
| D.E. Publicado em 10/11/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0026363-82.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de ação ajuizada em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando à conversão do benefício de auxílio doença "judicialmente concedido ao autor" em aposentadoria por invalidez, com o adicional de 25%, nos termos do art. 45, da Lei nº 8.213/91 (fls. 5).
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.
O Juízo a quo, entendendo não haver ofensa ao princípio da correlação ou congruência, julgou procedente o pedido, condenando o INSS a restabelecer ao autor o benefício de auxílio doença, a partir da cessação administrativa até que seja reabilitado para o desempenho de atividade laborativa de natureza mais leve, que tenha capacidade para realizar. Determinou o pagamento dos valores atrasados, acrescidos de correção monetária desde a citação, conforme critérios adotados por este Tribunal, e juros moratórios de 0,5% ao mês. Isentou o réu da condenação em custas processuais. Os honorários advocatícios foram arbitrados em 10% "sobre o benefício devido da citação até a prolação da sentença" (fls. 125). Concedeu a tutela de urgência.
Inconformada, apelou a autarquia, alegando em síntese:
- haver ocorrido a perda da qualidade de segurado, tendo em vista que, após a concessão administrativa do auxílio doença no período de 8/11/09 a 23/9/10 (NB 31/538.172.818-9, foi deferida a tutela antecipada na ação judicial 2.315/10, que tramitou perante a 2ª Vara Cível da Comarca de Itapetininga/SP, porém, a decisão liminar não foi confirmada em sentença. Ao invés, o processo foi julgado extinto sem julgamento do mérito (art. 267, inc. III, do CPC/73) em 21/3/12, por motivo de o autor não haver sido encontrado quando da intimação para a perícia judicial, sem comunicação do novo endereço, e, instado a dar andamento ao feito, quedou-se inerte (fls. 9/10). Não obstante a extinção, o INSS não foi cientificado para cancelamento do benefício, de modo que o mesmo continuou sendo pago de forma irregular até 31/10/16;
- que após 23/9/10, o autor não mais verteu contribuições ao RGPS, mantendo a condição de segurado até 15/11/11 e
- haver sido constatada na perícia médica judicial a mera incapacidade parcial, devendo ser reformada a R. sentença para julgar improcedente a ação e revogada a tutela de urgência deferida.
- Caso não sejam acolhidas as alegações acima mencionadas, requer a fixação do termo final de pagamento do, facultando-se ao autor efetuar o requerimento de sua prorrogação na via administrativa, bem como a observância dos critérios de correção monetária e juros moratórios nos termos da Lei nº 11.960/09.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
Newton De Lucca
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0026363-82.2017.4.03.9999/SP
VOTO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Nos exatos termos do art. 42 da Lei n.º 8.213/91, in verbis:
Com relação ao auxílio doença, dispõe o art. 59, caput, da referida Lei:
Dessa forma, depreende-se que os requisitos para a concessão da aposentadoria por invalidez compreendem: a) o cumprimento do período de carência, quando exigida, prevista no art. 25 da Lei n° 8.213/91; b) a qualidade de segurado, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios e c) incapacidade definitiva para o exercício da atividade laborativa. O auxílio doença difere apenas no que tange à incapacidade, a qual deve ser temporária.
No que tange ao recolhimento de contribuições previdenciárias, devo ressaltar que, em se tratando de segurado empregado, tal obrigação compete ao empregador, sendo do Instituto o dever de fiscalização do exato cumprimento da norma. Essas omissões não podem ser alegadas em detrimento do trabalhador que não deve - posto tocar às raias do disparate - ser penalizado pela inércia alheia.
Importante deixar consignado, outrossim, que a jurisprudência de nossos tribunais é pacífica no sentido de que não perde a qualidade de segurado aquele que está impossibilitado de trabalhar, por motivo de doença incapacitante.
Feitas essas breves considerações, passo à análise do caso concreto.
In casu, encontra-se acostado aos autos o extrato de consulta realizada no CNIS - Cadastro Nacional de Informações Sociais, a fls. 43, com registros de atividades do autor nos períodos de 1º/6/96 a fevereiro/97, 22/7/05 a 19/10/05, 1º/11/05 a 19/11/05 e 7/8/06 a abril/09, recebendo auxílio doença por acidente do trabalho no período de 22/4/08 a 31/1/09, e auxílio doença previdenciário no período de 8/11/09 a 23/9/10.
Outrossim, quanto ao requisito da incapacidade, no parecer técnico de fls. 77/79, cuja perícia médica judicial foi realizada em 8/11/16, o esculápio encarregado do referido exame afirmou que, segundo cópias de atestados médicos apresentados, o autor, de 35 anos e vendedor, é portador de AIDS (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida) desde 2003, e apresentou Neurosífilis tratada em janeiro/14. "Seu exame físico não evidenciou doença infecciosa atual (ver exame físico) ou manifestação clínica de baixa imunidade, no entanto apresenta deficiência visual (perda de visão do olho esquerdo) e deficiência física (claudicação da marcha por sequela neurológica em perna direita). (...) O reclamante além das limitações citadas apresenta sequelas que embora não cause invalidez leva a incapacidade parcial e definitiva com restrições para atividades que exija visão binocular como operar máquinas e equipamento com potencial risco de acidentes, ser motorista profissional e para tarefas com necessidade de realizar longas caminhadas ou se manter em pé por longo período."
No tocante à tutela antecipada concedida em 19/1/11 até dezembro/16, nos autos do processo nº 2.315/10, que tramitou perante a 2ª Vara Cível da Comarca de Itapetininga/SP, como bem asseverou o MM. Juiz a quo: "Os documentos médicos trazidos com a inicial, aliados à conclusão pericial, demonstram que o autor esteve incapaz por todo esse período, notadamente porque portador de HIV desde o ano de 2003, restando evidenciado que a situação foi se agravando progressivamente. (...) Isto posto, facilmente se conclui, após a análise dos fatos sob os vários prismas, a dificuldade de reinserção da parte autora no concorrido mercado de trabalho que enfrentamos, o que é corroborado pelas restrições físicas permanente (visão monocular e claudicação). Assim, as condições sociais da parte autora, aliadas às peculiaridades das doenças que a acometem, SMJ, autorizam a concessão de auxílio-doença, devido a partir da cessação do benefício na esfera administrativa, em dezembro de 2016" (fls. 111). Assim, a carência e a qualidade de segurado encontram-se comprovadas, tendo em vista que a presente ação foi ajuizada em 27/1/16, ou seja, no prazo previsto no art. 15, da Lei nº 8.213/91.
Esclareço que, anteriormente, adotava o posicionamento no sentido de não ser possível a concessão de benefício por incapacidade ao portador do vírus HIV na fase assintomática da doença. No entanto, impressionado com a correção e excelência da decisão monocrática proferida pelo E. Ministro Benedito Gonçalves, por ocasião da apreciação do Agravo em Recurso Especial nº 642.950-SC, passei a conceder tal benefício na hipótese mencionada. Asseverou o E. Ministro Relator, em sua decisão: "Em princípio, o portador do vírus HIV, nos períodos assintomáticos, não está impedido de exercer atividades laborais. Como é sabido, recentes avanços no tratamento do vírus aumentaram bastante a qualidade e a expectativa de vida desses pacientes, que muitas vezes têm condições de levar vida normal por um longo período de tempo. Entretanto, sem embargo do trabalho social que vem sendo desenvolvido pelos órgãos oficiais e por diversas organizações da sociedade civil, não se pode ignorar que ainda existe acentuada resistência de grande parte da sociedade, inclusive do meio empresário, em aceitar, sem distinções em seu meio, o portador do vírus do HIV, esteja ou não com a doença AIDS/SIDA ativa. O estigma a que está sujeito é ainda bastante profundo e interfere sobremaneira nas suas chances de colocar-se profissionalmente no mercado de trabalho. Não por outra razão que informações relativas ao eventual portador são revestidas de aspecto confidencial, na tentativa, quase nunca eficaz, de resguardá-lo das consequências nefastas da publicidade dessa condição de infectado. Trata-se de realidade que não pode ser ignorada. A rejeição social implica no fechar de portas do mercado de trabalho, após confirmada a presença do vírus HIV. (...) De se considerar, também, que mesmo aquele cuja doença se encontra assintomática, precisa manter precauções permanentes, porquanto está sujeito a grande número de doenças oportunistas, que se manifestam ante a baixa imunidade do organismo portador do vírus. Esse fato é reconhecido em estudo efetuado pelo próprio Ministério da Saúde, onde se percebe a preocupação com tais doenças, ainda que na fase assintomática do vírus, conforme retrata o item 6.1.2. da Norma Técnica de Avaliação da incapacidade laborativa para fins de Benefícios Previdenciários em HIV/AIDS, anexa à Resolução INSS/DC nº 89, DOU 29.04.2002, in verbis: 'Fase Assintomática. Após a fase aguda autolimitada, segue-se um período assintomático de duração variável, onde o estado clínico básico é mínimo ou inexistente, apesar de alguns pacientes apresentarem uma linfadenopatia generalizada persistente e indolor. Mesmo na ausência de sinais e sintomas, esses indivíduos podem apresentar alterações significativas dos parâmetros imunovirológicos, necessitando de monitoramento clínico-laboratorial periódico, no intuito de se determinar a necessidade e o momento mais adequado para iniciar o uso de terapia antirretroviral. A abordagem clínica nestes indivíduos prende-se a uma história clínica prévia, investigando condições clínicas de base, tais como hipertensão arterial sistêmica, diabetes, DPOC, doenças hepáticas, renais, pulmonares, intestinais, doenças sexualmente transmissíveis, tuberculose e outras doenças endêmicas, doenças psiquiátricas, se a pessoa faz uso prévio ou atual de medicamentos, enfim, situações que podem complicar ou serem agravantes em alguma fase de desenvolvimento da doença pelo HIV. A história familiar, hábitos de vida, avaliação do perfil emocional e psicossocial e seu nível de entendimento e orientação sobre a doença, também são importantes. No que diz respeito a avaliação laboratorial nesta fase, uma ampla variedade de alterações podem estar presentes...' Assim, não se pode exigir do doente portador de HIV a mesma condição para o labor de uma pessoa que não tem o vírus ou que padece de outras espécies de doenças caracterizadas pela condição crônica ou progressiva".
Dessa forma, embora a perícia médica tenha concluído que a parte autora não está inválida para o trabalho, entendo que a aferição da incapacidade, enquanto somatória das condições de saúde e pessoais de cada indivíduo, requer a valoração de aspectos não só científicos, mas também sócioeconômicos, culturais e profissionais. Referida asserção se justifica pelo fato de que, mesmo assintomático, o portador do vírus HIV traz consigo o estigma que acarreta a sua segregação profissional, restringindo sobremaneira a sua inserção no mercado de trabalho. Tais circunstâncias levam-me à conclusão de que não lhe seria fácil, senão ilusório, iniciar outro tipo de atividade.
Ademais, o portador de tal patologia está sujeito a tratamento médico regular e contínuo - com efeitos colaterais frequentemente debilitantes - com vistas a prevenir complicações e assegurar a estabilização do quadro clínico.
Dessa forma, deveria ser concedida a aposentadoria por invalidez pleiteada na exordial. Contudo, mantenho o auxílio doença deferido em sentença, à míngua de recurso do autor requerendo a reforma da R. sentença, devendo perdurar até a cessação da incapacidade, constatada por perícia médica, ou até a reabilitação profissional. Deixo consignado, contudo, que o benefício não possui caráter vitalício, tendo em vista o disposto nos artigos 59 e 101, da Lei nº 8.213/91.
Tendo em vista que a parte autora já se encontrava incapacitada desde a cessação do auxílio doença, o benefício deve ser concedido a partir daquela data.
O pressuposto fático da concessão do benefício é a incapacidade da parte autora, que é anterior ao seu ingresso em Juízo, sendo que a elaboração do laudo médico-pericial somente contribui para o livre convencimento do juiz acerca dos fatos alegados, não sendo determinante para a fixação da data de aquisição dos direitos pleiteados na demanda.
Assim, caso o benefício fosse concedido somente a partir da data do laudo pericial, desconsiderar-se-ia o fato de que as doenças de que padece a parte autora são anteriores ao ajuizamento da ação e estar-se-ia promovendo o enriquecimento ilícito do INSS que, somente por contestar a ação, postergaria o pagamento do benefício devido em razão de fatos com repercussão jurídica anterior.
Nesse sentido, merecem destaque os acórdãos abaixo, in verbis:
Quadra acrescentar, ainda, que deverão ser deduzidos na fase de execução do julgado os eventuais valores percebidos pela parte autora na esfera administrativa.
No que diz respeito à reabilitação profissional, dispõe o art. 62, da Lei n.º 8.213/91:
Dessa forma, cabe ao INSS submeter o requerente ao processo de reabilitação profissional, não devendo ser cessado o auxílio-doença até que o segurado seja dado como reabilitado para o desempenho de outra atividade que lhe garanta a subsistência ou, quando considerado não recuperável, for aposentado por invalidez, consoante expressa disposição legal acima transcrita.
Ademais, não há que se falar em fixação do termo final do benefício. Dispõe o art. 101 da Lei nº 8.213/91:
Nestes termos, não se nega que ao INSS é permitida a realização de exame médico-pericial voltado a verificar se houve modificação no estado de saúde do segurado. Contudo, é defeso à autarquia suspender automaticamente o benefício implementado por força de decisão judicial, sob pena de descumprimento da ordem proferida, ressaltando, ainda, que a autorização legal prevista no artigo acima mencionado não retira a competência do Magistrado para revogar ou não a tutela anteriormente concedida.
Nesse sentido, já decidiu esta E. Corte, in verbis:
A correção monetária deve incidir desde a data do vencimento de cada prestação e os juros moratórios a partir da citação, momento da constituição do réu em mora.
Com relação aos índices de atualização monetária e taxa de juros --- não obstante o meu posicionamento de que a referida matéria deveria ser discutida na fase da execução do julgado, tendo em vista a existência da Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 a ser apreciada pelo C. Supremo Tribunal Federal ---, passei a adotar o entendimento da 8ª Turma desta Corte, a fim de que seja observado o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal que estiver em vigor no momento da execução do julgado.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS para fixar a correção monetária e os juros moratórios na forma acima explicitada.
É o meu voto.
Newton De Lucca
Desembargador Federal Relator
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| Data e Hora: | 24/10/2017 16:08:07 |
