
| D.E. Publicado em 24/05/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial, dar provimento ao agravo retido interposto pela parte autora, restando prejudicados os apelos da parte autora e do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0005454-31.2011.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de ação previdenciária ajuizada pela parte autora em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, visando o reconhecimento de períodos de atividade especial, a serem convertidos em tempo comum, a fim de viabilizar a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, em sua forma integral.
Concedidos os benefícios da Justiça Gratuita (fl. 57).
Posteriormente, às fls. 93/94, a parte autora interpôs agravo retido em face do indeferimento do pedido de produção de prova pericial.
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido, para reconhecer tão-somente o período de 01.03.1989 a 31.08.1996, como atividade especial exercida pelo autor, convertido em tempo comum, a fim de conceder-lhe o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, porém, em sua forma proporcional, a partir da data do requerimento administrativo, qual seja, 22.10.2010. Concedida a tutela antecipada para determinar a implantação do benefício no prazo de 30 (trinta) dias. Consectários explicitados. Honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento), sobre o valor das parcelas vencidas até a prolação da sentença, nos termos da Súmula n.º 111 do C. STJ. Custas na forma da lei (fls. 97/103 e fls. 109/109vº).
Sentença submetida a reexame necessário.
Inconformado, recorre o INSS (fls. 112/119), sustentando o desacerto da r. sentença quanto ao reconhecimento de atividade especial, haja vista a utilização de equipamentos de proteção individual que neutralizam os efeitos nocivos do labor. Subsidiariamente, requer a alteração dos critérios de correção monetária e juros de mora.
Apela a parte autora (fls. 120/126), requerendo, em preliminar, a apreciação do agravo retido interposto no curso da instrução processual, aduzindo o cerceamento de defesa acarretado pelo indeferimento do pedido de produção de provas periciais indispensáveis a comprovação do quanto alegado e à consequente procedência do pedido principal. No mérito, pretende o reconhecimento da integralidade dos interstícios de atividade especial descritos na exordial, a fim de viabilizar a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, em sua forma integral, mais vantajosa.
Com contrarrazões (fls. 128/130), subiram os autos a esta E . Corte.
É o Relatório.
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Ab initio, insta salientar que em face da alteração legislativa decorrente da entrada em vigor do novo Código de Processo Civil (Lei n.º 13.105/15), a remessa oficial não há de ser conhecida.
DA REMESSA OFICIAL
O novo Estatuto processual trouxe inovações no tema da remessa ex officio, mais especificamente, estreitou o funil de demandas cujo trânsito em julgado é condicionado ao reexame pelo segundo grau de jurisdição, para tanto elevou o valor de alçada, verbis:
Art. 496. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:
I - proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público;
II - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal.
§ 1º Nos casos previstos neste artigo, não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal avocá-los-á.
§ 2º Em qualquer dos casos referidos no § 1º, o tribunal julgará a remessa necessária.
§ 3º Não se aplica o disposto neste artigo quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a:
I - 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito público;
...
§ 4º Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em:
I - súmula de tribunal superior;
II - acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;
III - entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;
IV - entendimento coincidente com orientação vinculante firmada no âmbito administrativo do próprio ente público, consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa.
Convém recordar que no antigo CPC, dispensava do reexame obrigatório a sentença proferida nos casos CPC, art. 475, I e II sempre que a condenação, o direito controvertido, ou a procedência dos embargos em execução da dívida ativa não excedesse a 60 (sessenta) salários mínimos. Contrario sensu, aquelas com condenação superior a essa alçada deveriam ser enviadas à Corte de segundo grau para que pudesse receber, após sua cognição, o manto da coisa julgada.
Pois bem. A questão que se apresenta, no tema Direito Intertemporal, é de se saber se as demandas remetidas ao Tribunal antes da vigência do Novo Diploma Processual - e, consequentemente, sob a égide do antigo CPC -, vale dizer, demandas com condenações da União e autarquias federais em valor superior a 60 salários mínimos, mas inferior a 1000 salários mínimos, se a essas demandas aplicar-se-ia o novel Estatuto e com isso essas remessas não seriam conhecidas (por serem inferiores a 1000 SM), e não haveria impedimento - salvo recursos voluntários das partes - ao seu trânsito em julgado; ou se, pelo contrario, incidiria o antigo CPC (então vigente ao momento em que o juízo de primeiro grau determinou envio ao Tribunal) e persistiria, dessa forma, o dever de cognição pela Corte Regional para que, então, preenchida fosse a condição de eficácia da sentença.
Para respondermos, insta ser fixada a natureza jurídica da remessa oficial.
NATUREZA JURÍDICA DA REMESSA OFICIAL
Cuida-se de condição de eficácia da sentença, que só produzirá seus efeitos jurídicos após ser ratificada pelo Tribunal.
Portanto, não se trata o reexame necessário de recurso, vez que a legislação não a tipificou com essa natureza processual.
Apenas com o reexame da sentença pelo Tribunal haverá a formação de coisa julgada e a eficácia do teor decisório.
Ao reexame necessário aplica-se o principio inquisitório (e não o principio dispositivo, próprio aos recursos), podendo a Corte de segundo grau conhecer plenamente da sentença e seu mérito, inclusive para modificá-la total ou parcialmente. Isso ocorre por não ser recurso, e por a remessa oficial implicar efeito translativo pleno, o que, eventualmente, pode agravar a situação da União em segundo grau.
Finalidades e estrutura diversas afastam o reexame necessário do capítulo recursos no processo civil.
Em suma, constitui o instituto em "condição de eficácia da sentença", e seu regramento será feito por normas de direito processual.
DIREITO INTERTEMPORAL
Como vimos, não possuindo a remessa oficial a natureza de recurso, na produz direito subjetivo processual para as partes, ou para a União. Esta, enquanto pessoa jurídica de Direito Publico, possui direito de recorrer voluntariamente. Aqui temos direitos subjetivos processuais. Mas não os temos no reexame necessário, condição de eficácia da sentença que é.
A propósito oportuna lição de Nelson Nery Jr.:
"A remessa necessária não é recurso, mas condição de eficácia da sentença. Sendo figura processual distinta da do recurso, a ela não se aplicavam as regras do direito intertemporal processual vigente para os eles: a) cabimento do recurso rege-se pela lei vigente à época da prolação da decisão; b) o procedimento do recurso rege-se pela lei vigente à época em que foi efetivamente interposto o recurso - Nery. Recursos, n. 37, pp. 492/500. Assim, a L 10352/01, que modificou as causas em que devem ser obrigatoriamente submetidas ao reexame do tribunal , após a sua entrada em vigor , teve aplicação imediata aos processos em curso. Consequentemente, havendo processo pendente no tribunal, enviado mediante a remessa necessária do regime antigo, o tribunal não poderá conhecer da remessa se a causa do envio não mais existe no rol do CPC 475. É o caso por exemplo, da sentença que anulou o casamento, que era submetida antigamente ao reexame necessário (ex- CPC 475 I), circunstância que foi abolida pela nova redação do CPC 475, dada pela L 10352/01. Logo, se os autos estão no tribunal apenas para o reexame de sentença que anulou o casamento, o tribunal não pode conhecer da remessa ." Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante, 11ª edição, pág 744.
Por consequência, como o Novo CPC modificou o valor de alçada para causas que devem obrigatoriamente ser submetidas ao segundo grau de jurisdição, dizendo que não necessitam ser confirmadas pelo Tribunal condenações da União em valores inferior a 1000 salários mínimos, esse preceito tem incidência imediata aos feitos em tramitação nesta Corte, inobstante remetidos pelo juízo a quo na vigência do anterior Diploma Processual.
Diante disso, não conheço da remessa oficial.
Do benefício
Realizadas tais considerações, observo que a controvérsia havida no presente feito cinge-se ao reconhecimento dos interstícios de atividade especial reclamados pelo autor (23.05.1980 a 13.02.1989 e de 01.03.1989 a 08.10.2003), isso com o intuito de viabilizar a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, em sua forma integral.
Observo que a parte autora requereu a produção de prova técnica pericial com fins de comprovar sua sujeição contínua a condições laborais insalubres desde o ajuizamento da ação (fls. 02/09), inclusive, com a apresentação de quesitos, reiterando expressamente o pedido no curso da instrução processual (fls. 88/90), contudo, tal pretensão foi equivocadamente negada pelo Juízo de Primeiro Grau, circunstância que ensejou a interposição de agravo retido (fls. 93/94).
A fundamentação aventada pelo Juízo a quo para o indeferimento do pedido de elaboração de pericia foi a suposta prescindibilidade da prova, sob o entendimento de que a comprovação dos períodos de labor especial deveria ocorrer exclusivamente através dos documentos acostados aos autos, como Formulários, Laudos e Perfis Profissiográficos Previdenciários (fl. 92).
Todavia, não se atentou o Juízo de Primeiro Grau para as argumentações expendidas pela parte autora acerca da existência de vícios no procedimento de elaboração dos Laudos Técnicos colacionados aos autos, eis que teriam sido elaborados de forma genérica, ou seja, sem a especificação das substâncias químicas e intensidade do ruído a que o segurado teria sido exposto durante sua jornada de trabalho. Além disso, não houve a certificação de que o layout dos ambientes laborais teriam permanecido inalterados, o que seria de rigor.
Consequentemente, nas sentenças proferidas às fls. 97/103 e fls. 109/109vº, o Juízo de Primeiro Grau reconheceu apenas parcialmente os períodos de atividade especial suscitados pelo requerente, excluindo assim, do cômputo de atividade especial um interstício de mais de 16 (dezesseis) anos de labor, isso em virtude da extemporaneidade dos laudos técnicos e da ausência de especificação dos dados contidos nos documentos em questão, circunstância que, a meu ver, não pode ser atribuída ao demandante.
Nesse sentido, observo que o indeferimento do pedido de produção de prova pericial no curso da instrução processual, ensejou claro cerceamento de defesa, acarretando evidente prejuízo à parte autora, eis que inviabilizou a comprovação do quanto alegado na inicial.
Diante disso, há de reconhecer a nulidade das r. sentenças de fls. 97/103 e fls. 109/109vº, com o retorno dos autos ao Juízo de origem, a fim de que seja dada oportunidade do demandante comprovar a caracterização de atividade especial na integralidade dos interstícios relacionados na exordial e, assim, permitir a aferição dos requisitos legais necessários à concessão do benefício almejado, a saber, a aposentadoria por tempo de contribuição.
Nesse sentido, colaciono aos autos, o posicionamento jurisprudencial sobre o tema:
"PROCESSUAL CIVIL. ART. 130 DO CPC. PROVAS. VALORAÇÃO. INDEFERIMENTO IMOTIVADO DA REALIZAÇÃO DE PROVA. CERCEAMENTO DE DEFESA. REAPRECIAÇÃO EM SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO. POSSIBILIDADE. TRATAMENTO IGUALITÁRIO ÀS PARTES NO PROCESSO.
1. Ação de obrigação de fazer cominada com reparação de danos em que a parte autora postula, na fase instrutória, realização de provas pericial, testemunhal e documental. Indeferimento da realização das provas pelo juiz de primeira instância. Julgamento antecipado da lide, com entendimento de ser dispensável a realização das referidas provas por haver elementos suficientes para a solução da contenda.
2. Apelação provida para anular a sentença por julgar ter havido cerceamento de defesa. Retorno dos autos à fase de instrução.
(...)
6. O indeferimento de realização de provas, possibilidade oferecida pelo art. 130 do CPC, não está ao livre arbítrio do juiz, devendo ocorrer apenas, e de forma motivada, quando forem dispensáveis e de caráter meramente protelatório.
7. Verificado, pela Corte revisional, o cerceamento de defesa pelo indeferimento da realização de prova requerida pela parte somada à insuficiência dos fundamentos de seu indeferimento, há de se reparar o erro, garantindo-se o constitucional direito à ampla defesa.
(...)
11. Recurso especial a que se nega provimento." (STJ, Resp 637547/RJ, 1ª Turma, Rel. Min. José Delgado, v.u., DJ 13.09.04, p. 186).
Confira-se, ainda:
"Não obstante a fundamentação da r. sentença, nesse caso, faz-se necessária a produção de prova pericial para a comprovação dos agentes agressivos e, assim, possibilitar o exame do preenchimento dos requisitos para a concessão da aposentadoria especial ou aposentadoria por tempo de contribuição (...) Assim, ao julgar parcialmente procedente o feito, sem franquear ao requerente a oportunidade de comprovar o labor especial, o MM. Juiz a quo efetivamente cerceou o seu direito de defesa, de forma que a anulação da r. sentença é medida que se impõe" (TRF3 - AC n.º 2010.61.13.003392-9/SP - Rel. Des. Fed. Tânia Marangoni - j. 22.04.2015).
Anote-se que a despeito do necessário reconhecimento da nulidade das r. sentenças de fls. 97/103 e fls. 109/109vº, não há de se falar na incidência do preceito contido no art. 1.013, § 3º, do Código de Processo Civil, haja vista a ausência de provas indispensáveis para a regular apreciação do quanto alegado pelas partes e o consequente julgamento do feito.
Por outro lado, considerando a natureza alimentar do benefício previdenciário em comento, consigno que deve ser mantida a tutela antecipada concedida pelo Juízo de Primeiro Grau, pois presentes os requisitos legais autorizadores.
DISPOSITIVO
Isto posto, NÃO CONHEÇO DO REEXAME NECESSÁRIO e DOU PROVIMENTO AO AGRAVO RETIDO INTERPOSTO PELA PARTE AUTORA ÀS FLS. 93/94, para anular as sentenças de fls. 97/103 e fls. 109/109vº e, por consequência, determino o retorno dos autos à Vara de origem, para regular instrução do feito, com a realização da prova pericial requerida pelo autor, mantendo-se a tutela antecipada concedida anteriormente, haja vista a presença dos requisitos legais autorizadores. Prejudicada a análise de mérito do apelo da parte autora e do apelo do INSS.
É o voto.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 10/05/2016 17:22:09 |
