
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5076581-82.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MAURICILIO SALVADOR
Advogado do(a) APELADO: FREDERICO JOSE DIAS QUERIDO - SP136887-A
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5076581-82.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MAURICILIO SALVADOR
Advogado do(a) APELADO: FREDERICO JOSE DIAS QUERIDO - SP136887-A
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R E L A T Ó R I O
Cuida-se de apelação interposta em face da sentença, não submetida a reexame necessário, que julgou procedente o pedido de aposentadoria por incapacidade permanente, desde a a data de iníco da incapacidade fixada na perícia (DIIem 29/3/2021), discriminados os consectários legais e antecipados os efeitos da tutela.
A autarquia previdenciária alega a ausência de incapacidade laboral total e permanente da parte autora e requer a reforma do julgado. Subsidiariamente, pleiteia: "1. A observância da prescrição quinquenal; 2. Seja a parte intimada a firmar e juntar aos autos a autodeclaração prevista no anexo I da Portaria INSS nº 450, de 03 de abril de 2020, em observância às regras de acumulação de benefícios estabelecida no art. 24, §§ 1.º e 2.º da Emenda Constitucional 103/2019; 3. Nas hipóteses da Lei 9.099/95, caso inexista nos autos declaração com esse teor, seja a parte autora intimada para que renuncie expressamente aos valores que excedam o teto de 60 (sessenta) salários-mínimos na data da propositura da ação e que eventualmente venham a ser identificados ao longo do processo, inclusive em sede de execução (renúncia expressa condicionada); 4. A fixação dos honorários advocatícios nos termos da Súmula 111 do STJ; 5. A declaração de isenção de custas e outras taxas judiciárias; 6. O desconto, de eventual montante retroativo, dos valores já pagos administrativamente ou de qualquer benefício inacumulável recebido no período, bem como pelo deferimento da cobrança de eventuais valores pagos indevidamente à parte autora em sede de antecipação dos efeitos da tutela".
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5076581-82.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MAURICILIO SALVADOR
Advogado do(a) APELADO: FREDERICO JOSE DIAS QUERIDO - SP136887-A
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V O T O
Conheço da apelação, em razão da satisfação de seus pressupostos de admissibilidade.
Discute-se nos autos o direito da parte autora a benefício por incapacidade laboral.
A cobertura do evento incapacidade para o trabalho é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II, da Seguridade Social, especialmente no artigo 201, I, da Constituição Federal (CF/1988), cuja redação atual é dada pela Emenda Constitucional n. 103, publicada em 13/11/2019 (EC n. 103/2019):
“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a: I - cobertura dos eventos de incapacidade temporária ou permanente para o trabalho e idade avançada; (...)”.
Já a Lei n. 8.213/1991, aplicando o princípio da distributividade (artigo 194, parágrafo único, III, da CF/1988), estabelece as condições para a concessão desse tipo de benefício.
A aposentadoria por invalidez, atualmente denominada aposentadoria por incapacidade permanente (EC n. 103/2019), é devida ao segurado que for considerado permanentemente incapaz para o exercício de quaisquer atividades laborativas, não sendo possível a reabilitação em outra profissão.
Nos termos do artigo 42 da Lei n. 8.213/1991, o benefício será devido ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e será pago enquanto perdurar esta condição.
Por sua vez, o auxílio-doença, atualmente denominado auxílio por incapacidade temporária (EC n. 103/2019), é devido ao segurado que ficar temporariamente incapacitado para o trabalho e, à luz do disposto no artigo 59 da Lei n. 8.213/1991, "não para quaisquer atividades laborativas, mas para (...) sua atividade habitual" (Direito da Seguridade Social, Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen, Livraria do Advogado e Esmafe, Porto Alegre, 2005, p. 128).
São requisitos para a concessão desses benefícios, além da incapacidade laboral: a qualidade de segurado, a carência de 12 (doze) contribuições mensais, quando exigida, bem como a demonstração de que o segurado não estava previamente incapacitado ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social.
Caso reconhecida a incapacidade apenas parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de benefício por incapacidade permanente ou temporária. Pode, ainda, conceder auxílio-acidente, na forma do artigo 86 da Lei n. 8.213/1991, se a parcial incapacidade decorre de acidente de trabalho, ou de qualquer natureza, ou ainda de doença profissional ou do trabalho (artigo 20, I e II, da mesma lei).
O reconhecimento da incapacidade laboral, total ou parcial, depende da realização de perícia médica, por perito nomeado pelo Juízo, nos termos do Código de Processo Civil (CPC). Contudo, o Juiz não está adstrito unicamente às suas conclusões, podendo valer-se de outros elementos pessoais, profissionais ou sociais para a formação de sua convicção, desde que constantes dos autos.
Alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização (TNU) são pertinentes a esse tema.
Súmula 47 da TNU: “Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez”.
Súmula 53 da TNU: “Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de Previdência Social”.
Súmula 77 da TNU: “O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual”.
No caso dos autos, a perícia médica judicial, realizada em 18/11/2022, constatou a incapacidade laboral parcial e permanente do autor (nascido em 1969, operador de máquina, com enisno médio completo), por ser portador de "CID M19.9 - Artrose não especificada".
O perito esclareceu:
"Considerando o déficit funcional tornozelo por motivo de artrose, existe incapacidade parcial e permanente para o trabalho habitual de operador de máquina. Considerando a cronicidade alegada e a limitação observada, não há perspectiva de melhora. Apresenta incapacidade para permanecer em pé por moderados períodos, deambular por moderadas distâncias e se agachar."
Lembro, por oportuno, que o magistrado não está adstrito ao laudo pericial.
Muito embora o perito tenha mencionado incapacidade laboral apenas parcial, atestou a inaptidão total e permanente para o exercício das atividades laborais habituais.
Por outro lado, verifica-se que o autor não é idoso, possui ensino médio completo e capacidade laboral residual para exercer atividades compatíveis com seu quadro clínico, sendo prematuro, ao menos por ora, aposentá-lo.
Trata-se, pois, de caso típico de auxílio por incapacidade temporária, em que o segurado não está inválido, mas não pode mais realizar suas atividades habituais.
Em decorrência, é devido o benefício de auxílio por incapacidade temporária, na esteira do precedente que cito:
"PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE LABORAL PARCIAL E PERMANENTE. IMPEDIMENTO PARA A ATIVIDADE HABITUAL. INSERÇÃO EM PROGRAMA DE REABILITAÇÃO PROFISSIONAL. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. INVERSÃO DO ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA.
1. Trata-se de pedido de concessão de benefício previdenciário por incapacidade, previsto na Lei 8.213/91.
2. Comprovado o preenchimento dos requisitos de qualidade de segurado e carência. Art. 15, II e Art. 25, I da Lei n. 8213/91.
3. Laudo médico pericial indica a existência de enfermidade que ocasiona incapacidade laboral parcial e permanente, com impedimento para a atividade habitual da parte autora. Auxílio-doença com inserção em programa de reabilitação profissional concedido.
4. Termo inicial do benefício fixado na data do pedido administrativo. REsp nº 1.369.165/SP. Súmula n 576 do STJ.
5. As parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora na forma estabelecida e pelos índices previstos no capítulo 4.3, do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, alterado pela Resolução CJF nº 784/2022, de 08 de agosto de 2022, ou daquele que estiver em vigor na data da liquidação do título executivo judicial.
6. Inversão do ônus da sucumbência.
7. Apelação da parte autora provida.” (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5002629-07.2023.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal MARCELO VIEIRA DE CAMPOS, julgado em 05/07/2023, DJEN DATA: 10/07/2023)
À luz do artigo 62 da Lei n. 8.213/1991, o segurado em gozo de auxílio por incapacidade temporária, insuscetível de recuperação para a sua atividade habitual, deverá submeter-se a processo de reabilitação profissional para o exercício de outra atividade, devendo ser mantido o benefício até que o segurado seja considerado reabilitado para o desempenho de atividade que lhe garanta a subsistência ou, quando considerado não recuperável, seja aposentado por incapacidade permanente.
Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação para, nos termos da fundamentação, conceder auxílio por incapacidade temporária, devendo ser mantido o benefício até que o segurado seja considerado reabilitado para o desempenho de atividade que lhe garanta a subsistência ou, quando considerado não recuperável, seja aposentado por incapacidade permanente.
Informe-se ao INSS, via sistema, para o cumprimento do julgado no tocante à alteração do benefício em manutenção e à inclusão do autor em procedimento de reabilitação profissional.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE. CAPACIDADE LABORAL RESIDUAL. POSSIBILIDADE DE REABILITAÇÃO PROFISSIONAL. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. DEVIDO AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA.
- São requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a qualidade de segurado, a carência de 12 (doze) contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e insuscetível de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por incapacidade permanente) ou a incapacidade temporária (auxílio por incapacidade temporária), bem como a demonstração de que o segurado não estava previamente incapacitado ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social.
- Comprovadas, por meio de prova pericial, a ausência de incapacidade laboral total e permanente do segurado e a possibilidade de reabilitação profissional para atividades compatíveis com o quadro clínico, não é possível a concessão de aposentadoria por incapacidade permanente.
- Apelação parcialmente provida.
