Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
6203023-52.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
29/04/2021
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 04/05/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE
SEGURADO. NULIDADE DO LAUDO PERICIAL. INSUBSISTÊNCIA DA ALEGAÇÃO.
INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE RECONHECIDA. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- A regra geral prevista no caput do art. 1.012 do Código de Processo Civil, segundo o qual “a
apelação terá efeito suspensivo”, é excepcionada no § 1.º desse mesmo dispositivo legal, cujo
inciso V expressamente determina que, “além de outras hipóteses previstas em lei, começa a
produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que confirma, concede ou
revoga tutela provisória”.
- Insuficiência do inconformismo para gerar dúvidas quanto à integridade do documento médico
produzido.
- Rejeição da matéria preliminar.
- Satisfeitos os requisitos legais previstos no art. 42 da Lei n° 8.213/91 - quais sejam, qualidade
de segurado, incapacidade total e permanente e cumprimento do período de carência (12 meses)
- é de rigor a concessão de aposentadoria por invalidez.
- Necessária a contextualização do indivíduo para a aferição da incapacidade laborativa.
Impossibilidade de exigir a reabilitação de trabalhador com baixo grau de instrução, para atividade
diversa de sua habitual. Incapacidade total e permanente configurada. Precedentes do STJ.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6203023-52.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOANA ILMA NERES BORGES
Advogado do(a) APELADO: LIGIA APARECIDA ROCHA - SP257688-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6203023-52.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOANA ILMA NERES BORGES
Advogado do(a) APELADO: LIGIA APARECIDA ROCHA - SP257688-N
OUTROS PARTICIPANTES:
-R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença,
desde a data de cessação do benefício (17/10/2017).
O juízo a quo julgou procedente o pedido formulado, reconhecendo à parte autora o direito ao
benefício de aposentadoria por invalidez, a partir da data de cessação administrativa
(17/10/2017). Deferida a antecipação dos efeitos da tutela.
O INSS apela, requerendo, preliminarmente, o recebimento do recurso em seu duplo efeito, além
disso, requer a nulidade da sentença e realização de novo exame pericial. No mérito, pleiteia a
reforma da sentença, sustentando, em síntese, o não cumprimento dos requisitos legais à
concessão em questão. Se vencido, requer a aplicação do art. 1.º, “f”, da Lei n.º 9.494/97, a partir
da vigência da Lei n.º 11.960/09 em relação a correção monetária e juros de mora.
Com contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6203023-52.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOANA ILMA NERES BORGES
Advogado do(a) APELADO: LIGIA APARECIDA ROCHA - SP257688-N
OUTROS PARTICIPANTES:
-V O T O
Requer o INSS, em seu recurso de apelação, a concessão do efeito suspensivo, condicionando
eventual implantação de benefício previdenciário após ocorrido o trânsito em julgado.
Não lhe assiste razão.
A alegação veiculada pelo INSS, concernente ao recebimento da apelação no duplo efeito, não
se coloca na hipótese dos autos.
A regra geral prevista no caput do art. 1.012 do Código de Processo Civil, segundo o qual “a
apelação terá efeito suspensivo”, é excepcionada no § 1.º desse mesmo dispositivo legal, cujo
inciso V expressamente determina que, “além de outras hipóteses previstas em lei, começa a
produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que confirma, concede ou
revoga tutela provisória”.
Não impedem, os recursos, a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão em sentido
diverso, "se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou
impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso" (CPC, art.
995, parágrafo único).
Neste caso, em que o recurso é interposto pelo INSS, não há nem urgência nem evidência para
que se conceda o efeito suspensivo. Pelo contrário, a urgência serve à parte autora, já que o
benefício previdenciário é considerado verba alimentar.
Preliminarmente, não procede a alegação de nulidade decorrente do indeferimento do pedido de
realização de novo laudo médico pericial.
É notório que a incapacidade laborativa deva ser provada por laudo de perito médico.
O médico nomeado pelo juízo possui habilitação técnica para proceder ao exame pericial da parte
requerente, de acordo com a legislação em vigência, que regulamenta o exercício da medicina,
não sendo necessária a especialização para o diagnóstico de doenças ou para a realização de
perícias.
Neste processo, o laudo foi produzido por médico de confiança do juízo, que fez a devida
anamnese da pericianda e respondeu a todos os quesitos do juízo e das partes.
Além disso, conforme informou no laudo, foram analisados todos os exames e atestados médicos
apresentados.
A perícia revelou-se suficiente para a formação do convencimento do juízo, revelando, a
insurgência da parte autora, inconformismo insuficiente para gerar dúvidas quanto à integridade
do documento médico produzido.
Eventual contradição entre o laudo pericial e os atestados médicos apresentados pela parte não
pode motivar a nulidade de um ou outro documento médico.
Rejeita-se, portanto, a preliminar em questão.
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E DO AUXÍLIO-DOENÇA A TRABALHADOR RURAL
Os requisitos da aposentadoria por invalidez encontram-se preceituados nos arts. 42 e seguintes
da Lei n.° 8.213/91, consistindo, mais precisamente, na presença da qualidade de segurado, na
existência de incapacidade total e permanente para o trabalho e na ocorrência do cumprimento
da carência, quando exigida.
O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos art. 59 e seguintes do
mesmo diploma legal, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
Excepcionalmente, com base em entendimento jurisprudencial consolidado, admite-se a
concessão de tais benefícios mediante comprovação pericial de incapacidade parcial e definitiva
para o desempenho da atividade laborativa, que seja incompatível com a ocupação habitual do
requerente e que implique em limitações tais que restrinjam sobremaneira a possibilidade de
recolocação no mercado de trabalho, diante das profissões que exerceu durante sua vida
profissional (STJ: AgRg no AREsp 36.281/MS, rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, 6.ª Turma,
DJe de 01/03/2013; e AgRg no AREsp 136474/MG, rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA
FILHO, 1.ª Turma, DJe de 29/06/2012).
Em casos específicos, em que demonstrada a necessidade de assistência permanente de outra
pessoa, possível, ainda, com base no art. 45 da Lei de Benefícios, o acréscimo de 25% ao valor
da aposentadoria por invalidez porventura concedida.
No tocante ao requisito da qualidade de segurado, cumpre reconhecer, nos termos do art. 11,
inciso I, da Lei n.º 8.213/91, e considerando as particularidades do labor campesino, que o
trabalhador rural que exerce sua atividade com subordinação e habitualidade, ainda que de forma
descontínua, é qualificado como empregado.
Esse, inclusive, é o tratamento dispensado pelo próprio INSS, que, na Instrução Normativa
INSS/DC nº 118, de 14.04.2005, considera como segurado, na categoria de empregado, o
trabalhador volante.
Por outro lado, para a obtenção de benefícios previdenciários, se faz necessária a comprovação
da atividade no campo e, consequentemente, o vínculo de segurado.
Em tal sentido, a interpretação do § 3.º do art. 55, c/c o art. 106, ambos da Lei n.º 8.213/91,
admite a comprovação de tempo de serviço em atividade rural, desde que baseada em início de
prova documental, sendo vedada a prova exclusivamente testemunhal.
Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência (art. 26, inciso III), como o dever de
verter contribuição por determinado número de meses.
Vale dizer: em relação às contribuições previdenciárias, é assente, desde sempre, o
entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de
atividade no meio rural (STJ, REsp n.º 207.425, 5.ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de
25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5.ª Turma, j. em
14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).
Essa comprovação do labor rural, nos termos dos arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios, dar-se-á
por meio de prova documental, ainda que incipiente, e, nos termos do art. 55, § 3.º, da retrocitada
Lei, corroborada por prova testemunhal.
Acrescente-se que a jurisprudência de longa data vem atentando para a necessidade dessa
conjunção de elementos probatórios (início de prova documental e colheita de prova
testemunhal), o que resultou até mesmo na edição do verbete n.º 149 da Súmula da
Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:”
"A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito
de obtenção do benefício previdenciário".
DO CASO DOS AUTOS (PROVAS DA QUALIDADE DE SEGURADO DE TRABALHADOR
RURAL)
Objetivando comprovar a qualidade de segurada, a autora juntou documentos e elencou
testemunhas a serem ouvidas.
No que concerne ao trabalho rural, foram apresentados os seguintes documentos: laudo de
vistoria prévia para comprovação de residência e atividade rural, que consta o nome da autora
como lavradora e o trabalho pastoril iniciado em 1996, datado de 8/1/2018 (Id. 107861601),
atestado de que a autora é beneficiária do projeto de assentamento Yapinary desde 15/8/1996
(Id. 107861602).
Além disso, procedeu-se a oitiva da testemunha Solange Cândido de Araújo que afirmou que
conhece a autora há mais de 15 anos, residem no mesmo assentamento, que na propriedade da
autora possuem gado e tiram leite, que a autor não faz mais esta tarefa porque teve um problema
no braço, relatou que em razão dos problemas de saúde a autora não trabalho desde 2010 ou
2011. A testemunha Marlene Moura da Silva aduziu que conhece autora há 23 anos, que a
conheceu no assentamento onde residem, que a requerente trabalhava tirando leite e em lavoura,
trabalhou por muito tempo sozinha nessas atividades, atualmente não trabalha mais por não ter
condições de saúde, encerrou suas atividades laborais acerca de cinco anos. Por fim, a
testemunha Maria Neusa Dias Costa relatou que conhece a autora há aproximadamente 23 anos,
à época ela já trabalhava na roça, residem no mesmo assentamento, a requerente e o marido
plantavam feijão, de tudo um pouco, os filhos ajudavam e toda família reside no local.
Assim, tornam-se desnecessárias maiores considerações a respeito desse requisito, restando
demonstrada a inocorrência da perda da qualidade de segurada, nos termos do art. 15, inciso II,
da Lei n.º 8.213/91, e tendo em vista o ajuizamento da ação em 21/3/2018.
O requerimento administrativo foi apresentado em 15/9/2017 (Id. 107861607).
Demonstrou, outrossim, ter atendido à exigência legal de recolhimento de 12 contribuições
previdenciárias para ensejar direito à aposentadoria por invalidez (art. 25 da Lei n.° 8.213/91).
No concernente à incapacidade, a perícia médica concluiu ser a apelada portadora de neoplasia
maligna da mama direita (CID C50), com realização de cirurgia, radioterapia e quimioterapia, em
acompanhamento ambulatorial. Considerou-a incapacitada para o trabalho de forma parcial e
permanente, desde 2015 (Id. 107861626).
A requerente acostou atestados médicos indicando a realização de acompanhamento em razão
do diagnóstico CID C50, estágio II, datados de 2/3/2018 e 16/6/2017 (Id. 107861603), biopsia da
mama direita indicando carcinoma mamário infiltrante tipo não especial moderadamente
diferenciado (diferenciação tubular 2, grau histológico) e segundo Scarff-Richardson e Bloon
modificado por Elston e Ellis, datado de 30/11/2015 (fl. 1, Id. 107861604) e raio-x mamografia
indicando laudo médico mamas assimétricas, maior a direita, de morfologia e contornos
regulares, com pele fina, lisa e sem alterações, datado de 4/6/2010 (fl. 1, Id. 107861604).
Não obstante a incapacidade se restrinja às atividades que demandem esforço físico,
considerando a idade do autor (60 anos), as limitações que as patologias lhe impõem são
grandes e restringem, em muito, a possibilidade de recolocação no mercado de trabalho, diante
da profissão de trabalhadora rural que sempre exerceu.
Desse modo, o conjunto probatório restou suficiente à concessão de aposentadoria por invalidez.
Quer seja em relação aos juros moratórios, devidos a partir da citação, momento em que
constituído o réu em mora; quer seja no tocante à correção monetária, incidente desde a data do
vencimento de cada prestação, há que prevalecer tanto o decidido, sob a sistemática da
repercussão geral, no Recurso Extraordinário n.º 870.947, de 20/9/2017, sob relatoria do Ministro
Luiz Fux, quanto o estabelecido no Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos na
Justiça Federal, em vigor por ocasião da execução do julgado, observada a rejeição dos
embargos de declaração no âmbito do julgamento em epígrafe, em 03/10/2019.
PREQUESTIONAMENTO
Quanto ao prequestionamento suscitado, inexiste contrariedade alguma à legislação federal ou a
dispostos constitucionais.
Posto isso, rejeito a matéria preliminar e nego provimento à apelação.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE
SEGURADO. NULIDADE DO LAUDO PERICIAL. INSUBSISTÊNCIA DA ALEGAÇÃO.
INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE RECONHECIDA. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- A regra geral prevista no caput do art. 1.012 do Código de Processo Civil, segundo o qual “a
apelação terá efeito suspensivo”, é excepcionada no § 1.º desse mesmo dispositivo legal, cujo
inciso V expressamente determina que, “além de outras hipóteses previstas em lei, começa a
produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que confirma, concede ou
revoga tutela provisória”.
- Insuficiência do inconformismo para gerar dúvidas quanto à integridade do documento médico
produzido.
- Rejeição da matéria preliminar.
- Satisfeitos os requisitos legais previstos no art. 42 da Lei n° 8.213/91 - quais sejam, qualidade
de segurado, incapacidade total e permanente e cumprimento do período de carência (12 meses)
- é de rigor a concessão de aposentadoria por invalidez.
- Necessária a contextualização do indivíduo para a aferição da incapacidade laborativa.
Impossibilidade de exigir a reabilitação de trabalhador com baixo grau de instrução, para atividade
diversa de sua habitual. Incapacidade total e permanente configurada. Precedentes do STJ.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e negar provimento à apelação, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
