Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5623454-59.2019.4.03.9999
Relator(a)
Juiz Federal Convocado GISELLE DE AMARO E FRANCA
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
01/06/2021
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 09/06/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL.
DESCARACTERIZAÇÃO. BENEFÍCIO DEVIDO NOS TERMOS DO § 3º, DO ART. 48, DA LEI Nº
8.213/91.
1. A Lei nº 11.718/2008, ao alterar o Art. 48, da Lei 8.213/91, possibilitou ao segurado o direito à
aposentadoria por idade, mediante a soma dos lapsos temporais de trabalho rural com o urbano.
2. Ocorrendo a descaracterização da condição de trabalhador rural, é de se aplicar a regra do §
3º, do Art. 48, da Lei nº 8.213/91.
3. Tendo a autora completado 60 anos e cumprido a carência com a soma do tempo de serviço
rural reconhecido e das contribuições vertidas ao RGPS, faz jus ao benefício de aposentadoria
por idade. Precedente: REsp 1674221/SP.
4. A correção monetária, que incide sobre as prestações em atraso desde as respectivas
competências, e os juros de mora devem ser aplicados de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
5. Os juros de mora incidirão até a data da expedição do precatório/RPV, conforme decidido em
19.04.2017 pelo Pleno do e. Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do RE 579431,
com repercussão geral reconhecida. A partir de então deve ser observada a Súmula Vinculante nº
17.
6. Os honorários advocatícios devem observar as disposições contidas no inciso II, do § 4º, do
Art. 85, do CPC, e a Súmula 111, do e. STJ.
7. A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e
do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93.
8. Apelação provida em parte.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5623454-59.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: OLINDA MARIA MENGATTO MANTOVANI
Advogados do(a) APELANTE: HELOISA ASSIS HERNANDES DANTAS - SP258155-N,
KAMILA GABRIELY DE SOUZA GOMES - SP343782-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5623454-59.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: OLINDA MARIA MENGATTO MANTOVANI
Advogados do(a) APELANTE: HELOISA ASSIS HERNANDES DANTAS - SP258155-N,
KAMILA GABRIELY DE SOUZA GOMES - SP343782-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta nos autos de ação de conhecimento em que se objetiva a
concessão da aposentadoria por idade a trabalhadora rural.
O MM. Juízoa quojulgou improcedente o pedido, condenando a autora ao pagamento de custas
e honorários advocatícios de R$1.000,00, observada a gratuidade da justiça.
Os embargos de declaração opostos pela autora foram rejeitados.
Apela a autora, pleiteando a reforma da r. sentença.
Com contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5623454-59.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: OLINDA MARIA MENGATTO MANTOVANI
Advogados do(a) APELANTE: HELOISA ASSIS HERNANDES DANTAS - SP258155-N,
KAMILA GABRIELY DE SOUZA GOMES - SP343782-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O benefício de aposentadoria por idade está previsto no Art. 48, da Lei nº 8.213/91, que dispõe:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se
mulher.
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso
de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I,
na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o
efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei.
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no §
2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de
contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65
(sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher."
A regra de transição contida no Art. 143 que tem a seguinte redação:
"Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício."
O período de 15 anos a que se refere o dispositivo retro citado exauriu-se, assim como as
sucessivas prorrogações, em 31.12.2010, como disposto no Art. 2º, da Lei nº 11.718/08:
"Art. 2o Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 143 da Lei no 8.213, de 24
de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010."
Assim, a partir de 01.01.2011 há necessidade de recolhimento de contribuições, na forma
estabelecida no Art. 3º, da Lei nº 11.718/08.
Acresça-se que a Lei nº 11.718, de 20.06.08, acrescentou o Art. 14-A à Lei nº 5.889/73,
permitindo a contratação de trabalhador rural por pequeno prazo, sem registro em CTPS,
mediante a sua inclusão, pelo empregador, na GFIP.
Entretanto, importante frisar que as contribuições previdenciárias dos trabalhadores rurais
diaristas, denominados de volantes ou bóia fria, são de responsabilidade do empregador,
cabendo à Secretaria da Receita Previdenciária a sua arrecadação e fiscalização. Precedentes
desta Corte Regional: AC 200203990244216, 7ª Turma; AC 200803990164855, 8ª Turma; AC
200161120041333, 9ª Turma e AC 200803990604685, 10ª Turma.
Tecidas estas considerações, passo ao exame do caso concreto.
O primeiro requisito encontra-se atendido, pois a autora nascida em 22/03/1952, completou 55
anos em 2007, portanto, anteriormente à data do ajuizamento da ação.
Com respeito ao alegado exercício da atividade rural, a autora acostou aos autos a cópia da
certidão de seu casamento com Luiz Carlos Mantovani, celebrado em 02/07/1977, na qual o
cônjuge está qualificado como lavrador; escritura de compra e venda do sítio Santa Ana,
celebrada em 15/10/2007, pelo qual casal alienou o imóvel a Inácio Fuzeto; escritura de compra
e venda do sítio Santa Ana, celebrada em 30/11/2007, pela qual Inacio Fuzeto alienou o imóvel
para o casal; guia Darf de pagamento de ITR do ano de 2016, referente ao Sítio Santa Ana;
escritura de divisão amigável de imóvel rural havido por herança, datada de 08/12/1987, pela
qual a autora e seu marido receberam quinhão de 7,99 hectares; certificado de cadastro de
imóvel rural no INCRA, sítio Santa Ana, em nome do cônjuge, referente aos anos de 1988 a
2009; notificação de lançamento de ITR, exercícios 1995 e 1996, referente ao Sítio Santa Ana
em nome do cônjuge; guia de pagamento de contribuição sindical rural/agricultor familiar, em
nome do cônjuge, referente ao Sítio Santa Ana, no exercício de 1997 e declaração de exercício
de atividade rural emitida pelo Sindicato Rural de Bebedouro/SP, datada de 2015, constando
exercício de atividade rural em regime de economia familiar pela autora no período de
08/12/1987 a 15/10/2007.
A prova oral produzida em Juízo corrobora a prova material apresentada.
Entretanto, como se vê dos dados do CNIS, a autora migrou para as lides urbanas, passando a
verter contribuições como contribuinte individual, microempresária, nos períodos de 01/06/2006
a 30/09/2007 e 01/11/2007 a 31/01/2008,não lhe sendo possível beneficiar-se da redução de 05
anos na aposentadoria por idade.
Confiram-se:
“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE
RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO.
REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE
DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL
PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º
combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que
estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural,
momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo
48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter
atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo
descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do
direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu
ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.
2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência.
Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil.
(REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado
em 09/09/2015, DJe 10/02/2016);
PREVIDENCIÁRIO. TRABALHADOR RURAL. APOSENTADORIA POR IDADE.
DEMONSTRAÇÃO DO TRABALHO NO CAMPO. DOCUMENTOS EXTEMPORÂNEOS.
VÍNCULO URBANO. CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. REEXAME INVIÁVEL. SÚMULA
7/STJ.
1. Para fins de comprovação da condição de rurícola, são aceitos, como início de prova
material, os documentos de registros civis que qualificam o autor como lavrador, aliados à
robusta prova testemunhal, desde que não haja demonstração de abandono das lides rurais em
face de exercício posterior de atividade urbana. De outro lado, a descaracterização da condição
de rurícola do cônjuge, por si só, não desqualifica o enquadramento do autor como segurado
especial, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do
grupo familiar (REsp 1.304.479/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe
19/12/2012, recurso submetido ao rito do art. 543-C do CPC). (g.n.)
2. No caso, partindo das premissas acima aventadas e das provas carreadas aos autos, o
Tribunal de origem concluiu pela ausência dos requisitos autorizadores da aposentadoria por
idade, pois o recorrente passou a trabalhar em diversas atividades urbanas a partir da década
de 80, sendo que o período aquisitivo do direito estaria compreendido no lapso temporal de
1991 a 2003. Por outro lado, ficou assentado no acórdão recorrido que a esposa do autor
trabalhou apenas como urbana.
3. Assim, a alteração das conclusões retratadas no acórdão recorrido apenas seria possível
mediante novo exame do acervo fático-probatório constante dos autos, providência vedada em
sede de recurso especial, a teor do óbice previsto na Súmula n. 7/STJ.
4. Agravo Regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp 1326112/PR, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em
13/08/2013, DJe 19/08/2013)”.
Comprovado que se acha, é de ser averbado no cadastro da autora, independente do
recolhimento das contribuições, e, tão só, para fins de aposentação por idade pelo Regime
Geral da Previdência Social - RGPS, o serviço rural no período de 02/07/1977 a 31/05/2006.
Por outro lado, ainda que se reconheça que antes de implementado o requisito etário tenha
ocorrido a descaracterização da condição de trabalhadora rural, faz jus a autora ao benefício
pleiteado.
Com efeito, a Lei nº 11.718/2008, ao alterar o Art. 48, da Lei 8.213/91, possibilitou ao segurado
o direito à aposentadoria por idade, mediante a soma dos lapsos temporais de trabalho rural
com o urbano.
Nesse sentido:
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. RECURSO ESPECIAL SUBMETIDO AO RITO
DOS RECURSOS REPETITIVOS. OBSERVÂNCIA DO ARTIGO 1.036, § 5o. DO CÓDIGO FUX
E DOS ARTS. 256-E, II, E 256-I DO RISTJ. APOSENTADORIA HÍBRIDA. ART. 48, §§ 3o. E 4o.
DA LEI 8.213/1991. PREVALÊNCIA DO PRINCÍPIO DE ISONOMIA A TRABALHADORES
RURAIS E URBANOS. MESCLA DOS PERÍODOS DE TRABALHO URBANO E RURAL.
EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL, REMOTO E DESCONTÍNUO, ANTERIOR À LEI
8.213/1991 A DESPEITO DO NÃO RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DO
TEMPO DE SERVIÇO PARA FINS DE CARÊNCIA. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO
DO LABOR CAMPESINO POR OCASIÃO DO IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO OU DO
REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. TESE FIXADA EM HARMONIA COM O PARECER
MINISTERIAL. RECURSO ESPECIAL DA SEGURADA PROVIDO.
1. A análise da lide judicial que envolve a proteção do Trabalhador Rural exige do julgador
sensibilidade, e é necessário lançar um olhar especial a esses trabalhadores para compreender
a especial condição a que estão submetidos nas lides campesinas.
2. Como leciona a Professora DANIELA MARQUES DE MORAES, é preciso analisar quem é o
outro e em que este outro é importante para os preceitos de direito e de justiça. Não obstante o
outro possivelmente ser aqueles que foi deixado em segundo plano, identificá-lo pressupõe um
cuidado maior. Não se pode limitar a apontar que seja o outro. É preciso tratar de tema
correlatos ao outro, com alteridade, responsabilidade e, então, além de distinguir o outro, incluí-
lo (mas não apenas de modo formal) ao rol dos sujeitos de direito e dos destinatários da justiça
(A Importância do Olhar do Outro para a Democratização do Acesso à Justiça, Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2015, p. 35).
3. A Lei 11.718/2008, ao incluir a previsão dos §§ 3o. e 4o. no art. 48 da lei 8.213/1991, abrigou,
como já referido, aqueles Trabalhadores Rurais que passaram a exercer temporária ou
permanentemente períodos em atividade urbana, já que antes da inovação legislativa o mesmo
Segurado se encontrava num paradoxo jurídico de desamparo previdenciário: ao atingir idade
avançada, não podia receber a aposentadoria rural porque exerceu trabalho urbano e não tinha
como desfrutar da aposentadoria urbana em razão de o curto período laboral não preencher o
período de carência (REsp. 1.407.613/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 28.11.2014).
4. A aposentadoria híbrida consagra o princípio constitucional de uniformidade e equivalência
dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, conferindo proteção àqueles
Trabalhadores que migraram, temporária ou definitivamente, muitas vezes acossados pela
penúria, para o meio urbano, em busca de uma vida mais digna, e não conseguiram
implementar os requisitos para a concessão de qualquer aposentadoria, encontrando-se em
situação de extrema vulnerabilidade social.
5. A inovação legislativa objetivou conferir o máximo aproveitamento e valorização ao labor
rural, ao admitir que o Trabalhador que não preenche os requisitos para concessão de
aposentadoria rural ou aposentadoria urbana por idade possa integrar os períodos de labor rural
com outros períodos contributivos em modalidade diversa de Segurado, para fins de
comprovação da carência de 180 meses para a concessão da aposentadoria híbrida, desde que
cumprido o requisito etário de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher.
6. Analisando o tema, esta Corte é uníssona ao reconhecer a possibilidade de soma de lapsos
de atividade rural, ainda que anteriores à edição da Lei 8.213/1991, sem necessidade de
recolhimento de contribuições ou comprovação de que houve exercício de atividade rural no
período contemporâneo ao requerimento administrativo ou implemento da idade, para fins de
concessão de aposentadoria híbrida, desde que a soma do tempo de serviço urbano ou rural
alcance a carência exigida para a concessão do benefício de aposentadoria por idade.
7. A teste defendida pela Autarquia Previdenciária, de que o Segurado deve comprovar o
exercício de período de atividade rural nos últimos quinze anos que antecedem o implemento
etário, criaria uma nova regra que não encontra qualquer previsão legal. Se revela, assim, não
só contrária à orientação jurisprudencial desta Corte Superior, como também contraria o
objetivo da legislação previdenciária.
8. Não admitir o cômputo do trabalho rural exercido em período remoto, ainda que o Segurado
não tenha retornado à atividade campesina, tornaria a norma do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991
praticamente sem efeito, vez que a realidade demonstra que a tendência desses Trabalhadores
é o exercício de atividade rural quando mais jovens, migrando para o atividade urbana com o
avançar da idade. Na verdade, o entendimento contrário, expressa, sobretudo, a velha posição
preconceituosa contra o Trabalhador Rural, máxime se do sexo feminino.
9. É a partir dessa realidade social experimentada pelos Trabalhadores Rurais que o texto legal
deve ser interpretado, não se podendo admitir que a justiça fique retida entre o rochedo que o
legalismo impõe e o vento que o pensamento renovador sopra. A justiça pode ser cega, mas os
juízes não são. O juiz guia a justiça de forma surpreendente, nos meandros do processo, e ela
sai desse labirinto com a venda retirada dos seus olhos.
10. Nestes termos, se propõe a fixação da seguinte tese: o tempo de serviço rural, ainda que
remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da
carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido
efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3o., da Lei 8.213/1991, seja
qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho
exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo.
11. Recurso Especial da Segurada provido, determinando-se o retorno dos autos à origem, a
fim de que prossiga no julgamento do feito analisando a possibilidade de concessão de
aposentadoria híbrida.
(REsp 1674221/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO,
julgado em 14/08/2019, DJe 04/09/2019)”.
Somados o tempo de trabalho rural ora reconhecido e o tempo de serviço urbano, perfaz a
autora a carência exigida, que é de 180 meses.
Nesse passo, tendo a autora completado 60 anos em 22/03/2012, atende também ao requisito
etário, fazendo jus ao benefício de aposentadoria por idade, contemplada no Art. 48, caput, da
Lei 8.213/91.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo
(26/01/2017).
Destarte, é de se reformar a r. sentença, devendo o réu conceder à autora o benefício de
aposentadoria por idade, a partir de 26/01/2017, e pagar as prestações vencidas, corrigidas
monetariamente e acrescidas de juros de mora.
A correção monetária, que incide sobre as prestações em atraso desde as respectivas
competências, e os juros de mora devem ser aplicados de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
Os juros de mora incidirão até a data da expedição do precatório/RPV, conforme decidido em
19.04.2017 pelo Pleno do e. Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do RE 579431,
com repercussão geral reconhecida. A partir de então deve ser observada a Súmula Vinculante
nº 17.
Convém alertar que das prestações vencidas devem ser descontadas aquelas pagas
administrativamente ou por força de liminar, e insuscetíveis de cumulação com o benefício
concedido, na forma do Art. 124, da Lei nº 8.213/91.
Os honorários advocatícios devem observar as disposições contidas no inciso II, do § 4º, do Art.
85, do CPC, e a Súmula 111, do e. STJ.
A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da
Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01,
e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação.
É o voto.
Não há nos autos qualquer documento que qualifique a autora como trabalhadora rural no
período concomitante ao trabalho urbano de seu cônjuge.
Assim, considerando que o labor rural deve ser comprovado por meio de início de prova
material corroborada por idônea prova testemunhal, vê-se que não foi apresentado documento
indispensável ao ajuizamento da ação, havendo de se extinguir o feito sem resolução do mérito.
Nesse sentido decidiu o e. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do recurso representativo
da controvérsia:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR
IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA
ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E
DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO
DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE
DOS ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO
ESPECIAL DO INSS DESPROVIDO.
1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os
seus procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas
previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em
conta os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto
social adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários.
2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais
da Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da
Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido
de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe
garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na
hermenêutica previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna,
a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental
à prestação previdenciária a que faz jus o segurado.
3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística
civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar
prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas
demandas.
4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual
garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir
como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo
certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente
dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura
previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela
via da assistência social.
5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do
CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo,
impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente
possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos
necessários à tal iniciativa.
6. Recurso Especial do INSS desprovido.
(REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL,
julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016)”.
Destarte, ausente um dos pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular
do processo, é de ser extinto o feito sem resolução do mérito, nos termos do Art. 485, IV, do
CPC, arcando a autoria com honorários advocatícios de 10% sobre o valor atualizado dado à
causa, observando-se o disposto no § 3º, do Art. 98, do CPC, por ser beneficiária da justiça
gratuita, ficando a cargo do Juízo de execução verificar se restou ou não inexequível a
condenação em honorários.
Ante o exposto, de ofício, julgo extinto o feito sem resolução do mérito, restando prejudicada a
apelação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL.
DESCARACTERIZAÇÃO. BENEFÍCIO DEVIDO NOS TERMOS DO § 3º, DO ART. 48, DA LEI
Nº 8.213/91.
1. A Lei nº 11.718/2008, ao alterar o Art. 48, da Lei 8.213/91, possibilitou ao segurado o direito à
aposentadoria por idade, mediante a soma dos lapsos temporais de trabalho rural com o
urbano.
2. Ocorrendo a descaracterização da condição de trabalhador rural, é de se aplicar a regra do §
3º, do Art. 48, da Lei nº 8.213/91.
3. Tendo a autora completado 60 anos e cumprido a carência com a soma do tempo de serviço
rural reconhecido e das contribuições vertidas ao RGPS, faz jus ao benefício de aposentadoria
por idade. Precedente: REsp 1674221/SP.
4. A correção monetária, que incide sobre as prestações em atraso desde as respectivas
competências, e os juros de mora devem ser aplicados de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
5. Os juros de mora incidirão até a data da expedição do precatório/RPV, conforme decidido em
19.04.2017 pelo Pleno do e. Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do RE 579431,
com repercussão geral reconhecida. A partir de então deve ser observada a Súmula Vinculante
nº 17.
6. Os honorários advocatícios devem observar as disposições contidas no inciso II, do § 4º, do
Art. 85, do CPC, e a Súmula 111, do e. STJ.
7. A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da
Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01,
e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93.
8. Apelação provida em parte. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
