D.E. Publicado em 05/05/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0016698-91.2007.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de remessa oficial e apelação do INSS interposta em face da r. sentença que julgou procedente o pedido deduzido na inicial, condenando a Autarquia Previdenciária a efetuar a conversão dos períodos especiais indicados na inicial e conceder o benefício de "aposentadoria por tempo de serviço" (contribuição) à parte autora, desde a data do ajuizamento da ação (22.04.2004), ressalvada eventual prescrição quinquenal, discriminados os consectários.
Pretende o INSS que seja reformada a sentença em razão da não comprovação do exercício de atividade especial, pleiteando, subsidiariamente, a fixação do termo inicial do benefício na data da apresentação do laudo pericial, a alteração dos honorários advocatícios e periciais, bem como o afastamento da condenação em custas e despesas processuais por ser a parte autora beneficiária da Justiça Gratuita. Prequestiona a matéria para fins recursais (fls. 202/209).
A parte apelada apresentou suas contrarrazões (fls. 212/217).
É o relatório.
VOTO
Discute-se, no presente feito, o direito da parte autora ao reconhecimento de exercício de atividades em condições especiais e, consequentemente, a benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Nos termos dos artigos 52 e 53 da Lei n.º 8.213/91, a aposentadoria por tempo de serviço (atualmente denominada aposentadoria por tempo de contribuição), é devida, na forma proporcional ou integral, respectivamente, ao segurado que tenha completado 25 anos de serviço (se mulher) e 30 anos (se homem), ou 30 anos de serviço (se mulher) e 35 anos (se homem).
O período de carência exigido, por sua vez, está disciplinado pelo artigo 25, inciso II, da Lei de Planos de Benefícios da Previdência Social, o qual prevê 180 (cento e oitenta) contribuições mensais, bem como pela norma transitória contida em seu artigo 142.
Contudo, após a Emenda Constitucional n.º 20, de 15 de dezembro de 1998, respeitado o direito adquirido à aposentadoria com base nos critérios anteriores até então vigentes, aos que já haviam cumprido os requisitos para sua obtenção (art. 3º), não há mais que se falar em aposentadoria proporcional.
Excepcionalmente, poderá se aposentar, ainda, com proventos proporcionais, o segurado filiado ao regime geral da previdência social até a data de sua publicação (D.O.U. de 16/12/1998) e que tenha preenchido as seguintes regras de transição: idade mínima de 53 (cinquenta e três) anos, se homem, e 48 (quarenta e oito) anos, se mulher e um período adicional de contribuição equivalente a 40% (quarenta por cento) do tempo que, àquela data, faltaria para atingir o limite temporal necessário (art. 9º, § 1º).
No caso da aposentadoria integral, descabe a exigência de idade mínima ou "pedágio", consoante exegese da regra permanente, menos gravosa, inserta no artigo 201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal, como já admitiu o próprio INSS administrativamente.
Registre-se, por oportuno, que, para efeito de concessão desse benefício, poderá ser considerado o tempo de serviço especial prestado em qualquer época, o qual será convertido em tempo de atividade comum, à luz do disposto no artigo 70, § 2º, do atual Regulamento da Previdência Social (Decreto n.º 3.048/1999): "As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum constantes deste artigo, aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período".
Inexiste, pois, limitação temporal à conversão em comento, havendo o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo, inclusive, firmado a compreensão de que se mantém "a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais para comum após 1998, pois a partir da última reedição da MP n. 1.663, parcialmente convertida na Lei 9.711/1998, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o referido § 5º do art. 57 da Lei n. 8.213/1991". Ficou assentado, ademais, que o enquadramento da atividade especial rege-se pela lei vigente ao tempo do labor, mas "a obtenção de benefício fica submetida às regras da legislação em vigor na data do requerimento", ou seja, no momento em que foram implementados os requisitos para a concessão da aposentadoria, como no caso da regra que define o fator de conversão (REsp 1151363/MG, Terceira Seção, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 05/04/2011).
Também, a Corte Superior, ao analisar outro recurso submetido à sistemática do artigo 543-C do CPC/1973, em sintonia com o aresto supracitado, decidiu que a "lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço", de modo que a conversão do tempo de atividade comum em especial, para fins de aposentadoria especial, é possível apenas no caso de o benefício haver sido requerido antes da entrada em vigor da Lei n.º 9.032/95, que deu nova redação ao artigo 57, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, exigindo que todo o tempo de serviço seja especial (REsp 1310034/PR, Primeira Seção, Rel.Min. Herman Benjamin, DJe 19/12/2012).
No tocante à atividade especial, o atual decreto regulamentar estabelece que a sua caracterização e comprovação "obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço" (art. 70,§ 1º), como já preconizava a jurisprudência existente acerca da matéria e restou sedimentado nos referidos recursos repetitivos.
Dessa forma, até o advento da Lei n.º 9.032, de 28 de abril de 1995, para a configuração da atividade especial, basta o seu enquadramento nos Anexos dos Decretos n.ºs. 53.831/64 e 83.080/79, os quais foram validados pelos Decretos n.ºs. 357/91 e 611/92, possuindo, assim, vigência concomitante.
Consoante entendimento consolidado de nossos tribunais, a relação de atividades consideradas insalubres, perigosas ou penosas constantes em regulamento é meramente exemplificativa, não exaustiva, sendo possível o reconhecimento da especialidade do trabalho executado mediante comprovação nos autos. Nesse sentido, a Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos: "Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento".
A partir da referida Lei n.º 9.032/95, que alterou o artigo 57, §§ 3º e 4º, da Lei n.º 8.213/91, não mais se permite a presunção de insalubridade, tornando-se necessária a comprovação da efetiva exposição a agentes prejudiciais à saúde ou integridade física do segurado e, ainda, que o tempo trabalhado em condições especiais seja permanente, não ocasional nem intermitente.
A propósito:
A comprovação podia ser realizada por meio de formulário específico emitido pela empresa ou seu preposto (SB-40, DISES BE 5235, DSS 8030 ou DIRBEN 8030, atualmente, Perfil Profissiográfico Previdenciário-PPP), ou outros elementos de prova, independentemente da existência de laudo técnico, com exceção dos agentes agressivos ruído e calor, os quais sempre exigiram medição técnica.
Posteriormente, a Medida Provisória n.º 1.523/96, com início de vigência na data de sua publicação, em 14/10/1996, convertida na Lei n.º 9.528/97 e regulamentada pelo Decreto n.º 2.172, de 05/03/97, acrescentou o § 1º ao artigo 58 da Lei n.º 8.213/91, determinando a apresentação do aludido formulário "com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho". Portanto, a partir da edição do Decreto n.º 2.172/97, que trouxe o rol dos agentes nocivos, passou-se a exigir, além das informações constantes dos formulários, a apresentação do laudo técnico para fins de demonstração da efetiva exposição aos referidos agentes.
Incluiu-se, ademais, o § 4º do mencionado dispositivo legal, in verbis:
O Decreto n.º 3.048/99, em seu artigo 68, § 9º, com a redação dada pelo Decreto n.º 8.123/2013, ao tratar dessa questão, assim definiu o PPP:
Por seu turno, o INSS editou a Instrução Normativa INSS/PRES n.º 77, de 21/01/2015, estabelecendo, em seu artigo 260, que: "Consideram-se formulários legalmente previstos para reconhecimento de períodos alegados como especiais para fins de aposentadoria, os antigos formulários em suas diversas denominações, sendo que, a partir de 1º de janeiro de 2004, o formulário a que se refere o § 1º do art. 58 da Lei nº 8.213, de 1991, passou a ser o PPP".
Quando à conceituação do PPP, dispõe o artigo 264 da referida Instrução Normativa:
Assim, o PPP, à luz da legislação de regência e nos termos da citada Instrução Normativa, deve apresentar, primordialmente, dois requisitos: assinatura do representante legal da empresa e identificação, por períodos, dos responsáveis técnicos habilitados para as medições ambientais e/ou biológicas.
Na atualidade, a jurisprudência tem admitido o PPP como substitutivo tanto do formulário como do laudo técnico, desde que devidamente preenchido.
A corroborar o entendimento esposado acima, colhem-se os seguintes precedentes:
Quanto ao uso de Equipamento de Proteção Individual - EPI, no julgamento do ARE n.º 664.335/SC, em que restou reconhecida a existência de repercussão geral do tema ventilado, o Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o mérito, decidiu que, se o aparelho "for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial". Destacou-se, ainda, que, havendo divergência ou dúvida sobre a sua real eficácia, "a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial".
Especificamente em relação ao agente agressivo ruído, estabeleceu-se que, na hipótese de a exposição ter se dado acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do EPI, "não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria". Isso porque não há como garantir, mesmo com o uso adequado do equipamento, a efetiva eliminação dos efeitos nocivos causados por esse agente ao organismo do trabalhador, os quais não se restringem apenas à perda auditiva.
No caso concreto, alega a parte autora haver trabalhado em condições especiais na empresa FEPASA FERROVIA PAULISTA S.A., sucedida pela "FERROBAN-Ferrovias Bandeirantes S.A" (atualmente "ALL-AMÉRICA LATINA LOGÍSTICA MALHA PAULISTA S.A."), no período de 28/06/1976 a 01/02/1999, desempenhando as funções de "auxiliar de estação" (de 28/06/1976 a 31/05/1987) e despachador (de 01/06/1987 a 01/02/1999).
No que tange à função de "Auxiliar de Estação C/B/A" (de 28/06/1976 a 31/05/1987), foram encartados aos autos formulário DSS-8030 e laudo técnico (fls. 161/163), os quais informam que o demandante, nesse período, trabalhou de forma habitual e intermitente exposto a intempéries (sol, chuva, frio, calor, poeira, vento etc).
As atividades desenvolvidas em seu local de trabalho ("Estação e Pátio ferroviário de Botucatu/Rubião Jr.") estão assim descritas: "Acompanhava e orientava manobras de vagões tanques cheios de líquidos inflamáveis ou vazios não desgaseificados, distribuição de vagões para carregamento e descarga e a formação de trens. O empregado fazia uso de rádios transceptores p/ comunicação com a equipe de máquina durante manobras e formação de trens".
As testemunhas Silvio Aparecido Machado e Moacir Bulgarelli, ao serem ouvidas em juízo, foram uníssonas em afirmar que trabalharam juntamente com o autor na aludida empregadora, como "auxiliar de estação" e, em tal função, "lidavam com todos os vagões que chegavam, no pátio, estando sujeitos a alta tensão, ao tempo e aos produtos químicos carregados pelos trens, além dos altos ruídos". A partir de 1986/1988, passaram a atuar no controle de tráfego de trens, expostos a ruídos elevados (fls. 186/187).
Porém, os agentes agressivos "eletricidade", "calor", "frio" e "ruído", em razão de sua natureza, exigem apuração técnica com indicação quantitativa de sua intensidade, sem a qual não é possível a aferição da existência de exposição acima dos limites legais de tolerância.
Além disso, os elementos de prova coletados não são bastante para ensejar o convencimento do julgador quanto à alegada insalubridade da atividade laboral, dado que não havia trabalho na via permanente. Desse modo, não se antevê, prima facie, o seu enquadramento no código 2.4.3 do Quadro Anexo ao Decreto n.º 53.831/64.
A perícia levada a efeito por determinação do Juízo "a quo", também não se mostra apta a demonstrar a especialidade da atividade em tela, uma vez que sequer foi realizada no local de trabalho do autor, havendo o perito extraído as suas conclusões com base, exclusivamente, nas afirmações prestadas pelo obreiro e nos documentos encartados nos autos (fls. 156/160).
Ademais, os laudos técnicos produzidos em relação a terceiros, em processos trabalhistas objetivando adicional de periculosidade/insalubridade (fls. 73/105), não se apresentam suficientes para a comprovação do trabalho especial, dado que os reclamantes não possuíam a mesma função do autor, mormente considerando que o agente "eletricidade" ali detectado sequer foi apontado no formulário emitido pela própria empregadora (fls. 161) e no respectivo laudo técnico, expedido por médico do trabalho e engenheiro de segurança do trabalho (fls. 162/163), referentes ao labor desenvolvido pelo demandante.
Portanto, ausente, no formulário e laudo de fls.161/163, a indicação dos índices de temperatura aos quais estaria submetido o autor, incabível o reconhecimento da existência de condições especiais de trabalho no período de 28/06/1976 a 31/05/1987.
No tocante à atividade de despachador, constam dos autos formulário DSS - 8030 e laudo técnico (fls. 70/72), os quais atestam que o requerente trabalhou, de forma habitual e permanente, exposto a ruído equivalente a 82 dB, no período de 01/06/1987 a 31/12/1995 e, após, inferior a 80 dB.
Nesse particular, tendo em vista o princípio "tempus regit actum", restou pacificado na jurisprudência que os níveis de pressão sonora a serem considerados insalubres são os seguintes: acima de 80 dB, na vigência do Decreto n.º 53.831/64 e, a partir de 06/03/1997, superior a 90 dB, conforme Decreto n.º 2.172/97, passando, posteriormente, para acima de 85 dB, a contar de 18/11/2003, quando foi editado o Decreto n.º 4.882/2003, o qual não se aplica retroativamente, consoante assentado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, em recurso submetido ao regime do art. 543-C do CPC/1973 (REsp 1398260/PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 05/12/2014).
Assim, há de ser considerado como atividade especial apenas o período laborado de 01/06/1987 a 31/12/1995, razão pela qual merece reforma a sentença recorrida.
De outra parte, em consulta ao CNIS e conforme recolhimentos juntados às fls. 18/17, constata-se que o autor manteve vínculo com a Previdência Social, na qualidade de autônomo/contribuinte individual, nos períodos de 01/02/1999 a 30/06/2002, 01/08/2002 a 30/11/2002 e de 01/12/2003 a 31/12/2003.
Nota-se, também, que o apelado prestou serviço militar por 01 (um) mês e 03 (três) dias, como faz prova o certificado de reservista de fls.14, fazendo jus à sua contagem como tempo de serviço (contribuição), nos termos do artigo 55, inciso I, da Lei n.º 8.213/91.
Dessa maneira, computando-se tais períodos, o tempo de atividade comum prestado na condição de empregado e aquele aqui considerado como de atividade especial, convertido ao tempo comum, possui o autor, até a data do ajuizamento da ação (22/04/2004), 29 (vinte e nove) anos, 11 (onze) meses e 15 (quinze) dias de serviço, insuficientes, portanto, para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição pleiteada, devendo ser reformada, também nesse aspecto, a douta decisão de primeira instância.
Por fim, tendo em vista que o autor foi vencido em quase a totalidade da demanda, a importar na inversão do ônus da sucumbência, restam prejudicados os demais pontos do apelo da Autarquia.
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS e à REMESSA OFICIAL para reformar a r. sentença recorrida e julgar parcialmente procedente o pedido, a fim de reconhecer como atividade especial apenas o período de 01/06/1987 a 31/12/1995 e determinar a expedição da respectiva certidão de tempo de contribuição em favor do autor, excluindo da condenação os demais períodos tidos como insalubres, bem como a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição postulada.
Considerando que o feito tramitou sob os auspícios da justiça gratuita, deixo de condenar o autor nas verbas de sucumbência, nos termos da Lei 1.060/1950 e em conformidade com o entendimento do E. STF (RE 313.348/RS, Min. Sepúlveda Pertence).
É como voto.
ANA PEZARINI
Desembargadora Federal
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