
| D.E. Publicado em 20/06/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, em consonância com o art. 1.013, § 1°, do CPC/2015, DAR PROVIMENTO à Apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003937-13.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Senhor Desembargador Federal Fausto De Sanctis:
Trata-se de Apelação interposta pelo autor Alberto Soares de Sousa (fls. 309-318) em face da r. Sentença (fls. 303-305) que julgou improcedente o pedido de restabelecimento de auxílio doença e/ou concessão de aposentadoria por invalidez, a partir da data da cessação administrativa do auxílio doença (20.10.2010). Condenou a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como de honorários advocatícios arbitrados em R$ 300,00, com observância do art. 12 da Lei n° 1.060/50.
Em seu recurso, a parte autora pugna pela reforma da r. Sentença, sob fundamento de que os documentos juntados aos autos e a análise das condições clínicas e sociais da parte autora comprovam a incapacidade laborativa para fazer jus ao benefício de aposentadoria por invalidez.
Subiram os autos a esta Eg. Corte, com as contrarrazões (fls. 330-331).
É o relatório.
VOTO
O Senhor Desembargador Federal Fausto De Sanctis:
Sem preliminares, passo a análise do mérito.
Cumpre, primeiramente, apresentar o embasamento legal relativo aos benefícios previdenciários concedidos em decorrência de incapacidade para o trabalho.
Nos casos em que está configurada uma incapacidade laboral de índole total e permanente, o segurado faz jus à percepção da aposentadoria por invalidez. Trata-se de benefício previsto nos artigos 42 a 47, todos da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Além da incapacidade plena e definitiva, os dispositivos em questão exigem o cumprimento de outros requisitos, quais sejam: a) cumprimento da carência mínima de doze meses para obtenção do benefício, à exceção das hipóteses previstas no artigo 151 da lei em epígrafe; b) qualidade de segurado da Previdência Social à época do início da incapacidade ou, então, a demonstração de que deixou de contribuir ao RGPS em decorrência dos problemas de saúde que o incapacitaram.
É possível, outrossim, que a incapacidade verificada seja de índole temporária e/ou parcial, hipóteses em que descabe a concessão da aposentadoria por invalidez, mas permite seja o autor beneficiado com o auxílio-doença (artigos 59 a 62, todos da Lei nº 8.213/1991). A fruição do benefício em questão perdurará enquanto se mantiver referido quadro incapacitante ou até que o segurado seja reabilitado para exercer outra atividade profissional.
Destacados os artigos que disciplinam os benefícios em epígrafe, passo a analisar a questão dos requisitos mencionados, no caso concreto.
No presente caso, a parte autora comprova a carência de 12 (doze) contribuições mensais, nos termos do disposto no art. 25, inciso I, da Lei nº 8.213, de 24.07.1991.
A teor do art. 15, I, da Lei nº 8.213/1991, mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições, e sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício.
Na espécie, conforme os dados constantes nos autos e pesquisa CNIS, verifico que a parte autora exerceu atividade laborativa como empresário/empregador no período de 01.1985 a 07.1987, de 09.1987 a 01.1988, de 05.1989 a 08.1989 e de 04.1991 a 12.1991, possui vínculos empregatícios, com início em 01.1999 a 06.2004, em 07.2007 e de 10.2011 a 08.2012, e gozou administrativamente do benefício de auxílio doença nos períodos de 04.08.2004 a 09.08.2008, de 16.09.2008 a 20.10.2010 e de 06.11.2011 a 31.08.2012 (HISCREWEB), que lhe garantiu a qualidade de segurado até 15.10.2013, nos termos do art. 15, II, § 4° da Lei n° 8.213/91.
Portanto, observa-se que na data da propositura da ação (19.04.2012 - contracapa) a parte autora detinha a qualidade de segurado. Ademais, considerando a indevida cessação administrativa do auxílio doença (20.10.2010 - CNIS), conforme se verá a seguir, não há que se falar em perda da qualidade de segurado.
Com respeito à incapacidade profissional, o laudo pericial (fls. 220-227 e 289-290), na perícia realizada em 27.03.2014, afirma que a parte autora é portadora de fratura anterior de fêmur e varizes. Ressalta que pode ser verificado melhora do quadro no resultado de exame de radiologia que comprova que a fratura se encontra alinhada após a cirurgia, não apresentando, ao exame físico, incapacidade, limitações, sequela ou redução da capacidade laboral (fl. 224). Afirma, categoricamente, nos esclarecimentos da conclusão pericial (fl. 290), que a insuficiência vascular não incapacita a parte autora, asseverando que, caso contrário, todo paciente que tiver varizes na perna e insuficiência vascular estaria inapto ao trabalho. Relata que o paciente portador de varizes deve evitar ortostatismo, ou seja, ficar parado por tempo prolongado, destacando que determinadas atividades são úteis para evitar agravamento. No tocante à patologia câncer de pele, relata que o autor foi submetido a diversas cirurgias, podendo verificar no resultado de todas as biópsias que o procedimento foi excelente e que retirou totalmente o câncer, não necessitando de mais tratamento para a doença. Afirma não haver limitação para o labor em relação à referida afecção, ressaltando ser necessário apenas serem adotadas medidas de segurança, como proteção contra radiação solar. Por fim, destaca a possibilidade do exercício laboral pelo autor em atividades que não o exponha ao sol, ratificando que não existem somente atividades com exposição solar (fl. 290). Assim, após exame físico-clínico criterioso e análise da documentação juntada aos autos, conclui que a parte autora não apresenta incapacidade laborativa.
Forçoso reconhecer que em matéria de benefício previdenciário por incapacidade a prova pericial assume grande relevância na decisão, contudo o laudo pericial não vincula o Juiz, ainda mais, quando os documentos juntados aos autos não se coadunam com a realidade fática demonstrada pelo perito judicial.
Neste ponto, cabe ressaltar que no tocante à fratura anterior de fêmur e insuficiência vascular, a conclusão pericial se coaduna com os documentos juntados aos autos, tendo em vista que restou comprovado que houve melhora do quadro clínico após a cirurgia (fls. 67-69, 73-74, 76-78). Em relação à insuficiência vascular não há relatório de médico particular informando a gravidade da doença, tampouco a necessidade de afastamento ao trabalho de forma permanente e/ou temporária, o que corrobora o entendimento do jurisperito. Frise-se que os documentos juntados acerca da referida patologia apenas prescrevem remédios e utilização de meia elástica de compressão (fls. 129,132-133, 177-179, 275-281 e 324).
Quanto à neoplasia de pele, observo que o conjunto probatório demonstra inicialmente uma incapacidade parcial e permanente da parte autora para atividades laborativas, considerando a restrição à radiação solar, que consiste em tomar precauções quanto à exposição prolongada à luz solar, sob pena de favorecer o aparecimento de novos tumores. Em que pese o expert do juízo referir que a moléstia não é incapacitante, reputo que a recomendação imposta pelo perito no sentido de que o autor deve evitar exposição solar sem a proteção de filtro solar e chapéu (fl. 290) já demonstra ipso facto severo impedimento laboral.
Ademais, não se diga que a utilização de protetor solar, chapéu e roupas compridas afastariam a flagrante incapacidade para as atividades habituais do autor (pedreiro, calceteiro), predominantemente sujeitas à exposição solar (CNIS). Exigir que o trabalhador atue constantemente "protegido" por roupas compridas e chapéu, seja no inverno, seja no verão, é demasiado exagerado, uma vez que tornaria o labor por demais sofrido durante os dias quentes e ensolarados que predominam no clima do nosso país.
Assim sendo, entendo que a solução da lide deve ser buscada à luz dos valores sociais que permeiam a legislação previdenciária, calcada na proteção do segurado da Previdência Social. Em face de tal premissa, na aferição da incapacidade laboral não cabe limitar a avaliação aos estritos limites do laudo pericial, senão contextualizá-lo no âmbito das circunstâncias pessoais, sociais, profissionais, econômicas e culturais.
Nesse sentido, resta claro por tudo que dos autos consta, inclusive pelo referido pelo perito judicial, que o retorno do segurado às suas atividades habituais, especialmente por ser inerente a sua prática a exposição à luz solar, inevitavelmente causaria riscos à sua saúde, podendo ocasionar o agravamento, ou mesmo recidiva das moléstias das quais padece.
Ademais, a conclusão pericial no sentido de que o autor foi submetido a diversas cirurgias, podendo verificar no resultado de todas as biópsias que o procedimento foi excelente e que retirou totalmente o câncer, não necessitando de mais tratamento para a doença, afirmando ainda não haver limitação para o labor em relação à referida afecção, por ser necessário apenas serem adotadas medidas de segurança como proteção contra radiação solar, não condiz com a realidade fática demostrada nos autos.
Ressalte-se que desde 2004 (fls. 27-29), conforme documentos juntados aos autos, o autor vem sofrendo com a referida patologia, tendo que se submeter a diversas cirurgias, e a despeito do sucesso de cada cirurgia realizada, conforme observação do jurisperito, não se pode olvidar que foram executadas aproximadamente 20 cirurgias em seu rosto (fls. 57-58, 64, 80, 113-114, 180-183, 194-201, 207, 238, 240, 322-323 e 340), o que corrobora o entendimento de que vem havendo recidiva da doença que já se instalou em diversas partes do rosto, como dorso, região temporal direita, região glabelar, região frontal direita, região frontal esquerda, infrapalpebral esquerda, nariz, infrapalpebral direita, pálpebra inferior esquerda, canto do olho esquerdo, lábio superior, supercílio direito, vertente nasal direita, orelha direita, entre outras (fls. 28, 30-33, 37, 39-48, 50-51, 54, 56, 60-62, 66, 75, 250-265, 338-339, 348 e 354).
Acrescente-se que as diversas cirurgias realizadas têm deixado inúmeras cicatrizes/marcas em seu rosto (fls. 267-268, 319-321 e 352), não se podendo deixar de observar que tal situação fática revela uma impossibilidade a mais de a parte autora adentrar no mercado de trabalho, já tão concorrido, de forma igualitária com outros candidatos em circunstâncias diversa à sua.
Não se pode ocultar que a realidade social, tão propensa a valores superficiais, aonde os múltiplos preconceitos de gênero, raça, cor, classe social, aparência etc têm lugar, tornaria o autor estigmatizado, vivendo uma situação em que estaria inabilitado para a aceitação social plena, bem como, ratifique-se, dificultando sua reinserção no mercado de trabalho.
Portanto, no presente caso, devem ser analisadas as condições clínicas e sociais da parte autora, pois se trata de pessoa com idade já adiantada (possui, atualmente, 56 anos), revelando possuir pouca instrução, sem qualquer especialização, que trabalhava em atividades preponderantemente expostas à radiação solar, bem como que sofre com a patologia da qual é portador sem melhora desde 2004. Assim, o quadro clínico do autor, que envolve proibição à exposição solar, comprovada pela documentação médica e relato do jurisperito, não é compatível com as exigências de sua atividade habitual de pedreiro, calceteiro, sendo que uma possível atuação em outra atividade que não o submeta à exposição solar, dada a instrução parca, bem como a maior dificuldade de ser aceito pelo mercado de trabalho em virtude do estigma social que sofreria (fls. 319-321 e 352), tendo em vista as diversas cirurgias realizadas em várias partes do rosto, seria de todo improvável.
Ressalto que tanto a doutrina quanto a jurisprudência vêm analisando sob o mesmo enfoque apontado acima:
E prossegue o entendimento:
E, nesse mesmo sentido, cito decisão desta Eg. Corte:
Sendo assim, as condições clínicas e socioculturais da parte autora permitem concluir que seria difícil, e até injusto, exigir sua reinserção no mercado de trabalho, ainda que seja em uma atividade que não necessite exposição à luz solar, sendo forçoso reconhecer, portanto, que sua incapacidade para o trabalho é total e permanente.
Desta sorte, diante do conjunto probatório e considerado o princípio do livre convencimento motivado, reputo comprovada a incapacidade total e permanente para atividades laborativas, de forma que a parte autora faz jus ao benefício de aposentadoria por invalidez.
No tocante ao termo inicial do benefício, comprovada a incapacidade laborativa da parte autora, deve ser concedida a aposentadoria por invalidez, a partir da data da cessação administrativa do auxílio doença (20.10.2010 - CNIS), tendo em vista os documentos juntados aos autos (fls. 27-33, 37-48, 50-52, 54-58, 60-64, 66, 72, 75, 80, 113-114, 180-201, 207, 210, 238, 240-266, 319-323, 337-340 e 346-354), que demonstram que não houve melhora do quadro clínico da parte autora apesar dos tratamentos realizados desde 2004 (fls. 27-29), bem como evidenciam que a cessação administrativa do benefício do auxílio doença foi indevida.
Destaco que os valores eventualmente pagos à parte autora, após a data acima, na esfera administrativa, deverão ser compensados por ocasião da execução do julgado.
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% (dez por cento), calculados sobre o valor das parcelas vencidas até a data da r. Sentença, consoante o parágrafo 3º do artigo 20 do Código de Processo Civil de 1973 e a regra da Súmula nº 111 do C. STJ, bem como do entendimento da Terceira Seção (Embargos Infringentes nº 0001183-84.2000.4.03.6111, julgado em 22.09.2011).
Os juros de mora e a correção monetária deverão ser calculados na forma prevista no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, sem prejuízo da aplicação da legislação superveniente, observando-se, ainda, quanto à correção monetária, o disposto na Lei n.º 11.960/2009, consoante a Repercussão Geral reconhecida no RE n.º 870.947, em 16.04.2015, Rel. Min. Luiz Fux.
Em relação à isenção de custas, cabe observar que, nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal (§ 3º do art. 109 da CF/88), o INSS está isento das custas quando lei estadual específica prevê a isenção.
Neste sentido:
Considerando a legislação estadual de São Paulo, especificamente, o art. 6° da Lei n° 11.608/03, com alteração da Lei n° 14.838/12, deve ser isenta das custas a Autarquia federal.
Por fim, verifico que o julgamento procedente do pleito autoral e a natureza alimentar, inerente ao benefício colimado, autoriza a adoção da antecipação dos efeitos da tutela, conforme requerido pela parte autora.
Portanto, independentemente do trânsito em julgado, determino seja enviado e-mail ao INSS, instruído com os documentos do segurado ALBERTO SOARES DE SOUSA, a fim de que se adotem as providências cabíveis à imediata implantação do benefício de aposentadoria por invalidez, com data de início - DIB, em 21.10.2010, e renda mensal inicial - RMI a ser calculada pelo INSS, com observância, inclusive, das disposições do art. 461, §§ 4º e 5º, do Código de Processo Civil de 1973 (art. 497 do Diploma Processual de 2015).
Oficie-se ao INSS, para que proceda à imediata implantação do benefício em voga.
Posto isto, em consonância com o art. 1.013, § 1°, do CPC/2015, voto por DAR PROVIMENTO à Apelação da parte autora, nos termos expendidos na fundamentação.
É o voto.
Fausto De Sanctis
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 05/06/2017 14:53:27 |
