Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5732144-85.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
21/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 23/02/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL.
DESCARACTERIZAÇÃO. BENEFÍCIO DEVIDO NOS TERMOS DO § 3º, DO ART. 48, DA LEI Nº
8.213/91.
1. A Lei nº 11.718/2008, ao alterar o Art. 48, da Lei 8.213/91, possibilitou ao segurado o direito à
aposentadoria por idade, mediante a soma dos lapsos temporais de trabalho rural com o urbano.
2. Ocorrendo a descaracterização da condição de trabalhador rural, é de se aplicar a regra do §
2º, do Art. 48, da Lei nº 8.213/91.
3. Se algum fato constitutivo, ocorrido no curso do processo autorizar a concessão do benefício, é
de ser levado em conta, competindo ao Juiz ou à Corte atendê-lo no momento em que proferir a
decisão.
4. Tendo a autora completado 60 anos e cumprido a carência mediante a soma do tempo de
serviço rural reconhecido,com os vínculos de natureza rural e urbana comprovados nos autos e
as contribuições vertidas ao RGPS,faz jus ao benefício de aposentadoria por idade. Precedente:
REsp 1674221/SP.
5. A correção monetária, que incide sobre as prestações em atraso desde as respectivas
competências, e os juros de mora devem ser aplicados de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
6. Os juros de moradeverão obedecer aos critérios definidos quando do julgamento doTema
995/STJ e incidirão até a data da expedição do precatório/RPV, conforme decidido em
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
19.04.2017 pelo Pleno do e. Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do RE 579431,
com repercussão geral reconhecida. A partir de então deve ser observada a Súmula Vinculante nº
17.
7. Tendo a autoria decaído de parte do pedido, vez que implementados os requisitos somente no
curso da ação, devem ser observadas as disposições contidas no inciso II, do § 4º e § 14, do Art.
85, e no Art. 86, do CPC.
8. Apelação provida em parte.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIO
Nº
RELATOR:
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5732144-85.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: MARIA HELENA FERREIRA DE SOUZA
Advogados do(a) APELANTE: SILVIA FONTANA FRANCO - SP168970-N, EDUARDO FABBRI
- SP295838-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em ação de conhecimento que tem por objeto a concessão da
aposentadoria por idade a trabalhadora rural.
O MM. Juízo a quo julgou improcedente o pedido, deixando de condenar a parte autora ao
pagamento das verbas de sucumbência, por ser beneficiária da gratuidade judiciária.
Em seu recurso, a parte autora pleiteia a reforma da r. sentença.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5732144-85.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: MARIA HELENA FERREIRA DE SOUZA
Advogados do(a) APELANTE: SILVIA FONTANA FRANCO - SP168970-N, EDUARDO FABBRI
- SP295838-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O benefício de aposentadoria por idade está previsto no Art. 48, da Lei nº 8.213/91, que dispõe:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se
mulher.
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso
de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I,
na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o
efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei.
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no §
2ºdeste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de
contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65
(sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher."
A regra de transição contida no Art. 143 que tem a seguinte redação:
"Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício."
O período de 15 anos a que se refere o dispositivo retro citado exauriu-se, assim como as
sucessivas prorrogações, em 31.12.2010, como disposto no Art. 2º, da Lei nº 11.718/08:
"Art. 2º Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 143 da Lei no 8.213, de 24
de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010."
Assim, a partir de 01.01.2011 há necessidade de recolhimento de contribuições, na forma
estabelecida no Art. 3º, da Lei nº 11.718/08.
Acresça-se que a Lei nº 11.718, de 20.06.08, acrescentou o Art. 14-A à Lei nº 5.889/73,
permitindo a contratação de trabalhador rural por pequeno prazo, sem registro em CTPS,
mediante a sua inclusão, pelo empregador, na GFIP.
Entretanto, importante frisar que as contribuições previdenciárias dos trabalhadores rurais
diaristas, denominados de volantes ou boia-fria, são de responsabilidade do empregador,
cabendo à Secretaria da Receita Previdenciária a sua arrecadação e fiscalização. Precedentes
desta Corte Regional: AC 200203990244216, 7ª Turma; AC 200803990164855, 8ª Turma; AC
200161120041333, 9ª Turma e AC 200803990604685, 10ª Turma.
O e. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do recurso representativo da controvérsia,
pacificou a questão no sentido da possibilidade do reconhecimento de trabalho rural anterior ao
documento mais antigo juntado como início de prova material, conforme julgado abaixo
transcrito:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA.
APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/91. TEMPO DE
SERVIÇO RURAL. RECONHECIMENTO A PARTIR DO DOCUMENTO MAIS ANTIGO.
DESNECESSIDADE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONJUGADO COM PROVA
TESTEMUNHAL. PERÍODO DE ATIVIDADE RURAL COINCIDENTE COM INÍCIO DE
ATIVIDADE URBANA REGISTRADA EM CTPS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. A controvérsia cinge-se em saber sobre a possibilidade, ou não, de reconhecimento do
período de trabalho rural anterior ao documento mais antigo juntado como início de prova
material.
2. De acordo com o art. 400 do Código de Processo Civil "a prova testemunhal é sempre
admissível, não dispondo a lei de modo diverso". Por sua vez, a Lei de Benefícios, ao disciplinar
a aposentadoria por tempo de serviço, expressamente estabelece no § 3º do art. 55 que a
comprovação do tempo de serviço só produzirá efeito quando baseada em início de prova
material, "não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo
de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento" (Súmula 149/STJ).
3. No âmbito desta Corte, é pacífico o entendimento de ser possível o reconhecimento do
tempo de serviço mediante apresentação de um início de prova material, desde que
corroborado por testemunhos idôneos. Precedentes.
4. A Lei de Benefícios, ao exigir um "início de prova material", teve por pressuposto assegurar o
direito à contagem do tempo de atividade exercida por trabalhador rural em período anterior ao
advento da Lei 8.213/91 levando em conta as dificuldades deste, notadamente hipossuficiente.
5. Ainda que inexista prova documental do período antecedente ao casamento do segurado,
ocorrido em 1974, os testemunhos colhidos em juízo, conforme reconhecido pelas instâncias
ordinárias, corroboraram a alegação da inicial e confirmaram o trabalho do autor desde 1967.
6. No caso concreto, mostra-se necessário decotar, dos períodos reconhecidos na sentença,
alguns poucos meses em função de os autos evidenciarem os registros de contratos de
trabalho urbano em datas que coincidem com o termo final dos interregnos de labor como
rurícola, não impedindo, contudo, o reconhecimento do direito à aposentadoria por tempo de
serviço, mormente por estar incontroversa a circunstância de que o autor cumpriu a carência
devida no exercício de atividade urbana, conforme exige o inc. II do art. 25 da Lei 8.213/91.
7. Os juros de mora devem incidir em 1% ao mês, a partir da citação válida, nos termos da
Súmula n. 204/STJ, por se tratar de matéria previdenciária. E, a partir do advento da Lei
11.960/09, no percentual estabelecido para caderneta de poupança. Acórdão sujeito ao regime
do art. 543-C do Código de Processo Civil.
(STJ, REsp 1348633/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado
em 28/08/2013, DJe 05/12/2014)".
A alteração legislativa trazida pela Lei 11.718, de 20.06.2008, que introduziu o §§3 e 4º ao Art.
48 da Lei 8.213/91, passou a permitir a concessão de aposentadoria por idade àqueles
segurados que, embora inicialmente rurícolas, passaram a exercer outras atividades e tenha
idade mínima de 60 anos (mulher) e 65 anos (homem).
Tecidas estas considerações, passo ao exame do caso concreto.
O primeiro requisito encontra-se atendido, pois a autora, nascida em 05/06/1959, completou 55
anos em 2014,anteriormente à data do ajuizamento da ação.
Impõe-se verificar, se demonstrado, ou não, a carência exigida de 180 meses.
Para comprovar o alegado exercício da atividade rural, a autora instruiu a petição inicial
comcópiada certidão de seu casamento com Geraldo Gonçalves de Souza, realizado em
20/12/1975, no Município de Lupércio/SP, na qual seu marido está qualificado com a profissão
de lavrador; cópia da certidão de óbito de seu marido, ocorrido em 29/01/2008, no mesmo
Município, na qual o falecido está qualificado com a profissão de serviços gerais; e a cópia da
CTPS em nome próprio, na qual está registrado o contrato de trabalho da autora, no cargo de
serviços gerais, exercido na Fazenda Santa Luzia, Município de Lupércio/SP, no período de
01/03/1995 a 10/01/2006.
Cabe elucidar que consta do extrato do CNIS juntado aos autos, que a autora laborou para Luiz
Roberto Rabello no período de 06/06/2018 a 24/07/2018, trabalho que foi exercido na lavoura,
conforme posto pelo douto Juízo sentenciante.
A prova oral produzida em Juízo corrobora a prova material apresentada.
Contudo, de acordo com os dados constantes da CTPS e do CNIS, a autora laborou com
vínculo urbano no período de 01/07/2006 a 13/02/2008, e efetuou recolhimentos como
empregada doméstica,descaracterizando a sua condição de trabalhadora rural, não lhe sendo
possível beneficiar-se da redução de 05 anos na aposentadoria por idade.
Comprovado que se acha, portanto, é de ser reconhecido o tempo de serviço rural exercido
pela autora, independente do recolhimento das contribuições e, tão só, para fins de
aposentação por idade pelo Regime Geral da Previdência Social - RGPS, no período
20/12/1975 a 01/03/1995 (data do primeiro registro anotado em sua CTPS).
Por outro lado, ainda que se reconheça que antes de implementado o requisito etário tenha
ocorrido a descaracterização da condição de trabalhadora rural, faz jus a autora ao benefício
pleiteado.
Como dito, a Lei nº 11.718/2008, ao alterar o Art. 48, da Lei 8.213/91, possibilitou ao segurado
o direito à aposentadoria por idade, mediante a soma dos lapsos temporais de trabalho rural
com o urbano.
Nesse sentido decidiu o e. Superior Tribunal de Justiça ao julgar o REsp 1674221/SP,
submetido ao rito dos recursos repetitivos:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. RECURSO ESPECIAL SUBMETIDO AO RITO
DOS RECURSOS REPETITIVOS. OBSERVÂNCIA DO ARTIGO 1.036, § 5o. DO CÓDIGO FUX
E DOS ARTS. 256-E, II, E 256-I DO RISTJ. APOSENTADORIA HÍBRIDA. ART. 48, §§ 3o. E 4o.
DA LEI 8.213/1991. PREVALÊNCIA DO PRINCÍPIO DE ISONOMIA A TRABALHADORES
RURAIS E URBANOS. MESCLA DOS PERÍODOS DE TRABALHO URBANO E RURAL.
EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL, REMOTO E DESCONTÍNUO, ANTERIOR À LEI
8.213/1991 A DESPEITO DO NÃO RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DO
TEMPO DE SERVIÇO PARA FINS DE CARÊNCIA. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO
DO LABOR CAMPESINO POR OCASIÃO DO IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO OU DO
REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. TESE FIXADA EM HARMONIA COM O PARECER
MINISTERIAL. RECURSO ESPECIAL DA SEGURADA PROVIDO.
1. A análise da lide judicial que envolve a proteção do Trabalhador Rural exige do julgador
sensibilidade, e é necessário lançar um olhar especial a esses trabalhadores para compreender
a especial condição a que estão submetidos nas lides campesinas.
2. Como leciona a Professora DANIELA MARQUES DE MORAES, é preciso analisar quem é o
outro e em que este outro é importante para os preceitos de direito e de justiça. Não obstante o
outro possivelmente ser aqueles que foi deixado em segundo plano, identificá-lo pressupõe um
cuidado maior. Não se pode limitar a apontar que seja o outro. É preciso tratar de tema
correlatos ao outro, com alteridade, responsabilidade e, então, além de distinguir o outro, incluí-
lo (mas não apenas de modo formal) ao rol dos sujeitos de direito e dos destinatários da justiça
(A Importância do Olhar do Outro para a Democratização do Acesso à Justiça, Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2015, p. 35).
3. A Lei 11.718/2008, ao incluir a previsão dos §§ 3o. e 4o. no art. 48 da lei 8.213/1991, abrigou,
como já referido, aqueles Trabalhadores Rurais que passaram a exercer temporária ou
permanentemente períodos em atividade urbana, já que antes da inovação legislativa o mesmo
Segurado se encontrava num paradoxo jurídico de desamparo previdenciário: ao atingir idade
avançada, não podia receber a aposentadoria rural porque exerceu trabalho urbano e não tinha
como desfrutar da aposentadoria urbana em razão de o curto período laboral não preencher o
período de carência (REsp. 1. 407.613/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 28.11.2014).
4. A aposentadoria híbrida consagra o princípio constitucional de uniformidade e equivalência
dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, conferindo proteção àqueles
Trabalhadores que migraram, temporária ou definitivamente, muitas vezes acossados pela
penúria, para o meio urbano, em busca de uma vida mais digna, e não conseguiram
implementar os requisitos para a concessão de qualquer aposentadoria, encontrando-se em
situação de extrema vulnerabilidade social.
5. A inovação legislativa objetivou conferir o máximo aproveitamento e valorização ao labor
rural, ao admitir que o Trabalhador que não preenche os requisitos para concessão de
aposentadoria rural ou aposentadoria urbana por idade possa integrar os períodos de labor rural
com outros períodos contributivos em modalidade diversa de Segurado, para fins de
comprovação da carência de 180 meses para a concessão da aposentadoria híbrida, desde que
cumprido o requisito etário de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher.
6. Analisando o tema, esta Corte é uníssona ao reconhecer a possibilidade de soma de lapsos
de atividade rural, ainda que anteriores à edição da Lei 8.213/1991, sem necessidade de
recolhimento de contribuições ou comprovação de que houve exercício de atividade rural no
período contemporâneo ao requerimento administrativo ou implemento da idade, para fins de
concessão de aposentadoria híbrida, desde que a soma do tempo de serviço urbano ou rural
alcance a carência exigida para a concessão do benefício de aposentadoria por idade.
7. A teste defendida pela Autarquia Previdenciária, de que o Segurado deve comprovar o
exercício de período de atividade rural nos últimos quinze anos que antecedem o implemento
etário, criaria uma nova regra que não encontra qualquer previsão legal. Se revela, assim, não
só contrária à orientação jurisprudencial desta Corte Superior, como também contraria o
objetivo da legislação previdenciária.
8. Não admitir o cômputo do trabalho rural exercido em período remoto, ainda que o Segurado
não tenha retornado à atividade campesina, tornaria a norma do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991
praticamente sem efeito, vez que a realidade demonstra que a tendência desses Trabalhadores
é o exercício de atividade rural quando mais jovens, migrando para o atividade urbana com o
avançar da idade. Na verdade, o entendimento contrário, expressa, sobretudo, a velha posição
preconceituosa contra o Trabalhador Rural, máxime se do sexo feminino.
9. É a partir dessa realidade social experimentada pelos Trabalhadores Rurais que o texto legal
deve ser interpretado, não se podendo admitir que a justiça fique retida entre o rochedo que o
legalismo impõe e o vento que o pensamento renovador sopra. A justiça pode ser cega, mas os
juízes não são. O juiz guia a justiça de forma surpreendente, nos meandros do processo, e ela
sai desse labirinto com a venda retirada dos seus olhos.
10. Nestes termos, se propõe a fixação da seguinte tese: o tempo de serviço rural, ainda que
remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da
carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido
efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991, seja
qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho
exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo.
11. Recurso Especial da Segurada provido, determinando-se o retorno dos autos à origem, a
fim de que prossiga no julgamento do feito analisando a possibilidade de concessão de
aposentadoria híbrida.
(REsp 1674221/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO,
julgado em 14/08/2019, DJe 04/09/2019)".
Assim, somados o tempo de trabalho rural ora reconhecido, com os com os vínculos de
natureza rural e urbana comprovados nos autos e as contribuições vertidas ao RGPS, perfaz a
autora a carência exigida, que é de 180 meses.
É certo que, se algum fato constitutivo, ocorrido no curso do processo autorizar a concessão do
benefício, é de ser levado em conta, competindo ao Juiz ou à Corte atendê-lo no momento em
que proferir a decisão (Art. 493, do CPC) e, tendo a autora completado 60 anos em 05/06/2019,
atende também ao requisito etário, fazendo jus ao benefício de aposentadoria por idade,
contemplada no Art. 48, caput, da Lei 8.213/91.
Confira-se:
“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO.
ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. REAFIRMAÇÃO DA DER (DATA DE ENTRADA DO
REQUERIMENTO). CABIMENTO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. O comando do artigo 493 do CPC/2015 autoriza a compreensão de que a autoridade judicial
deve resolver a lide conforme o estado em que ela se encontra. Consiste em um dever do
julgador considerar o fato superveniente que interfira na relação jurídica e que contenha um
liame com a causa de pedir.
2. O fato superveniente a ser considerado pelo julgador deve guardar pertinência com a causa
de pedir e pedido constantes na petição inicial, não servindo de fundamento para alterar os
limites da demanda fixados após a estabilização da relação jurídico-processual.
3. A reafirmação da DER (data de entrada do requerimento administrativo), objeto do presente
recurso, é um fenômeno típico do direito previdenciário e também do direito processual civil
previdenciário. Ocorre quando se reconhece o benefício por fato superveniente ao
requerimento, fixando-se a data de início do benefício para o momento do adimplemento dos
requisitos legais do benefício previdenciário.
4. Tese representativa da controvérsia fixada nos seguintes termos: É possível a reafirmação da
DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que implementados os requisitos
para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da
ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e
933 do CPC/2015, observada a causa de pedir.
5. No tocante aos honorários de advogado sucumbenciais, descabe sua fixação, quando o
INSS reconhecer a procedência do pedido à luz do fato novo.
6. Recurso especial conhecido e provido, para anular o acórdão proferido em embargos de
declaração, determinando ao Tribunal a quo um novo julgamento do recurso, admitindo-se a
reafirmação da DER.
Julgamento submetido ao rito dos recursos especiais repetitivos.
(REsp 1727063/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado
em 23/10/2019, DJe 02/12/2019)”.
O termo inicial do benefício deve fixado na data em que implementado o requisito etário
(05/06/2019).
Destarte, é de se reformar a r. sentença, pelos fundamentos ora expendidos, devendo o réu
conceder à autora o benefício de aposentadoria por idade a partir de 05/06/2019, e pagar as
prestações vencidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora.
A correção monetária, que incide sobre as prestações em atraso desde as respectivas
competências, e os juros de mora devem ser aplicados de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
Os juros de moradeverão obedecer aos critérios definidos quando do julgamento doTema
995/STJ e incidirão até a data da expedição do precatório/RPV, conforme decidido em
19.04.2017 pelo Pleno do e. Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do RE 579431,
com repercussão geral reconhecida. A partir de então deve ser observada a Súmula Vinculante
nº 17.
Convém alertar que das prestações vencidas devem ser descontadas aquelas pagas
administrativamente ou por força de liminar, e insuscetíveis de cumulação com o benefício
concedido, na forma do Art. 124, da Lei nº 8.213/91.
Tendo a autoria decaído de parte do pedido, vez que implementados os requisitos somente no
curso da ação, devem ser observadas as disposições contidas no inciso II, do § 4º e § 14, do
Art. 85, e no Art. 86, do CPC. A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos,
nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo
Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93 e a parte autora, por ser
beneficiária da assistência judiciária integral e gratuita, está isenta de custas, emolumentos e
despesas processuais.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL.
DESCARACTERIZAÇÃO. BENEFÍCIO DEVIDO NOS TERMOS DO § 3º, DO ART. 48, DA LEI
Nº 8.213/91.
1. A Lei nº 11.718/2008, ao alterar o Art. 48, da Lei 8.213/91, possibilitou ao segurado o direito à
aposentadoria por idade, mediante a soma dos lapsos temporais de trabalho rural com o
urbano.
2. Ocorrendo a descaracterização da condição de trabalhador rural, é de se aplicar a regra do §
2º, do Art. 48, da Lei nº 8.213/91.
3. Se algum fato constitutivo, ocorrido no curso do processo autorizar a concessão do benefício,
é de ser levado em conta, competindo ao Juiz ou à Corte atendê-lo no momento em que proferir
a decisão.
4. Tendo a autora completado 60 anos e cumprido a carência mediante a soma do tempo de
serviço rural reconhecido,com os vínculos de natureza rural e urbana comprovados nos autos e
as contribuições vertidas ao RGPS,faz jus ao benefício de aposentadoria por idade.
Precedente: REsp 1674221/SP.
5. A correção monetária, que incide sobre as prestações em atraso desde as respectivas
competências, e os juros de mora devem ser aplicados de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
6. Os juros de moradeverão obedecer aos critérios definidos quando do julgamento doTema
995/STJ e incidirão até a data da expedição do precatório/RPV, conforme decidido em
19.04.2017 pelo Pleno do e. Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do RE 579431,
com repercussão geral reconhecida. A partir de então deve ser observada a Súmula Vinculante
nº 17.
7. Tendo a autoria decaído de parte do pedido, vez que implementados os requisitos somente
no curso da ação, devem ser observadas as disposições contidas no inciso II, do § 4º e § 14, do
Art. 85, e no Art. 86, do CPC.
8. Apelação provida em parte. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
