Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5293644-78.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
07/10/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 13/10/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ART. 42, CAPUT E § 2º DA LEI
8.213/91. AUXÍLIO-DOENÇA. ARTIGOS 59 E 62 DA LEI N.º 8.213/91. QUALIDADE DE
SEGURADO. CARÊNCIA. INCAPACIDADE TOTAL APENAS PARA ATIVIDADE HABITUAL.
REQUISITOS PRESENTES. AUXÍLIO-DOENÇA DEVIDO. TERMO INICIAL. RECOLHIMENTOS
COMO CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. NÃO INDICATIVO DE ATIVIDADE LABORATIVA. TEMA
REPETITIVO 1.013/STJ. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. CUSTAS PROCESSUAIS.
- Comprovada a incapacidade total apenas para a atividade habitual, havendo possibilidade de
reabilitação, bem como presentes os demais requisitos previstos nos artigos 59 e 62 da Lei n.º
8.213/91, é devida a concessão do benefício de auxílio-doença.
- O termo inicial do benefício deve ser fixado no dia imediatamente posterior à cessação indevida
do auxílio-doença anteriormente concedido à parte autora (02/03/2018), uma vez que o conjunto
probatório existente nos autos revela que o mal de que ela é portadora não cessou desde então,
não tendo sido recuperada a capacidade laborativa, devendo ser descontados eventuais valores
pagos administrativamente.
- No caso de concessão de benefício por incapacidade, o recolhimento de contribuições
previdenciárias como contribuinte individual não é indicativo de exercício de atividade laborativa,
implica, muita vezes, na necessidade de contribuir para a manutenção da qualidade de segurado
e não significa retorno ao trabalho.
- O Tema Repetitivo 1.013/STJ é assim resolvido: "No período entre o indeferimento
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez,
mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas
do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo
benefício previdenciário pago retroativamente."
- A correção monetária será aplicada de acordo com o vigente Manual de Cálculos da Justiça
Federal, atualmente a Resolução nº 267/2013, observado o julgamento final do RE 870.947/SE
em Repercussão Geral.
- No tocante à forma de incidência dos juros de mora, falta interesse recursal à autarquia
previdenciária, uma vez que a condenação se deu nos termos do seu inconformismo.
- Honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, §§ 3º e 4º, II, do
Novo Código de Processo Civil/2015, e da Súmula 111 do STJ.
- Não há falar em custas ou despesas processuais, por ser a autora beneficiária da assistência
judiciária gratuita.
- Apelação do INSS parcialmente conhecida e parcialmente provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5293644-78.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO ARAUJO DOS SANTOS FILHO
Advogado do(a) APELADO: MARIA AUGUSTA PERES MIRANDA - SP164570-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5293644-78.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO ARAUJO DOS SANTOS FILHO
Advogado do(a) APELADO: MARIA AUGUSTA PERES MIRANDA - SP164570-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Proposta ação de conhecimento
de natureza previdenciária, objetivando a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por
invalidez, sobreveio sentença de procedência do pedido, condenando-se a autarquia
previdenciária a conceder o benefício de aposentadoria por invalidez, no valor de 100% do salário
de benefício, desde a data de cessação do benefício anterior (02/03/2018), com correção
monetária e juros de mora, além de custas e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez
por cento) sobre o valor da condenação, consideradas as parcelas vencidas até a data da
sentença, observando-se o disposto na Súmula 111 do C. STJ.
A r. sentença não foi submetida ao reexame necessário.
Inconformada, a autarquia previdenciária interpôs recurso de apelação pugnando pela reforma da
sentença, para julgar improcedente o pedido, uma vez que não preenchidos os requisitos legais
para concessão do benefício. Subsidiariamente, requer que o termo inicial do benefício seja
fixado na data do laudo pericial; que o pagamento do benefício seja suspenso nas competências
de exercício de atividade remunerada; que o valor do benefício seja determinado nos moldes do
art. 26 da EC 103/19; a redução dos honorários advocatícios; a aplicação do Manual de Cálculos
da Justiça Federal aos critérios de correção monetária e juros de mora; bem como a isenção do
pagamento de custas processuais.
Com as contrarrazões, os autos foram remetidos a este Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5293644-78.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO ARAUJO DOS SANTOS FILHO
Advogado do(a) APELADO: MARIA AUGUSTA PERES MIRANDA - SP164570-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Recebo o recurso de apelação,
nos termos do artigo 1.010 do Código de Processo Civil, haja vista que tempestivo.
Os requisitos para a concessão da aposentadoria por invalidez, de acordo com o artigo 42, caput
e § 2.º, da Lei n.º 8.213/91, são os que seguem: 1) qualidade de segurado; 2) cumprimento da
carência, quando for o caso; 3) incapacidade insuscetível de reabilitação para o exercício de
atividade que garanta a subsistência; 4) não serem a doença ou a lesão existentes antes da
filiação à Previdência Social, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de agravamento
daquelas.
A qualidade de segurado da parte autora e o cumprimento da carência prevista no inciso I do
artigo 25 da Lei nº 8.213/91 restaram comprovadas, uma vez que ela esteve em gozo de auxílio-
doença, benefício este que lhe foi concedido administrativamente até 02/03/2018 (Id 138212139 -
Pág. 3). Dessa forma, estes requisitos foram reconhecidos pela autarquia por ocasião da
concessão do benefício de auxílio-doença. Proposta a ação em 05/10/2018, não há falar em
perda da qualidade de segurado, uma vez que da data da cessação do benefício até a data da
propositura da presente demanda não se ultrapassou o período de graça previsto no artigo 15,
inciso II, da Lei n.º 8.213/91.
Por outro lado, para a solução da lide, ainda, é de substancial importância a prova técnica
produzida. Neste passo, a incapacidade para o exercício de trabalho que garanta a subsistência
foi atestada pelo laudo pericial realizado (Id 138212182). De acordo com referido laudo, a parte
autora está incapacitada de forma total para sua atividade habitual de pedreiro, porém, poderia
ser reabilitado para exercer outras atividades, tais como porteiro, almoxarife, etc.
Diante da ausência de comprovação da incapacidade total e permanente da parte autora para o
exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e sendo requisito essencial à concessão da
aposentadoria por invalidez, nos termos do artigo 42 da Lei nº 8.213/91, tal benefício não deve
ser concedido.
Sobre o tema, trago à colação o seguinte julgado:
"PREVIDENCIÁRIO - APOSENTADORIA POR INVALIDEZ - INCAPACIDADE PARCIAL -
ARTIGO 42 DA LEI 8.213/91.
O segurado considerado parcialmente incapacitado para determinadas tarefas, podendo, porém,
exercer atividades outras que lhe garantam a subsistência, não tem direito ao benefício da
aposentadoria por invalidez. Para deferimento do benefício, a incapacidade há que ser total e
permanente, insuscetível de reabilitação. Recurso conhecido e provido." (REsp nº 231093-SP,
Relator Ministro Jorge Scartezzini, j. 18/11/99, DJ 21/02/2000, p. 165).
Por outro lado, de acordo com os artigos 59 e 62 da Lei nº 8.213/91, o benefício de auxílio-
doença é devido ao segurado que fica incapacitado temporariamente para o exercício de suas
atividades profissionais habituais, bem como àquele cuja incapacidade, embora permanente, não
seja total, isto é, que haja a possibilidade de reabilitação para outra atividade que garanta o seu
sustento.
É dever do INSS conceder o benefício de auxílio-doença à parte autora e reintegrá-la em
processo de reabilitação profissional, nos termos do referido artigo 62 da Lei nº 8.213/91.
Enquanto tal reabilitação não ocorra, é devido o benefício de auxílio-doença. Note-se que esse é
o entendimento pacífico deste Egrégio Tribunal: "Comprovada, através de perícia medica, a
incapacidade total e temporária para o trabalho, é de rigor a manutenção da concessão do
auxílio-doença, cujo benefício deverá fruir até a efetiva reabilitação da apelada ou, caso negativo,
ser convertido em aposentadoria por invalidez, consoante determina o artigo 62 da lei n. 8213/91"
(TRF - 3ª Região, AC n.º 300029878-SP, Relator Juiz Theotonio Costa, j. 02/08/1994, DJ
20/07/1995, p. 45173).
Dessa forma, a parte autorafaz jus ao benefício de auxílio-doença, calculado nos termos do art.
29, II, e § 10, art. 33 e art. 61, todos da Lei 8.213/1991, tendo em vista que cumpriu os requisitos
necessários ao deferimento do benefício antes do advento da EC 103/2019.
O termo inicial do benefício deve ser fixado no dia imediatamente posterior à cessação indevida
do auxílio-doença anteriormente concedido à parte autora (02/03/2018), uma vez que o conjunto
probatório existente nos autos revela que o mal de que ela é portadora não cessou desde então,
não tendo sido recuperada a capacidade laborativa, devendo ser descontados eventuais valores
pagos administrativamente.
No caso de concessão de benefício por incapacidade, o recolhimento de contribuições
previdenciárias como contribuinte individual não é indicativo de exercício de atividade laborativa,
implica, muita vezes, na necessidade de contribuir para a manutenção da qualidade de segurado
e não significa retorno ao trabalho.
Além disso, o C. Superior Tribunal de Justiça, em sessão de julgamento realizada em 24/06/2020,
em sede de recurso representativo da controvérsia (Tema 1.013 - Recurso Especial repetitivo
1786590/SP e 1788700/SP, Ministro HERMAN BENJAMIN), firmou posicionamento no sentido de
que “No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou
de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao
recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua
incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente”, conforme
ementa a seguir transcrita:
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ARTS.
1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015. TEMA REPETITIVO 1.013/STJ. BENEFÍCIO POR
INCAPACIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-DOENÇA. DEMORA NA
IMPLEMENTAÇÃO DO BENEFÍCIO. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE REMUNERADA PELO
SEGURADO. NECESSIDADE DE SUBSISTÊNCIA DO SEGURADO. FUNÇÃO SUBSTITUTIVA
DA RENDA NÃO CONSUBSTANCIADA. POSSIBILIDADE DE RECEBIMENTO CONJUNTO DA
RENDA DO TRABALHO E DAS PARCELAS RETROATIVAS DO BENEFÍCIO ATÉ A EFETIVA
IMPLANTAÇÃO. TESE REPETITIVA FIXADA. IDENTIFICAÇÃO E DELIMITAÇÃO DA
CONTROVÉRSIA
1. O tema repetitivo ora controvertido consiste em definir a "possibilidade de recebimento de
benefício, por incapacidade, do Regime Geral de Previdência Social, de caráter substitutivo da
renda (auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez), concedido judicialmente em período de
abrangência concomitante àquele em que o segurado estava trabalhando e aguardava o
deferimento do benefício."
2. Os fatos constatados no presente Recurso Especial consistem cronologicamente em: a) o
segurado teve indeferido benefício por incapacidade (auxílio-doença ou aposentadoria por
invalidez) na via administrativa; b) para prover seu sustento, trabalhou após o indeferimento e
entrou com ação judicial para a concessão de benefício por incapacidade; c) a ação foi julgada
procedente para conceder o benefício desde o requerimento administrativo, o que acabou por
abranger o período de tempo em que o segurado trabalhou; e d) o debate, travado ainda na fase
ordinária, consiste no entendimento do INSS de que o benefício por incapacidade concedido
judicialmente não pode ser pago no período em que o segurado estava trabalhando, ante seu
caráter substitutivo da renda e à luz dos arts. 42, 46 e 59 da Lei 8.213/1991.
3. A presente controvérsia e, consequentemente, a tese repetitiva que for fixada não abrangem as
seguintes hipóteses:
3.1. O segurado está recebendo regularmente benefício por incapacidade e passa a exercer
atividade remunerada incompatível com sua incapacidade, em que não há o caráter da
necessidade de sobrevivência como elemento que justifique a cumulação, e a função substitutiva
da renda do segurado é implementada de forma eficaz. Outro aspecto que pode ser analisado
sob perspectiva diferente é o relativo à boa-fé do segurado. Há jurisprudência das duas Turmas
da Primeira Seção que analisa essa hipótese, tendo prevalecido a compreensão de que há
incompatibilidade no recebimento conjunto das verbas. A exemplo: AgInt no REsp 1.597.369/SC,
Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 13.4.2018; REsp 1.454.163/RJ, Rel.
Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 18.12.2015; e REsp 1.554.318/SP, Rel.
Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 2.9.2016.
3.2. O INSS alega o fato impeditivo do direito (o exercício de trabalho pelo segurado) somente na
fase de cumprimento da sentença, pois há elementos de natureza processual prejudiciais à
presente tese a serem considerados, notadamente a aplicabilidade da tese repetitiva fixada no
REsp 1.253.513/AL (Rel. Ministro Castro Meira, Primeira Seção, DJe de 20.8.2012).
RESOLUÇÃO DA TESE CONTROVERTIDA
4. Alguns benefícios previdenciários possuem a função substitutiva da renda auferida pelo
segurado em decorrência do seu trabalho, como mencionado nos arts. 2º, VI, e 33 da Lei
8.213/1991. Em algumas hipóteses, a substitutividade é abrandada, como no caso de ser
possível a volta ao trabalho após a aposentadoria por tempo de contribuição (art. 18, § 2º, da Lei
8.213/1991). Em outras, a substitutividade resulta na incompatibilidade entre as duas situações
(benefício e atividade remunerada), como ocorre com os benefícios auxílio-doença por
incapacidade e aposentadoria por invalidez.
5. Desses casos de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, é pressuposto que a
incapacidade total para o trabalho seja temporária ou definitiva, respectivamente.
6. Como consequência, o Regime Geral de Previdência Social arca com os citados benefícios por
incapacidade para consubstanciar a função substitutiva da renda, de forma que o segurado que
não pode trabalhar proveja seu sustento.
7. A cobertura previdenciária, suportada pelo regime contributivo solidário, é o provimento do
sustento do segurado enquanto estiver incapaz para o trabalho.
8. É decorrência lógica da natureza dos benefícios por incapacidade, substitutivos da renda, que
a volta ao trabalho seja, em regra, causa automática de cessação desses benefícios, como se
infere do requisito da incapacidade total previsto nos arts. 42 e 59 da Lei 8.213/1991, com
ressalva ao auxílio-doença.
9. No caso de aposentadoria por invalidez, o art. 42 da Lei de Benefícios da Previdência Social
(LBPS) estabelece como requisito a incapacidade "para o exercício de atividade que lhe garanta
a subsistência", e, assim, a volta a qualquer atividade resulta no automático cancelamento do
benefício (art. 46).
10. Já o auxílio-doença estabelece como requisito (art. 59) que o segurado esteja "incapacitado
para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual". Desse modo, a função substitutiva do
auxílio-doença é restrita às duas hipóteses, fora das quais o segurado poderá trabalhar em
atividade não limitada por sua incapacidade.
11. Alinhada a essa compreensão, já implícita desde a redação original da Lei 8.213/1991, a Lei
13.135/2015 incluiu os §§ 6º e 7º no art. 60 daquela, com a seguinte redação (grifos
acrescentados): "§ 6º O segurado que durante o gozo do auxílio-doença vier a exercer atividade
que lhe garanta subsistência poderá ter o benefício cancelado a partir do retorno à atividade. § 7º
Na hipótese do § 6º, caso o segurado, durante o gozo do auxílio-doença, venha a exercer
atividade diversa daquela que gerou o benefício, deverá ser verificada a incapacidade para cada
uma das atividades exercidas." 12. Apresentado esse panorama legal sobre o tema, importa
estabelecer o ponto diferencial entre a hipótese fática dos autos e aquela tratada na lei: aqui o
segurado requereu o benefício, que lhe foi indeferido, e acabou trabalhando enquanto não obteve
seu direito na via judicial; já a lei trata da situação em que o benefício é concedido, e o segurado
volta a trabalhar.
13. A presente controvérsia cuida de caso, portanto, em que falhou a função substitutiva da
renda, base da cobertura previdenciária dos benefícios auxílio-doença e aposentadoria por
invalidez.
14. O provimento do sustento do segurado não se materializou, no exato momento da
incapacidade, por falha administrativa do INSS, que indeferiu incorretamente o benefício, sendo
inexigível do segurado que aguarde a efetivação da tutela jurisdicional sem que busque, pelo
trabalho, o suprimento da sua subsistência.
15. Por culpa do INSS, resultado do equivocado indeferimento do benefício, o segurado teve de
trabalhar, incapacitado, para o provimento de suas necessidades básicas, o que doutrinária e
jurisprudencialmente convencionou-se chamar de sobre-esforço. Assim, a remuneração por esse
trabalho tem resultado inafastável da justa contraprestação pecuniária.
16. Na hipótese, o princípio da vedação do enriquecimento sem causa atua contra a autarquia
previdenciária, pois, por culpa sua - indeferimento equivocado do benefício por incapacidade -, o
segurado foi privado da efetivação da função substitutiva da renda laboral, objeto da cobertura
previdenciária, inerente aos mencionados benefícios.
17. Como tempero do elemento volitivo do segurado, constata-se objetivamente que, ao trabalhar
enquanto espera a concessão de benefício por incapacidade, está ele atuando de boa-fé,
cláusula geral hodiernamente fortalecida na regência das relações de direito.
18. Assim, enquanto a função substitutiva da renda do trabalho não for materializada pelo efetivo
pagamento do auxílio-doença ou da aposentadoria por invalidez, é legítimo que o segurado
exerça atividade remunerada para sua subsistência, independentemente do exame da
compatibilidade dessa atividade com a incapacidade laboral.
19. No mesmo sentido do entendimento aqui defendido: AgInt no AREsp 1.415.347/SP, Rel.
Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, Je de 28.10.2019; REsp 1.745.633/PR, Rel. Ministro
Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 18.3.2019; AgInt no REsp 1.669.033/SP, Rel. Ministro
Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe de 30.8.2018; REsp 1.573.146/SP, Rel.
Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe de 13.11.2017; AgInt no AgInt no
AREsp 1.170.040/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe de 10.10.2018; AgInt no
REsp 1.620.697/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe de 2.8.2018; AgInt
no AREsp 1.393.909/SP, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 6.6.2019; e REsp
1.724.369/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 25.5.2018.
FIXAÇÃO DA TESE REPETITIVA
20. O Tema Repetitivo 1.013/STJ é assim resolvido: "No período entre o indeferimento
administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez,
mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas
do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo
benefício previdenciário pago retroativamente."
RESOLUÇÃO DO CASO CONCRETO
21. Ao Recurso Especial deve-se negar provimento, pois o Tribunal de origem julgou o presente
caso no mesmo sentido do entendimento aqui proposto (fl. 142-143/e-STJ): "A permanência do
segurado no exercício das atividades laborativas decorre da necessidade de prover sua
subsistência enquanto a administração ou o Judiciário não reconheça sua incapacidade, não
obstando a concessão do benefício vindicado durante a incapacidade."
22. Consubstanciado o que previsto no Enunciado Administrativo 7/STJ, o recorrente é
condenado ao pagamento de honorários advocatícios de 10% (dez por cento) sobre o valor total
da verba sucumbencial fixada nas instâncias ordinárias, com base no § 11 do art. 85 do
CPC/2015.
CONCLUSÃO
23. Recurso Especial não provido, sob o rito dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015.”
Não há falar, portanto, em descontos relativos aos meses em que houve recolhimentos como
contribuinte individual ao RGPS.
A correção monetária será aplicada de acordo com o vigente Manual de Cálculos da Justiça
Federal, atualmente a Resolução nº 267/2013, observado o julgamento final do RE 870.947/SE
em Repercussão Geral.
No tocante à forma de incidência dos juros de mora, falta interesse recursal à autarquia
previdenciária, uma vez que a condenação se deu nos termos do seu inconformismo.
Honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, §§ 3º e 4º, II, do Novo
Código de Processo Civil/2015, e da Súmula 111 do STJ.
Por fim, a autarquia previdenciária está isenta do pagamento de custas e emolumentos, nos
termos do art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96, do art. 24-A da Lei nº 9.028/95 (dispositivo
acrescentado pela Medida Provisória nº 2.180-35/01) e do art. 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/93, o que
não inclui as despesas processuais. Todavia, a isenção de que goza a autarquia não obsta a
obrigação de reembolsar as custas suportadas pela parte autora, quando esta é vencedora na
lide. Entretanto, no presente caso, não há falar em custas ou despesas processuais, por ser a
autora beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Diante do exposto, NÃO CONHEÇO DE PARTE DA APELAÇÃO DO INSS, no tocante aos juros
de mora E, NA PARTE CONHECIDA, DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO, para conceder à parte
autora o benefício de auxílio-doença, isentar a autarquia do pagamento das custas processuais e
explicitar a forma de incidência dos honorários advocatícios, nos termos da fundamentação.
Independentemente do trânsito em julgado, comunique-se ao INSS, a fim de que se adotem as
providências cabíveis à imediata implantação do benefício de AUXÍLIO-DOENÇA, em nome de
JOÃO ARAÚJO DOS SANTOS FILHO, com data de início - DIB em 03/03/2018 e renda mensal
inicial - RMI a ser calculada pelo INSS, nos termos do art. 497 do CPC.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ART. 42, CAPUT E § 2º DA LEI
8.213/91. AUXÍLIO-DOENÇA. ARTIGOS 59 E 62 DA LEI N.º 8.213/91. QUALIDADE DE
SEGURADO. CARÊNCIA. INCAPACIDADE TOTAL APENAS PARA ATIVIDADE HABITUAL.
REQUISITOS PRESENTES. AUXÍLIO-DOENÇA DEVIDO. TERMO INICIAL. RECOLHIMENTOS
COMO CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. NÃO INDICATIVO DE ATIVIDADE LABORATIVA. TEMA
REPETITIVO 1.013/STJ. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. CUSTAS PROCESSUAIS.
- Comprovada a incapacidade total apenas para a atividade habitual, havendo possibilidade de
reabilitação, bem como presentes os demais requisitos previstos nos artigos 59 e 62 da Lei n.º
8.213/91, é devida a concessão do benefício de auxílio-doença.
- O termo inicial do benefício deve ser fixado no dia imediatamente posterior à cessação indevida
do auxílio-doença anteriormente concedido à parte autora (02/03/2018), uma vez que o conjunto
probatório existente nos autos revela que o mal de que ela é portadora não cessou desde então,
não tendo sido recuperada a capacidade laborativa, devendo ser descontados eventuais valores
pagos administrativamente.
- No caso de concessão de benefício por incapacidade, o recolhimento de contribuições
previdenciárias como contribuinte individual não é indicativo de exercício de atividade laborativa,
implica, muita vezes, na necessidade de contribuir para a manutenção da qualidade de segurado
e não significa retorno ao trabalho.
- O Tema Repetitivo 1.013/STJ é assim resolvido: "No período entre o indeferimento
administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez,
mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas
do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo
benefício previdenciário pago retroativamente."
- A correção monetária será aplicada de acordo com o vigente Manual de Cálculos da Justiça
Federal, atualmente a Resolução nº 267/2013, observado o julgamento final do RE 870.947/SE
em Repercussão Geral.
- No tocante à forma de incidência dos juros de mora, falta interesse recursal à autarquia
previdenciária, uma vez que a condenação se deu nos termos do seu inconformismo.
- Honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, §§ 3º e 4º, II, do
Novo Código de Processo Civil/2015, e da Súmula 111 do STJ.
- Não há falar em custas ou despesas processuais, por ser a autora beneficiária da assistência
judiciária gratuita.
- Apelação do INSS parcialmente conhecida e parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por
unanimidade, decidiu NÃO CONHECER DE PARTE DA APELAÇÃO DO INSS, no tocante aos
juros de mora E, NA PARTE CONHECIDA, DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO, para conceder à
parte autora o benefício de auxílio-doença, isentar a autarquia do pagamento das custas
processuais e explicitar a forma de incidência dos honorários advocatícios, nos termos da
fundamentação., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
