
| D.E. Publicado em 23/01/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do autor para conceder a aposentadoria por invalidez, e dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007621-56.2014.4.03.6105/SP
RELATÓRIO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de ação ajuizada em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando ao restabelecimento do auxílio doença e sua conversão em aposentadoria por invalidez. Pleiteia, ainda, indenização por dano moral.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fls. 306).
Intimado o INSS a apresentar proposta de acordo, nos termos da Portaria PGF nº 258/16, manifestou-se no sentido da ausência de interesse (fls. 381/382vº).
O Juízo a quo não acolheu o pedido de indenização por danos morais, entendendo não haver sido comprovado dolo tampouco negligência do médico do INSS, e julgou parcialmente procedente a ação, condenando a autarquia ré a restabelecer o auxílio doença ao autor, a partir da data da cessação do benefício, em 31/10/14 (fls. 394). Determinou, ainda, o pagamento dos valores atrasados, acrescidos de correção monetária, desde os respectivos vencimentos, conforme a Lei nº 11.960/09, com base no IPCA, "índice que melhor reflete a inflação acumulada no período", e juros moratórios de "0,5%, a partir da citação, com fundamento no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com redação MP 2.180-35/2001 (ADIs 4357/DF e 4425/DF)", contando-se "de forma decrescente para as prestações posteriores a tal ato processual e de forma globalizada para as anteriores", incidindo "até a apresentação dos cálculos voltados à execução do julgado, observando-se a prescrição quinquenal" (fls. 384). Isentou o réu da condenação em custas processuais. Considerando que o autor e o INSS são parcialmente sucumbentes, determinou a distribuição proporcional das despesas, nos termos do art. 86, caput, do CPC/15, não havendo condenação em honorários advocatícios. Concedeu a tutela de urgência.
Inconformada, apelou a autarquia, alegando em síntese:
- a ausência de incapacidade laborativa desde janeiro/10, conforme apontado no laudo pericial, vez que, após a cessação do auxílio doença em 2014, o demandante voltou ao mercado de trabalho como segurado facultativo, com o recolhimento de contribuições, consoante o extrato do CNIS de fls. 394.
- Caso não seja acolhida a alegação acima mencionada, pleiteia a suspensão do cumprimento da decisão, em razão do perigo de irreversibilidade da tutela deferida em sentença, a fixação do termo inicial do benefício no dia posterior à sua última contribuição previdenciária, bem como a aplicação da Lei nº 11.960/09 por todo o período da conta de liquidação, no tocante à correção monetária e juros moratórios.
Por sua vez, apelou, também, a parte autora, requerendo, em síntese:
- a fixação da verba honorária, entre o mínimo de 10% e o máximo de 20% sobre o valor das parcelas vencidas até a data do acórdão (art. 85, § 2º, do CPC/15), considerando que seu pedido de restabelecimento de auxílio doença foi julgado procedente;
- a conversão do auxílio doença em aposentadoria por invalidez, vez que constatada no laudo pericial a incapacidade parcial e permanente, havendo a necessidade de ser levada em consideração a idade, o baixo nível de escolaridade e o desempenho habitual da função de mecânico, não havendo a possibilidade de reabilitação para outra atividade, como salientou a Sra. Perita e
- não estar o magistrado adstrito às conclusões do parecer técnico.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
Newton De Lucca
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007621-56.2014.4.03.6105/SP
VOTO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Nos exatos termos do art. 42 da Lei n.º 8.213/91, in verbis:
Com relação ao auxílio doença, dispõe o art. 59, caput, da referida Lei:
Dessa forma, depreende-se que os requisitos para a concessão da aposentadoria por invalidez compreendem: a) o cumprimento do período de carência, quando exigida, prevista no art. 25 da Lei n° 8.213/91; b) a qualidade de segurado, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios e c) incapacidade definitiva para o exercício da atividade laborativa. O auxílio doença difere apenas no que tange à incapacidade, a qual deve ser temporária.
No que tange ao recolhimento de contribuições previdenciárias, devo ressaltar que, em se tratando de segurado empregado, tal obrigação compete ao empregador, sendo do Instituto o dever de fiscalização do exato cumprimento da norma. Essas omissões não podem ser alegadas em detrimento do trabalhador que não deve - posto tocar às raias do disparate - ser penalizado pela inércia alheia.
Importante deixar consignado, outrossim, que a jurisprudência de nossos tribunais é pacífica no sentido de que não perde a qualidade de segurado aquele que está impossibilitado de trabalhar, por motivo de doença incapacitante.
Feitas essas breves considerações, passo à análise do caso concreto.
Primeiramente, deixo de analisar os requisitos da carência e qualidade de segurado, à míngua de recurso do INSS impugnando tais matérias.
Outrossim, quanto ao requisito da incapacidade, no parecer técnico de fls. 347/364, cuja perícia médica judicial foi realizada em 5/10/15, a esculápia encarregada do referido exame afirmou, com base no exame físico e documentação médica dos autos, que o autor de 50 anos e torneiro mecânico por toda a vida laborativa, com grau de escolaridade ensino médio, é portador de sequelas de toxoplasmose cerebral e ocular, infecção pelo HIV, epilepsia. hipotireoidismo, hipertensão arterial e tabagismo. Apresenta história clínica de neurotoxoplasmose, diagnosticada em janeiro/10, após exclusão de neoplasia cerebral, por investigação de quadro de perda de consciência no Natal de 2009. "Sucessivamente diagnosticada infecção pelo HIV (AIDS) e membrana epi-retiniana em olho direito com diminuição da visão do mesmo olho. Em 2011 foi submetido a tratamento cirúrgico em olho direito. Desde então é acompanhado na UNICAMP (desde abril de 2010 com a neurologia), no ambulatório de doenças sexualmente transmissíveis e AIDS do município de Campinas/SP, com o oftalmologista Dr. Lucas Quagliato. Toma medicamentos para o tratamento da AIDS, para hipertensão arterial, hipotireoidismo e colírio para o olho direito" (fls. 361), concluindo pela incapacidade permanente para a função de torneiro mecânico, pelo risco de operar equipamento sendo portador de epilepsia, e parcial, em razão da capacidade para o exercício de outra função (fls. 362).
Esclareço que, anteriormente, adotava o posicionamento no sentido de não ser possível a concessão de benefício por incapacidade ao portador do vírus HIV na fase assintomática da doença. No entanto, impressionado com a correção e excelência da decisão monocrática proferida pelo E. Ministro Benedito Gonçalves, por ocasião da apreciação do Agravo em Recurso Especial nº 642.950-SC, passei a conceder tal benefício na hipótese mencionada. Asseverou o E. Ministro Relator, em sua decisão: "Em princípio, o portador do vírus HIV, nos períodos assintomáticos, não está impedido de exercer atividades laborais. Como é sabido, recentes avanços no tratamento do vírus aumentaram bastante a qualidade e a expectativa de vida desses pacientes, que muitas vezes têm condições de levar vida normal por um longo período de tempo. Entretanto, sem embargo do trabalho social que vem sendo desenvolvido pelos órgãos oficiais e por diversas organizações da sociedade civil, não se pode ignorar que ainda existe acentuada resistência de grande parte da sociedade, inclusive do meio empresário, em aceitar, sem distinções em seu meio, o portador do vírus do HIV, esteja ou não com a doença AIDS/SIDA ativa. O estigma a que está sujeito é ainda bastante profundo e interfere sobremaneira nas suas chances de colocar-se profissionalmente no mercado de trabalho. Não por outra razão que informações relativas ao eventual portador são revestidas de aspecto confidencial, na tentativa, quase nunca eficaz, de resguardá-lo das consequências nefastas da publicidade dessa condição de infectado. Trata-se de realidade que não pode ser ignorada. A rejeição social implica no fechar de portas do mercado de trabalho, após confirmada a presença do vírus HIV. (...) De se considerar, também, que mesmo aquele cuja doença se encontra assintomática, precisa manter precauções permanentes, porquanto está sujeito a grande número de doenças oportunistas, que se manifestam ante a baixa imunidade do organismo portador do vírus. Esse fato é reconhecido em estudo efetuado pelo próprio Ministério da Saúde, onde se percebe a preocupação com tais doenças, ainda que na fase assintomática do vírus, conforme retrata o item 6.1.2. da Norma Técnica de Avaliação da incapacidade laborativa para fins de Benefícios Previdenciários em HIV/AIDS, anexa à Resolução INSS/DC nº 89, DOU 29.04.2002, in verbis: 'Fase Assintomática. Após a fase aguda autolimitada, segue-se um período assintomático de duração variável, onde o estado clínico básico é mínimo ou inexistente, apesar de alguns pacientes apresentarem uma linfadenopatia generalizada persistente e indolor. Mesmo na ausência de sinais e sintomas, esses indivíduos podem apresentar alterações significativas dos parâmetros imunovirológicos, necessitando de monitoramento clínico-laboratorial periódico, no intuito de se determinar a necessidade e o momento mais adequado para iniciar o uso de terapia antirretroviral. A abordagem clínica nestes indivíduos prende-se a uma história clínica prévia, investigando condições clínicas de base, tais como hipertensão arterial sistêmica, diabetes, DPOC, doenças hepáticas, renais, pulmonares, intestinais, doenças sexualmente transmissíveis, tuberculose e outras doenças endêmicas, doenças psiquiátricas, se a pessoa faz uso prévio ou atual de medicamentos, enfim, situações que podem complicar ou serem agravantes em alguma fase de desenvolvimento da doença pelo HIV. A história familiar, hábitos de vida, avaliação do perfil emocional e psicossocial e seu nível de entendimento e orientação sobre a doença, também são importantes. No que diz respeito a avaliação laboratorial nesta fase, uma ampla variedade de alterações podem estar presentes...' Assim, não se pode exigir do doente portador de HIV a mesma condição para o labor de uma pessoa que não tem o vírus ou que padece de outras espécies de doenças caracterizadas pela condição crônica ou progressiva".
Dessa forma, embora a perícia médica tenha concluído que a parte autora não está inválida para o trabalho, entendo que a aferição da incapacidade, enquanto somatória das condições de saúde e pessoais de cada indivíduo, requer a valoração de aspectos não só científicos, mas também sócioeconômicos, culturais e profissionais. Referida asserção se justifica pelo fato de que, mesmo assintomático, o portador do vírus HIV traz consigo o estigma que acarreta a sua segregação profissional, restringindo sobremaneira a sua inserção no mercado de trabalho. Tais circunstâncias levam-me à conclusão de que não lhe seria fácil, senão ilusório, iniciar outro tipo de atividade.
Ademais, o portador de tal patologia está sujeito a tratamento médico regular e contínuo - com efeitos colaterais frequentemente debilitantes - com vistas a prevenir complicações e assegurar a estabilização do quadro clínico.
Dessa forma, deve ser concedida a aposentadoria por invalidez pleiteada na exordial. Deixo consignado, contudo, que o benefício não possui caráter vitalício, tendo em vista o disposto nos artigos 42 e 101, da Lei nº 8.213/91.
Tendo em vista que a parte autora já se encontrava incapacitada desde a cessação do auxílio doença, em 30/10/14, o benefício deve ser concedido a partir daquela data.
O pressuposto fático da concessão do benefício é a incapacidade da parte autora, que é anterior ao seu ingresso em Juízo, sendo que a elaboração do laudo médico-pericial somente contribui para o livre convencimento do juiz acerca dos fatos alegados, não sendo determinante para a fixação da data de aquisição dos direitos pleiteados na demanda.
Assim, caso o benefício fosse concedido somente a partir da data do laudo pericial, desconsiderar-se-ia o fato de que as doenças de que padece a parte autora são anteriores ao ajuizamento da ação e estar-se-ia promovendo o enriquecimento ilícito do INSS que, somente por contestar a ação, postergaria o pagamento do benefício devido em razão de fatos com repercussão jurídica anterior.
Nesse sentido, merecem destaque os acórdãos abaixo, in verbis:
Não merece prosperar a alegação do INSS no sentido de que o autor retornou ao mercado de trabalho, não havendo incapacidade laborativa. Ressalto que, conforme o extrato de consulta ao CNIS - Cadastro Nacional de Informações Sociais, de fls. 394, houve recolhimentos de contribuições no período de 1º/1/15 a 31/8/16, como segurado facultativo, que, por definição do próprio RGPS, designa-se o filiado que não possui renda própria, porém, contribui para a Previdência Social. Dessa forma, ficou comprovado o não recebimento pelo autor de nenhuma remuneração por trabalho desempenhado a partir de 31/10/14, data do termo inicial de concessão do benefício.
Quadra acrescentar, ainda, que deverão ser deduzidos na fase de execução do julgado os valores percebidos pela parte autora a título de tutela de urgência (auxílio doença).
A correção monetária deve incidir desde a data do vencimento de cada prestação e os juros moratórios a partir da citação, momento da constituição do réu em mora.
Com relação aos índices de atualização monetária e taxa de juros, deve ser observado o julgamento proferido pelo C. Supremo Tribunal Federal na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947.
No que diz respeito aos honorários advocatícios, nos exatos termos do art. 85 do CPC/15:
Assim raciocinando, a verba honorária fixada, no presente caso, à razão de 10% sobre o valor da condenação remunera condignamente o serviço profissional prestado.
No que se refere à sua base de cálculo, devem ser levadas em conta apenas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, nos termos da Súmula nº 111, do C. STJ.
Por derradeiro, deve ser mantida a antecipação dos efeitos do provimento jurisdicional final, já sob a novel figura da tutela de urgência, uma vez que evidenciado nos presentes autos o preenchimento dos requisitos do art. 300, do CPC/15.
Inequívoca a existência da probabilidade do direito, tendo em vista o reconhecimento à percepção do benefício pleiteado. Quanto ao perigo de dano, parece-me que, entre as posições contrapostas, merece acolhida aquela defendida pela parte autora porque, além de desfrutar de elevada probabilidade, é a que sofre maiores dificuldades de reversão. Outrossim, o perigo da demora encontra-se evidente, tendo em vista o caráter alimentar do benefício,
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação da parte autora para condenar a autarquia ré a pagar o benefício de aposentadoria por invalidez, a partir do dia seguinte à cessação do auxílio doença, em 30/10/14, deduzindo-se na fase de execução do julgado os valores percebidos a título de tutela de urgência, devendo a verba honorária incidir nos termos do voto, e dou parcial provimento à apelação do INSS para fixar a correção monetária e os juros moratórios na forma acima explicitada.
É o meu voto.
Newton De Lucca
Desembargador Federal Relator
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | NEWTON DE LUCCA:10031 |
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| Data e Hora: | 12/12/2017 15:19:56 |
