
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0040285-30.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LOURDES TREVIZAN SANGALLI
Advogado do(a) APELADO: LUIS HENRIQUE LIMA NEGRO - SP209649-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0040285-30.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LOURDES TREVIZAN SANGALLI
Advogado do(a) APELADO: LUIS HENRIQUE LIMA NEGRO - SP209649-N
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício previdenciário de auxílio-doença, com eventual conversão em aposentadoria por invalidez.
A sentença prolatada em 01/07/2016 julgou procedente o pedido, para condenar o INSS a conceder o benefício de aposentadoria por invalidez à parte autora a partir do requerimento administrativo, 02/12/2015, com o pagamento dos valores em atraso acrescidos de correção monetária e juros moratórios segundo o Manual de Cálculos da Justiça Federal, além de honorários de advogado, fixados em 10% (dez por cento) das prestações vencidas até a sentença. Concedida a antecipação de tutela. Sentença não submetida a remessa necessária.
Apela o INSS, pugnando seja a sentença submetida a reexame necessário. No mérito, alega a pré-existência da incapacidade ao ingresso da autora ao RGPS, considerando ter se filiado ao sistema em idade avançada, na condição de contribuinte individual, além de possuir histórico contributivo de poucas contribuições. Pede seja a autora condenada por litigância de má-fé ao omitir do Juízo documentos médicos contemporâneos ao início das patologias. Por fim, pede a incidência da correção monetária e dos juros moratórios nos termos do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação da Lei nº 11.960/09 e a fixação da verba honorária no patamar mínimo.
Com contrarrazões.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0040285-30.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LOURDES TREVIZAN SANGALLI
Advogado do(a) APELADO: LUIS HENRIQUE LIMA NEGRO - SP209649-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo termo inicial do benefício (02/12/2015), seu valor aproximado e a data da sentença (01/07/2016), que o valor total da condenação é inferior à importância de 1.000 (mil) salários mínimos estabelecida no inciso I do § 3º do artigo 496 do Código de Processo Civil/2015.
Assim, é nítida a inadmissibilidade, na hipótese em tela, da remessa necessária.
O artigo 42 da Lei nº 8.213/91 estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da mesma lei, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
A condição de segurado (obrigatório ou facultativo), requisito para a concessão dos benefícios por incapacidade, decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes.
No caso dos autos, a sentença foi no sentido da procedência do pedido inicial com base na conclusão do perito judicial afirmando a existência de incapacidade total e permanente para o trabalho, bem como da observância do cumprimento dos demais requisitos para a concessão do benefício de auxílio doença, nos termos seguintes:
"(...) No que concerne à incapacidade, o laudo pericial concluiu que a autora é portadora de cervicalgia ( M54.2), labirintite (H83.0), Hipertensão arterial ( I.10).
As patologias atestadas no laudo pericial são degenerativas e progressivas (item c - fls. 42), causaram a incapacidade da autora de forma que se restringe a atividade habitualmente exercida, ou seja, multiprofissional (item f - fls. 42/43) e segundo o perito judicial a autora não está sujeira a reabilitação profissional (Item 1 0 fl. 44).
Conforme o expert perito judicial constatou, a incapacidade que acomete a autora é total e permanente (item 4 - fl. 43), tornando a requerente incapaz para a atividade laboral que exercia.
(...omissis,,,)
Portanto, por se tratar de um trauma permanente e absoluto, nas condições da autora, sem possibilidade de reabilitação ou tratamento para melhora do quadro, faz jus a receber o benefício de aposentadoria porinvalidez.
Segundo a perícia, a incapacidade da autora teve início em outobro de 2015 (Item i - fl. 43), época em que a autora mantinha sua qualidade de segurado.
Assim, a autora tem direito à concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, cujo valor consistirá em 100% (cem por cento) do salário de benefício, calculado nos termos do artigo 33, da Lei nº 8.213/91. O pagamento contará desde a data do requerimento administrativo (02/12/2015, fl. 23). (...)
Em que pesem os fundamentos adotados pelo MM. Juiz sentenciante, entendo que, embora a existência de incapacidade seja incontroversa, o conjunto probatório acostado aos autos não é apto a demonstrar que teve seu início após a aquisição da qualidade de segurado.
Consta do laudo da perícia médica judicial acostado às fls. 138/150 - ID 99415204, elaborado em 16/07/2014, que a autora, então com 51 anos de idade, afirmou a incapacidade total e permanente para a atividade de cabeleireira, por se encontrar acometida de gonartrose primária bilateral e síndrome do manguito rotador, fixando o laudo como data de início da doença e a data de início da incapacidade em abril de 2014.
Porém, observa-se do conjunto probatório que a incapacidade da parte autora deriva de patologia de natureza crônico degenerativa, evidentemente preexistente à sua refiliação ao RGPS, o que impossibilita a concessão do benefício.
Com efeito, as normas dos §1º do artigo 42 e do parágrafo único do artigo art. 59, ambos da Lei nº 8.213/91, prevêem que o segurado não fará jus aos benefícios de aposentadoria por invalidez ou auxílio doença, respectivamente, na hipótese da doença ou lesão invocada como causa da incapacidade for preexistente à sua filiação/refiliação ao Regime Geral de Previdência Social, exceto se sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa patologia.
Em consulta ao CNIS, verifica-se que a parte autora, nascida em 12/01/1937, se filiou ao RGPS, como contribuinte individual, em 01/09/2010, aos 73 anos de idade, efetuando, desde então, contribuições descontínuas (10/2010, 12/2010, 02/2011, 04/2011, 06/2011, 08/2011, 06/2013, 07/2013, 10/2013, 10/2014, 11/2014, 01/2015, 03/2015, 05/2015, 07/2015, 09/2015.
A petição inicial foi instruída apenas com documentos médicos contemporâneos ao requerimento, como verifica dos atestados médicos e exames datados de 2015, segundo os quais apresenta diagnóstico de espondilodiscartrose cervical,com quadro de dor em coluna cervical e lombar.
No laudo da perícia médica (fls. 38 - ID 89625566), exame ocorrido em 28/04/2016, a autora, aos 79 anos de idade, apresentou quadro de cervicalgia, labirintite e hipertensão arterial, consignando expressamente se tratar de doenças degenerativas e progressivas, resultantes da senilidade e sem cura, concluindo pela incapacidade total e permanente para as atividades laborais.
Não socorrem à parte autora as exceções legais de progressão ou agravamento da doença, considerando que se refiliou ao RGPS já em idade avançada, na qualidade de contribuinte individual, vindo a requerer o benefício após breve período de contribuição, o que corrobora a preexistência da própria incapacidade.
Por certo que a doença ou invalidez são contingências futuras e incertas, todavia, as doenças degenerativas, evolutivas, próprias do envelhecer devem ser analisadas com parcimônia, já que filiações extemporâneas e reingressos tardios afrontam a lógica do sistema, causando desequilíbrio financeiro e atuarial.
In casu, tratando-se de doença preexistente à filiação ao RGPS, inviável a concessão da aposentadoria por invalidez / auxílio doença, sendo de rigor a reforma da sentença.
Por fim, inviável o acolhimento do pedido de condenação da autora como litigante de má-fé.
A litigância de má-fé foi presumida pela parte ré tão somente pela postulação em juízo de benefício tido por indevido, sem que fosse comprovada a utilização de expedientes processuais desleais, desonestos e procrastinatórios visando o êxito na demanda a qualquer custo, mas tão-somente agiu de forma a obter uma prestação jurisdicional favorável.
Nesse sentido, confira-se os julgados: TRF3, AC 0039745-79.2016.4.03.9999/SP, OITAVA TURMA, Relatora Des. Fed. TANIA MARANGONI, julgamento: 06.03.2017, e-DJF3 Judicial 1: 20.03.2017, TRF 3ª Região - AI 314450 - Relator Desembargador Fausto de Sanctis, Sétima Turma, j. 22.04.2013, e-DJF3 02.05.2013, STJ, RESP nº 334259; Rel. Min. Castro Filho; 3ª Turma; DJ 10.03.2003, p. 0185.
Assim, ante a ausência de prova satisfatória da existência do dano à parte contrária e da configuração de conduta dolosa, não restou caracterizada a litigância de má-fé.
Inverto o ônus da sucumbência e condeno a parte autora ao pagamento de honorários de advogado, que ora fixo em 10% (dez por cento) do valor da causa atualizado, de acordo com o §6º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
Revogo a antecipação de tutela anteriormente concedida. A questão referente à eventual devolução dos valores recebidos a este título deverá ser analisada e decidida em sede de execução, nos termos do artigo 302, I, e parágrafo único, do CPC/2015, e de acordo com o que restar decidido no julgamento do Tema 692, pelo C. Superior Tribunal de Justiça.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação do INSS, para julgar improcedente o pedido formulado na inicial, restando prejudicado o apelo da autora.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE PREEXISTENTE À REAQUISIÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO. LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ. DOLO PROCESSUAL PRESUMIDO. IMPOSSIBILIDADE.INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA.
1. Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que, após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (art. 25, I), sejam acometidos por incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso de aposentadoria por invalidez (art. 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio-doença (art. 59).
2. Para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência, quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.
3. Preexistência da incapacidade ao ingresso no RGPS. A autora padece de doenças crônico/degenerativas, de caráter evolutivo, comumente consolidadas com o passar dos anos, pelo que forçoso concluir que a doença já se manifestara quando da filiação.
4. A doença ou invalidez são contingências futuras e incertas, todavia, as doenças degenerativas, evolutivas, próprias do envelhecer devem ser analisadas com parcimônia, já que filiações extemporâneas e reingressos tardios afrontam a lógica do sistema, causando desequilíbrio financeiro e atuarial.
5. Se é certo que a filiação a qualquer tempo não é vedada, também é correto afirmar que a aposentadoria por invalidez não pode se dar por moléstia já existente quando dessa filiação.
6. Reputa-se litigante de má-fé aquele que, no processo, age de forma dolosa ou culposa, de forma a causar prejuízo à parte contrária.
7. O autor não se utilizou de expedientes processuais desleais, desonestos e procrastinatórios visando à vitória na demanda a qualquer custo, mas tão-somente agiu de forma a obter uma prestação jurisdicional favorável. Litigância de má-fé presumida pelo juízo a quo. Impossibilidade. Precedentes.
8. Ausência de prova satisfatória da existência do dano à parte contrária e da configuração de conduta dolosa. Litigância de má fé não caracterizada.
9. Inversão do ônus da sucumbência. Exigibilidade dos honorários condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015. Tutela revogada.
10. Apelo do INSS provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
