Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5924513-09.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
15/12/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 17/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL SEM
REGISTRO. PROVA MATERIAL. PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO
VÁLIDO DO PROCESSO.
1. Os requisitos para a concessão da aposentadoria por idade ao trabalhador rural compreendem
a idade e a comprovação de efetivo exercício de atividade no campo.
2. Não havendo nos autos documentos hábeis, contemporâneos ao período que se quer
comprovar, admissíveis como início de prova material, é de ser extinto o feito sem resolução do
mérito, face a ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo.
3. Honorários advocatícios de 10% sobre o valor atualizado dado à causa, observando-se o
disposto no § 3º, do Art. 98, do CPC, por ser beneficiária da justiça gratuita, ficando a cargo do
Juízo de execução verificar se restou ou não inexequível a condenação em honorários.
4. Apelação prejudicada.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5924513-09.2019.4.03.9999
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: MARIA LINA DIAS
Advogado do(a) APELANTE: VALMIR DOS SANTOS - SP247281-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5924513-09.2019.4.03.9999
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta nos autos de ação de conhecimento em que se objetiva a
concessão da aposentadoria por idade a trabalhadora rural.
O MM. Juízo a quo julgou improcedente o pedido, condenando a autora ao pagamento de
custas, despesas processuais e honorários advocatícios arbitrados em R$500,00, observada a
gratuidade da justiça.
Em seu recurso a autora pleiteia a reforma da r. sentença.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O benefício de aposentadoria por idade está previsto no Art. 48, da Lei nº 8.213/91, que dispõe:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se
mulher.
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso
de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I,
na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o
efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei.
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no §
2º deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de
contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65
(sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher."
A aposentadoria por idade, no caso de trabalhadores rurais, referidos na alínea a, do inciso I, na
alínea g, do inciso V e nos incisos VI e VII, do Art. 11, da Lei 8.213/91, portanto, é devida ao
segurado que, cumprido o número de meses exigidos no Art. 143, da Lei 8.213/91, completar
60 anos de idade para homens e 55 para mulheres (Art. 48, § 1º).
Dessarte, os requisitos para a concessão da aposentadoria por idade ao trabalhador rural
compreendem a idade e a comprovação de efetivo exercício de atividade no campo, que deve
ser comprovado por meio de início de prova material corroborada por idônea prova
testemunhal.
O primeiro requisito encontra-se atendido, pois a autora, nascida em 22/09/1950, completou 55
anos em 2005, anteriormente à data do ajuizamento da ação.
Para comprovar o alegado exercício da atividade rural, a autora instruiu a petição inicial com a
cópia da certidão de seu casamento com Lourival Gonçalves Dias, realizado em 24/02/1973, na
qual não consta a qualificação dos cônjuges; e a cópia da certidão de óbito de seu marido,
ocorrido em 03/04/2016, na qual o de cujus está qualificado como trabalhador rural.
Entretanto, como se vê das informações constantes do extrato do CNIS juntado aos autos pela
defesa, o marido da autora exerceu atividades urbanas nos períodos de 18/09/1979 a
06/12/1979, 01/02/1980 a 26/05/1980, 01/03/1989 a 02/1993, e efetuou recolhimentos como
empresário/empregador, em períodos intermitentes, desde 1989 a 1994, descaracterizando a
sua condição de trabalhador rural.
Acresça-se que, em conformidade com os registros assentados no CNIS, o marido da autora
laborou formalmente como empregado de uma usina de cana-de-açúcar desde 21/02/2007,
tendo se aposentado por invalidez em 26/11/2010, e a partir de seu óbito em 03/04/2016, foi
concedida à autora o benefício de pensão por morte.
Impende destacar que não é possível estender a condição de trabalhador rural de um cônjuge
ao outro quando o início de prova material apresentado se restringir, tão só, à CTPS, uma vez
que os contratos de trabalho nela registrados não significam que o postulante tenha trabalhado
no meio rural, dado o seu caráter pessoal, ou seja, somente o contratado pode prestar o serviço
ao empregador.
Confira-se:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. BENEFÍCIO NÃO
CONTRIBUTIVO. ARTIGO 143 DA LEI 8.213/91. NORMA TRANSITÓRIA. PROVA MATERIAL.
CÔNJUGE EMPREGADO RURAL. PROVA TESTEMUNHAL FRÁGIL. AUSÊNCIA DE
COMPROVAÇÃO DO LABOR RURAL PELO PERÍODO EXIGIDO NA LEGISLAÇÃO.
REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. INVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA. APELAÇÃO PROVIDA.
TUTELA ESPECÍFICA REVOGADA.
- Discute-se o atendimento das exigências à concessão de aposentadoria por idade ao rurícola,
a saber: a comprovação da idade mínima e o desenvolvimento de atividade rural no período
imediatamente anterior ao requerimento, consoante o disposto na Lei n. 8.213/91.
- A questão relativa à comprovação de atividade rural se encontra pacificada no Superior
Tribunal de Justiça, que exige início de prova material e afasta por completo a prova
exclusivamente testemunhal (Súmula 149 do STJ).
- De acordo com o que restou definido quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado
segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), aplica-se a
súmula acima aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a
apresentação de início de prova material, corroborada com provas testemunhal, para
comprovação de tempo de serviço.
- ... "omissis".
- ... "omissis".
- ... "omissis".
- ... "omissis".
- ... "omissis".
- ... "omissis".
- ... "omissis".
- ... "omissis".
- ... "omissis".
- ... "omissis".
- ... "omissis".
- Outrossim, CTPS do cônjuge com dois vínculos empregatício rural, nos interstícios de
1º/4/2004 a 21/12/2008 e 1º/9/2009 a 18/2/2010. Contudo, tais anotações rurais não podem ser
estendidas à autora, porque ele trabalhava com registro em CTPS, não em regime de economia
familiar (vide súmula nº 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região).
- Entendo que, no caso dos empregados rurais, mostra-se impossibilitada a extensão da
condição de lavrador do marido à mulher, em vista do caráter individual e específico em tais
atividades laborais ocorrem. O trabalho, neste caso, não se verifica com o grupo familiar, haja
vista restrito ao próprio âmbito profissional de cada trabalhador. Assim, ao contrário da hipótese
do segurado especial, não há de se falar em empréstimo, para fins previdenciários, da condição
de lavrador do cônjuge.
- No caso, a existência de vínculos rurais registrados em CTPS do marido não significa que a
esposa tenha, igualmente, trabalhado no meio rural com aquele no mesmo emprego.
- ... "omissis".
- ... "omissis".
- ... "omissis".
- Não preenchimento dos requisitos exigidos à concessão do benefício pretendido.
- ... "omissis".
- Apelação do INSS provida.
- Revogação da tutela antecipatória de urgência concedida.
(TRF 3ª Região, 9ª Turma, AC - 0019153-43.2018.4.03.9999, Rel. Juiz convocado Rodrigo
Zacharias, julgado em 10/10/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:25/10/2018 )".
Malgrado não tenha vindo aos autos a cópia da CTPS do marido da autora, os vínculos
trabalhistas assentados em seu CNIS dispensam a apresentação desse documento, pois
corroboram que ele trabalhou formalmente por longo período, na condição de empregado.
De outra parte, a autora alega na inicial que “desde seus pais e avós, sempre fizeram parte dos
trabalhadores da zona rural, trabalhando em regime de economia familiar com o esforço em
conjunto de todos para o cultivo de subsistência.”.
A atividade rural em regime de economia familiar, diferentemente do trabalho rural sem registro,
deve ser comprovada mediante a apresentação de documentos que comprovem o efetivo
trabalho pelo grupo familiar, nos termos do Art. 106, da Lei nº 8.213/91: contrato de
arrendamento, parceria ou comodato rural; comprovante de cadastro do Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária - INCRA, no caso de produtores em regime de economia
familiar; bloco de notas do produtor rural; notas fiscais de entrada de mercadorias, emitidas pela
empresa adquirente da produção, com indicação do nome do segurado como vendedor;
documentos fiscais relativos a entrega de produção rural à cooperativa agrícola, entreposto de
pescado ou outros, com indicação do segurado como vendedor ou consignante; comprovantes
de recolhimento de contribuição à Previdência Social decorrentes da comercialização da
produção; cópia da declaração de imposto de renda, com indicação de renda proveniente da
comercialização de produção rural; ou licença de ocupação ou permissão outorgada pelo Incra,
em nome próprio, de seu cônjuge ou de seus genitores.
Como se vê, a autora não trouxe aos autos nenhum documento oficial em nome próprio para
comprovar o alegado trabalho rural sem registro, ou mesmo qualquer um dos documentos
elencados no Art. 106, da Lei nº 8.213/91, em seu nome ou de seus genitores, para comprovar
a atividade desenvolvida em regime de economia familiar.
Assim,vê-se que não foi apresentado documento indispensável ao ajuizamento da ação,
havendo de se extinguir o feito sem resolução do mérito.
Nesse sentido decidiu o e. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do recurso representativo
da controvérsia:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR
IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA
ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E
DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO
DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE
DOS ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO
ESPECIAL DO INSS DESPROVIDO.
1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os
seus procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas
previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em
conta os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto
social adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários.
2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais
da Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da
Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido
de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe
garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na
hermenêutica previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna,
a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental
à prestação previdenciária a que faz jus o segurado.
3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística
civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar
prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas
demandas.
4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual
garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir
como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo
certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente
dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura
previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela
via da assistência social.
5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do
CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo,
impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente
possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos
necessários à tal iniciativa.
6. Recurso Especial do INSS desprovido.
(REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL,
julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016)”.
Destarte, ausente um dos pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular
do processo, é de ser extinto o feito sem resolução do mérito, nos termos do Art. 485, IV, do
CPC, arcando a autoria com honorários advocatícios de 10% sobre o valor atualizado dado à
causa, observando-se o disposto no § 3º, do Art. 98, do CPC, por ser beneficiária da justiça
gratuita, ficando a cargo do Juízo de execução verificar se restou ou não inexequível a
condenação em honorários.
Ante o exposto, de ofício,extingo o feito sem resolução do mérito, restando prejudicada a
apelação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL SEM
REGISTRO. PROVA MATERIAL. PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E
DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO.
1. Os requisitos para a concessão da aposentadoria por idade ao trabalhador rural
compreendem a idade e a comprovação de efetivo exercício de atividade no campo.
2. Não havendo nos autos documentos hábeis, contemporâneos ao período que se quer
comprovar, admissíveis como início de prova material, é de ser extinto o feito sem resolução do
mérito, face a ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo.
3. Honorários advocatícios de 10% sobre o valor atualizado dado à causa, observando-se o
disposto no § 3º, do Art. 98, do CPC, por ser beneficiária da justiça gratuita, ficando a cargo do
Juízo de execução verificar se restou ou não inexequível a condenação em honorários.
4. Apelação prejudicada. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por
unanimidade, decidiu de ofício, extinguir o feito sem resolução do mérito, e dar por prejudicada
a apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
