Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5006452-91.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
29/09/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 01/10/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. TRABALHADOR
RURAL. EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO PERÍODO
ANTERIOR AO REQUERIMENTO. ANULAÇÃO DA SENTENÇA.
- Os requisitos à aposentadoria por invalidez, conforme preceituam os arts. 42 e seguintes da Lei
n.° 8.213/91, consistem na presença da qualidade de segurado, na existência de incapacidade
total e permanente para o trabalho e na ocorrência do cumprimento da carência, nas hipóteses
em que exigida. O auxílio-doença, por sua vez, é concedido nos casos de incapacidade
temporária.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova
testemunhal.
- Ausente a prova oral requerida pela parte, a anulação da sentença é medida que se impõe,
porquanto sua produção faz-se necessária para o deslinde da questão acerca da condição de
qualidade de segurado especial.
- Anulação da sentença para produção da prova oral.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5006452-91.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JANETE DILETA ZUZE DE MEDEIRO
Advogado do(a) APELADO: ANA PAULA FONTOURA FROES - MS21908-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5006452-91.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JANETE DILETA ZUZE DE MEDEIRO
Advogado do(a) APELADO: ANA PAULA FONTOURA FROES - MS21908-A
OUTROS PARTICIPANTES:
-R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez a trabalhador rural,
desde a data do requerimento administrativo (23/10/2017).
O juízo a quo julgou procedente o pedido formulado, reconhecendo à parte autora o direito ao
benefício de auxílio-doença, “entre 03/06/2019 (data do pedido administrativo - fls. 105) e
17/03/2020 (seis meses subsequentes a data da perícia, realizada em 17/09/2019 - fls. 136)”
(fs. 6 a 13, Id. 143370531).
O INSS apela, pleiteando, preliminarmente, a atribuição do efeito suspensivo ao recurso, e, no
mérito, a reforma da sentença, sustentando, em síntese, a ausência do requisito da qualidade
de segurado para concessão do benefício em questão.
Recurso adesivo da parte autora, pleiteando a reforma da sentença, pleiteando a concessão de
auxílio doença com termo inicial em 23/10/2017 e termo final 17/3/2020, bem como a majoração
dos honorários.
Com contrarrazões da parte autora, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5006452-91.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JANETE DILETA ZUZE DE MEDEIRO
Advogado do(a) APELADO: ANA PAULA FONTOURA FROES - MS21908-A
OUTROS PARTICIPANTES:
-V O T O
Requer o INSS, em seu recurso de apelação, a concessão do efeito suspensivo, condicionando
eventual implantação de benefício previdenciário após ocorrido o trânsito em julgado.
Não lhe assiste razão.
A alegação veiculada pelo INSS, concernente ao recebimento da apelação no duplo efeito, não
se coloca na hipótese dos autos.
A regra geral prevista no caput do art. 1.012 do Código de Processo Civil, segundo o qual “a
apelação terá efeito suspensivo”, é excepcionada no § 1.º desse mesmo dispositivo legal, cujo
inciso V expressamente determina que, “além de outras hipóteses previstas em lei, começa a
produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que confirma, concede ou
revoga tutela provisória”.
Não impedem, os recursos, a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão em sentido
diverso, "se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou
impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso" (CPC, art.
995, parágrafo único).
Neste caso, em que o recurso é interposto pelo INSS, não há nem urgência nem evidência para
que se conceda o efeito suspensivo. Pelo contrário, a urgência serve à parte autora, já que o
benefício previdenciário é considerado verba alimentar.
Rejeita-se, portanto, a matéria preliminar em questão.
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E DO AUXÍLIO-DOENÇA A TRABALHADOR RURAL
Os requisitos da aposentadoria por invalidez encontram-se preceituados nos arts. 42 e
seguintes da Lei n.° 8.213/91, consistindo, mais precisamente, na presença da qualidade de
segurado, na existência de incapacidade total e permanente para o trabalho e na ocorrência do
cumprimento da carência, quando exigida.
O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos art. 59 e seguintes do
mesmo diploma legal, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
Excepcionalmente, com base em entendimento jurisprudencial consolidado, admite-se a
concessão de tais benefícios mediante comprovação pericial de incapacidade parcial e
definitiva para o desempenho da atividade laborativa, que seja incompatível com a ocupação
habitual do requerente e que implique em limitações tais que restrinjam sobremaneira a
possibilidade de recolocação no mercado de trabalho, diante das profissões que exerceu
durante sua vida profissional (STJ: AgRg no AREsp 36.281/MS, rel. Ministra ASSUSETE
MAGALHÃES, 6.ª Turma, DJe de 01/03/2013; e AgRg no AREsp 136474/MG, rel. Ministro
NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, 1.ª Turma, DJe de 29/06/2012).
Em casos específicos, em que demonstrada a necessidade de assistência permanente de outra
pessoa, possível, ainda, com base no art. 45 da Lei de Benefícios, o acréscimo de 25% ao valor
da aposentadoria por invalidez porventura concedida.
No tocante ao requisito da qualidade de segurado, cumpre reconhecer, nos termos do art. 11,
inciso I, da Lei n.º 8.213/91, e considerando as particularidades do labor campesino, que o
trabalhador rural que exerce sua atividade com subordinação e habitualidade, ainda que de
forma descontínua, é qualificado como empregado.
Esse, inclusive, é o tratamento dispensado pelo próprio INSS, que, na Instrução Normativa
INSS/DC nº 118, de 14.04.2005, considera como segurado, na categoria de empregado, o
trabalhador volante.
Por outro lado, para a obtenção de benefícios previdenciários, se faz necessária a comprovação
da atividade no campo e, consequentemente, o vínculo de segurado.
Em tal sentido, a interpretação do § 3.º do art. 55, c/c o art. 106, ambos da Lei n.º 8.213/91,
admite a comprovação de tempo de serviço em atividade rural, desde que baseada em início de
prova documental, sendo vedada a prova exclusivamente testemunhal.
Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência (art. 26, inciso III), como o dever
de verter contribuição por determinado número de meses.
Vale dizer: em relação às contribuições previdenciárias, é assente, desde sempre, o
entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício
de atividade no meio rural (STJ, REsp n.º 207.425, 5.ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de
25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5.ª Turma, j. em
14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).
Essa comprovação do labor rural, nos termos dos arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios, dar-se-á
por meio de prova documental, ainda que incipiente, e, nos termos do art. 55, § 3.º, da
retrocitada Lei, corroborada por prova testemunhal.
Acrescente-se que a jurisprudência de longa data vem atentando para a necessidade dessa
conjunção de elementos probatórios (início de prova documental e colheita de prova
testemunhal), o que resultou até mesmo na edição do verbete n.º 149 da Súmula da
Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:”
"A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para
efeito de obtenção do benefício previdenciário".
DO CASO DOS AUTOS (AUSÊNCIA DE PROVA ORAL)
In casu, em que pese tenha a autora juntada diversos documentos aptos a indicar início de
prova documental para sua qualificação como segurada especial (trabalhadora rural), não
houve produção de prova oral.
Ocorre que, em peça exordial protocolada em 14/5/2019, a parte autora requereu “A produção
de todos os meios de prova, principalmente pericial, documental e testemunhal” (f. 13, Id.
143370529).
Para indicar sua qualidade de segurada, juntou a autora certidão de casamento qualificando
seu cônjuge como “lavrador”, datado em 10/9/1992; documentos de seu cônjuge como notas
fiscais de venda de produtos rurais, declarações anuais de produtor rural e declarações de
recibos de Imposto Territorial Rural, datados entre os anos de 2015 a 2018 (Ids. 143370529 e
fs. 1 a 21, Id. 143370530).
Acostou, ainda, cópia de sua CTPS com registro de vínculos de trabalho, sendo o último
cessado em 31/10/2014 (fs. 21 a 24, Id. 143370529).
Perícia médica realizada indicou a presença de incapacidade total e temporária a partir de
12/4/2019 (fs. 77 a 86, Id. 143370530).
Ausente a prova oral requerida pela parte, a anulação da sentença é medida que se impõe,
porquanto sua produção faz-se necessária para o deslinde da questão acerca da condição de
qualidade de segurado especial. A não produção de prova oral pode prejudicar a parte autora,
na medida em que impede a comprovação de sua condição de segurada especial.
No mesmo sentido, a jurisprudência dessa Corte:
“PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA OU APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO
CONTRADITÓRIO. TRABALHADORA RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA ORAL.
CERCEAMENTO DE DEFESA. SENTENÇA ANULADA DE OFÍCIO. APELAÇÕES
PREJUDICADAS.
- No laudo pericial, elaborado em 08/03/2016, o perito atestou que a demandante sofre de
espondilite, bursite e processo degenerativo da coluna. Quanto à existência de incapacidade da
autora, verifico que o experto foi contraditório.
- O artigo 5º da Constituição Federal, dentre os direitos e garantias fundamentais, dispõe em
seu inciso LV que "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em
geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela
inerentes".
- Considerando que o direito de ação está previsto explicitamente na Carta Magna (art. 5º,
XXXV), não podendo o Judiciário deixar de examinar lesão ou ameaça de lesão às pessoas, os
mandamentos gerais da Constituição concernentes aos direitos e garantias individuais devem
ser aplicados também ao processo civil, incluído entre eles o princípio da igualdade (art. 5º, I,
da CF).
- Assim, em observância aos princípios acima mencionados, deve o magistrado permitir que as
partes, em igualdade de condições, apresentem suas defesas, com as provas de que dispõem,
em busca do direito de que se julgam titulares.
- Dessa forma, a conclusão a respeito da pertinência ou não do julgamento antecipado deve ser
tomada de forma ponderada, porque não depende apenas da vontade do Juiz, mas da natureza
dos fatos e questões existentes nos autos.
- No caso, é patente a contradição existente no laudo pericial. Portanto, o julgamento não
poderia ter ocorrido sem a realização de novo exame pericial, uma vez que o feito não estava
suficientemente instruído.
- Verifico, ainda, que não houve oitiva de testemunhas, fundamental para corrobar o início de
prova material apresentado pela demandante com o fim de comprovar sua qualidade de
segurada especial.
- Sentença anulada de ofício.
- Apelação da parte autora e do INSS prejudicadas.”
(TRF 3ª Região, OITAVA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2098099 - 0034165-
05.2015.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS, julgado em
02/10/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/10/2017)
“PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. PROVA PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA
CONFIGURADO.
I - O princípio constitucional do devido processo legal impõe que se conceda aos litigantes o
direito à produção de provas, devendo facultar-se amplos meios para que se possa comprovar
os fatos que amparam o direito disputado em juízo. Segundo Eduardo Couture, "A lei
instituidora de uma forma de processo não pode privar o indivíduo de razoável oportunidade de
fazer valer seu direito, sob pena de ser acoimada de inconstitucional" (BARACHO, José Alfredo
de Oliveira; Teoria Geral do Processo Constitucional in Revista de Direito Constitucional e
Internacional, vol. 62, p. 135, Jan/2008).
II - No presente caso, o indeferimento da prova pericial causou efetivo prejuízo à parte autora,
por impedir a comprovação do caráter especial das atividades exercidas, o que obstou a
concessão da aposentadoria por tempo de contribuição ou aposentadoria especial.
III – Apelação da parte autora parcialmente provida. Sentença anulada. Prejudicados, no mérito,
a apelação da parte autora, o recurso do INSS e o reexame necessário.”
(TRF 3ª Região, 8ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 0007107-
11.2011.4.03.6105, Rel. Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA, julgado em
07/12/2020, Intimação via sistema DATA: 11/12/2020)
Posto isso, rejeito a matéria preliminar e, de ofício, anulo asentença e determino oretorno dos
autos ao juízo de origem para regular instrução do feito com a oitiva de testemunhas, restando-
se prejudicados os recursos da autarquia federal e da parte, nos termos da fundamentação,
supra.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA.
TRABALHADOR RURAL. EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA
NO PERÍODO ANTERIOR AO REQUERIMENTO. ANULAÇÃO DA SENTENÇA.
- Os requisitos à aposentadoria por invalidez, conforme preceituam os arts. 42 e seguintes da
Lei n.° 8.213/91, consistem na presença da qualidade de segurado, na existência de
incapacidade total e permanente para o trabalho e na ocorrência do cumprimento da carência,
nas hipóteses em que exigida. O auxílio-doença, por sua vez, é concedido nos casos de
incapacidade temporária.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova
testemunhal.
- Ausente a prova oral requerida pela parte, a anulação da sentença é medida que se impõe,
porquanto sua produção faz-se necessária para o deslinde da questão acerca da condição de
qualidade de segurado especial.
- Anulação da sentença para produção da prova oral.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e, de ofício, anular a R. sentença, com retorno
dos autos ao juízo de origem para regular instrução do feito com a oitiva de testemunhas,
restando-se prejudicados os recursos da autarquia federal e da parte, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
