
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000105-25.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUIZ CONVOCADO DENILSON BRANCO
AUTOR: EVANI DAS MERCES GONCALVES MOTA
Advogado do(a) AUTOR: ADRIANA DOS SANTOS SOUSA - SP273957-A
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000105-25.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUIZ CONVOCADO DENILSON BRANCO
AUTOR: EVANI DAS MERCES GONCALVES MOTA
Advogado do(a) AUTOR: ADRIANA DOS SANTOS SOUSA - SP273957-A
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Senhor Juiz Federal Convocado DENILSON BRANCO (Relator): Proposta ação de conhecimento de natureza previdenciária, objetivando a concessão de auxílio por incapacidade temporária ou de aposentadoria por incapacidade permanente, com o acréscimo de 25%, sobreveio sentença de improcedência do pedido, condenando-se a parte autora ao pagamento de custas e despesas processuais, bem como de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC, observando-se a gratuidade processual.
A parte autora interpôs recurso de apelação, pugnando pela reforma da sentença, para julgar procedente o pedido, uma vez que a doença não seria preexistente ao seu ingresso no RGPS.
Opostos embargos de declaração pela autarquia, foram eles acolhidos, “a fim de condenar a autora a devolver ao INSS, nestes mesmos autos, a depender de liquidação, a integralidade dos valores recebidos precariamente a título de antecipação dos efeitos da tutela, com a devida correção, nos termos do art. 302, I, do Código de Processo Civil” (id 275651387 - Pág. 118).
A parte autora, então, complementou o recurso de apelação, requerendo o afastamento da determinação de devolução dos valores recebidos a título de tutela antecipada.
Sem as contrarrazões, os autos foram remetidos a este Tribunal.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000105-25.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUIZ CONVOCADO DENILSON BRANCO
AUTOR: EVANI DAS MERCES GONCALVES MOTA
Advogado do(a) AUTOR: ADRIANA DOS SANTOS SOUSA - SP273957-A
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Senhor Juiz Federal Convocado DENILSON BRANCO (Relator): Recebo o recurso de apelação da parte autora, nos termos do artigo 1.010 do Código de Processo Civil, haja vista que tempestivo.
Os requisitos para a concessão da aposentadoria por incapacidade permanente, de acordo com o artigo 42, caput e § 2.º, da Lei n.º 8.213/91, são os que seguem: 1) qualidade de segurado; 2) cumprimento da carência, quando for o caso; 3) incapacidade insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que garanta a subsistência; 4) não serem a doença ou a lesão existentes antes da filiação à Previdência Social, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de agravamento daquelas. Enquanto que, de acordo com os artigos 59 e 62 da Lei n.º 8.213/91, o benefício de auxílio por incapacidade temporária é devido ao segurado que fica incapacitado temporariamente para o exercício de suas atividades profissionais habituais, bem como àquele cuja incapacidade, embora permanente, não seja total, isto é, haja a possibilidade de reabilitação para outra atividade que garanta o seu sustento.
A questão que sobeja é saber se a doença incapacitante, sendo preexistente, poderia dar azo à concessão de benefício previdenciário.
O art. 42, § 2º, da Lei nº 8.213/91, ao cuidar da aposentadoria por incapacidade permanente estabelece que:
"A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social, não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão."
Em consulta ao sistema SAT do INSS, verifica-se que a autora possui recolhimentos como contribuinte individual tão-somente no período de 01/02/2008 a 31/12/2009.
Realizado o laudo pericial (id 275651387 - Pág. 27/33), concluiu o perito que a autora, nascida em 16/01/1977, portadora de psicose inespecífica, esquizofrenia e transtorno bipolar, apresentava incapacidade laborativa total e permanente. Em complementação ao laudo, asseverou o perito que “Pelo relato da acompanhante, pode-se acreditar que a doença já estava instalada por volta do ano 2000 (DID), e o primeiro relatório psiquiátrico apresentado permite afirmar que a condição de incapacidade total e permanente para o trabalho já era evidente na época. Portanto, na ausência de dados anteriores, cabível considerar a data de 28/09/2009 para o início da incapacidade (DII)” (id 275651387 - Pág. 90).
De fato, conforme testemunhos do marido e da sobrinha da autora, realizados, respectivamente, em 2010 e 2011 (id’s 275651395 - Pág. 199 e 133) no inquérito policial nº 156/2010, no qual se apura a tentativa de suicídio da autora ocorrida em 30/07/2010, ela apresentaria transtornos mentais e faria tratamento psiquiátrico há dez anos, portanto entre 2000 e 2001.
O caso em tela se enquadra, portanto, na primeira parte do referido art. 42, § 2º, da Lei nº 8.213/91, pois a incapacidade preexistia à filiação da parte autora ao Regime Geral de Previdência Social, em 01/02/2008.
Embora a Lei nº 8.213/91, quando define os requisitos para que seja concedido o benefício em questão, não faça qualquer menção ao tempo exato em que o segurado adquiriu a moléstia incapacitante, o referido § 2º do dispositivo acima transcrito dispõe que a doença preexistente à filiação do segurado à Previdência Social retira-lhe o direito a percepção do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente, ressalvando somente os casos em que a incapacidade sobrevenha por motivo de progressão ou agravamento da moléstia, o que não se configurou no presente caso.
Nesse passo, restando comprovado nos autos que a moléstia de que padece a parte autora preexiste a sua filiação à Previdência, é indevida a concessão de aposentadoria por incapacidade permanente ou auxílio por incapacidade temporária, não merecendo reparos a sentença a este respeito.
No que tange à possibilidade de devolução dos valores indevidamente recebidos a título de tutela antecipada, tem-se que a Primeira Seção do E. STJ, no julgamento da Pet 12.482/DF (DJe de 24/5/2022), acolheu proposta de revisão do entendimento firmado no denominado Tema 692, ficando o julgado assim ementado:
“PROCESSUAL CIVIL. PROPOSTA DE REVISÃO DO ENTENDIMENTO FIRMADO NO TEMA REPETITIVO 692/STJ (RESP N. 1.401.560/MT). ART. 927, § 4º, DO CPC/2015. ARTS. 256-S, 256-T, 256-U E 256-V DO RISTJ. DEVOLUÇÃO DE VALORES DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS RECEBIDOS POR FORÇA DE DECISÃO LIMINAR POSTERIORMENTE REVOGADA. ADVENTO DE NOVA LEGISLAÇÃO. ART. 115, INC. II, DA LEI N. 8.213/1991, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI N. 13.846/2019. TEMA N. 799/STF (ARE 722.421/MG): POSSIBILIDADE DA DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS EM VIRTUDE DE TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE REVOGADA. NATUREZA INFRACONSTITUCIONAL. QUESTÃO DE ORDEM JULGADA NO SENTIDO DA REAFIRMAÇÃO, COM AJUSTES REDACIONAIS, DO PRECEDENTE FIRMADO NO TEMA REPETITIVO N. 692/STJ.
[...]
21. Questão de ordem julgada no sentido da reafirmação da tese jurídica, com acréscimo redacional para ajuste à nova legislação de regência, nos termos a seguir: "A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago". grifei
(Pet. 12.482/DF, Rel. Min. Og Fernandes, Primeira Seção, DJe 24/05/2022). "
Assim, assentada regra geral segundo a qual a reforma da decisão concessiva de tutela provisória obriga a quem dela se favoreceu a restituir os valores recebidos a título de benefício previdenciário ou assistencial, independentemente de boa-fé.
Ressalte-se ainda o disposto no art. 302, caput e parágrafo único, do CPC/2015, ao determinar que “a parte responde pelo prejuízo que a efetivação da tutela de urgência causar à parte adversa” se a sentença lhe for desfavorável ou ocorrer a cessação da eficácia da medida em qualquer hipótese legal, bem que a “indenização será liquidada nos autos em que a medida tiver sido concedida”.
Logo, em havendo expressa normativa dispondo que o dever de ressarcimento do prejuízo causado à parte adversa pela vigência precária de uma tutela de urgência é consequência natural da respectiva cessação, tem-se por prescindível que tal obrigação seja consignada no título judicial, podendo o correspondente valor, assim, ser liquidado nos próprios autos, em consideração, também, aos preceitos da economia processual e razoável duração do processo.
Nessa esteira, a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça:
"CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. MARCAS E PATENTES. DECISÃO LIMINAR QUE SUSPENDEU A COMERCIALIZAÇÃO DE MEDICAMENTO. POSTERIOR REVOGAÇÃO. ART. 811 DO CPC/73. PREJUÍZOS QUE PODEM SER LIQUIDADOS NOS PRÓPRIOS AUTOS. REPARAÇÃO INTEGRAL. RESPONSABILIDADE PROCESSUAL OBJETIVA. DESNECESSIDADE DE PRONUNCIAMENTO JUDICIAL FIXANDO OBRIGAÇÃO DE REPARAR OS DANOS SOFRIDOS. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Aplica-se o NCPC a este recurso ante os termos do Enunciado Administrativo nº 3, aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.
2. A obrigação de indenizar o dano causado pela execução de tutela antecipada posteriormente revogada é consequência natural da improcedência do pedido, dispensando-se, nessa medida, pronunciamento judicial que a imponha de forma expressa.
3. Nos termos da jurisprudência desta Corte, os danos causados a partir da execução de tutela antecipada suscitam responsabilidade processual objetiva e devem ser integralmente reparados (art. 944 do CC/02) após apurados em procedimento de liquidação levado a efeito nos próprios autos.
4. Recurso especial provido."
(REsp n. 1.780.410/SP, relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, relator para acórdão Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 23/2/2021, DJe de 13/4/2021)
"DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PREVIDÊNCIA PRIVADA. TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE REVOGADA. DEVOLUÇÃO DE VALORES. PROCESSAMENTO NOS PRÓPRIOS AUTOS DA AÇÃO DE CONHECIMENTO. DECISÃO MANTIDA.
1. "A obrigação de indenizar a parte adversa dos prejuízos advindos com o deferimento da tutela provisória posteriormente revogada é decorrência 'ex lege' da sentença de improcedência ou de extinção do feito sem resolução de mérito, como no caso, sendo dispensável, portanto, pronunciamento judicial a esse respeito, devendo o respectivo valor ser liquidado nos próprios autos em que a medida tiver sido concedida, em obediência, inclusive, aos princípios da celeridade e economia processual" (REsp 1770124/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/05/2019, DJe 24/05/2019).
2. Agravo interno a que se nega provimento."
(AgInt no AREsp n. 519.991/RS, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 16/9/2019, DJe de 19/9/2019.)
Outrossim, os artigos 927, III e 1.040, ambos do CPC, impõe aos juízes e aos tribunais, a observância dos v. acórdãos em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos.
Segue jurisprudência da 9ª Turma no mesmo sentido do presente julgado:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. TEMA N. 692 DO STJ. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. TUTELA REVOGADA. IMPROCEDÊNCIA. DEVOLUÇÃO DE VALORES. MESMOS AUTOS.
- O Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do Tema Repetitivo n. 692, deliberou que “A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago.”
- Não há óbice para que a autarquia pleiteie, nos mesmos autos, a devolução de valor levantado a mais pela parte autora, com fundamento na celeridade e na efetividade da prestação jurisdicional, sem a necessidade de propositura de ação autônoma.
- Apelação provida.
(TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5068900-95.2023.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA, julgado em 07/12/2023, DJEN DATA: 13/12/2023)
Assim considerando, na hipótese dos autos é devida a devolução, pela autora, dos valores auferidos a título de benefício previdenciário por força de tutela antecipada posteriormente revogada.
Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE. AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA. ARTIGOS 42, CAPUT E § 2.º, 59 E 62 DA LEI N.º 8.213/91. INCAPACIDADE PREEXISTENTE À FILIAÇÃO AO RGPS. BENEFÍCIOS INDEVIDOS. DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS A TÍTULO DE TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE REVOGADA. TEMA 692/STJ. POSSIBILIDADE.
- A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao se filiar ao Regime Geral da Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por incapacidade permanente ou auxílio por incapacidade temporária, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.
- O caso em tela se enquadra na primeira parte do art. 42, § 2º, da Lei nº 8.213/91, pois a incapacidade preexistia à filiação da parte autora ao Regime Geral de Previdência Social, em 01/02/2008.
- Restando comprovado nos autos que a moléstia de que padece a parte autora preexiste a sua filiação à Previdência, é indevida a concessão de aposentadoria por incapacidade permanente ou auxílio por incapacidade temporária.
- O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema Repetitivo n. 692, assentou regra geral segundo a qual a reforma da decisão concessiva de tutela provisória obriga a quem dela se favoreceu a restituir os valores recebidos a título de benefício previdenciário ou assistencial, independentemente de boa-fé.
- Em havendo expressa normativa dispondo que o dever de ressarcimento do prejuízo causado à parte adversa pela vigência precária de uma tutela de urgência é consequência natural da respectiva cessação, tem-se por prescindível que tal obrigação seja consignada no título judicial, podendo o correspondente valor, assim, ser liquidado nos próprios autos, em consideração, também, aos preceitos da economia processual e razoável duração do processo.
- Apelação da parte autora não provida.
