Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
6071924-56.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
20/08/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 26/08/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ALUNO-APRENDIZ.
PERÍODO RECONHECIDO PARA FINS PREVIDENCIÁRIOS. NATUREZA ESPECIAL DAS
ATIVIDADES LABORADAS PARCIALMENTE RECONHECIDA. MOTORISTA.
ENQUADRAMENTO. EXPOSIÇÃO A RUÍDOS ACIMA DOS LIMITES LEGALMENTE
ADMITIDOS. AGENTE FÍSICO. POSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM
COMUM MEDIANTE APLICAÇÃO DO FATOR PREVISTO NA LEGISLAÇÃO. TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO, CARÊNCIA E QUALIDADE DE SEGURADO COMPROVADOS.
1. A aposentadoria por tempo de contribuição, conforme art. 201, § 7º, da constituição Federal,
com a redação dada pela EC nº 20/98, é assegurada após 35 (trinta e cinco) anos de
contribuição, se homem, e 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher. Nos dois casos,
necessária, ainda, a comprovação da carência e da qualidade de segurado.
2. A jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça, de forma consolidada, reconheceu o direito
à averbação do período de trabalho na qualidade de aluno-aprendiz, exigindo-se, para tanto, a
demonstração de remuneração paga pelo poder público, que pode ser realizada mediante o
fornecimento de utilidades ou em espécie.
3. A legislação aplicável para caracterização da natureza especial é a vigente no período em que
a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, ser levada em
consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até
05.03.1997 e, após, pelos Decretos nº 2.172/97 e nº 3.049/99.
4. Os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas
normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
5. A atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pode
ser considerada especial, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada até então,
era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos
informativos SB-40 e DSS-8030, exceto para o agente nocivo ruído por depender de prova
técnica.
6. É de considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a ruídos superiores a 80 decibéis, de
06.03.1997 a 18.11.2003, a exposição a ruídos de 90 decibéis e, a partir de então, a exposição a
ruídos de 85 decibéis.
7. Efetivo exercício de atividades especiais comprovado por meio de formulários de insalubridade
e laudos técnicos que atestam a exposição a agentes físicos agressores à saúde, em níveis
superiores aos permitidos em lei.
8. No caso dos autos, os períodos incontroversos em virtude de acolhimento na via administrativa
totalizam 28 (vinte e oito) anos, 01 (um) mês e 06 (seis) dias de tempo de contribuição, não tendo
sido reconhecidos como de natureza especial nenhum dos períodos pleiteados (ID 97534881).
Por sua vez, tendo em vista os termos da apelação da parte autora, reputo superada a
controvérsia relativamente a especialidade dos períodos de 05.03.1997 a 02.10.2002 e
03.10.2002 a 17.11.2003, não acolhidos na sentença prolatada. Ocorre que, no período de
01.10.1992 a 04.03.1997, a parte autora exerceu a função de motorista (ID 97534879 – fls. 01/02
e 97534878 - fl. 4), devendo ser reconhecida a natureza especial dessa atividade, pelo regular
enquadramento no código 2.4.4 do Decreto nº 53.831/64. Por sua vez, no período de 19.11.2003
a 30.11.2005, a parte autora esteve exposta a ruídos acima dos limites legalmente admitidos (ID
97534879 – fls. 03/04), devendo ser reconhecida a natureza especial das atividades exercidas
nesses períodos, conforme código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.5 do Decreto nº
83.080/79, código 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e código 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99, neste
ponto observado, ainda, o Decreto nº 4.882/03. Ainda, finalizando, o período de 18.11.2003 deve
ser reconhecido como tempo de contribuição comum, ante a ausência de comprovação de
exposição a quaisquer agentes físicos, químicos ou biológicos (ID 97534879 – fls. 03/04).
9. Somados todos os períodos comuns e especiais, estes devidamente convertidos, totaliza a
parte autora 33 (trinta e três) anos, 06 (seis) meses e 26 (vinte e seis) diasde tempo de
contribuição até a data do requerimento administrativo (D.E.R. 29.10.2014), insuficiente para a
obtenção do benefício de pleiteado.
10. Com relação aos honorários advocatícios, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da
verba honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art.
85, § 3º, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, todos do CPC/2015.
11. Reconhecido como especiais os períodos de 01.10.1992 a 04.03.1997 e 19.11.2003 a
30.11.2005.
12. Apelações parcialmente providas.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6071924-56.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PAULO CESAR MANARA
Advogado do(a) APELADO: ELOISA BIANCHI - SP144569-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6071924-56.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PAULO CESAR MANARA
Advogado do(a) APELADO: ELOISA BIANCHI - SP144569-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de pedido de aposentadoria
por tempo de contribuição (melhor hipótese financeira) ajuizado por Paulo César Manara em face
do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Sentença pela parcial procedência do pedido, para reconhecer como tempo de contribuição o
período exercido como aluno-aprendiz em escola agrícola no período de 02.02.1982 a
20.12.1984, bem como o período de 18.11.2003 a 30.11.2005 como sendo de natureza especial,
fixando a sucumbência (ID 97534905).
Apelação do INSS pela improcedência total do pedido formulado na exordial (ID 97534910).
Apelação da parte autora pelo reconhecimento da especialidade do período de 01.10.1992 a
04.03.1997 com a correspondente concessão do benefício postulado (ID 97534915)
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6071924-56.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PAULO CESAR MANARA
Advogado do(a) APELADO: ELOISA BIANCHI - SP144569-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Pretende a parte autora, nascida em
25.01.1964, o reconhecimento do período de 02.02.1982 a 20.12.1984, em que foi aluno-
aprendiz, bem como exercício de atividades especiais nos períodos de 01.10.1992 a 02.10.2002
e 03.10.2002 a 30.11.2005, e a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de
contribuição (melhor hipótese financeira), a partir do requerimento administrativo (D.E.R.
29.10.2014).
Para elucidação da controvérsia, cumpre distinguir a aposentadoria especial, prevista no art. 57
da Lei nº 8.213/91, da aposentadoria por tempo de contribuição, prevista no art. 52 do mesmo
diploma legal, pois a primeira pressupõe o exercício de atividade laboral considerada especial,
pelo tempo de 15, 20 ou 25 anos, sendo que, cumprido esse requisito, o segurado tem direito à
aposentadoria com valor equivalente a 100% do salário-de-benefício (§ 1º do art. 57), não
estando submetido à inovação legislativa da EC 20/98, ou seja, inexiste pedágio ou exigência de
idade mínima, nem submissão ao fator previdenciário, conforme art. 29, II, da Lei nº 8.213/91.
Diferentemente, na aposentadoria por tempo de contribuição pode haver tanto o exercício de
atividades especiais como o exercício de atividades comuns, sendo que os períodos de atividade
especial sofrem conversão em atividade comum, aumentando assim o tempo de serviço do
trabalhador, e, conforme a data em que o segurado preenche os requisitos, deverá se submeter
às regras da EC 20/98.
Atividade sem anotação em CTPS.
Inicialmente, no que se refere ao período de 02.02.1982 a 20.12.1984, em que a parte autora foi
aluno-aprendiz do "ETEC Dr. Carolino da Motta e Silva", registro que o vínculo de aprendizado
não deve ser considerado para fins previdenciários.
A Súmula nº 96 do Tribunal de Contas da União, por sua vez, assim dispõe:
"Conta-se para todos os efeitos, como tempo de serviço público, o período de trabalho prestado,
na qualidade de aluno-aprendiz, em Escola Pública Profissional, desde que comprovada a
retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de
alimentação, fardamento, material escolar e parcela de renda auferida com a execução de
encomendas para terceiros".
Estabelecidas estas premissas, cumpre ressaltar que a jurisprudência do C. Superior Tribunal de
Justiça, de forma consolidada, reconheceu o direito à averbação do período de trabalho na
qualidade de aluno-aprendiz de estudante do "Instituto Tecnológico da Aeronáutica - ITA",
exigindo-se, para tanto, a demonstração de remuneração paga pela União, que pode ser
realizada mediante o fornecimento de utilidades ou em espécie.
Nesse sentido:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ALUNO APRENDIZ. APOSENTADORIA.
CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO. POSSIBILIDADE. SÚMULA 96 do TCU. RECORRENTE:
OBREIROS. "Conta-se para todos os efeitos, como tempo de serviço público, o período de
trabalho prestado na qualidade de aluno-aprendiz, em Escola Pública Profissional, desde que
comprovada a retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o
recebimento de alimentação, fardamento, material escolar e parcela de renda auferida com a
execução de encomendas para terceiros." -Súmula 96 do TCU. (Precedente). Recurso conhecido
e provido."
(STJ - 5ª Turma, REsp 627051, Rel. José Arnaldo da Fonseca, DJ 28.06.2004, p. 416).
"PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO. ALUNO-APRENDIZ. ITA. ART. 58, INCISO XXI, DO
DECRETO Nº 611/92. O período como estudante do ITA - instituto destinado à preparação
profissional para indústria aeronáutica -, nos termos do art. 58, inciso XXI, do Decreto 611/91 e
Decreto-Lei nº 4.073/42, pode ser computado para fins previdenciários, e o principal traço que
permite essa exegese é remuneração, paga pelo Ministério da Aeronáutica a título de auxílio-
educando, ao aluno-aprendiz. Recurso não conhecido."
(STJ - 5ª Turma, REsp 398018, Rel. Min. Felix Fischer, DJ 08.04.2002 - p. 282). - grifo nosso.
"PREVIDENCIÁRIO. COMPROVAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO. ITA. ALUNO-APRENDIZ. 1. O
tempo de estudante prestado como aluno-aprendiz do ITA, entidade destinada à formação de
profissional para a indústria aeronáutica, pode ser computado para fins de complementação de
tempo de serviço, objetivando fins previdenciários, em face da remuneração paga pelo Ministério
da Aeronáutica, a título de auxílio-educando. 2. Inteligência do artigo 58, inciso XXI, do Decreto
611/92 e do Decreto-Lei nº 4.073/42. 3. Recurso não conhecido."
(STJ - 6ª Turma, REsp 182281, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJ 26.06.2000 - p. 207). - grifo
nosso.
No caso em tela, restou demonstrado que a parte autora foi remunerada de forma indireta,
mediante “o fornecimento de alojamento constando de dormitório e alimentação gratuitos” (ID
97534880), de modo que o período de 02.02.1982 a 20.12.1984 deve ser computado como tempo
de serviço para fins previdenciários.
Da atividade especial.
No que se refere à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação
aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi
efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a
disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelo
Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de
contribuição para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95, como a seguir se
verifica.
O art. 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original que “(...) A relação de atividades
profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física será objeto de lei específica (...)”. Com a
edição da Medida Provisória nº 1.523/96, tal dispositivo legal teve sua redação alterada, com a
inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º, na forma que segue:
“Art. 58. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes
prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da
aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será definida pelo Poder Executivo.
§ 1º a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante
formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, emitido pela
empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho
expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
§ 2º Deverão constar do laudo técnico referido no parágrafo anterior informação sobre a
existência de tecnologia de proteção coletiva que diminua a intensidade do agente agressivo a
limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo.
§ 3º A empresa que não mantiver laudo técnico atualizado com referência aos agentes nocivos
existentes no ambiente de trabalho de seus trabalhadores ou que emitir documento de
comprovação de efetiva exposição em desacordo com o respectivo laudo estará sujeita à
penalidade prevista no art. 133 desta Lei.
§ 4º A empresa deverá elaborar e manter atualizado perfil profissiográfico abrangendo as
atividades desenvolvidas pelo trabalhador, e fornecer a este, quando da rescisão do contrato de
trabalho, cópia autêntica deste documento [...]”.
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida
pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na
MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados
os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação foi definida apenas com a edição do
Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV). Ocorre que, em se tratando de matéria
reservada à lei, tal disposição somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de
10.12.1997, razão pela qual a apresentação de laudo técnico só pode ser exigida a partir dessa
ultima data. Nesse sentido é o entendimento majoritário do E. STJ:
“PREVIDENCIÁRIO - RECURSO ESPECIAL - APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO -
CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM - POSSIBILIDADE - LEI
8.213/91 - LEI 9.032/95 - LAUDO PERICIAL INEXIGÍVEL - LEI 9.528/97.
[...]
- A Lei nº 9.032/95 que deu nova redação ao art. 57 da Lei 8.213/91 acrescentando seu § 5º,
permitiu a conversão do tempo de serviço especial em comum para efeito de aposentadoria
especial. Em se tratando de atividade que expõe o obreiro a agentes agressivos, o tempo de
serviço trabalhado pode ser convertido em tempo especial, para fins previdenciários.
- A necessidade de comprovação da atividade insalubre através de laudo pericial, foi exigida após
o advento da Lei 9.528, de 10.12.97, que convalidando os atos praticados com base na Medida
Provisória nº 1.523, de 11.10.96, alterou o § 1º, do art. 58, da Lei 8.213/91, passando a exigir a
comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, mediante formulário, na
forma estabelecida pelo INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico
das condições ambientais do trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de
segurança do trabalho. Tendo a mencionada lei caráter restritivo ao exercício do direito, não pode
ser aplicada à situações pretéritas, portanto no caso em exame, como a atividade especial foi
exercida anteriormente, ou seja, de 17.11.75 a 19.11.82, não está sujeita à restrição legal.
- Precedentes desta Corte.
- Recurso conhecido, mas desprovido” (STJ; Resp 436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge
Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482).
Assim, em tese, pode ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo
sem a apresentação de laudo técnico, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada
até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação
dos informativos SB-40 e DSS-8030 (exceto para o agente nocivo ruído, por depender de prova
técnica).
Ressalto que os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não
havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre
as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
Saliento que não se encontra vedada a conversão de tempo especial em comum, exercida em
período posterior a 28.05.1998, uma vez que ao ser editada a Lei nº 9.711/98, não foi mantida a
redação do art. 28 da Medida Provisória nº 1.663-10, de 28.05.98, que revogava expressamente
o parágrafo 5º, do art. 57, da Lei nº 8.213/91, devendo, portanto, prevalecer este último
dispositivo legal, nos termos do art. 62 da Constituição da República.
Quanto ao agente nocivo ruído, o Decreto nº 2.172, de 05.03.1997, passou a considerar o nível
de ruídos superior a 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o
referido decreto, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 decibéis como agente nocivo à
saúde. Com o advento do Decreto nº 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo
de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º,
que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência
Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o
disposto no Decreto nº 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição
a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao C. Superior Tribunal de Justiça que, no
julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do art.543-C do
Código de Processo Civil (Recurso Especial Repetitivo), fixou entendimento pela impossibilidade
de se aplicar de forma retroativa o Decreto nº 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para
85 decibéis, na forma que segue:
“ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E
RESOLUÇÃO STJ 8/2008. DESAFETAÇÃO DO PRESENTE CASO. PREVIDENCIÁRIO.
REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. TEMPO ESPECIAL. RUÍDO. LIMITE DE 90DB NO
PERÍODO DE 6.3.1997 A 18.11.2003. DECRETO 4.882/2003. LIMITE DE 85 DB. RETROAÇÃO.
IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE À ÉPOCA DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.
1. Considerando que o Recurso especial 1.398.260/PR apresenta fundamentos suficientes para
figurar como representativo da presente controvérsia, este recurso deixa de se submeter ao rito
do art.543-C do CPC e da Resolução STJ 8/2008.
2. Está pacificado no STJ o entendimento de que a lei que rege o tempo de serviço é aquela
vigente no momento da prestação do labor. Nessa mesma linha: REsp 1.151.363/MG, Rel.
Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011; REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman
Benjamin, Primeira Seção, DJe 19.12.2012, ambos julgados sob o regime do art. 543-C do CPC.
3. O limite de tolerância para configuração da especial idade do tempo de serviço para o agente
ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto
2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, não sendo possível aplicação retroativa do
Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB
(ex-LICC). Precedentes do STJ.
4. Na hipótese dos autos, a redução do tempo de serviço especial implica indeferimento do
pedido de aposentadoria especial por falta de tempo de serviço.
5. Recurso especial provido” (REsp 1401619/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA
SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014).
Dessa forma, é de se considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a nível de ruído superior
a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, superior a 90 decibéis e, a partir de então, superior a
85 decibéis.
De outra parte, o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, instituído pelo art. 58, §4º, da Lei nº
9.528/97, é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a
identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho,
sendo apto para comprovar o exercício de atividades em condições especiais, fazendo às vezes
do laudo técnico.
E não afasta a validade de suas conclusões o fato de ter sido o PPP ou laudo elaborado
posteriormente à prestação do serviço, vez que tal requisito não está previsto em lei, mormente
porque a responsabilidade por sua expedição é do empregador, não podendo o empregado arcar
com o ônus de eventual desídia daquele e, ademais, a evolução tecnológica tende a propiciar
condições ambientais menos agressivas à saúde do obreiro do que aquelas vivenciadas à época
da execução dos serviços.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com
repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de
atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-
se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao
caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído,
que podem ser assim sintetizadas: “i) tese 1 - regra geral: o direito à aposentadoria especial
pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o
Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não
haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial; e ii) tese 2 - agente
nocivo ruído: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de
tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP),
no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo
de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe
equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte
auditiva, mas também óssea e outros órgãos”.
NO CASO DOS AUTOS, os períodos incontroversos em virtude de acolhimento na via
administrativa totalizam 28 (vinte e oito) anos, 01 (um) mês e 06 (seis) dias de tempo de
contribuição, não tendo sido reconhecidos como de natureza especial nenhum dos períodos
pleiteados (ID 97534881). Por sua vez, tendo em vista os termos da apelação da parte autora,
reputo superada a controvérsia relativamente a especialidade dos períodos de 05.03.1997 a
02.10.2002 e 03.10.2002 a 17.11.2003, não acolhidos na sentença prolatada. Portanto, a
controvérsia colocada nos autos engloba apenas o reconhecimento da natureza especial das
atividades exercidas nos períodos de 01.10.1992 a 04.03.1997 e 18.11.2003 a 30.11.2005.
Ocorre que, no período de 01.10.1992 a 04.03.1997, a parte autora exerceu a função de
motorista (ID 97534879 – fls. 01/02 e 97534878 - fl. 4), devendo ser reconhecida a natureza
especial dessa atividade, pelo regular enquadramento no código 2.4.4 do Decreto nº 53.831/64.
Por sua vez, no período de 19.11.2003 a 30.11.2005, a parte autora esteve exposta a ruídos
acima dos limites legalmente admitidos (ID 97534879 – fls. 03/04), devendo ser reconhecida a
natureza especial das atividades exercidas nesses períodos, conforme código 1.1.6 do Decreto nº
53.831/64, código 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79, código 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e código
2.0.1 do Decreto nº 3.048/99, neste ponto observado, ainda, o Decreto nº 4.882/03.
Ainda, finalizando, o período de 18.11.2003 deve ser reconhecido como tempo de contribuição
comum, ante a ausência de comprovação de exposição a quaisquer agentes físicos, químicos ou
biológicos (ID 97534879 – fls. 03/04).
Sendo assim, somados todos os períodos comuns e especiais, estes devidamente convertidos,
totaliza a parte autora 33 (trinta e três) anos, 06 (seis) meses e 26 (vinte e seis) dias de tempo de
contribuição até a data do requerimento administrativo (D.E.R. 29.10.2014), insuficiente para a
obtenção do benefício de pleiteado.
Com relação aos honorários advocatícios, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba
honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art. 85, §
3º, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, todos do CPC/2015.
Embora o INSS seja isento do pagamento de custas processuais, deverá reembolsar as
despesas judiciais feitas pela parte vencedora e que estejam devidamente comprovadas nos
autos (Lei nº 9.289/96, artigo 4º, inciso I e parágrafo único).
Diante de todo o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS para restringir o período
especial reconhecido na sentença para 19.11.2003 a 30.11.2005, bem como dou parcial
provimento à apelação da parte autora, para reconhecer como especial o período de 01.10.1992
a 04.03.1997, tudo na forma acima explicitada.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ALUNO-APRENDIZ.
PERÍODO RECONHECIDO PARA FINS PREVIDENCIÁRIOS. NATUREZA ESPECIAL DAS
ATIVIDADES LABORADAS PARCIALMENTE RECONHECIDA. MOTORISTA.
ENQUADRAMENTO. EXPOSIÇÃO A RUÍDOS ACIMA DOS LIMITES LEGALMENTE
ADMITIDOS. AGENTE FÍSICO. POSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM
COMUM MEDIANTE APLICAÇÃO DO FATOR PREVISTO NA LEGISLAÇÃO. TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO, CARÊNCIA E QUALIDADE DE SEGURADO COMPROVADOS.
1. A aposentadoria por tempo de contribuição, conforme art. 201, § 7º, da constituição Federal,
com a redação dada pela EC nº 20/98, é assegurada após 35 (trinta e cinco) anos de
contribuição, se homem, e 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher. Nos dois casos,
necessária, ainda, a comprovação da carência e da qualidade de segurado.
2. A jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça, de forma consolidada, reconheceu o direito
à averbação do período de trabalho na qualidade de aluno-aprendiz, exigindo-se, para tanto, a
demonstração de remuneração paga pelo poder público, que pode ser realizada mediante o
fornecimento de utilidades ou em espécie.
3. A legislação aplicável para caracterização da natureza especial é a vigente no período em que
a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, ser levada em
consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até
05.03.1997 e, após, pelos Decretos nº 2.172/97 e nº 3.049/99.
4. Os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo
revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas
normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
5. A atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pode
ser considerada especial, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada até então,
era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos
informativos SB-40 e DSS-8030, exceto para o agente nocivo ruído por depender de prova
técnica.
6. É de considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a ruídos superiores a 80 decibéis, de
06.03.1997 a 18.11.2003, a exposição a ruídos de 90 decibéis e, a partir de então, a exposição a
ruídos de 85 decibéis.
7. Efetivo exercício de atividades especiais comprovado por meio de formulários de insalubridade
e laudos técnicos que atestam a exposição a agentes físicos agressores à saúde, em níveis
superiores aos permitidos em lei.
8. No caso dos autos, os períodos incontroversos em virtude de acolhimento na via administrativa
totalizam 28 (vinte e oito) anos, 01 (um) mês e 06 (seis) dias de tempo de contribuição, não tendo
sido reconhecidos como de natureza especial nenhum dos períodos pleiteados (ID 97534881).
Por sua vez, tendo em vista os termos da apelação da parte autora, reputo superada a
controvérsia relativamente a especialidade dos períodos de 05.03.1997 a 02.10.2002 e
03.10.2002 a 17.11.2003, não acolhidos na sentença prolatada. Ocorre que, no período de
01.10.1992 a 04.03.1997, a parte autora exerceu a função de motorista (ID 97534879 – fls. 01/02
e 97534878 - fl. 4), devendo ser reconhecida a natureza especial dessa atividade, pelo regular
enquadramento no código 2.4.4 do Decreto nº 53.831/64. Por sua vez, no período de 19.11.2003
a 30.11.2005, a parte autora esteve exposta a ruídos acima dos limites legalmente admitidos (ID
97534879 – fls. 03/04), devendo ser reconhecida a natureza especial das atividades exercidas
nesses períodos, conforme código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.5 do Decreto nº
83.080/79, código 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e código 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99, neste
ponto observado, ainda, o Decreto nº 4.882/03. Ainda, finalizando, o período de 18.11.2003 deve
ser reconhecido como tempo de contribuição comum, ante a ausência de comprovação de
exposição a quaisquer agentes físicos, químicos ou biológicos (ID 97534879 – fls. 03/04).
9. Somados todos os períodos comuns e especiais, estes devidamente convertidos, totaliza a
parte autora 33 (trinta e três) anos, 06 (seis) meses e 26 (vinte e seis) diasde tempo de
contribuição até a data do requerimento administrativo (D.E.R. 29.10.2014), insuficiente para a
obtenção do benefício de pleiteado.
10. Com relação aos honorários advocatícios, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da
verba honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art.
85, § 3º, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, todos do CPC/2015.
11. Reconhecido como especiais os períodos de 01.10.1992 a 04.03.1997 e 19.11.2003 a
30.11.2005.
12. Apelações parcialmente providas. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Decima Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento a apelacoes, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
