Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0000539-87.2018.4.03.6313
Relator(a)
Juiz Federal TAIS VARGAS FERRACINI DE CAMPOS GURGEL
Órgão Julgador
14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
12/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 19/11/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. VISÃO SUBNORMAL EM AMBOS OS
OLHOS. LAUDO OFTALMOLÓGICO POSITIVO. INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE.
DOENÇA PREEXISTENTE AGRAVADA APÓS A FILIAÇÃO AO RGPS. RECURSO INSS
IMPROVIDO.
1. Autora submetida à perícia médica judicial em oftalmologia, que constatou doença genética
que a afeta desde a infância e progrediu para incapacidade total e permanente para toda e
qualquer atividade após a filiação ao RGPS.
2. Ainda que se trate de doença congênita, a vida laboral da parte autora comprova que ela
possuía capacidade para o trabalho até a data de início da incapacidade fixada pelo perito
judicial.
3. Recurso do INSS a que se nega provimento.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000539-87.2018.4.03.6313
RELATOR:41º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: MAINARA SANTOS CORDEIRO DUQUE
Advogado do(a) RECORRIDO: TATIANE ANTONIO TEIXEIRA TORRES - SP374554-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000539-87.2018.4.03.6313
RELATOR:41º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: MAINARA SANTOS CORDEIRO DUQUE
Advogado do(a) RECORRIDO: TATIANE ANTONIO TEIXEIRA TORRES - SP374554-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso interposto pelo INSS contra sentença que julgou procedente o pedido de
concessão de benefício por incapacidade.
De acordo com as razões a sentença deve ser reformada, pois trata-se de “doença congênita,
com início na infância da autora, a qual não melhorou ou se agravou ao longo do tempo, pois
desde os 03 anos de idade a autora já estava incapacitada”. Requer assim a improcedência do
pedido.
Foram apresentadas contrarrazões.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000539-87.2018.4.03.6313
RELATOR:41º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: MAINARA SANTOS CORDEIRO DUQUE
Advogado do(a) RECORRIDO: TATIANE ANTONIO TEIXEIRA TORRES - SP374554-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Recurso foi ofertado tempestivamente.
O artigo 1.013 do Código de Processo Civil preconiza que o recurso devolve à instância
recursal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido
solucionadas desde que relativas ao capítulo impugnado.
O benefício do auxílio doença tem previsão legal no artigo 59 da Lei 8.213/1991, exigindo o
preenchimento de três requisitos: i) manutenção da qualidade de segurado; ii) incapacidade
total e temporária para o exercício da atividade habitual por mais de quinze dias consecutivos; e
iii) cumprimento do período de carência exigido pela lei.
Por sua vez, o benefício de aposentadoria por invalidez tem previsão nos artigos 42 a 47 da Lei
8.213/1991, e também exige o preenchimento de três requisitos: i) manutenção da qualidade de
segurado; ii) incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que garanta a
subsistência; e iii) cumprimento do período de carência exigido pela lei.
Por fim, o benefício de auxílio acidente tem previsão legal no artigo 18, I, h e § 1º bem como no
artigo 86 da Lei 8.213/91, sendo concedido, apenas aos segurados empregados, avulsos e
especiais, como indenização, ao segurado que, após consolidação das lesões decorrentes de
acidente de qualquer natureza, permanecer com sequelas que impliquem na redução da
capacidade para o trabalho que anteriormente exercia. Para fazer jus a este benefício,
igualmente é necessária a qualidade de segurado, não existindo, no entanto, qualquer carência
a ser cumprida (art. 26, I da Lei 8.213/91).
Caso concreto.
A parte autora, nascida em 07/01/1896, foi submetida a perícia na especialidade de
OFTALMOLOGIA, na data de 29/05/2018, que concluiu pela incapacidade laboral total e
permanente, fixando a DII em setembro/2012.
Vejamos o que disse o laudo, em síntese:
“(...)
HISTÓRICO:Distrofia de cones, doença genética, irreversível evoluindo com visão subnormal.
EXAME FÌSICO:
ATUAL:OD: 20/200
OE: 20/200
EXAME COMPLEMENTARES: ERG de campo total: As respostas de bastonetes mostraram-se
normais ambos os olhos. Respostas de cones mostraram-se reduzidas em 96% no olho direito
e 93% no olho esquerdo.
(...)
1. A parte autora é portadora de algum mal ou defeito físico? Em caso positivo, especificá-lo
minuciosamente.
R:Sim. Distrofia de cones e visão subnormal ambos os olhos.
2. Pode o Sr. Perito especificar o inicio da incapacidade da parte autora?
R:Setembro de 2012.
3. Caso a parte autora porte algum mal, este poderá ser recuperado mediante tratamento
medico especializado?
R: Não.
4. Em sendo a parte autora portadora de algum mal, está incapacitada para o trabalho? Em
caso positivo, esta incapacidade é total ou
parcial, temporária ou permanente?
R:Incapacidade total e permanente.
5. É suscetível de reabilitação?
R: Não.
6. O tratamento médico adequado seria capaz de suprimir o mal de que é vitima a parte autora?
R: Não.
(...)”
Ainda foram apresentados os seguintes esclarecimentos: “afirmo que houve agravamento da
patologia, e isto se deve a doença ser prognostico ruim e ser progressiva”.
As alegações do INSS, de que a parte autora estaria incapacitada desde os três anos, portanto
desde antes de sua filiação ao RGPS, ou de que a documentação médica revelaria que a
incapacidade teria se iniciado aos menos em 10/11/2010, não procede.
Com efeito, verifico na CTPS que a parte autora manteve vínculos empregatícios no período de
01/11/2010 a 22/03/2012 (balconista) e a partir de 01/09/2012 (recepcionista). Sua vida laboral
comprova que a doença, ainda que genética e com manifestação a partir de tenra idade, não
lhe incapacitava para o trabalho ao menos até meados do ano de 2012.
Vale ressaltar que a prova pericial realizada judicialmente é soberana a todas as outras provas
para a avaliação da capacidade ou não da parte autora. Vale dizer ainda, que o perito judicial
tem fé pública e ao realizar a perícia e elaborar o laudo, analisa todos os documentos médicos
juntados aos autos e os porventura trazidos na perícia.
O laudo pericial não merece reparo, pois é suficientemente claro e conclusivo e está fundado
em elementos objetivos extraídos da documentação médica e do exame clínico da parte autora.
As razões oferecidas pela parte recorrente não possuem o condão de afastá-lo. Estas não
apresentam informações ou fatos novos que justifiquem a desconsideração do laudo
apresentado, a realização de novas perícias, ou ainda o retorno dos autos ao perito para mais
esclarecimentos.
O perito judicial que elaborou o laudo em referência é imparcial e de confiança deste juízo e o
laudo por ele elaborado encontra-se claro e bem fundamentado.
Com efeito, não obstante o artigo 42, §1º, da lei n. 8213/91 seja cristalino ao exigir a prova de
tal incapacidade mediante a realização de “exame médico-pericial” na via administrativa, na via
judicial é de conhecimento notório a existência dos princípios da liberdade de provas (artigo
369, do NCPC) e do livre convencimento motivado do magistrado (artigo 371, do NCPC), o que
abre, inicialmente, a possibilidade de reconhecimento da existência ou inexistência de
incapacidade laboral por outros meios de prova que não a pericial.
Destaque-se que, embora o magistrado não esteja adstrito ao laudo elaborado pelo perito
judicial, é certo que, não havendo elementos nos autos que sejam aptos a afastar suas
conclusões, tal prova deverá ser prestigiada, posto que equidistante do interesse de ambas as
partes.
A perícia médica tem por escopo não somente analisar os exames e relatórios médicos
apresentados pela parte como também validar, pelo exame clínico, os resultados e impressões
dos médicos da parte autora em conjunto com a profissão por ela exercida.
Digo inicialmente porque, se é inegável que o sistema de produção probatória firmado pelo
Código de Processo Civil não é tarifado, também é cristalino que a comprovação da
incapacidade laboral, sempre fundada em doença ou lesão, tem na prova pericial médica seu
mais importante e poderoso instrumento.
Isso porque tal constatação depende de conhecimentos técnicos na área da Medicina, o que
aponta exatamente para a necessidade de realização de prova pericial, a cargo do perito como
auxiliar de confiança do juízo.
Tal conclusão decorre inexoravelmente do prescrito pelos artigos 149 e 156, do Novo Código de
Processo Civil:
“Art. 149. São auxiliares da Justiça, além de outros cujas atribuições sejam determinadas pelas
normas de organização judiciária, o escrivão, o chefe de secretaria, o oficial de justiça, o perito,
o depositário, o administrador, o intérprete, o tradutor, o mediador, o conciliador judicial, o
partidor, o distribuidor, o contabilista e o regulador de avarias. (...)
Art. 156. O juiz será assistido por perito quando a prova do fato depender de conhecimento
técnico ou científico.
§ 1o Os peritos serão nomeados entre os profissionais legalmente habilitados e os órgãos
técnicos ou científicos devidamente inscritos em cadastro mantido pelo tribunal ao qual o juiz
está vinculado.
§ 2o Para formação do cadastro, os tribunais devem realizar consulta pública, por meio de
divulgação na rede mundial de computadores ou em jornais de grande circulação, além de
consulta direta a universidades, a conselhos de classe, ao Ministério Público, à Defensoria
Pública e à Ordem dos Advogados do Brasil, para a indicação de profissionais ou de órgãos
técnicos interessados.
§ 3o Os tribunais realizarão avaliações e reavaliações periódicas para manutenção do cadastro,
considerando a formação profissional, a atualização do conhecimento e a experiência dos
peritos interessados.
§ 4o Para verificação de eventual impedimento ou motivo de suspeição, nos termos dos arts.
148 e 467, o órgão técnico ou científico nomeado para realização da perícia informará ao juiz os
nomes e os dados de qualificação dos profissionais que participarão da atividade.
§ 5o Na localidade onde não houver inscrito no cadastro disponibilizado pelo tribunal, a
nomeação do perito é de livre escolha pelo juiz e deverá recair sobre profissional ou órgão
técnico ou científico comprovadamente detentor do conhecimento necessário à realização da
perícia.”
No concernente à realização em si da prova pericial e suas formalidades e exigências, a
primeira constatação decorre do prescrito pelo artigo 465, caput, do NCPC, que exige que o
perito seja “especializado no objeto da perícia”.
Outrossim, o artigo 473, do NCPC traz os elementos que deverão constar no corpo dos laudos
periciais, a saber: i) a exposição do objeto da perícia; ii) a análise técnica ou científica realizada
pelo perito; iii) a indicação do método utilizado, esclarecendo-o e demonstrando ser
predominantemente aceito pelos especialistas da área do conhecimento da qual se originou; iv)
resposta conclusiva a todos os quesitos apresentados pelo juiz, pelas partes e pelo Órgão do
Ministério Público.
Por fim, o artigo 477, §2º, do NCPC arrola as duas hipóteses nas quais cabe o esclarecimento,
pelo perito, de pontos levantados pelas partes: i) sobre o qual exista divergência ou dúvida de
qualquer das partes, do juiz ou do órgão do ministério Público; ii) divergente apresentado no
parecer do assistente técnico da parte.
De todo o exposto, verifico que, cumpridos os requisitos legais apontados pelos artigos 465 e
473, do NCPC, o laudo pericial é idôneo, somente sendo admissível sua impugnação em dois
casos: i) quando levantada divergência pelo assistente técnico da parte; ii) quando apontada
divergência ou dúvida pela própria parte.
Por evidente que tais divergências e/ou dúvidas deverão estar devidamente fundamentadas, de
forma pormenorizada e individualizada, além de dizer respeito a fatos ou contradições
existentes no corpo do laudo pericial, não cabendo insurgências em termos de nãoaceitação
das conclusões lançadas ou a envolver matéria de direito.
Tratando-se de perícia médica na área da saúde, sem a presença de patologia complexa e
incomum, basta que seja designado profissional capacitado para tanto e regularmente inscrito
no respectivo conselho de fiscalização, prescindindo-se da especialização correspondente à
enfermidade alegada.
No caso em tela, realizada perícia médica restou comprovada, de forma peremptória, que a
doença da parte autora progrediu para incapacidade total e permanente após a filiação ao
RGPS.
A lide é fruto da discordância entre os fatos alegados e documentos médicos trazidos pela parte
autora e o parecer igualmente médico do perito do INSS.
É justamente pela contrariedade de dois pareceres unilaterais - o da parte e o do INSS, acerca
da mesma situação que surge a necessidade de produção da prova médica em Juízo.
Em que pese a isenção que se espera de cada uma das partes envolvidas (requerente e INSS),
o meio idôneo para dirimir a controvérsia é através da perícia judicial feita a cargo de médico de
confiança do Juízo.
Assim, como não se pode dar ganho de causa a ambas as partes o resultado da demanda não
é outro senão a contrariedade de um dos arcabouços de documentos médicos produzidos.
Assim, ausentes elementos de prova a afastar a conclusão do laudo pericial, a sentença nele
fundada deve ser mantida.
Posto isso, nego provimento ao recurso.
Condeno o Recorrente vencido ao pagamento de honorários advocatícios, os quais fixo
moderadamente, no valor de 10% sobre o valor da condenação. A parte ré ficará dispensada
desse pagamento se a parte autora não for assistida por advogado ou for assistida pela DPU
(STJ, Súmula 421 e REsp 1.199.715/RJ).
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. VISÃO SUBNORMAL EM AMBOS
OS OLHOS. LAUDO OFTALMOLÓGICO POSITIVO. INCAPACIDADE TOTAL E
PERMANENTE. DOENÇA PREEXISTENTE AGRAVADA APÓS A FILIAÇÃO AO RGPS.
RECURSO INSS IMPROVIDO.
1. Autora submetida à perícia médica judicial em oftalmologia, que constatou doença genética
que a afeta desde a infância e progrediu para incapacidade total e permanente para toda e
qualquer atividade após a filiação ao RGPS.
2. Ainda que se trate de doença congênita, a vida laboral da parte autora comprova que ela
possuía capacidade para o trabalho até a data de início da incapacidade fixada pelo perito
judicial.
3. Recurso do INSS a que se nega provimento. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Quarta Turma
Recursal decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA