Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA / SP
5169026-27.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
15/02/2022
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 18/02/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE PREEXISTENTE AO
INGRESSO NO REGIME GERAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL (RGPS). CONTRIBUINTE
INDIVIDUAL. PEDIDO IMPROCEDENTE. TUTELA DE URGÊNCIA REVOGADA. REMESSA
OFICIAL. NÃO CONHECIMENTO. RECURSO ADESIVO PREJUDICADO.
I- Os requisitos para a concessão da aposentadoria por invalidez compreendem: a) o
cumprimento do período de carência, quando exigida, prevista no art. 25 da Lei n° 8.213/91; b) a
qualidade de segurado, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios e c) incapacidade definitiva
para o exercício da atividade laborativa. O auxílio doença difere apenas no que tange à
incapacidade, a qual deve ser temporária.
II- O extrato de consulta realizada no "CNIS - Cadastro Nacional de Informações Sociais" da
requerente, juntado pelo INSS, revela a inscrição como contribuinte individual, com recolhimentos
de contribuições no período de 1º/1/16 a 30/4/19. A presente ação foi ajuizada em 28/3/19.
III- Na perícia médica judicial realizada em 10/8/19, relatou a demandante, acompanhada de sua
neta, que "em 2014 começou a sentir dores na coluna lombar e quadril direito, quando procurou
um médico Ortopedista que realizou exames e iniciou tratamento com medicação e fisioterapia.
Em 2017 as dores pioraram quando se afastou das atividades laborais, porém não teve
reconhecido o pedido de auxilio doença". Afirmou o esculápio encarregado do exame, com base
no exame clínico e análise da documentação médica dos autos, que a autora de 73 anos, grau de
instrução 4ª série do ensino fundamental, e tendo como última atividade exercida a de vendedora
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
autônoma, "apresenta histórico de Hérnia Discal protrusa no nível L4-L5 com radiculopatia em
membro inferior direito, com sintomatologias álgicas e impotência funcional importante". Concluiu
pela constatação da incapacidade laborativa total e permanente, estabelecendo o início da
incapacidade em 7/6/17, data do exame de ressonância magnética da coluna lombar.
IV- Cumpre ressaltar que o expert atestou tratar-se de "patologia de caráter osteodegenerativa",
sendo que a autora retificou a qualificação descrita na exordial, de "diarista" para "do lar". Não
obstante toda a documentação médica estar datada de 2017, assim como o requerimento
administrativo formulado em 11/12/17, verifica-se da perícia administrativa realizada pelo INSS
em 19/1/18, que a demandante relatou "Queixa de dores lombares que irradiam para MID,
agravadas há 1,5a -2a. Mora com 2 netas de 23a (gêmeas) - tem a tutela desde pequenas. Já fez
tratamento medicamentoso e fisioterápico, sem melhora e o médico acha que vai precisar
operar".
V- Assim, não parece crível que um ano após iniciar suas contribuições ao RGPS, eclodiu a
incapacidade, mormente, em se tratando de patologias ortopédicas que se manifestam quase que
imediatamente, com quadro álgico, sendo encaminhada, inclusive, para avaliação acerca de
submissão a procedimento cirúrgico.
VI- Dessa forma, verifica-se que ao proceder ao ingresso no Regime Geral da Previdência Social
– GPS como contribuinte individual em 1º/1/16, aos 69 anos de idade, apresentava incapacidade
preexistente, impedindo, portanto, a concessão dos benefícios de auxílio doença ou
aposentadoria por invalidez, nos termos do disposto nos arts. 42, § 2º e 59, parágrafo único, da
Lei de Benefícios.
VII- Tendo em vista a improcedência do pedido, faz-se necessária a revogação da tutela de
urgência concedida em sentença, ficando prejudicada a análise do recurso adesivo da parte
autora e do pedido de majoração dos honorários sucumbenciais recursais nas contrarrazões de
apelação.
VIII- Arbitrados os honorários advocatícios em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade
ficará suspensa, nos termos do art. 98, §3º, do CPC, por ser a parte autora beneficiária da justiça
gratuita.
IX- Quanto à sujeição da sentença ao duplo grau de jurisdição por ser ilíquida, observo que
líquida é a sentença cujo quantum debeatur pode ser obtido por meros cálculos aritméticos, sem
a necessidade de nova fase de produção de provas ou de atividade cognitiva futura que venha a
complementar o título judicial. Inviável, portanto, acolher a interpretação conferida pelo Juízo a
quo ao conceito de sentença ilíquida. Ademais, o valor da condenação não excede a 1.000 (um
mil) salários mínimos, motivo pelo qual a R. sentença não está sujeita ao duplo grau obrigatório.
X- Apelação do INSS provida. Pedido improcedente. Tutela de urgência revogada. Remessa
oficial não conhecida. Recurso adesivo da parte autora prejudicado.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5169026-27.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MAYRA MALHER DA CUNHA
Advogados do(a) APELADO: FABIO GOMES PONTES - SP295848-A, CAROLINA DA SILVA
GARCIA - SP233993-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região8ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5169026-27.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MAYRA MALHER DA CUNHA
Advogados do(a) APELADO: FABIO GOMES PONTES - SP295848-A, CAROLINA DA SILVA
GARCIA - SP233993-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de
ação ajuizada em 28/3/19 em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando à
concessão de aposentadoria por invalidez, com o adicional de 25%, ou auxílio doença, ou,
ainda, auxílio acidente. Pleiteia, ainda, a tutela de urgência.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita, e indeferida a
antecipação dos efeitos da tutela.
O Juízo a quo, em 14/6/20, julgou procedente o pedido, concedendo em favor da autora a
aposentadoria por invalidez, a contar de 7/6/17, acrescidos de correção monetária pelo IPCA-E,
e juros moratórios incidentes sobre a caderneta de poupança. Os honorários advocatícios foram
fixados em 10% sobre o valor da condenação, consideradas as parcelas vencidas até a data da
sentença (Súmula nº 111 do C. STJ). Isentou o réu da condenação em despesas processuais.
Deferiu a tutela de urgência em parte, somente para implantação benefício.
Inconformada, apelou a autarquia, sustentando em breve síntese:
- que, em se tratando de moléstia progressiva, constatada em exame de junho/17, quando a
autora tinha 70 anos de idade, fica evidente que, ao proceder ao recolhimento de contribuições
ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS), em 15/2/16, já era portadora da incapacidade,
sendo preexistente.
- Requer a reforma da R. sentença, para julgar improcedente o pedido.
- Caso não seja acolhida a alegação acima mencionada, pleiteia a incidência do INPC como
índice de correção monetária. Por fim, argui o prequestionamento da matéria para fins
recursais.
Por sua vez, adesivamente recorreu a parte autora, requerendo, em síntese:
- a elevação dos honorários advocatícios para 20% sobre o valor da condenação e, não sendo
este o entendimento, a fixação do coeficiente em 15% sobre o valor da condenação, afastando
a incidência da Súmula nº 111 do C. STJ, incompatível com o disposto no CPC/15.
Com contrarrazões somente da demandante, nas quais pleiteia a majoração dos honorários
sucumbenciais recursais, nos termos do art. 85, § 11, do CPCV/15, subiram os autos a esta E.
Corte.
É o breve relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região8ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5169026-27.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MAYRA MALHER DA CUNHA
Advogados do(a) APELADO: FABIO GOMES PONTES - SP295848-A, CAROLINA DA SILVA
GARCIA - SP233993-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Nos exatos
termos do art. 42 da Lei nº 8.213/91, in verbis:
"Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência
exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for
considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe
garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
§ 1º A concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de
incapacidade mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social, podendo o
segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança.
§ 2º A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de
Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a
incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão."
Com relação ao auxílio doença, dispõe o art. 59, caput, da referida Lei:
"O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o
período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua
atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos."
Dessa forma, depreende-se que os requisitos para a concessão da aposentadoria por invalidez
compreendem: a) o cumprimento do período de carência, quando exigida, prevista no art. 25 da
Lei n° 8.213/91; b) a qualidade de segurado, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios e c)
incapacidade definitiva para o exercício da atividade laborativa. O auxílio doença difere apenas
no que tange à incapacidade, a qual deve ser temporária.
No que tange ao recolhimento de contribuições previdenciárias, devo ressaltar que, em se
tratando de segurado empregado, tal obrigação compete ao empregador, sendo do Instituto o
dever de fiscalização do exato cumprimento da norma. Essas omissões não podem ser
alegadas em detrimento do trabalhador que não deve - posto tocar às raias do disparate - ser
penalizado pela inércia alheia.
Importante deixar consignado, outrossim, que a jurisprudência de nossos tribunais é pacífica no
sentido de que não perde a qualidade de segurado aquele que está impossibilitado de trabalhar,
por motivo de doença incapacitante.
Deixo de analisar os requisitos para a concessão do auxílio acidente, considerando não haver
sido noticiada nos autos a ocorrência de acidente de qualquer natureza.
Feitas essas breves considerações, passo à análise do caso concreto.
In casu, o extrato de consulta realizada no "CNIS - Cadastro Nacional de Informações Sociais"
da requerente, juntado pelo INSS a fls. 71 (id. 206163984 – pág. 3), revela a inscrição como
contribuinte individual, com recolhimentos de contribuições no período de 1º/1/16 a 30/4/19. A
presente ação foi ajuizada em 28/3/19.
Por sua vez, na perícia médica judicial realizada em 10/8/19, cujo parecer técnico foi juntado a
fls. 127/143 (id. 206164013 – págs. 1/17), relatou a demandante, acompanhada de sua neta,
que "em 2014 começou a sentir dores na coluna lombar e quadril direito, quando procurou um
médico Ortopedista que realizou exames e iniciou tratamento com medicação e fisioterapia. Em
2017 as dores pioraram quando se afastou das atividades laborais, porém não teve reconhecido
o pedido de auxilio doença" (fls. 129 - id. 206164013 – pág. 3, grifos meus). Afirmou o esculápio
encarregado do exame, com base no exame clínico e análise da documentação médica dos
autos, que a autora de 73 anos, grau de instrução 4ª série do ensino fundamental, e tendo
como última atividade exercida a de vendedora autônoma, "apresenta histórico de Hérnia Discal
protrusa no nível L4-L5 com radiculopatia em membro inferior direito, com sintomatologias
álgicas e impotência funcional importante" (fls. 130 - id. 206164013 – pág. 4). Concluiu pela
constatação da incapacidade laborativa total e permanente, estabelecendo o início da
incapacidade em 7/6/17, data do exame de ressonância magnética da coluna lombar.
Cumpre ressaltar que o expert atestou tratar-se de "patologia de caráter osteodegenerativa", a
fls. 142 (id. 206164013 – pág. 16, grifos meus), sendo que a autora retificou a qualificação
descrita na exordial, de "diarista" para "do lar" (fls. 116 – id. 206164005).
Não obstante toda a documentação médica estar datada de 2017 (fls. 32/37 – id. 206163969 –
págs. 1/6), assim como o requerimento administrativo formulado em 11/12/17 (fls. 38 – id.
206163970 – pág. 1), verifica-se da perícia administrativa realizada pelo INSS em 19/1/18, que
a demandante relatou "Queixa de dores lombares que irradiam para MID, agravadas há 1,5a -
2a. Mora com 2 netas de 23a (gêmeas) - tem a tutela desde pequenas. Já fez tratamento
medicamentoso e fisioterápico, sem melhora e o médico acha que vai precisar operar" (fls. 74 –
id. 206163984 – pág. 6).
Assim, não parece crível que um ano após iniciar suas contribuições ao RGPS, eclodiu a
incapacidade, mormente, em se tratando de patologias ortopédicas que se manifestam quase
que imediatamente, com quadro álgico, sendo encaminhada, inclusive, para avaliação acerca
de submissão a procedimento cirúrgico.
Dessa forma, verifica-se que ao proceder ao ingresso no Regime Geral da Previdência Social –
GPS como contribuinte individual em 1º/1/16, aos 69 anos de idade, apresentava incapacidade
preexistente, impedindo, portanto, a concessão dos benefícios de auxílio doença ou
aposentadoria por invalidez, nos termos do disposto nos arts. 42, § 2º e 59, parágrafo único, da
Lei de Benefícios.
Nesse sentido, merecem destaque os acórdãos abaixo, in verbis:
"PROCESSO CIVIL. AGRAVO LEGAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ. ART. 42, CAPUT E § 2º DA LEI 8.213/91. DOENÇA PREEXISTENTE. BENEFÍCIO
INDEVIDO.
1. Comprovado que a incapacidade para o trabalho é preexistente à filiação do segurado ao
Regime Geral da Previdência Social, bem como que não houve agravamento após a filiação,
não faz jus a parte autora à concessão de aposentadoria por invalidez.
2. Agravo legal desprovido."
(TRF - 3ª Região, Agravo Legal em Apelação Cível nº 2009.03.99.026444-1/SP, 9ª Turma, Rel.
Des. Fed. Lucia Ursaia, j. 26/7/10, v.u., DE 6/8/10).
"PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-
DOENÇA. NÃO PREENCHIDOS OS REQUISITOS LEGAIS. DECISÃO FUNDAMENTADA.
I - É pacífico o entendimento nesta E. Corte, segundo o qual não cabe alterar decisões
proferidas pelo relator, desde que bem fundamentadas e quando não se verificar qualquer
ilegalidade ou abuso de poder que possa gerar dano irreparável ou de difícil reparação.
II - Não merece reparos a decisão recorrida, fundamentando-se no fato de que a autora
apresenta incapacidade preexistente a nova filiação, não havendo comprovação de que a
enfermidade tenha progredido ou agravado, impedindo-a de trabalhar, o que afasta a
concessão dos benefícios pleiteados, nos termos do artigo 42, § 2º, da Lei nº 8.213/91.
III - Deixou de contribuir em 09/1996, voltando a recolher contribuições de 10/2003 a 03/2004. O
perito judicial atesta que a incapacidade teve início há seis anos do laudo pericial de 17/09/07.
IV - O auxílio-doença concedido administrativamente foi cessado, tendo em vista que as
contribuições relativas ao período de 10/2003 a 12/2003 foram recolhidas com atraso, somente
em 30/12/2004.
V - Agravo não provido."
(TRF - 3ª Região, Agravo Legal em Apelação Cível nº 2006.61.24.001574-8, 8ª Turma, Rel.
Des. Fed. Marianina Galante, j. 31/5/10, v.u., DE 28/7/10)
Tendo em vista a improcedência do pedido, faz-se necessária a revogação da tutela de
urgência concedida em sentença, ficando prejudicada a análise do recurso adesivo da parte
autora e do pedido de majoração dos honorários sucumbenciais recursais nas contrarrazões de
apelação.
Arbitro os honorários advocatícios em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade ficará
suspensa, nos termos do art. 98, §3º, do CPC, por ser a parte autora beneficiária da justiça
gratuita.
Por fim, quanto à sujeição da sentença ao duplo grau de jurisdição por ser ilíquida, observo que
líquida é a sentença cujo quantum debeatur pode ser obtido por meros cálculos aritméticos,
sem a necessidade de nova fase de produção de provas ou de atividade cognitiva futura que
venha a complementar o título judicial. Neste sentido, explica Cândido Rangel Dinamarco:
"Liqüidez é o conhecimento da quantidade de bens devidos ao credor. Uma obrigação é líqüida
(a) quando já se encontra perfeitamente determinada a quantidade dos bens que lhe constituem
o objeto ou (b) quando essa quantidade é determinável mediante a realização de meros
cálculos aritméticos, sempre sem a necessidade de buscar elementos ou provas necessárias ao
conhecimento do quantum. O estado de determinação da quantidade de bens devidos resulta
desde logo do título que representa o direito ou mesmo lhe dá origem, ou será atingido
mediante providências inerentes ao incidente de liquidação de sentença (arts. 475-A ss.);
quando o valor de obrigação reconhecida em sentença ou em título extrajudicial é determinável
por mero cálculo, não há iliqüidez nem é necessária liquidação alguma, bastando ao credor a
elaboração da memória de cálculo indicada nos arts. 475-B e 614, inc. II, do Código de
Processo Civil." (Instituições de Direito Processual Civil, vol. IV, 3ª ed., rev. e atual., São
Paulo:Malheiros, 2009, pp. 231/232 e 235, grifos meus)
Inviável, portanto, acolher a interpretação conferida pelo Juízo a quo ao conceito de sentença
ilíquida.
Ademais, impende salientar que o § 3º do art. 496 do CPC, de 2015, dispõe não ser aplicável a
remessa necessária "quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de
valor certo e líquido inferior a: I) 1.000 (mil) salários mínimos para a União e as respectivas
autarquias e fundações de direito público".
No tocante à aplicação imediata do referido dispositivo, peço vênia para transcrever os
ensinamentos do Professor Humberto Theodoro Júnior, na obra "Curso de Direito Processual
Civil", Vol. III, 47ª ed., Editora Forense, in verbis:
"A extinção da remessa necessária faz desaparecer a competência do tribunal de segundo grau
para o reexame da sentença. Incide imediatamente, impedindo o julgamento dos casos
pendentes. É o que se passa com as sentenças condenatórias dentro dos valores ampliados
pelo § 3º do art. 496 do NCPC para supressão do duplo grau obrigatório. Os processos que
versem sobre valores inferiores aos novos limites serão simplesmente devolvidos ao juízo de
primeiro grau, cuja sentença terá se tornado definitiva pelo sistema do novo Código, ainda que
proferida anteriormente à sua vigência." (grifos meus)
Observo que o valor da condenação não excede a 1.000 (um mil) salários mínimos, motivo pelo
qual a R. sentença não está sujeita ao duplo grau obrigatório.
Ante o exposto, dou provimento à apelação do INSS para julgar improcedente o pedido,
revogando-se a tutela de urgência concedida em sentença, não conheço da remessa oficial e
julgo prejudicado o recurso adesivo da parte autora.
É o meu voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE PREEXISTENTE
AO INGRESSO NO REGIME GERAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL (RGPS). CONTRIBUINTE
INDIVIDUAL. PEDIDO IMPROCEDENTE. TUTELA DE URGÊNCIA REVOGADA. REMESSA
OFICIAL. NÃO CONHECIMENTO. RECURSO ADESIVO PREJUDICADO.
I- Os requisitos para a concessão da aposentadoria por invalidez compreendem: a) o
cumprimento do período de carência, quando exigida, prevista no art. 25 da Lei n° 8.213/91; b)
a qualidade de segurado, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios e c) incapacidade definitiva
para o exercício da atividade laborativa. O auxílio doença difere apenas no que tange à
incapacidade, a qual deve ser temporária.
II- O extrato de consulta realizada no "CNIS - Cadastro Nacional de Informações Sociais" da
requerente, juntado pelo INSS, revela a inscrição como contribuinte individual, com
recolhimentos de contribuições no período de 1º/1/16 a 30/4/19. A presente ação foi ajuizada
em 28/3/19.
III- Na perícia médica judicial realizada em 10/8/19, relatou a demandante, acompanhada de
sua neta, que "em 2014 começou a sentir dores na coluna lombar e quadril direito, quando
procurou um médico Ortopedista que realizou exames e iniciou tratamento com medicação e
fisioterapia. Em 2017 as dores pioraram quando se afastou das atividades laborais, porém não
teve reconhecido o pedido de auxilio doença". Afirmou o esculápio encarregado do exame, com
base no exame clínico e análise da documentação médica dos autos, que a autora de 73 anos,
grau de instrução 4ª série do ensino fundamental, e tendo como última atividade exercida a de
vendedora autônoma, "apresenta histórico de Hérnia Discal protrusa no nível L4-L5 com
radiculopatia em membro inferior direito, com sintomatologias álgicas e impotência funcional
importante". Concluiu pela constatação da incapacidade laborativa total e permanente,
estabelecendo o início da incapacidade em 7/6/17, data do exame de ressonância magnética da
coluna lombar.
IV- Cumpre ressaltar que o expert atestou tratar-se de "patologia de caráter osteodegenerativa",
sendo que a autora retificou a qualificação descrita na exordial, de "diarista" para "do lar". Não
obstante toda a documentação médica estar datada de 2017, assim como o requerimento
administrativo formulado em 11/12/17, verifica-se da perícia administrativa realizada pelo INSS
em 19/1/18, que a demandante relatou "Queixa de dores lombares que irradiam para MID,
agravadas há 1,5a -2a. Mora com 2 netas de 23a (gêmeas) - tem a tutela desde pequenas. Já
fez tratamento medicamentoso e fisioterápico, sem melhora e o médico acha que vai precisar
operar".
V- Assim, não parece crível que um ano após iniciar suas contribuições ao RGPS, eclodiu a
incapacidade, mormente, em se tratando de patologias ortopédicas que se manifestam quase
que imediatamente, com quadro álgico, sendo encaminhada, inclusive, para avaliação acerca
de submissão a procedimento cirúrgico.
VI- Dessa forma, verifica-se que ao proceder ao ingresso no Regime Geral da Previdência
Social – GPS como contribuinte individual em 1º/1/16, aos 69 anos de idade, apresentava
incapacidade preexistente, impedindo, portanto, a concessão dos benefícios de auxílio doença
ou aposentadoria por invalidez, nos termos do disposto nos arts. 42, § 2º e 59, parágrafo único,
da Lei de Benefícios.
VII- Tendo em vista a improcedência do pedido, faz-se necessária a revogação da tutela de
urgência concedida em sentença, ficando prejudicada a análise do recurso adesivo da parte
autora e do pedido de majoração dos honorários sucumbenciais recursais nas contrarrazões de
apelação.
VIII- Arbitrados os honorários advocatícios em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade
ficará suspensa, nos termos do art. 98, §3º, do CPC, por ser a parte autora beneficiária da
justiça gratuita.
IX- Quanto à sujeição da sentença ao duplo grau de jurisdição por ser ilíquida, observo que
líquida é a sentença cujo quantum debeatur pode ser obtido por meros cálculos aritméticos,
sem a necessidade de nova fase de produção de provas ou de atividade cognitiva futura que
venha a complementar o título judicial. Inviável, portanto, acolher a interpretação conferida pelo
Juízo a quo ao conceito de sentença ilíquida. Ademais, o valor da condenação não excede a
1.000 (um mil) salários mínimos, motivo pelo qual a R. sentença não está sujeita ao duplo grau
obrigatório.
X- Apelação do INSS provida. Pedido improcedente. Tutela de urgência revogada. Remessa
oficial não conhecida. Recurso adesivo da parte autora prejudicado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação do INSS para julgar improcedente o pedido,
revogando-se a tutela de urgência concedida em sentença, não conhecer da remessa oficial e
julgar prejudicado o recurso adesivo da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
