Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
6211261-60.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
04/06/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 08/06/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA.FILIAÇÃO
COM INCAPACIDADE LABORAL PREEXISTENTE. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
INVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA.
- São requisitos para a concessão de benefícios por incapacidade: a qualidade de segurado, a
carência de doze contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de
forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que
garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-
doença), bem como a demonstração de que o segurado não era portador da alegada
enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social.
- À luz do artigo 42, § 2º da Lei 8.213/1991, a filiação do segurado ou seu retorno ao sistema
previdenciáriocom incapacidade laboral preexistente impede a concessão de aposentadoria por
invalidez.
- Inversão da sucumbência. Condenação daparte autora ao pagamento das custas processuais e
honorários de advogado, com a majoração decorrente da fase recursal, conforme critérios do
artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do Código de Processo Civil,suspensa, porém, a exigibilidade,
na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo estatuto processual, por tratar-se de beneficiária da justiça
gratuita.
- Apelação provida.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6211261-60.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IVANIDES MARQUES DA SILVA
Advogados do(a) APELADO: MAIBI MONTEIRO MARQUES MORA - SP362302-N, LUIZ PAULO
DE ARRUDA - SP358258-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6211261-60.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IVANIDES MARQUES DA SILVA
Advogados do(a) APELADO: MAIBI MONTEIRO MARQUES MORA - SP362302-N, LUIZ PAULO
DE ARRUDA - SP358258-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Exma. Sra. DesembargadoraFederal Daldice Santana: cuida-se de apelaçãointerpostaem face
da sentença, não submetida a reexame necessário, que julgou procedente o pedido de
aposentadoria por invalidez, desde o requerimento administrativo,discriminados os consectários
legais.
A autarquia previdenciária sustenta a preexistência das doenças em relação ao ingresso da parte
autora ao sistema previdenciárioe requer seja integralmentereformadoo julgado.
Subsidiariamente, impugna os critérios de incidência da correção monetária e dos juros de mora,
além dos honorários de advogado.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6211261-60.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IVANIDES MARQUES DA SILVA
Advogados do(a) APELADO: MAIBI MONTEIRO MARQUES MORA - SP362302-N, LUIZ PAULO
DE ARRUDA - SP358258-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana:conheço do recurso, em razão da
satisfação de seusrequisitos.
Discute-se nos autos o direito da parte autora a benefício por incapacidade.
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da
Seguridade Social, especialmente no artigo 201, I, da Constituição Federal (CF/1988), com a
redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/1998, que tem o seguinte teor:
“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter
contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e
atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e
idade avançada (...)”.
Já a Lei n. 8.213/1991, aplicando o princípio da distributividade (artigo 194, parágrafo único, III, da
CF/1988), estabelece as condições para a concessão desse tipo de benefício.
Aaposentadoria por invalidez, segundo a dicção do artigo 42 da Lei n. 8.213/1991, é devida ao
segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o
trabalho, de forma omniprofissional, e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade
que lhe garanta a subsistência.
Oauxílio-doençaé devido a quem ficar temporariamente incapacitado, à luz do disposto no artigo
59 da mesma lei, mas a incapacidade se refere "não para quaisquer atividades laborativas, mas
para aquela exercida pelo segurado (sua atividade habitual)" (Direito da Seguridade Social,
Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen, Livraria do Advogado e Esmafe, Porto Alegre, 2005,
p. 128).
Assim, o evento determinante para a concessão desses benefícios é aincapacidade para o
trabalho.
São requisitos para a concessão desses benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze
contribuições mensais, quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a
demonstração de que o segurado não estava previamente incapacitado ao filiar-se ao Regime
Geral da Previdência Social.
Caso reconhecida a incapacidade apenasparcialpara o trabalho, o juiz deve analisar as condições
pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez ou de auxílio-
doença. Pode, ainda, conceder auxílio-acidente, na forma do artigo 86 da Lei n. 8.213/1991, se a
parcial incapacidade decorre de acidente de trabalho, ou de qualquer natureza, ou ainda de
doença profissional ou do trabalho (artigo 20, I e II, da mesma lei).
O reconhecimento da incapacidade, total ou parcial, depende da realização de perícia médica,
por perito nomeado pelo Juízo, nos termos do Código de Processo Civil (CPC). Contudo, o juiz
não está adstrito unicamente às suas conclusões, podendo valer-se de outros elementos
pessoais, profissionais ou sociais para a formação de sua convicção, desde que constantes dos
autos.
Alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização (TNU) são pertinentes a esse tema:
Súmula 33 da TNU:Quando o segurado houver preenchido os requisitos legais para a concessão
da aposentadoria por tempo de serviço na data do requerimento administrativo, esta data será o
termo inicial da concessão do benefício.
Súmula 47 da TNU:Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve
analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por
invalidez.
Súmula 53 da TNU:Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a
incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de
Previdência Social.
Súmula 77 da TNU:O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando
não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual.
No caso dos autos, a perícia médica judicial, realizada no dia 27/6/2019, constatou a
incapacidadepermanente da parte autora (nascida em 1947, qualificada no laudo como serviços
gerais) para atividades laborais com esforços físicos, por ser portadora de"má formação em
coronarianas, hipotireoidismo, hipertensão arterial e processo degenerativo osteoarticular".
O perito não fixou a data de início da incapacidade laboral (DII) e esclareceu: "Autora já medicada
e em acompanhamento cardiológico. Não há previsão para tratamento cirúrgico, Autora não
apresenta sintomas em uso de medicação e abstendo-se de esforços físicos".
Lembro, por oportuno, que o magistrado não está adstrito ao laudo pericial.
A parte autora não faz jus ao benefício por um motivo bastante preciso. Elapassou toda a idade
laborativa sem jamais contribuir para a previdência social,exercendo seus ofícios na
informalidade, sem recolher contribuições, e só se filiou quando já estava envelhecida e
fisicamente incapaz para o trabalho remunerado.
A autora filiou-se ao sistema previdenciário somente em julho de 2015 (vide Cadastro Nacional de
Informações Sociais - CNIS), como contribuinte individual, já desgastada pela idade e doenças
físicas apontadas no laudo, e por breve período, até março de 2018, antes de apresentar o
requerimento administrativo do benefício em 19/6/2018.
Ocorre que, não obstante o perito não tenhafixado a data de início da incapacidade laboral da
autora, os demais elementos de prova demonstram que a autora já estava incapacitada para o
trabalho muito antes de ingressarao sistema previdenciário, em julho de 2015, quando já
portadora da doenças apontadas no laudo.
O laudo de exame cardiológico realizado em 22/2/2016 já revelavaa doença da autora,
sendoevidente que os documentos médicos mais antigos da parte autoranãoforam fornecidos ao
perito, como costuma ocorrer em casos como esses.
Entendo que se afigura indevida a concessão de benefício nestas circunstâncias, por ter sido
constatada a presença de incapacidade preexistente àfiliação.
Não é possível conceder benefício previdenciário a quem se filia à previdência social quando não
mais consegue trabalhar ou mesmo em vias de se tornar inválido.
Infelizmente, esse tipo de artifício - filiar-se o segurado à previdência social quando já
incapacitado - está se tornando comum.
Seja como for, independentemente das conclusões do perito, esse tipo de proceder não pode
contar com a complacência do Poder Judiciário porque implica burla às regras previdenciárias.
In casu, não há dúvidas de que se aplica a esta demanda o disposto no artigo 42, § 2º, da Lei n.
8.213/1991, por tratar-se de incapacidade preexistente.
Nesse sentido estão os seguintes precedentes:
"AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ART. 42, §
2º, DA LEI Nº 8.213/1991. DOENÇA PREEXISTENTE À FILIAÇÃO AO REGIME GERAL DE
PREVIDÊNCIA SOCIAL. REEXAME DO CONJUNTO PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ.
1. Demonstrado nos autos, que a incapacidade laboral é anterior à filiação ao Regime Geral de
Previdência Social, não faz jus o segurado à aposentadoria por invalidez, conforme o artigo 42, §
2º da Lei 8.213/1991.
2. Rever o entendimento do Tribunal de origem quanto a existência da incapacidade laborativa do
autor, antes mesmo de sua filiação junto ao Regime Geral de Previdência Social - RGPS,
demandaria o reexame do conjunto fático-probatório, providência sabidamente incompatível com
a via estreita do recurso especial. (Súmula nº 7/STJ).
3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ, AgRg no Ag 1329970 / SP AGRAVO
REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 2010/0132461-4 Relator(a) Ministro MARCO
AURÉLIO BELLIZZE (1150) Órgão Julgador T5 - QUINTA TURMA Data do Julgamento
17/04/2012 Data da Publicação/Fonte DJe 31/05/2012)
"PREVIDENCIÁRIO - AGRAVO LEGAL - APOSENTADORIA POR INVALIDEZ - AUXÍLIO
DOENÇA - PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADA - OCORRÊNCIA - DOENÇA PRÉ-
EXISTENTE I. Para concessão de aposentadoria por invalidez é necessário comprovar a
condição de segurado, o cumprimento da carência, salvo quando dispensada, e a incapacidade
total e permanente para o trabalho. O auxílio-doença tem os mesmos requisitos, ressalvando-se a
incapacidade, que deve ser total e temporária. II. Considerando que as patologias diagnosticadas
são de caráter crônico e degenerativo, restou evidenciado que, ao ingressar ao Regime Geral da
Previdência Social, na qualidade de contribuinte facultativo, no período de 01/07/2003 a 06/2004,
a autora já estava incapacitada. III. Considerando a data da incapacidade fixada nos autos
(meados de 08/2008), e a última contribuição vertida pela autora (09/06/2004 - 06/2004), teria
sido consumada a perda da qualidade de segurada, conforme disposto no art. 15, II, e §4°, da Lei
8.213/91, uma vez que também não houve o recolhimento das quatro contribuições necessárias,
após tal perda, nos termos do art. 24, par. único, da LBPS. IV. Agravo legal improvido.” (AC -
APELAÇÃO CÍVEL - 1056095 Processo: 0039855-64.2005.4.03.9999 UF: SP Órgão Julgador:
NONA TURMA Data do Julgamento: 03/10/2011 Fonte: DJF3 CJ1 DATA:17/10/2011 Relator:
DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS)
Manifestada a incapacidade prévia à filiação, já iniciada com premeditação ao requerimento de
concessão de benefício, irrelevante será eventual agravamento do quadro clínico.
A solidariedade legal tem via dupla: todos devem contribuir para a previdência social, quando
exercem atividade de filiação obrigatória, para que todos os necessitados filiados obtenham a
proteção previdenciária.
Ademais, é importante destacar, quando a parte autora voltou a efetuar recolhimentos à
previdência social, já tinhaidade avançada, esta constituindo um dos eventos geradores de
benefício previdenciário, à luz da Constituição Federal (artigo 201, I) e da Lei n. 8.213/1991.
Ocorre que, para perceber aposentadoria por idade, é preciso recolher 180 (cento e oitenta)
contribuições, a teor do disposto no artigo 25, II, da Lei n. 8.213/1991.
Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de
advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre a mesma base de cálculo fixada na
sentença, já majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I,
e 4º, III, do CPC, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo
estatuto processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto,dou provimentoà apelação para julgar improcedente o pedido.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA.FILIAÇÃO
COM INCAPACIDADE LABORAL PREEXISTENTE. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
INVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA.
- São requisitos para a concessão de benefícios por incapacidade: a qualidade de segurado, a
carência de doze contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de
forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que
garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-
doença), bem como a demonstração de que o segurado não era portador da alegada
enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social.
- À luz do artigo 42, § 2º da Lei 8.213/1991, a filiação do segurado ou seu retorno ao sistema
previdenciáriocom incapacidade laboral preexistente impede a concessão de aposentadoria por
invalidez.
- Inversão da sucumbência. Condenação daparte autora ao pagamento das custas processuais e
honorários de advogado, com a majoração decorrente da fase recursal, conforme critérios do
artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do Código de Processo Civil,suspensa, porém, a exigibilidade,
na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo estatuto processual, por tratar-se de beneficiária da justiça
gratuita.
- Apelação provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
