
| D.E. Publicado em 29/11/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001338-15.2004.4.03.6122/SP
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta por JULIO PEREIRA DA SILVA (falecido) em face da r. sentença que julgou improcedente o pedido deduzido na inicial, por reputar ausente o requisito da carência. Condenou o requerente ao pagamento de custas e honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor atribuído à causa, observada a gratuidade judiciária deferida ao autor.
Em seu recurso, pleiteia o demandante a concessão de aposentadoria por invalidez, aduzindo ter cumprido os requisitos necessários à obtenção de tal benesse (fls. 175/187).
A parte apelada apresentou suas contrarrazões (fl. 191).
Noticiado o falecimento do autor (fls. 196/197), vieram aos autos a respectiva certidão de óbito (fl. 202) e a ulterior habilitação da herdeira, deferida pelo despacho de fl. 206.
É o relatório.
VOTO
Conheço do recurso de apelação, uma vez cumpridos os requisitos de admissibilidade previstos no art. 1.011 do NCPC.
Discute-se o direito da parte autora a benefício por incapacidade.
Nos termos do artigo 42 da Lei n. 8.213/91, a aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
Por sua vez, o auxílio-doença é devido ao segurado temporariamente incapacitado, nos termos do disposto no art. 59 da mesma lei. Trata-se de incapacidade "não para quaisquer atividades laborativas, mas para aquela exercida pelo segurado (sua atividade habitual)" (Direito da Seguridade Social, Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen, Livraria do Advogado e Esmafe, Porto Alegre, 2005, pág. 128).
Assim, o evento determinante para a concessão desses benefícios é a incapacidade para o trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) ou a incapacidade temporária (auxílio-doença), observados os seguintes requisitos: 1 - a qualidade de segurado; 2 - cumprimento da carência de doze contribuições mensais - quando exigida; e 3 - demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.
No caso dos autos, a ação foi ajuizada em 17/09/2004 (fl. 02) visando à concessão de aposentadoria por invalidez, desde o requerimento administrativo formulado em 08/04/2002 (fl. 13).
O INSS foi citado em 25/10/2004 (fl. 27).
Realizada a perícia médica em 05/05/2005, o laudo ofertado considerou o autor, nascido em 22/06/1946, trabalhador rural e com ensino fundamental incompleto, totalmente incapacitado para o trabalho, por sofrer de crises convulsivas não controladas, a despeito do uso de medicações, e por ser portador de cardiopatia, apresentando distúrbios cognitivos irreversíveis, decorrentes das crises convulsivas. Verificou-se, ainda, que autor não poderia ser reabilitado para outra atividade que lhe garantisse a subsistência (fl. 99).
O perito afirmou que as crises convulsivas tiveram início "há cinco anos", enquanto que a cardiopatia surgiu "há seis meses", conforme os dados colhidos.
A remarcar o quadro de inaptidão apontada, de se destacar o atestado médico de fl. 95, o qual certificou, em 2005, a incapacidade posteriormente constatada no exame realizado em juízo, ao declarar que o autor apresenta "dificuldades para as atividades laborativas", por estar acometido das moléstias ora diagnosticadas.
Por sua vez, os dados do CNIS revelam que o proponente: (a) manteve vínculos empregatícios nos períodos de 13/01/1982 a 11/02/1982, 01/05/1984 a 10/09/1984, 01/11/1988 a 14/12/1988, 01/08/1990 a 10/12/1990, 21/08/1991 a 20/09/1991 e a partir de 01/12/2000, com remuneração percebida até 01/2001; (b) verteu contribuições, como trabalhador avulso, no interstício de 01/01/2002 a 28/02/2002; (c) efetuou recolhimentos, como segurado facultativo, de 01/08/2002 a 31/01/2003; (d) recebeu benefício de amparo social à pessoa portadora de deficiência, no período de 12/07/2006 a 09/12/2007.
A cópia da CTPS do autor traz, ainda, registros de labor rural nos períodos de 10/01/1987 a 13/06/1987 e de 27/03/1991 a 19/04/1991 (fls. 10 e 12).
Como prova oral, tem-se o depoimento pessoal do vindicante, colhido em audiência de instrução e julgamento realizada em 04/05/2005, em que afirmou residir em Herculância/SP há mais de vinte anos, tendo laborado sempre como bóia-fria, para os empregadores Haiashi, Morelato, Pinato, Moacir, Osvaldo Costa e José Fernandes, sem registro em carteira de trabalho. Disse sofrer de problema cardíaco e hipertensão. Relatou, ainda, ter laborado pela última vez, há cerca de dois ou três anos, para Manoel Tenório, sendo que não mais conseguiu trabalhar desde então, por conta de problemas de saúde. Por fim, declarou padecer de "convulsão" (fl. 88).
Nesta audiência, também foram ouvidas duas testemunhas arroladas pelo demandante.
A primeira delas, Raul Caldeira Oliveira, declarou conhecer o autor há aproximadamente vinte e dois anos, da cidade de Herculândia/SP. Afirmou ter laborado com o requerente, como bóia-fria, para os empregadores Pinato, Guerrino Seiscentos, José Fernandes, João Alexandre e João Bonomo, sempre sem registro em carteira de trabalho. Sabe que o demandante passou a apresentar problemas de saúde há dois anos e que não mais labora desde então. Relata que "O autor ia para a roça e tinha convulsão, tendo que retornar para casa" (sic) (fl. 90).
Já a testemunha Laurindo Ribeiro Calixto declarou conhecer o autor há mais de vinte anos, da cidade de Herculândia/SP, tendo com ele laborado como bóia-fria para os empregadores Gerrino, Morelato, José Fernandes, Haiashi, Shiró, Geraldo Moreira e Pinato, sempre sem registro em carteira de trabalho. Relatou que, devido aos problemas de saúde, o autor "vai para a roça e tem "esquecimento", fica zonzo, sem saber onde está" (sic), e que permanece "mais internado do que trabalhando". Afirmou, ainda, terem trabalhado juntos, pela última vez, há cerca de um ano e meio (fl. 92).
Da análise do conjunto probatório formado nos autos, pode-se concluir que, após a cessação das contribuições em 01/2003, o autor viu-se impedido de continuar exercendo suas atividades laborais, em razão da moléstia incapacitante que o acometeu.
Portanto, conclui-se que, à época do surgimento da incapacidade, o vindicante tinha carência e qualidade de segurado.
Desse modo, forçoso reconhecer em favor da parte autora o direito ao benefício de aposentadoria por invalidez, na medida em que o laudo atesta a presença de distúrbios cognitivos irreversíveis, que impossibilitavam o demandante de exercer qualquer ofício capaz de garantir seu sustento. Tal fato demonstra, assim, que a incapacidade do autor se revelava total e permanente, uma vez que, associando-se sua idade e grau de instrução à época da perícia, bem como as condições do mercado de trabalho então vigentes, imperioso concluir que não lhe era possível exercer outra atividade remunerada para manter as mínimas condições de sobreviver dignamente.
Segue aresto do e. Superior Tribunal de Justiça nesse diapasão:
A mesma orientação tem sido seguida por esta Turma: AC 0001343-55.2018.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Gilberto Jordan, v.u., e-DJF3 Judicial 1 DATA: 21/03/2018; AC 0042629-47.2017.4.03.9999, Rel. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias, v.u., e-DJF3 Judicial 1 DATA: 21/03/2018.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data da citação, efetivada em 25/10/2004 (fl. 27), em conformidade com o entendimento esposado pela jurisprudência dominante (Súmula n. 576 do Superior Tribunal de Justiça) e porque, nesta data, o vindicante se revelava inapto para o trabalho.
Outrossim, tendo em vista o óbito do segurado, ocorrido em 09/12/2007 (fl. 202), o benefício deve ser cessado na mencionada data.
Passo à análise dos consectários.
Cumpre esclarecer que, em 20 de setembro de 2017, o STF concluiu o julgamento do RE 870.947, definindo as seguintes teses de repercussão: "1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e 2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina."
Assim, a questão relativa à aplicação da Lei n. 11.960/2009, no que se refere aos juros de mora e à correção monetária, não comporta mais discussão, cabendo apenas o cumprimento da decisão exarada pelo STF em sede de repercussão geral.
Nesse cenário, sobre os valores em atraso incidirão juros e correção monetária em conformidade com os critérios legais compendiados no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observadas as teses fixadas no julgamento final do RE 870.947, de relatoria do Ministro Luiz Fux.
Deve o INSS arcar com os honorários advocatícios em percentual mínimo a ser definido na fase de liquidação, nos termos do inciso II do § 4º do artigo 85 do NCPC, observando-se o disposto nos §§ 3º, 5º e 11 desse mesmo dispositivo legal e considerando-se as parcelas vencidas até a data da decisão concessiva do benefício (Súmula n. 111 do STJ).
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO, para conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por invalidez, desde a data da citação até a data do óbito do demandante, com acréscimo dos consectários nos moldes delineados.
É como voto.
ANA PEZARINI
Desembargadora Federal
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| Data e Hora: | 08/11/2018 17:13:21 |
