento no sentido de que a simples
declaração prestada em favor do segurado, sem guardar contemporaneidade com o fato
declarado, carece da condição de prova material, exteriorizando, apenas, simples testemunho
escrito que, legalmente, não se mostra apto a comprovar a atividade laborativa para fins
previdenciários (EREsp 205.885/SP, Relator Ministro Vicente Leal, in DJ 30/10/2000).
7. Recurso não conhecido."
(STJ, REsp. n.º 434.015, 6ª Turma, Relator Min. Hamilton Carvalhido, j. 20/02/03, DJ 17/03/03, p.
299, v.u., grifos meus)
Com efeito, os indícios de prova material, singularmente considerados, não são, por si sós,
suficientes para formar a convicção do magistrado. Nem tampouco as testemunhas
provavelmente o seriam. Mas apenas a conjugação de ambos os meios probatórios - todos
juridicamente idôneos para formar a convicção do juiz - tornaria inquestionável a comprovação da
atividade laborativa rural.
Não comprovando o autor o recolhimento das devidas contribuições no período exigido em lei, o
pedido deve ser julgado improcedente.
Arbitro os honorários advocatícios em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade ficará
suspensa, nos termos do art. 98, §3º, do CPC, por ser a parte autora beneficiária da justiça
gratuita.
Ante o exposto, dou provimento à apelação para julgar improcedente o pedido.
É o meu voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. REGIME DE
ECONOMIA FAMILIAR NÃO CARACTERIZADO.
I- As provas exibidas não constituem um conjunto harmônico de molde a colmatar a convicção no
sentido de que o requerente tenha exercido atividades no campo como pequeno produtor rural
em regime de economia familiar.
II- Os documentos apresentados descaracterizam a alegada atividade como pequeno produtor
rural em regime de economia familiar, no qual o trabalho dos membros da família é indispensável
à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a
utilização de empregados.
III- Não preenchidos, in casu, os requisitos necessários à concessão do benefício, consoante
dispõe os arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios.
IV- Apelação do INSS provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
