Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5066926-91.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
04/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 08/02/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. TRABALHADOR
RURAL. EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO PERÍODO
ANTERIOR AO REQUERIMENTO. NÃO PRODUÇÃO DE PROVA ORAL. ANULAÇÃO DA
SENTENÇA.
- Os requisitos à aposentadoria por invalidez, conforme preceituam os arts. 42 e seguintes da Lei
n.° 8.213/91, consistem na presença da qualidade de segurado, na existência de incapacidade
total e permanente para o trabalho e na ocorrência do cumprimento da carência, nas hipóteses
em que exigida. O auxílio-doença, por sua vez, é concedido nos casos de incapacidade
temporária.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova
testemunhal.
- Ausente a prova oral requerida pela parte, a anulação da sentença é medida que se impõe,
porquanto sua produção faz-se necessária para o deslinde da questão acerca da condição de
qualidade de segurado especial.
- Sentença anulada de ofício.
- Apelação do INSS e da parte autora prejudicados.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5066926-91.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: MARIA CREUSA MARES DE SOUSA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: ELIENE SOARES DE OLIVEIRA - SP356666-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, MARIA CREUSA MARES
DE SOUSA
Advogado do(a) APELADO: ELIENE SOARES DE OLIVEIRA - SP356666-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5066926-91.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: MARIA CREUSA MARES DE SOUSA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: ELIENE SOARES DE OLIVEIRA - SP356666-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, MARIA CREUSA MARES
DE SOUSA
Advogado do(a) APELADO: ELIENE SOARES DE OLIVEIRA - SP356666-N
OUTROS PARTICIPANTES:
-R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença a
trabalhador rural, desde a data do requerimento administrativo (8/3/2017).
O juízo a quo julgou procedente o pedido formulado, reconhecendo à parte autora o direito ao
benefício de aposentadoria por invalidez, a partir da data do laudo pericial.
O INSS apela, pleiteando a reforma da sentença, sustentando, em síntese, que não há respaldo
documental para a fixação da data de início da incapacidade conforme sugerido pela perícia, e
que considerando a data dos documentos médicos apresentados (2017/2019), a autora não
mais detinha a condição de segurada do RGPS.
A parte autora apela, pleiteando a reforma da sentença, sustentando, em síntese, seja a data
de início do benefício concedido fixada na data do requerimento administrativo, bem como a
majoração dos honorários advocatícios.
Com contrarrazões da parte autora, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5066926-91.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: MARIA CREUSA MARES DE SOUSA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: ELIENE SOARES DE OLIVEIRA - SP356666-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, MARIA CREUSA MARES
DE SOUSA
Advogado do(a) APELADO: ELIENE SOARES DE OLIVEIRA - SP356666-N
OUTROS PARTICIPANTES:
-V O T O
Tempestivo os recursos e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao
exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E DO AUXÍLIO-DOENÇA A TRABALHADOR RURAL
Os requisitos da aposentadoria por invalidez encontram-se preceituados nos arts. 42 e
seguintes da Lei n.° 8.213/91, consistindo, mais precisamente, na presença da qualidade de
segurado, na existência de incapacidade total e permanente para o trabalho e na ocorrência do
cumprimento da carência, quando exigida.
O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos art. 59 e seguintes do
mesmo diploma legal, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
Excepcionalmente, com base em entendimento jurisprudencial consolidado, admite-se a
concessão de tais benefícios mediante comprovação pericial de incapacidade parcial e
definitiva para o desempenho da atividade laborativa, que seja incompatível com a ocupação
habitual do requerente e que implique em limitações tais que restrinjam sobremaneira a
possibilidade de recolocação no mercado de trabalho, diante das profissões que exerceu
durante sua vida profissional (STJ: AgRg no AREsp 36.281/MS, rel. Ministra ASSUSETE
MAGALHÃES, 6.ª Turma, DJe de 01/03/2013; e AgRg no AREsp 136474/MG, rel. Ministro
NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, 1.ª Turma, DJe de 29/06/2012).
Em casos específicos, em que demonstrada a necessidade de assistência permanente de outra
pessoa, possível, ainda, com base no art. 45 da Lei de Benefícios, o acréscimo de 25% ao valor
da aposentadoria por invalidez porventura concedida.
No tocante ao requisito da qualidade de segurado, cumpre reconhecer, nos termos do art. 11,
inciso I, da Lei n.º 8.213/91, e considerando as particularidades do labor campesino, que o
trabalhador rural que exerce sua atividade com subordinação e habitualidade, ainda que de
forma descontínua, é qualificado como empregado.
Esse, inclusive, é o tratamento dispensado pelo próprio INSS, que, na Instrução Normativa
INSS/DC nº 118, de 14.04.2005, considera como segurado, na categoria de empregado, o
trabalhador volante.
Por outro lado, para a obtenção de benefícios previdenciários, se faz necessária a comprovação
da atividade no campo e, consequentemente, o vínculo de segurado.
Em tal sentido, a interpretação do § 3.º do art. 55, c/c o art. 106, ambos da Lei n.º 8.213/91,
admite a comprovação de tempo de serviço em atividade rural, desde que baseada em início de
prova documental, sendo vedada a prova exclusivamente testemunhal.
Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência (art. 26, inciso III), como o dever
de verter contribuição por determinado número de meses.
Vale dizer: em relação às contribuições previdenciárias, é assente, desde sempre, o
entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício
de atividade no meio rural (STJ, REsp n.º 207.425, 5.ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de
25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5.ª Turma, j. em
14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).
Essa comprovação do labor rural, nos termos dos arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios, dar-se-á
por meio de prova documental, ainda que incipiente, e, nos termos do art. 55, § 3.º, da
retrocitada Lei, corroborada por prova testemunhal.
Acrescente-se que a jurisprudência de longa data vem atentando para a necessidade dessa
conjunção de elementos probatórios (início de prova documental e colheita de prova
testemunhal), o que resultou até mesmo na edição do verbete n.º 149 da Súmula da
Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:”
"A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para
efeito de obtenção do benefício previdenciário".
DO CASO DOS AUTOS (AUSÊNCIA DE PROVA ORAL)
In casu, em que pese tenha a autora juntada diversos documentos aptos a indicar início de
prova documental para sua qualificação como segurada especial (trabalhadora rural), não
houve produção de prova oral.
Ocorre que, em peça exordial protocolada em 22/4/2019, a parte autora requereu “produção de
todos os meios de prova em direito permitidos, notadamente pela produção da prova
testemunhal, cujo rol será oportunamente apresentado, ofícios requisitórios, perícias, juntada de
novos documentos e demais que se fizerem necessárias” (Id. 156476913).
Para indicar sua qualidade de segurada, juntou a autora certidão de nascimento de seu filho,
em que se qualifica seu cônjuge como “lavrador”, datado em 17/7/1995; certidão de casamento
qualificando seu cônjuge como “lavrador”, datado de 8/1/1997 (fs. 3 e 4, Id. 156476915).
Acostou, ainda, cópia de sua CTPS com registro de vínculos empregatícios rurais, desde 1983,
sendo o último de 22/1/2013 a 14/11/2013 (Id. 156476916).
Perícia médica realizada indicou a presença de incapacidade total e permanente, fixando o
início da incapacidade de maneira questionável, uma vez que a única menção que o perito faz
relativo à DII é acompanhado da expressão “s.i.c”, o que denota tratar-se de informação
fornecida pela própria parte e apenas transcrita no laudo pericial pelo expert. (Id. 156476943).
Nesse contexto, ausente a prova oral requerida pela parte, a anulação da sentença é medida
que se impõe, porquanto sua produção faz-se necessária para o deslinde da questão acerca da
condição de qualidade de segurado especial. A não produção de prova oral pode prejudicar a
parte autora, na medida em que impede a comprovação de sua condição de segurada especial.
No mesmo sentido, a jurisprudência dessa Corte:
“PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA OU APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO
CONTRADITÓRIO. TRABALHADORA RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA ORAL.
CERCEAMENTO DE DEFESA. SENTENÇA ANULADA DE OFÍCIO. APELAÇÕES
PREJUDICADAS.
- No laudo pericial, elaborado em 08/03/2016, o perito atestou que a demandante sofre de
espondilite, bursite e processo degenerativo da coluna. Quanto à existência de incapacidade da
autora, verifico que o experto foi contraditório.
- O artigo 5º da Constituição Federal, dentre os direitos e garantias fundamentais, dispõe em
seu inciso LV que "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em
geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela
inerentes".
- Considerando que o direito de ação está previsto explicitamente na Carta Magna (art. 5º,
XXXV), não podendo o Judiciário deixar de examinar lesão ou ameaça de lesão às pessoas, os
mandamentos gerais da Constituição concernentes aos direitos e garantias individuais devem
ser aplicados também ao processo civil, incluído entre eles o princípio da igualdade (art. 5º, I,
da CF).
- Assim, em observância aos princípios acima mencionados, deve o magistrado permitir que as
partes, em igualdade de condições, apresentem suas defesas, com as provas de que dispõem,
em busca do direito de que se julgam titulares.
- Dessa forma, a conclusão a respeito da pertinência ou não do julgamento antecipado deve ser
tomada de forma ponderada, porque não depende apenas da vontade do Juiz, mas da natureza
dos fatos e questões existentes nos autos.
- No caso, é patente a contradição existente no laudo pericial. Portanto, o julgamento não
poderia ter ocorrido sem a realização de novo exame pericial, uma vez que o feito não estava
suficientemente instruído.
- Verifico, ainda, que não houve oitiva de testemunhas, fundamental para corrobar o início de
prova material apresentado pela demandante com o fim de comprovar sua qualidade de
segurada especial.
- Sentença anulada de ofício.
- Apelação da parte autora e do INSS prejudicadas.”
(TRF 3ª Região, OITAVA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2098099 - 0034165-
05.2015.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS, julgado em
02/10/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/10/2017)
“PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. PROVA PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA
CONFIGURADO.
I - O princípio constitucional do devido processo legal impõe que se conceda aos litigantes o
direito à produção de provas, devendo facultar-se amplos meios para que se possa comprovar
os fatos que amparam o direito disputado em juízo. Segundo Eduardo Couture, "A lei
instituidora de uma forma de processo não pode privar o indivíduo de razoável oportunidade de
fazer valer seu direito, sob pena de ser acoimada de inconstitucional" (BARACHO, José Alfredo
de Oliveira; Teoria Geral do Processo Constitucional in Revista de Direito Constitucional e
Internacional, vol. 62, p. 135, Jan/2008).
II - No presente caso, o indeferimento da prova pericial causou efetivo prejuízo à parte autora,
por impedir a comprovação do caráter especial das atividades exercidas, o que obstou a
concessão da aposentadoria por tempo de contribuição ou aposentadoria especial.
III – Apelação da parte autora parcialmente provida. Sentença anulada. Prejudicados, no mérito,
a apelação da parte autora, o recurso do INSS e o reexame necessário.”
(TRF 3ª Região, 8ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 0007107-
11.2011.4.03.6105, Rel. Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA, julgado em
07/12/2020, Intimação via sistema DATA: 11/12/2020)
Quanto ao prequestionamento suscitado, inexiste contrariedade alguma à legislação federal ou
a dispostos constitucionais.
Posto isso, de ofício, anulo a R. sentença, com retorno dos autos ao juízo de origem para
regular instrução do feito com a oitiva de testemunhas, restando-se prejudicados os recursos da
autarquia federal e da parte, nos termos da fundamentação, supra.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA.
TRABALHADOR RURAL. EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA
NO PERÍODO ANTERIOR AO REQUERIMENTO. NÃO PRODUÇÃO DE PROVA ORAL.
ANULAÇÃO DA SENTENÇA.
- Os requisitos à aposentadoria por invalidez, conforme preceituam os arts. 42 e seguintes da
Lei n.° 8.213/91, consistem na presença da qualidade de segurado, na existência de
incapacidade total e permanente para o trabalho e na ocorrência do cumprimento da carência,
nas hipóteses em que exigida. O auxílio-doença, por sua vez, é concedido nos casos de
incapacidade temporária.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova
testemunhal.
- Ausente a prova oral requerida pela parte, a anulação da sentença é medida que se impõe,
porquanto sua produção faz-se necessária para o deslinde da questão acerca da condição de
qualidade de segurado especial.
- Sentença anulada de ofício.
- Apelação do INSS e da parte autora prejudicados.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu, de ofício, anular a R. sentença, com retorno dos autos ao juízo de origem
para regular instrução do feito com a oitiva de testemunhas, restando prejudicados os recursos
da autarquia federal e da parte, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
