Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5555701-85.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
21/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 23/02/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL E URBANO.
PERIODO RURAL SEM REGISTRO. PROVA MATERIAL. PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO
E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO.
1. A Lei nº 11.718/2008, ao alterar o Art. 48, da Lei 8.213/91, possibilitou ao segurado o direito à
aposentadoria por idade, mediante a soma dos lapsos temporais de trabalho rural com o urbano.
2. Somente os períodos de vínculos formais anotados no CNIS, é insuficiente para a percepção
do benefício de aposentadoria por idade.
3. O Art. 106, da Lei nº 8.213/91, dispõe que a comprovação do exercício de atividade rural será
feita, no caso de segurado especial em regime de economia familiar, por meio de um dos
documentos elencados e não havendo nos autos documentos hábeis, contemporâneos ao
período rural que se quer comprovar, admissíveis como início de prova material, é de ser extinto o
feito sem resolução do mérito, face a ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento
válido do processo.
4. Apelação prejudicada.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIO
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Nº
RELATOR:
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5555701-85.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: SONIA MARIA FORNAGIERI
Advogado do(a) APELANTE: CLERIO FALEIROS DE LIMA - SP150556-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em ação de conhecimento, que tem por objeto a concessão da
aposentadoria por idade, nos termos da Lei nº 11.718/08, mediante o reconhecimento da
atividade rural no período de 21.10.1964 a 27.05.1972.
O MM. Juízo a quo julgou improcedente o pedido, condenando a autora ao pagamento de
custas, despesas processuais e honorários advocatícios fixados em R$1.000,00, com as
ressalvas do benefício da gratuidade judiciária concedida.
A autora apela, pleiteando a reforma parcial da r. sentença,requerendo a concessão de
aposentadoria por idade.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5555701-85.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: SONIA MARIA FORNAGIERI
Advogado do(a) APELANTE: CLERIO FALEIROS DE LIMA - SP150556-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O benefício de aposentadoria por idade está previsto no Art. 48, da Lei nº 8.213/91, que dispõe:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se
mulher.
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso
de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I,
na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o
efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei.
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no §
2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de
contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65
(sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher."
A regra de transição contida no Art. 143 que tem a seguinte redação:
"Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício."
O período de 15 anos a que se refere o dispositivo retro citado exauriu-se, assim como as
sucessivas prorrogações, em 31.12.2010, como disposto no Art. 2º, da Lei nº 11.718/08:
"Art. 2o Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 143 da Lei no 8.213, de 24
de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010."
Assim, a partir de 01.01.2011 há necessidade de recolhimento de contribuições, na forma
estabelecida no Art. 3º, da Lei nº 11.718/08.
Acresça-se que a Lei nº 11.718, de 20.06.08, acrescentou o Art. 14-A à Lei nº 5.889/73,
permitindo a contratação de trabalhador rural por pequeno prazo, sem registro em CTPS,
mediante a sua inclusão, pelo empregador, na GFIP.
Entretanto, importante frisar que as contribuições previdenciárias dos trabalhadores rurais
diaristas, denominados de volantes ou bóia fria, são de responsabilidade do empregador,
cabendo à Secretaria da Receita Previdenciária a sua arrecadação e fiscalização. Nesse
sentido a orientação desta Corte Regional: AC 200203990244216, Desembargadora Federal
Leide Polo, 7ª Turma, DJF3 CJ1 01/07/2009, p. 171, AC 200803990164855, Desembargadora
Federal Vera Jucovsky, 8ª Turma, DJF3 07/10/2008, AC 200161120041333, Desembargadora
Federal Marisa Santos, 9ª Turma, DJU 20/04/2005, p. 615, AC 200803990604685,
Desembargador Federal Sergio Nascimento, 10ª Turma, DJF3 CJ1 17/03/2010, p. 2114 e AC
200003990391915, Juiz Federal convocado Alexandre Sormani, Turma Suplementar da 3ª
Seção, DJF3 15/10/2008.
Dessarte, os requisitos para a concessão da aposentadoria por idade ao trabalhador rural
compreendem a idade e a comprovação de efetivo exercício de atividade no campo.
O e. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do recurso representativo da controvérsia,
pacificou a questão no sentido da possibilidade do reconhecimento de trabalho rural anterior ao
documento mais antigo juntado como início de prova (STJ, REsp 1348633/SP, Rel. Ministro
Arnaldo Esteves Lima, 1ª Seção, julgado em 28/08/2013, DJe 05/12/2014).
Ainda, como já decidido pela c. Corte Superior de Justiça, desnecessária a produção de prova
material do período total reclamado, ou, no período imediatamente anterior ao requerimento do
benefício (AgInt no AREsp 938.333/MS, Rel. Ministro Gurgel de Faria, 1ª Turma, julgado em
28/11/2017, DJe 07/02/2018 e AgRg no AREsp 730.275/PR, Rel. Ministro Humberto Martins, 2ª
Turma, julgado em 25/08/2015, DJe 02/09/2015).
De outra parte, a Lei nº 11.718/2008, ao alterar o Art. 48, da Lei 8.213/91, possibilitou ao
segurado o direito à aposentadoria por idade, mediante a soma dos lapsos temporais de
trabalho rural com o urbano.
Tecidas estas considerações, passo ao exame do caso concreto.
A autora pretende a percepção do benefício de aposentadoria por idade nos termos do Art. 48,
§ 3 e 42 da Lei 8.213/91 alegando que, somados o tempo de trabalho exercido nas lides
campestres no período de 21.10.1964 a 27.05.1972 com as contribuições vertidas ao RGPS,
cumpre a carência legal exigida.
O primeiro requisito encontra-se atendido, pois a autora, nascida em 30.09.1954, completou 60
anos no ano de 2014, portanto, anteriormente à data do ajuizamento da ação.
Impõe-se verificar, se demonstrado, ou não, a carência exigida de 180 meses.
Com respeito ao alegado exercício da atividade rural, a autora acostou aos autos, cópia de
declaração em nome do seu genitor, datada de 17.04.1978, constando seu local de trabalho na
Fazenda Posses do Rio Grande S.A. Frigorífico Anglo, onde prestou serviços como empregado
no período de 21.10.1964 a 27.05.1972; do requerimento de pensão, MTPS FUNRURAL,
realizado pela sua genitora, datado de 12.09.1972, em que consta que residiam na Fazenda
Posses do Rio Grande.
Contudo, a atividade rural em regime de economia familiar, diferentemente do trabalho rural
sem registro, deve ser comprovada mediante a apresentação de documentos que comprovem o
efetivo trabalho pelo grupo familiar, nos termos do Art. 106, da Lei nº 8.213/91: contrato de
arrendamento, parceria ou comodato rural; comprovante de cadastro do Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária - INCRA, no caso de produtores em regime de economia
familiar; bloco de notas do produtor rural; notas fiscais de entrada de mercadorias, emitidas pela
empresa adquirente da produção, com indicação do nome do segurado como vendedor;
documentos fiscais relativos a entrega de produção rural à cooperativa agrícola, entreposto de
pescado ou outros, com indicação do segurado como vendedor ou consignante;comprovantes
de recolhimento de contribuição à Previdência Social decorrentes da comercialização da
produção; cópia da declaração de imposto de renda, com indicação de renda proveniente da
comercialização de produção rural; ou licença de ocupação ou permissão outorgada pelo Incra,
em nome próprio, de seu cônjuge ou de seus genitores.
Como se vê, não foi apresentado documento indispensável ao ajuizamento da ação, elencados
no Art. 106 da Lei 8.213/91, em se tratando de trabalho em regime de economia familiar, ou
documento próprio que a associe ao alegado trabalho rural.
Assim, não basta a prova oral, se não for corroborada pela documentação trazida como início
de prova material. De igual modo, sem a idônea prova oral fica comprometida toda a
documentação que se presta a servir de início de prova material, havendo de se extinguir o feito
sem resolução do mérito, a fim de oportunizar a realização de idônea prova oral, resguardando-
se à autoria produzir as provas constitutivas de seu direito - o que a põe no processo em
idêntico patamar da ampla defesa assegurada ao réu, e o devido processo legal, a rechaçar
qualquer nulidade processual, assegurando-se desta forma eventual direito. Nesse sentido
decidiu o e. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do recurso representativo da
controvérsia:
Confira-se:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR
IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA
ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E
DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO
DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE
DOS ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO
ESPECIAL DO INSS DESPROVIDO.
1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os
seus procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas
previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em
conta os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto
social adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários.
2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais
da Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da
Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido
de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe
garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na
hermenêutica previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna,
a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental
à prestação previdenciária a que faz jus o segurado.
3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística
civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar
prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas
demandas.
4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual
garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir
como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo
certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente
dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura
previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela
via da assistência social.
5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do
CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo,
impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente
possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos
necessários à tal iniciativa.
6. Recurso Especial do INSS desprovido.
(REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL,
julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016)".
Destarte, é de ser extinto o feito sem resolução do mérito, nos termos do Art. 485, IV, do CPC,
arcando a autoria com honorários advocatícios de 10% sobre o valor atualizado dado à causa,
observando-se o disposto no § 3º, do Art. 98, do CPC, por ser beneficiária da justiça gratuita.
Ante o exposto, de ofício,extingo o feito sem resolução do mérito, restando prejudicada a
apelação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL E URBANO.
PERIODO RURAL SEM REGISTRO. PROVA MATERIAL. PRESSUPOSTO DE
CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO.
1. A Lei nº 11.718/2008, ao alterar o Art. 48, da Lei 8.213/91, possibilitou ao segurado o direito à
aposentadoria por idade, mediante a soma dos lapsos temporais de trabalho rural com o
urbano.
2. Somente os períodos de vínculos formais anotados no CNIS, é insuficiente para a percepção
do benefício de aposentadoria por idade.
3. O Art. 106, da Lei nº 8.213/91, dispõe que a comprovação do exercício de atividade rural será
feita, no caso de segurado especial em regime de economia familiar, por meio de um dos
documentos elencados e não havendo nos autos documentos hábeis, contemporâneos ao
período rural que se quer comprovar, admissíveis como início de prova material, é de ser extinto
o feito sem resolução do mérito, face a ausência de pressuposto de constituição e
desenvolvimento válido do processo.
4. Apelação prejudicada. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por
unanimidade, decidiu, de ofício, extinguir o feito sem resolução do mérito e dar por prejudicada
a apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA