
| D.E. Publicado em 06/04/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora e conceder a tutela antecipada, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0039046-54.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de ação ajuizada em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando ao restabelecimento de auxílio doença "desde o requerimento administrativo formulado no dia 12/8/13 e que foi processado pelo nº 31/602.868.005-6" (fls. 7) até sua total recuperação para voltar ao mercado de trabalho ou após a reabilitação profissional ou, ainda, a concessão de aposentadoria por invalidez. Pleiteia, ainda, a tutela antecipada.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita, e indeferida a antecipação dos efeitos da tutela (fls. 32 e vº).
O Juízo a quo julgou improcedente o pedido, sob o fundamento de que se encontra capacitada para exercer suas atividades laborais, vez que constatada no laudo pericial a evolução de seu quadro clínico com o tratamento realizado.
Inconformada, apelou a parte autora, alegando em breve síntese:
- a impossibilidade de labor em ambiente insalubre, porque tendo baixa imunidade, pode estar sujeita ao risco de contrair várias doenças infecciosas, bem como a falta de qualificação profissional, devendo levar-se em consideração tais fatos na aferição da incapacidade.
- Requer a reforma da R. sentença, para a concessão dos benefícios, abono anual, acrescidos de correção monetária, juros moratórios de 1% ao mês e verba honorária de 20% sobre o valor total da condenação.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
Newton De Lucca
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0039046-54.2017.4.03.9999/SP
VOTO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Nos exatos termos do art. 42 da Lei n.º 8.213/91, in verbis:
Com relação ao auxílio doença, dispõe o art. 59, caput, da referida Lei:
Dessa forma, depreende-se que entre os requisitos previstos na Lei de Benefícios, faz-se mister a comprovação da incapacidade permanente da parte autora - em se tratando de aposentadoria por invalidez - ou temporária, no caso de auxílio doença.
In casu, foi acostado aos autos o extrato de consulta realizada no "CNIS - Cadastro Nacional de Informações Sociais" a fls. 44, no qual constam os registros de atividades da demandante nos períodos de 9/10/08 a 22/4/09, 25/6/12 a 7/8/12, 9/10/12 a 7/12/12, 21/2/13 a 15/3/13, recebendo auxílio doença no período de 12/8/13 a 12/9/13.
Com relação ao cumprimento da carência mínima de 12 contribuições mensais, cumpre transcrever o disposto no art. 151, da Lei nº 8.213/91, in verbis:
Impende salientar que não obstante o fato de o período de carência não ser exigido ao segurado acometido das doenças previstas no art. 151 da Lei de Benefícios, deve ser comprovada a qualidade de segurado. A presente ação foi ajuizada em 18/12/13, ou seja, no prazo previsto no art. 15, da Lei nº 8.213/91.
Outrossim, quanto ao requisito da incapacidade, faz-se mister a análise da conclusão da perícia médica.
No laudo pericial de fls. 124/128, cuja perícia judicial foi realizada em 19/5/17, embora tenha o esculápio encarregado do exame afirmado que a autora, de 39 anos, trabalhadora rural em corte de cana e serviços gerais em frigoríficos até 2013, é portadora da patologia de SIDA - CID 10: B24, concluiu que a pericianda encontra-se com a capacidade laborativa preservada. "Em tratamento ambulatorial apresenta comprovantes seriados de exames laboratoriais, evidenciando tolerabilidade imunológica satisfatória. Tem como limitação o estigma de ser portadora de uma doença que causa certa repulsa, por falta de informações, aos contactantes. Alega preconceito no ato de informar antecipadamente sua situação de portadora de HIV ao procurar serviço e por outro lado fica temerosa de ser despedida, se ocultar" (fls. 128).
Esclareço que, anteriormente, adotava o posicionamento no sentido de não ser possível a concessão de benefício por incapacidade ao portador do vírus HIV, na fase assintomática da doença. No entanto, impressionado com a correção e excelência da decisão monocrática proferida pelo E. Ministro Benedito Gonçalves, por ocasião da apreciação do Agravo em Recurso Especial nº 642.950-SC, passei a conceder tal benefício na hipótese mencionada. Asseverou o E. Ministro Relator, em sua decisão: "Em princípio, o portador do vírus HIV, nos períodos assintomáticos, não está impedido de exercer atividades laborais. Como é sabido, recentes avanços no tratamento do vírus aumentaram bastante a qualidade e a expectativa de vida desses pacientes, que muitas vezes têm condições de levar vida normal por um longo período de tempo. Entretanto, sem embargo do trabalho social que vem sendo desenvolvido pelos órgãos oficiais e por diversas organizações da sociedade civil, não se pode ignorar que ainda existe acentuada resistência de grande parte da sociedade, inclusive do meio empresário, em aceitar, sem distinções em seu meio, o portador do vírus do HIV, esteja ou não com a doença AIDS/SIDA ativa. O estigma a que está sujeito é ainda bastante profundo e interfere sobremaneira nas suas chances de colocar-se profissionalmente no mercado de trabalho. Não por outra razão que informações relativas ao eventual portador são revestidas de aspecto confidencial, na tentativa, quase nunca eficaz, de resguardá-lo das consequências nefastas da publicidade dessa condição de infectado. Trata-se de realidade que não pode ser ignorada. A rejeição social implica no fechar de portas do mercado de trabalho, após confirmada a presença do vírus HIV. (...) De se considerar, também, que mesmo aquele cuja doença se encontra assintomática, precisa manter precauções permanentes, porquanto está sujeito a grande número de doenças oportunistas, que se manifestam ante a baixa imunidade do organismo portador do vírus. Esse fato é reconhecido em estudo efetuado pelo próprio Ministério da Saúde, onde se percebe a preocupação com tais doenças, ainda que na fase assintomática do vírus, conforme retrata o item 6.1.2. da Norma Técnica de Avaliação da incapacidade laborativa para fins de Benefícios Previdenciários em HIV/AIDS, anexa à Resolução INSS/DC nº 89, DOU 29.04.2002, in verbis: 'Fase Assintomática. Após a fase aguda autolimitada, segue-se um período assintomático de duração variável, onde o estado clínico básico é mínimo ou inexistente, apesar de alguns pacientes apresentarem uma linfadenopatia generalizada persistente e indolor. Mesmo na ausência de sinais e sintomas, esses indivíduos podem apresentar alterações significativas dos parâmetros imunovirológicos, necessitando de monitoramento clínico-laboratorial periódico, no intuito de se determinar a necessidade e o momento mais adequado para iniciar o uso de terapia antirretroviral. A abordagem clínica nestes indivíduos prende-se a uma história clínica prévia, investigando condições clínicas de base, tais como hipertensão arterial sistêmica, diabetes, DPOC, doenças hepáticas, renais, pulmonares, intestinais, doenças sexualmente transmissíveis, tuberculose e outras doenças endêmicas, doenças psiquiátricas, se a pessoa faz uso prévio ou atual de medicamentos, enfim, situações que podem complicar ou serem agravantes em alguma fase de desenvolvimento da doença pelo HIV. A história familiar, hábitos de vida, avaliação do perfil emocional e psicossocial e seu nível de entendimento e orientação sobre a doença, também são importantes. No que diz respeito a avaliação laboratorial nesta fase, uma ampla variedade de alterações podem estar presentes...' Assim, não se pode exigir do doente portador de HIV a mesma condição para o labor de uma pessoa que não tem o vírus ou que padece de outras espécies de doenças caracterizadas pela condição crônica ou progressiva".
Dessa forma, embora a perícia médica tenha concluído que a parte autora não está inválida para o trabalho, entendo que a aferição da incapacidade, enquanto somatória das condições de saúde e pessoais de cada indivíduo, requer a valoração de aspectos não só científicos, mas também socioeconômicos, culturais e profissionais. Referida asserção se justifica pelo fato de que, mesmo assintomático, o portador do vírus HIV traz consigo o estigma que acarreta a sua segregação profissional, restringindo sobremaneira a sua inserção no mercado de trabalho. Tais circunstâncias levam-me à conclusão de que não lhe seria fácil, senão ilusório, iniciar outro tipo de atividade.
Ademais, o portador de tal patologia está sujeito a tratamento médico regular e contínuo - com efeitos colaterais frequentemente debilitantes -com vistas a prevenir complicações e assegurar a estabilização do quadro clínico.
Quadra acrescentar, ex abundantia, que a Lei nº 7.670/88, estendeu aos portadores da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida - SIDA/AIDS a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio doença, independentemente do cumprimento de carência, sem estabelecer distinção entre aqueles que estão assintomáticos e os que já manifestam os sintomas da doença.
Por derradeiro, em que pese o trabalho realizado pelo Perito de confiança do Juízo, necessário se faz analisar a moléstia e suas implicações para aferição da incapacidade da parte autora, não ficando o magistrado adstrito ao laudo judicial, conforme já decidido pelo C. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Dessa forma, considero comprovada a incapacidade alegada pela parte autora, devendo ser concedida a aposentadoria por invalidez pleiteada na exordial. Deixo consignado, contudo, que o benefício não possui caráter vitalício, tendo em vista o disposto nos artigos 42 e 101, da Lei nº 8.213/91.
Tendo em vista que a parte autora já se encontrava incapacitada desde a cessação do auxílio doença (12/9/13 - fls. 44), o benefício deve ser concedido a partir daquela data.
O pressuposto fático da concessão do benefício é a incapacidade da parte autora, que é anterior ao seu ingresso em Juízo, sendo que a elaboração do laudo médico-pericial somente contribui para o livre convencimento do juiz acerca dos fatos alegados, não sendo determinante para a fixação da data de aquisição dos direitos pleiteados na demanda.
Assim, caso o benefício fosse concedido somente a partir da data do laudo pericial, desconsiderar-se-ia o fato de que as doenças de que padece a parte autora são anteriores ao ajuizamento da ação e estar-se-ia promovendo o enriquecimento ilícito do INSS que, somente por contestar a ação, postergaria o pagamento do benefício devido em razão de fatos com repercussão jurídica anterior.
Nesse sentido, merecem destaque os acórdãos abaixo, in verbis:
Quadra acrescentar, ainda, que deverão ser deduzidos na fase de execução do julgado os eventuais valores percebidos pela parte autora na esfera administrativa.
A correção monetária deve incidir desde a data do vencimento de cada prestação e os juros moratórios a partir da citação, momento da constituição do réu em mora.
Com relação aos índices de atualização monetária e taxa de juros, deve ser observado o julgamento proferido pelo C. Supremo Tribunal Federal na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947.
A verba honorária fixada à razão de 10% sobre o valor da condenação remunera condignamente o serviço profissional prestado, nos termos do art. 85 do CPC/15 e precedentes desta Oitava Turma.
No que se refere à sua base de cálculo, considerando que o direito pleiteado pela parte autora foi reconhecido somente no Tribunal, passo a adotar o posicionamento do C. STJ de que os honorários devem incidir até o julgamento do recurso nesta Corte, in verbis: "Nos termos da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça, o marco final da verba honorária deve ser o decisum no qual o direito do segurado foi reconhecido, que no caso corresponde ao acórdão proferido pelo Tribunal a quo." (AgRg no Recurso Especial nº 1.557.782-SP, 2ª Turma, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, j. em 17/12/15, v.u., DJe 18/12/15).
Por derradeiro, deve ser deferida a antecipação dos efeitos do provimento jurisdicional final, já sob a novel figura da tutela de urgência, uma vez que evidenciado nos presentes autos o preenchimento dos requisitos do art. 300, do CPC/15.
Inequívoca a existência da probabilidade do direito, tendo em vista o reconhecimento à percepção do benefício pleiteado. Quanto ao perigo de dano, parece-me que, entre as posições contrapostas, merece acolhida aquela defendida pela parte autora porque, além de desfrutar de elevada probabilidade, é a que sofre maiores dificuldades de reversão. Outrossim, o perigo da demora encontra-se evidente, tendo em vista o caráter alimentar do benefício, motivo pelo qual concedo a tutela pleiteada, determinando ao INSS a implementação do benefício no prazo de 30 dias, sob pena de multa, a ser oportunamente fixada na hipótese de inadimplemento.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação para conceder à parte autora a aposentadoria por invalidez, desde o dia imediato à data da cessação administrativa do auxílio doença, em 12/9/13, devendo as parcelas vencidas ser acrescidas de correção monetária e juros moratórios na forma acima indicada e arbitro os honorários advocatícios nos termos da fundamentação. Concedo a tutela antecipada, determinando a expedição de ofício ao INSS para que implemente a aposentadoria por invalidez, com DIB em 13/9/13, no prazo de 30 dias.
É o meu voto.
Newton De Lucca
Desembargador Federal Relator
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | NEWTON DE LUCCA:10031 |
| Nº de Série do Certificado: | 47BDFEB73D46F0B2 |
| Data e Hora: | 19/03/2018 16:34:45 |
